Resumo
A questao da relaçâo sistemática entre Filosofia da Religiao e Ciência da Religiao permanece até hoje controvertida, mesmo considerando possíveis pontos de convergência. Tais controvérsias orientam, explícita ou implicitamente, a seleçao dos autores que sao considerados clássicos para a área científica da religiao. Este é o caso, por exemplo, da difusa recepçao da obra de Schleiermacher (1768-1834), um proeminente pensador da religiao do século XIX cujo lugar entre o rol dos pioneiros nas pesquisas científicas da religiao continua sendo objeto de discordia para os especialistas. Nao obstante, dificilmente se compreende a trajetória das teorias da religiao desenvolvidas nos últimos dois séculos desconsiderando a mudança paradigmática que Schleiermacher inaugurou. Neste artigo, propomos expor de maneira concisa sua Filosofia da Religiao, a fim de justificar o porqué de sua importância ora reivindicada, e como seu programa epistemológico forneceu um modelo original e inovador para o estudo da religiao em sua época, cuja metodologia deixou marcas indeléveis para as investigaçoes filosóficas e científicas da religiao.
Palavras-chave: ciência; Deus; filosofia; Iluminismo; religiao.
Abstract
The question of systematic relationship between Philosophy of Religion and Science of Religion remains controversial, even considering some possible points of convergence. Such controversies explicitly or implicitly lead the selection of considered classical authors in the scientific field of religion. This is the case, for example, of the diffuse reception of Schleiermacher's work (1768-1834), a prominent religious thinker of the 19th century, whose recognition as one of the pioneers in religion science researches is still subject of disagreement among the current experts. Nevertheless, it is difficult to understand the trajectory of religion theories developed in the last two centuries ignoring the paradigm shift that Schleiermacher opened. Firstly, our proposal is to expose concisely his Philosophy of Religion, in order to justify their due importance here claimed an expose their epistemological program provided an original and innovative model for religious studies in his time, whose methodology left indelible marks for philosophical and scientific investigations on religion.
Keywords: Enlightenment; God; philosophy; religion; science.
Introduçâo
A Filosofía da Religiao surgiu e se desenvolveu, enquanto disciplina específica, somente a partir do Iluminismo europeu dos fins do século XVIII, na medida em que se diferenciou gradativamente da Metafísica e da Ética, muito embora discursos filosóficos ante a religiao sejam tao antigos como a própria tradiçao filosófica. O deísmo inglés e o racionalismo francés constituíram decerto os precursores mais imediatos da disciplina, cujas raízes remetiam à Teologia natural mais antiga (JAESCHKE, 2012)1. Contudo, o ponto de guinada fundamental da incipiente Filosofia da Religiao esteve estreitamente conectado com a filosofía transcendental de Immanuel Kant (1724-1804) e os debates subsequentes oriundos da recepçao de sua obra: por esta razao, o escrito kantiano de 1793 é considerado geralmente a obra literária de estreia desta nova disciplina, a saber, Die Religion innerhalb der Grenzen der bloßen Vernunft (A religiao nos limites da simples razao) (KANT, 1868)2.
Desde entao a Filosofia da Religiao passou a compor definitivamente o cânon das disciplinas filosóficas, desempenhando papeis de destaque, por exemplo, nos sistemas filosóficos de autores como Friedrich D. E. Schleiermacher (1768-1834) e Georg W. F. Hegel (1770-1831) - e isso para ficarmos apenas com dois autores da primeira metade do século XIX que se tornaram extremamente influentes nao só para sua época em particular, mas também para as principais discussoes filosófico-religiosas dos fins do século XIX e início do século XX.
Por sua vez, a Ciéncia da Religiao emergiu principalmente a partir da segunda metade do século XIX, em virtude de uma série de fatores nao imediatamente conexos, mas que fomentaram especialmente estudos no horizonte das ciências empíricas, possibilitando sua institucionalizaçao a partir da década de setenta do século XIX - a primeira cátedra surgiu na Suiça, em Genebra, no ano de 1873, intitulada Histoire des Religions (LANCZKOWSKI, 1980, 76-79; USARSKI, 2006, p. 24-28). Destes fatores centrais para a consolidaçao da disciplina, poder-se-ia destacar, em síntese, o colonialismo e a expansao mercantil, as missoes europeias e o contato com outras religioes, as descobertas arqueológicas, os progressos linguístico-comparados da filologia e o gradual florescimento científico do século XIX nos campos da sociologia, da etnologia e da psicologia da religiao.
Por razoes históricas e sistemáticas, a disciplina da Ciência da Religiao conquistou paulatinamente sua autonomia mediante diferenciaçao epistêmica em face da Teologia e da Filosofia da Religiao. Mas isso nao impediu diversos estímulos que recebeu da Filosofia, em particular do idealismo e romantismo alemaes, assim como da tradiçao filológico-hermenéutica desenvolvida pela Teologia (DIERKEN, 2009, p. 11). Entretanto, ainda que deixemos de lado as discussoes mais acirradas com relaçao à Teologia e, além disso, mesmo considerando os possíveis pontos de convergência entre filósofos e cientistas da religiao no transcurso do desenvolvimento destes saberes, permanece até hoje controvertida a questao da relaçao sistemática entre Filosofia da Religiao e Ciência da Religiao (HOCK, 2010)3.
Nao restam dúvidas de que estas duas disciplinas, a filosófica e a científica, percorreram direçoes diferentes e independentes desde o final do século XIX. Além disso, a Filosofia da Religiao contém uma miríade de abordagens que podem ou nao dialogar com a Ciência da Religiao, dependendo de sua maior ou menor proximidade dos estudos socioculturais e históricos das religioes. Mas a Ciência da Religiao também nao desfruta de unanimidade acerca de seu perfil paradigmático, de modo que o diálogo com a Filosofia da Religiao é frequentemente condicionado pela orientaçao epistemológica: quando o que está em jogo é uma abordagem compreensiva ou hermenéutica há abertura para esta interlocuçao, mas ela se torna árdua quando se defende perspectivas radicalmente empírico-positivistas.
Nao pretendemos explorar aqui as razoes históricas que, ora aproximaram, ora afastaram cientistas da religiao e filósofos. Particularmente no ámbito da pesquisa brasileira, existe geralmente um descompasso na área da Ciéncia da Religiao com relaçao à recepçao da Filosofía da Religiao clássica, o que se agrava ainda mais quando autores tao caros à própria tradiçao da Ciéncia da Religiao sao isolados dos intercámbios filosóficos em que suas teorias se forjaram4. Por um lado, este descompasso é motivado pela necessidade de afirmaçao da identidade e autonomia da Ciéncia da Religiao diante da Filosofia e, principalmente, diante da Teologia. Por outro lado, os estudos de Filosofia da Religiao no Brasil ainda sao bastante reatraídos, sobretudo a respeito daqueles autores da tradiçao idealista e romántica que contribuíram para a constituiçao da Ciéncia da Religiao (PAINE, 2013)5.
Para os propósitos do presente estudo, convém ressaltar o fato de que a Filosofia da Religiao foi especialmente responsável pela reformulaçao teórica da compreensao de religiao na modernidade, pois nao só concebeu como objeto da filosofia um conceito universal de religiao, para além do uso cristao do termo, mas também foi responsável pela valorizaçao do estudo histórico das religioes. Deste modo, se a filosofia nao foi diretamente promotora dos avanços historiográficos e empíricos, a partir dos quais a Ciéncia da Religiao se tornou disciplina autónoma, tratou-se decerto da antecámara de disciplinas que se desenvolveram ulteriormente: como, por exemplo, a Historia Comparada das Religioes e a Fenomenología da Religiao, subdisciplinas que foram fundamentais para a configuraçao clássica dos estudos científico-religiosos.
Com o intuito de aprofundar exemplarmente em que sentido se pode afirmar que a Filosofia da Religiao clássica tornou-se a antecámara de estudos importantes para a Ciência da Religiao, propomos a seguir uma breve análise da Filosofia da Religiao de Schleiermacher, um autor fundamental às discussoes de religiao desde 0 século XIX, mas cujo lugar entre o rol dos pioneiros nas pesquisas da Ciência da Religiao permanece até hoje objeto de discordia, muito embora dificilmente se possa negar sua importáncia e influência. Pretendemos justificar o porqué de sua centralidade para os estudos da religiao e como seu programa filosófico da religiao constituiu um modelo original e inovador para o estudo das religioes da época, conquistando, ao mesmo tempo, lugar sistemático próprio e autónomo, que se beneficiou das pesquisas históricas de seu tempo sem precisar disputar espaço com a Teologia.
1 Diálogo com Schleiermacher
Nas pesquisas atuais da Ciência da Religiao ainda continua objeto de controvérsia se Schleiermacher pode ou nao ser reunido junto à plêiade dos autores clássicos da área (KRECH, 2010)6. Mas também nao é tarefa fácil excluí-lo definitivamente da história da disciplina, menos ainda para a tradiçao de estudos da religiao realizados na Alemanha (WAGNER, 1985)7. Na verdade, dificilmente se compreenderia a trajetória das teorias da religiao desenvolvidas nos últimos dois séculos desconsiderando a mudança paradigmática do conceito de religiao (SORRENTINO, 2000; ADRIAANSE, 2000)8 que Schleiermacher inaugurou, por exemplo, com a publicaçao em 1799 de sua obra Über die Religion: Reden na die Gebildeten unter ihren Verächtern (Sobre a religiao: discursos aos seus desprezadores cultos) (SCHLEIERMACHER, 1984)9.
Nesta obra, Reden (Discursos) - conforme ficou amplamente conhecida, Schleiermacher defende a tese da distinçao entre religiao, metafísica e moral, com o que acentua, para o conceito de religiao, uma dimensao de experiencia própria e autónoma, categorialmente distinta de atividades volitivas e cognitivas, tais como a açao e o pensamento. Por esta razao, define-se religiao a partir de uma provincia independente, i.e., como "mtuiçao e sentimento", esfera que se determina como "sentido e gosto pelo Infinito" (SCHLEIERMACHER, 1984, p. 211; 212). Trata-se de um deslocamento conceitual do ámbito, por assim dizer, cognitivo - teórico e prático - para um ámbito vivencial ou pré-cognitivo. Além disso, Schleiermacher complementa sua abordagem revalorizando as religioes positivas ou históricas - pois elas sao o lugar de facto em que se efetivam e se desenvolvem as intuiçoes e sentimentos na sua expressao social-comunicativa, que é também investigada como fenómeno histórico próprio e independente10.
Contudo, a modificaçao teórica fundamental consistiu na emancipaçao do conceito de religiao de sua referência tradicional teológica, ou seja, ao conceito teísta de Deus, contribuindo para que a religiao se tornasse, efetivamente, objeto de um discurso nao exclusivamente teológico - pois mesmo o uso universal e moral-abstrato do conceito de religiao desenvolvido pelo iluminismo nao se divorciou da ideia de Deus como legislador moral do mundo (Kant). Tratou-se de uma mudança tao profunda na abordagem tradicional da Teologia que mesmo o discurso teológico haveria de se referir à religiao como comunidade de fé histórica: em outras palavras, o conceito de religiao assume o primeiro plano, deixando em segundo plano, inclusive, o conceito tradicional de Deus - que até entao desempenhava papel central nas teorias de religiao (DIERKEN, 2005, p. 245).
De ser assim, o conceito de Universum assume o lugar privilegiado nas Reden, subordinando o conceito de Deus a um momento particular e periférico do conceito de religiao. Nao é imprescindível para as religioes possuir um conceito específico de Deus, pois "a divindade nao é nada mais do que um modo de intuiçao religiosa individual" (SCHLEIERMACHER, 1984, p. 243). Portanto, o conceito de Deus é apenas uma representaçao condicionada pela consciência religiosa e pelos estágios da cultura, mas nao é o critério decisivo de distinçao entre as religioes.
Do ponto de vista metodológico, Schleiermacher conjugou nas Reden uma teoria da religiao em geral com uma abordagem das religioes positivas ou históricas - a saber: uma teoria da religiâo e das religioes, como se deixa evidenciar na remissao à dupla dimensao fenoménica da religiao: por um lado, ela se deixa conhecer "segundo sua esséncia interna, entao, trata-se de um produto da natureza humana", por outro lado, trata-se de um "resultado do tempo e da história" (SCHLEIERMACHER, 1984, p. 198). A manifestaçao da religiao no interior do homem é a condiçao de possibilidade das religioes positivas ou históricas. A investigaçao deste lócus interno da religiao marca o ponto de partida da pergunta pela essência da religiao. Ao mesmo tempo, a condiçao concreta de manifestaçao desta essência supoe um caráter comunicativo e positivo, cuja efetivaçao se dá na forma das religioes históricas, sem as quais nao haveria uma objetivaçao possível da natureza interior da religiao. Em última análise, a teoria da religiao de Schleiermacher exige um duplo modo de conhecimento possível que se complementa reciprocamente, ou seja, uma discussao da condiçao subjetiva vis-à-vis sua descriçao histórico-positiva.
Nao é difícil perceber a antecipaçao de tópicos e motivos que se tornariam ulteriormente centrais para o desdobramento dos estudos científicos da religiao. Trata-se de impulsos teóricos perceptíveis principalmente nas áreas da Ciência da Religiäo comparada e da fenomenologia da religiäo, e que repercutem até mesmo na concepçâo de Ciência da Religiäo sistemática de Joachim Wach (MOHN, 2011). Além disso, tem-se já bem documentado os efeitos da teoria da religiäo de Schleiermacher em autores incontestes da Ciência da Religiäo, tais como Friedrich Max Müller (1823-1900)11, além de Nathan Söderblom (1866-1931), Rudolf Otto (1869-1937) e Gerardus van der Leeuw - sendo que este último recebeu a influência de Schleiermacher via W. B. Kristensen (1867-1953), conhecedor da obra de Wilhelm Dilthey (1833-1911) que, como se sabe, näo só conhecia a obra schleiermacheriana como foi um de seus principais comentadores na segunda metade do século XIX (GLADIGOW, 1997, p. 26; KRECH, 2010, p. 70-72).
Contudo, o debate acerca da teoria da religiäo de Schleiermacher näo se restringiu evidentemente à sua formulagäo nas Reden. Pelo contrário, o período de sistematizagäo de seu pensamento é posterior12, muito embora conserve as coordenadas teóricas principais da obra juvenil. Como se indicou acima, nas Reden se articulam especialmente uma discussäo sobre a religiäo (essência) e sobre as religioes (história). No tocante à questäo acerca das religioes, Schleiermacher reservou esta discussäo à disciplina por ele designada, em seu sistema de ciências, de Filosofia da Religiäo. Disciplina que, porém, recebeu escassa atengäo na história da recepgäo filosófica de seu pensamento, sendo na maioria das vezes identificada, contra o interesse sistemático do próprio Schleiermacher, com sua formulagäo da teoria do sentimento (Gefühlstheorie) (SCHOLTZ, 1984)13.
Nos estudos históricos da Ciência da Religiäo é ainda mais grave esta lacuna, pois as atengoes se voltam frequentemente apenas às Reden, sem encontrar tratamento mais detido da concepgäo sistemática da Filosofia da Religiäo do pensamento maduro de Schleiermacher14. Possivelmente duas razoes principáis tenham concorrido conjuntamente para esta lacuna: por um lado, os principais manuscritos filosóficos de Schleiermacher vieram a lume post-mortem, sem terem sido preparados para a publicaçao e sem que houvesse um tratado específico sobre sua Filosofia da Religiao; por outro lado, o principal documento literário na qual a disciplina de Filosofia da Religiao encontrou seu maior desenvolvimento fora justamente seu opus magnum teológico, a saber: Der christliche Glaube nach den Grundsätzen der Evangelischen Kirche im Zusammenhänge dargestellt (A Fé Crista exposta sistematicamente segundo os principios da igreja evangélica), razao pela qual a disciplina permaneceu provavelmente encoberta, na medida em que estava implícita e a serviço da Teologia (SCHLEIERMACHER, 2003)15.
Com respeito ao objetivo do presente estudo, nosso diálogo com Schleiermacher quer ser uma discussao concisa de sua concepçao sistemática da disciplina de Filosofia da Religiao, concentrando-se nos principios e no traço metodológico fundamental de sua abordagem. Para tanto, precisamos delimitar a seguir sua compreensao básica de Teologia, a partir da qual se deixa compreender a Filosofia da Religiao como disciplina autónoma. Até que ponto é possível estabelecer, a partir de nossas análises, contributos históricos à Ciência da Religiao, será objeto de nossas consideraçoes finais.
2 Principios formais da Teologia: delimitaçâo sistemática16
De acordo com o parágrafo de abertura da segunda ediçao da Enciclopédia (1830)17, obra responsável pela exposiçao formal18 de cada disciplina teológica e de sua organizaçao sistemática, define-se Teología como "uma ciência positiva, cujas partes apenas estao conectadas a um todo pela sua referência comum a um modo de fé determinado", ou seja, ciência positiva é um saber organizado em que seus elementos científicos se organizam "para soluçao de uma tarefa prática" (SCHLEIERMACHER, 1998, p. 325-326). Positivo substitui aqui qualificativos como natural, moral e especulativo, rejeitando, respectivamente, as propostas tradicionais da teología naturalis (da ortodoxia protestante), mas também o projeto de uma Teologia moral (Kant) e o de uma Teologia especulativa (Schelling/Hegel). Em síntese, se Teologia é discurso ou ciência sobre Deus, conforme seu étimo original, sua definiçao como ciência positiva efetua uma restriçao cognitiva à possibilidade de uma doutrina racional de Deus (Gotteslehre) em favor de uma doutrina da fé (Glaubenslehre), entendida como uma ciência cujo objeto é uma comunidade de fé ou de vida históricas (SCHLEIERMACHER, 2003, p. 15).
A Teologia possui essencialmente teor ou significado histórico. A consciência religiosa ou piedade (Frömmigkeit) já é sempre historicamente mediada, de sorte que a consciência de Deus se desenvolve no interior de uma religiao positiva - i.e., de uma igreja (Kirche), conceito que se refere à dimensao sociológico-cultural das religioes. Por esta razao, enquanto tarefa prática, toda Teologia está a serviço da direçao da igreja (Kirchenleitung) ou do governo da igreja (Kirchenregiment) (SCHLEIERMACHER, 1998, p. 327- 328). Neste sentido, nao existe uma Teologia em geral ou das religioes, pois, estritamente falando, Teologia é ciência de uma religiao concreta específica - portanto, no caso de Schleiermacher, trata-se da Teología crista evangélica19. Porém, a despeito da referencia óbvia ao cristianismo, o conceito da Teologia é aplicável, em princípio, a qualquer religiao positiva.
Cientificamente considerada, a Teologia é uma grande área acadêmica, cujos saberes que a integram nao precisam ser produzidos exclusivamente no interior das disciplinas teológicas. Na verdade, o caráter científico (universitário) da Teologia pressupoe necessariamente diálogo com os conhecimentos de outras ciências, particularmente aqueles saberes históricos da Ética, que é descrita como a ciência dos princípios da história ou da cultura em geral. Portanto, a Teologia consiste numa disciplina funcional, da mesma maneira que a medicina e o direito20. A consequência imediata deste perfil epistemológico é a seguinte: para o quefazer teológico nao há nenhum empecilho às contribuiçoes de outras ciências. Muito pelo contrário: a Teologia sente necessidade e se apropria, para seus fins práticos, dos resultados científicos desenvolvidos autonomamente pelas outras ciências, dentre as quais, destaca-se a disciplina da Filosofia da Religiao21. Voltaremos a este ponto adiante, antes precisamos expor uma visao geral da organizaçao das ciências teológicas.
Com efeito, a partir da definiçao geral de Teologia como ciência positiva, Schleiermacher divide todo o sistema teológico em três disciplinas interdependentes, a saber: Teologia filosófica, prática e histórica. Esta trilogia organiza todos aqueles saberes necessários à tarefa teológica, articulando-os e tornando-os consistentes para o uso especificamente prático. A Teologia filosófica expoe a essência do cristianismo, a forma da comunidade crista e o tipo particular que a distingue de outras religioes. Por sua vez, a Teologia prática ocupa-se do saber sobre a atividade da direçao eclesiástica, assim como com os saberes técnicos necessários para esta direçao. Já a Teologia histórica consiste no conhecimento mais ampio acerca do todo da igreja que, considerada em seu devir, é produto do passado e condiçao histórica presente.
Considerando o sistema de ciências, o lugar sistemático da obra Glaubenslehre situa-se no âmbito da Teologia histórica, mais especificamente - na parte que Schleiermacher designa de Dogmática. A Teologia dogmática consiste no "conhecimento histórico do estado presente do cristianismo" que se ocupa especialmente da doutrina da igreja evangélica válida para o presente (SCHLEIERMACHER, 1998, p. 393). Neste sentido, as premissas doutrinais de um determinado tempo histórico nao sao necessariamente válidas para outra época, muito menos sao válidas para outras religioes positivas. Para nossas análises subsequentes, devemos considerar mais de perto a Teologia filosófica, que é parcialmente desenvolvida nos prolegómenos da Glaubenslehre.
3 Filosofia da Religiao implícita na Teologia filosófica
Apresentamos sumariamente a definiçao de Teologia e suas subdisciplinas fundamentais. A publicaçao da Glaubenslehre foi a principal contribuiçao para o ramo da Teologia histórica - disciplina que designaríamos hoje de Teologia sistemática22. Mas Schleiermacher nao redigiu uma obra individual sobre Teologia filosófica, com exceçao dos principios formais descritos na Enciclopédia. Nao obstante, com base em seus elementos estruturais e pelos tópicos constitutivos de sua abordagem, a seçao introdutória da Glaubenslehre pode ser classificada como pertencente ao ramo da Teologia filosófica, embora seu desenvolvimento seja parcial, contendo finalidade imediata de delimitar os princípios pressupostos pela Teologia dogmática23.
Conforme a definiçao geral de Teología, toda e qualquer disciplina teológica está conectada com um modo de fé específico. Logo, a Teologia filosófica consiste na tarefa de expor a essência do cristianismo, i.e., o seu modo de fé peculiar ou específico (eigentümlich), pela qual se distingue das outras comunidades de fé. Mas o qualificativo da disciplina como filosófico exige uma consideraçao mais detida de seu sentido. Como já foi dito, o principio de organizaçao disciplinar da Teologia é prático, de maneira que o traço filosófico aqui indicado diz respeito aos conhecimentos de disciplinas nao-teológicas que auxiliam no empreendimento teológico.
Por esta razao, na Introduçao à segunda ediçao da Glaubenslehre, Schleiermacher usa o vocábulo alemao Lehnsätze - lemas - para se referir às proposiçoes de empréstimo retiradas de outras ciências a fim de oferecerem suporte à argumentaçao principal: as très primeiras seçoes do primeiro capítulo sao Lehnsätze provenientes, respectivamente, da Ética filosófica, da Filosofia da Religiao e da Apologética - as duas primeiras sao disciplinas estritamente filosóficas, ao passo que a última é uma disciplina teológica. O uso deste vocábulo era comum à época24, sendo razoável supor que Schleiermacher faça uso aqui de um tipo de demonstraçao lógica similar à de Kant no parágrafo 68 da Crítica da Faculdade do Juízo, quando este último se referia ao fato de que os princípios de uma ciência podem ser internos (principia domestica) ou externos (peregrina); para Kant, a ciência cujos principios sao externos faz uso de Lehnsätze (lemmata), pois seu conceito é emprestado de outra ciência (KANT, 1974, p. 330).
Deste modo, as discussoes filosóficas (Ética filosófica e Filosofia da Religiao) situadas no interior de uma obra teológica - como a Glaubenslehre - possuem pretensao de validade independentemente de pressupostos teológicos. Assim, a Filosofia da Religiao nao devia privilegiar uma religiao positiva em detrimento das outras - como, por exemplo, o cristianismo ante as demais religioes. Para tanto, a Glaubenslehre já pressupôe uma disciplina teológica específica que se dedica especialmente ao cristianismo, a saber, a Apologética. Esta distinçao metodológica é fundamental. A Filosofia da Religiao nao pertence ao sistema teológico, mas ao sistema filosófico, de modo que seu desenvolvimento no interior da Teologia era um pressuposto externo necessário para o quefazer teológico, apropriado pela Apologética, mas nao produzido pela Teologia. Temos agora condiçôes suficientes para considerarmos em detalhe os principios formais da disciplina da Filosofia da Religiao.
4 Filosofia da Religiao: estudo comparado e tipológico
Na primeira ediçao da Enciclopédia (1811) ainda nao aparece explicitamente uma definiçao de Filosofia da Religiao, mas já está decidido que para se cumprir a tarefa da Teologia filosófica, i.e., determinar a essência do cristianismo concatenada com os estudos históricos da Ética, faz-se necessário satisfazer a seguinte condiçao: conservar face a face (Gegeneinanderhalten) tanto a grandeza histórica (particular) do cristianismo quanto a ideia (universal) de religiao e de igreja - pois uma religiao positiva (histórica) nao se deixaria determinar nem por uma pesquisa meramente empírica, nem se deixaria derivar por uma investigaçao puramente científico-abstrata a partir da ideia de religiao (SCHLEIERMACHER, 1998, p. 256-257).
Mas a delimitaçao da disciplina ocorreu somente nos escritos de Ética filosófica de 1812/13 e 1816. O conceito de Filosofia da Religiao (Religionsphilosophie) surge, pela primeira vez, embora ainda de maneira breve e sem detalhamento, na Ética filosófica de 1812/13: trata-se de uma "disciplina crítica" cuja tarefa é "fixar, numa intuiçao comparativa (comparativ), a diferença individual da igreja particular" (SCHLEIERMACHER, 1913, p. 365). De ser assim, a necessidade de conservar face a face os elementos históricos e ideativos significava propriamente comparar. Com efeito, finalmente em seus escritos de Ética filosófica de 1816, o programa de uma disciplina crítica é explicitado de maneira nítida: trata-se da referencia recíproca entre elementos especulativos (das Beschauliche) e empíricos (das Erfahrungsmäßige) (SCHLEIERMACHER, 1913, P- 549).
Deste modo, já na segunda ediçao da Enciclopédia (1830), Schleiermacher expoe completamente sua definiçao de Filosofia da Religiao, respectivamente, nos parágrafos 23 e 32, a saber:
§ 23. O desenvolvimento adicional do conceito de comunidades piedosas precisa produzir também de que maneira e com qual critério se pode distinguir uma [comunidade] da outra, de igual modo, como o componente peculiar das comunidades de fé, historicamente dadas, refere-se a estas diferenças. Esta tarefa tem lugar na Filosofia da Religiao (SCHLEIERMACHER, 1998, p. 334).
§ 32. Dado que a essência individual do cristianismo nao se deixa construir tampouco de maneira puramente científica, como também ela nao pode ser apreendida de maneira simplesmente empírica: assim, ela se deixa determinar apenas criticamente (Cf. § 23) por meio da contraposiçao daquilo que é dado historicamente no cristianismo e por meio das oposiçoes em virtude das quais as comunidades piedosas podem ser diferenciadas umas das outras (SCHLEIERMACHER, 1998, p. 338).
Em suma, a disciplina da Filosofia da Religiao é uma disciplina crítica porque responsável pela síntese entre principios especulativos e empíricos. Para tanto, é exigida a investigaçao comparada das religioes históricas - i.e., o estudo comparado de cada fé historicamente constituída -, com a intençao de se estabelecer distinçoes tipológicas das diferentes religioes positivas (SCHLEIERMACHER, 1998, p. 339). A comparaçao crítica tem como ponto de partida os dados históricos, mas busca elevá-los, pela comparaçao, a formas especulativo-racionais. A partir desta definiçao de Filosofia da Religiao, Schleiermacher busca realizá-lo na Introduçao da Glaubenslehre. Em sua segunda ediçao (1830/31), entende-se por Filosofia da Religiao "uma exposiçao crítica das distintas formas existentes (gegebenen) de comunidades piedosas" (SCHLEIERMACHER, 2003, p. 19). Mas para determinar as diferenças entre estas comunidades, devemos considerar tanto os graus de desenvolvimento como seus tipos ou espécies (Arten) (SCHLEIERMACHER, 2003, p. 60).
Em primeiro lugar, devemos refletir sobre as razôes da necessidade alegada de uma síntese entre trabalho especulativo e empírico. Conforme a metodologia de Schleiermacher, a disciplina da Ética filosófica é responsável por determinar as comunidades de fé - as igrejas - de um modo geral, como associaçôes humanas resultantes da açao (livre) concreta do homem no mundo. Porém, o conceito universal de igreja é insuficiente, por si só, para detalhar as características individuais únicas de cada religiao histórica. Dito de outro modo: nao é possível derivar de maneira meramente dedutiva ou apriorística os dados históricos da ideia sócio-comunicativa geral de igreja, fazendo-se necessária a referência a uma comunidade de fé específica.
Por conseguinte, para se conhecer as manifestaçôes históricas particulares, dever-se-ia aplicar também, além da Ética filosófica, um método empírico de análise deste fenómeno. Só que, uma abordagem meramente empírica também seria indesejável, na medida em que ela careceria de um critério para se determinar o elemento essencial em face dos elementos mutáveis e contingentes. Assim, a Filosofia da Religiao deve ser capaz de equilibrar a necessidade de um método simultaneamente histórico (empírico) e especulativo (apriorístico): ao mesmo tempo em que se busca a base comum das diversas religiôes, pretende-se também estabelecer suas diferenças específicas25.
Schleiermacher estava consciente de que nao definia esta disciplina de maneira convencional, mas nao explicitou qual era a maneira convencional a que se referia (SCHLEIERMACHER, 1998, p. 334). Contudo, aludia provavelmente à compreensao tradicional da disciplina desenvolvida no seio do kantismo, ou seja, como um ramo da filosofia prática e a serviço da moralidade. Deste modo, tratava-se de uma compreensao original da disciplina, privilegiando, no estudo das religiôes, os componentes empírico-históricos e especulativo-classificatórios. Nestes termos, Schleiermacher antecipa formalmente o programa científico desenvolvido posteriormente pela ciência comparada da religiao e pela a fenomenología da religiao do final do século XIX e inicio do século XX.
Porém, consideramos até agora somente os princípios formais da disciplina da Filosofia da Religiao, concentremo-nos brevemente em sua exposiçao material na Glaubenslehre - vale ressaltar que se trata de um documento histórico importante que reúne questoes relativas à interpretaçao das religioes sem recorrer prontamente à autoridade da revelaçao crista que era até entao o procedimento hermenêutico padrao para julgar a história das religioes.
Como se disse, a Filosofia da Religiao deve descrever as comunidades piedosas conforme seus tipos ou géneros e seus graus de desenvolvimento. Mas apenas a classificaçao por tipologias é insuficiente, pois dentro de um determinado género ou grupo nao encontramos necessariamente os mesmos estágios de desenvolvimento das comunidades piedosas. Importante ressaltar que estes niveis de desenvolvimento pertencem à constituiçao da forma do ânimo piedoso, de modo que duas comunidades, espacial ou temporalmente separadas uma da outra podem estar no mesmo nivel de desenvolvimento. Assim, também nao existe falsa religiao diante de uma verdadeira, mas apenas religioes mais ou menos desenvolvidas (SCHLEIERMACHER, 2003, 60-64).
Schleiermacher distingue très tipos-estágios: idolatria - também designada de fetichismo -, politeísmo e monoteísmo. O critério para a distinçao destes diferentes estágios consiste na configuraçao da piedade. Os niveis mais elevados consistem naqueles estados mentais piedosos que enunciam a dependência de todo elemento finito diante do Uno supremo e Infinito. Por esta razao, o monoteísmo é considerado o estágio mais elevado, pois consiste justamente no estado mental em que a totalidade é dependente da unidade - trata-se do sentimento de dependência absoluta26. O fetichismo é o nível mais baixo, pois o sentido para a totalidade ainda nao está desenvolvido - trata-se da autoconsciência confusa cuja expressao é a idolatría. Por sua vez, o politeísmo é o estágio intermediário, pois possui o sentido para a totalidade, mas ainda carece de unidade - trata-se da autoconsciência sensível (SCHLEIERMACHER, 2003, p. 64-70).
A partir disso, Schleiermacher se concentra na análise das três principais comunidades monoteístas, a saber: o judaísmo, o maometismo27 e o cristianismo. Em sua opiniao, o primeiro possui uma inclinaçao para o fetichismo - monolatria, como fé no povo -; o segundo é marcado por componentes intensos de sensibilidades; ao passo que só o último é superior28 à esfera simples da sensibilidade e do fetichismo29 (SCHLEIERMACHER, 2003, p. 70-71).
Schleiermacher distingue ainda afecçoes piedosas cuja orientaçao é teleológico-ética de outras que sao natural-estética. Na verdade, estas duas orientaçoes estao sempre presentes numa religiao histórica, sendo que apenas ocorre o predomínio de uma ou de outra orientaçao. A orientaçao teológica consiste na referência predominante da piedade à tarefa ética. A orientaçao natural ou estética consiste na referencia predominante da piedade à receptividade do individuo pelo ser finito. Para Schleiermacher, o politeísmo constitui em geral uma piedade estética, cujo exemplo é o politeísmo helénico, o qual careceria da ideia de uma totalidade de fins éticos, concentrando-se principalmente na ideia de beleza com relaçao a seus deuses; com efeito, o monoteísmo constitui em geral uma piedade teleológica, embora o isla seja considerado exceçao, por causa de sua orientaçao naturalista-fatalista. Já o cristianismo, em virtude de sua referencia ao reino de Deus, e o judaísmo, em virtude do esquema castigo/recompensa divinas, sao claramente piedades teleológicas (SCHLEIERMACHER, 2003, p. 78-80).
Após descrever comparativamente as religioes apenas segundo critérios tipológico-gradativos, estabelecendo uma classificaçao geral do cristianismo diante das outras duas comunidades de fé monoteístas - diante do maometismo e do judaísmo -, Schleiermacher ressalta dois critérios fundamentais para determinar a individualidade das comunidades de fé. O primeiro critério repousa no fato de que as comunidades de fé possuem um início específico exterior (histórico!): ou seja, toda religiao positiva possui um fundador que é um individuo histórico. Conforme o primeiro critério, para Schleiermacher, o modo de fé no interior das igrejas permanece sempre estreitamente conectado com seu fundador, nao obstante suas variaçoes e singularidades. Neste caso, o cristianismo possui seu nexo histórico com Jesus, o judaismo com Moises e o maometismo com Maomé.
O segundo critério fundamental repousa no fato de que o surgimento do fundador configura um modo de fé, cuja consciência de Deus possui uma qualidade individual única. Isso porque, o que mantém a unidade dos conteúdos positivos, ou seja, o fato de que as piedades individuais permaneçam interligadas numa comunidade, depende de um fato originario (Urthatsache), enquanto um fenómeno histórico fundamental, cujo responsável é o fundador (SCHLEIERMACHER, 2003, p. 89). Para Schleiermacher, este é o ponto da argumentaçao da Glaubenslehre em que se chega ao fim da contribuiçao da Filosofia da Religiao, já tendo fornecido entao todos os elementos universais necessários para a definiçao do cristianismo. Este é o momento da transiçao para a Apologética com base na elaboraçao de uma interpretaçao cristológica.
Evidentemente, a Teologia filosófica vai além dos resultados obtidos pela Filosofia da Religiao. Do ponto de vista sistemático, a Filosofia da Religiao é autónoma e se desenvolve apartada da Teologia filosófica. Mas o interesse teológico se apropria da Filosofia da Religiao através da disciplina teológica designada de Apologética, visto que esta última lida com o problema da verdade do cristianismo (em geral) e do protestantismo (em particular). A Apologética consiste na defesa pública da religiäo com base na convicçao de verdade de seus adeptos (SCHLEIERMACHER, 1998, p. 340-341). Temos aqui a transiçâo definitiva para o terreno da Teologia propriamente dita, que pressupoe a verdade de uma comunidade de fé e já se situa, por principio, além da Filosofia da Religiäo.
Conciusâo: contributos históricos e desafios
Esperamos ter demonstrado, dialogando com Schleiermacher, como sua concepçâo de Filosofia da Religiäo pressupunha uma disciplina autónoma e independente da Teologia, cujo programa científico antecipa insights fundamentais à constituiçâo dos estudos comparados e fenomenológicos da Ciência da Religiäo - como, por exemplo, sua busca metódica tanto pela base comum das diversas religioes, como também pelas suas diferenças especificas. Tratou-se sem dúvida de uma compreensäo bastante original e inovadora para o estudo das religioes de sua época, que foi conquistada paulatinamente diante da necessidade de se determinar a peculiaridade de uma religiäo positiva (cristianismo) sem exclusäo de suas dimensoes, simultaneamente, histórica e ideativa.
Havia um evidente interesse teológico que impulsionou Schleiermacher a delimitar uma disciplina nos moldes comparativo e tipológico: ora, pretendia-se, antes de tudo, determinar a peculiaridade do cristianismo diante das outras religioes - tarefa da Teologia filosófica. Mas se exigia, para isso, uma ciência autónoma e filosoficamente fundamentada, independentemente da Teologia. Em outras palavras, näo se buscava instituir uma Filosofia da Religiäo como disciplina teológica, nem mesmo restaurar uma nova espécie de ancilla theologiae.
Na verdade, o desenvolvimento material da Filosofia da Religiäo na Glaubenslehre se fazia necessário, para a Teologia, como um tipo de levantamento prévio dos resultados filosóficos (científicos em amplo sentido!). Deste modo, embora fossem disciplinas autónomas, näo havia impedimentos para que a Apologética instrumentalizasse os resultados filosóficos úteis à tarefa prática da Teología. Isso porque a Teología era uma ciência funcional com objetivos práticos, cuja restriçao consistia no fato de que os saberes filosóficos nao estavam sob sua tutela.
Em virtude de sua vocaçao dialética, Schleiermacher postulava, como ideal científico, o trabalho colaborativo entre os saberes, de tal maneira que se supunha como possível realizar, sem constrangimento, a cooperaçao entre disciplinas filosóficas (Ética filosófica e Filosofia da Religiao) e teológicas (Apologética, Dogmática) - sem perder, com isso, suas diferenças específicas. Mutatis mutandis, transposta para a relaçao entre Filosofia da Religiao e Ciência da Religiao hoje - mas também vale para a relaçao entre Teologia e Ciência da Religiao -, ainda permanece certamente um desiderato encontrar consonâncias sem perder as diferenças.
Investigamos, sobretudo, o método da Filosofia da Religiao, de tal sorte que ele revelou importantes principios compatíveis, em vários níveis, com os estudos comparados clássicos da Ciência da Religiao: por um lado, tratava-se de um estudo objetivo das religioes como grandezas históricas que podiam ser descritas conforme sua organizaçao social e mediante classificaçoes tipológicas, conduzida de maneira bastante similar com o que designaríamos hoje de Ciência da Religiao Sistemática.
Em todo caso, devemos ressaltar que a Filosofia da Religiao de Schleiermacher era e deve permanecer sendo Filosofia da Religiao. De modo que os insights que indicamos nao pretendiam sugerir uma substituiçao ou mesmo identificaçao entre a tarefa da Filosofia da Religiao e a da Ciência da Religiao. Nao obstante os louros metodológicos já ressaltados, ainda assim, poderíamos levantar vários questionamentos acerca do resultado material desta Filosofia da Religiao, dado que envolve certamente aspectos delicados e controversos para a perspectiva da Ciência da Religiao atual, cujas balizas teóricas possuem outros referenciais. Nao há dúvidas de que existem limitaçoes historiográficas em sua abordagem filosófica, mas também nao pretendíamos resgatá-lo como se fosse um autor novamente contemporâneo.
Ora, mediante o uso da Filosofía da Religiao pela Apologética, o cristianismo continuou ocupando espaço privilegiado em suas análises, que se restringiram basicamente à tipificaçao das religioes monoteístas crista, islámica e judaica; concomitantemente, o papel de destaque concedido aos fundadores de religiao ofereceria restriçoes analíticas diante de religioes para as quais os fundadores nao desempenham papel central, ou até para aquelas concebidas como sem fundadores.
Todavia, estas críticas nao deslegitimam o programa filosófico como tal, ou seja, formalmente considerado, embora ele careça de aperfeiçoamentos. Nao se deve perder de vista que Schleiermacher nao tinha à sua disposiçao o acervo historiográfico que se avolumou na segunda metade do século XIX, nem muito menos acompanhou, neste mesmo período, o desdobramento dos métodos das ciências empíricas - com o que sua tipificaçao das religioes positivas poderia alcançar maiores desdobramentos e aprimoramentos. Aliás, possíveis correçoes na Filosofia da Religiao de Schleiermacher nao entrariam em desacordo com sua própria concepçao de ciência: ele a concebia como uma tarefa aproximativa que nao detinha a posse definitiva e final da verdade.
Em última análise, a defesa da superioridade do cristianismo seria certamente o principal alvo das críticas contemporáneas, como uma posiçao de fundo considerada como eurocêntrica e tao somente apologética - logo, só aparentemente filosófica e autónoma. Sem contar que o critério de sua superioridade dependia da teoria do sentimento, que, por sua vez, enfrentaria igualmente críticas de que se tratasse de uma abordagem metafísica e essencialista. Para uma avaliaçao mais acurada destas e outras críticas, bem como de sua consistência, precisaríamos analisar mais detidamente a teoria do sentimento e sua fundamentaçao filosófica e teológica, mas aí já seria matéria para outra contribuiçao. Seja como for, independentemente da recepçao de sua obra, quer positiva quer negativa, os estudiosos da religiao atuais estarao sempre em débito com Schleiermacher.
1 Jaeschke ressalta que o termo Filosofia da Religiao é expressamente usado desde pelo menos 1770, na obra de Abraham Friedrich Rückersfelder, intitulada Philosophie de religioni naturali libri duo; porém, reproduzindo geralmente a Teologia naturalis tradicional, na medida em que natural ou racional consiste na conexao entre verdades racionais da Teologia com a Ética. Este autor argumenta ainda que já se pode considerar como Filosofia da Religiao, avant la lettre, o escrito de Georg Friedrich Meier - intitulado Philosophischen Sittenlehre, cuja primeira ediçao é do ano de 1753.
2 Nesta obra, Kant propöe a distinçao entre Teologia filosófica - enquanto pura doutrina filosófica da religiao que se orienta por principios a priori - e Teologia bíblica - enquanto pressupöe o dominio da revelaçao e a dimensao histórica das escrituras (KANT, 1868, p. 104; 107).
3 K. Hock oferece uma boa síntese deste debate, considerando especialmente a relaçao entre Filosofia da Religiao e Ciência da Religiao no ocidente europeu (HOCK, 2010, p. 199-203).
4 Recorrente é a crítica contra a Fenomenologia da Religiao de Rudolf Otto, como, por exemplo, a levantada por F. Usarski de que o problema da teoria de Otto estaría, dentre outros, nas "implicaçoes ontológicas" da categoría do sagrado (USARSKI, 2006, p. 33): o autor supöe provavelmente uma espécie de realismo ingênuo supranatural para o qual Otto apelaria no fim das contas, interpretando-o, porém, à margem dos desenvolvimentos da Filosofia Transcendental, e nao só daquela realizada por Friedrich Schleiermacher, mas também da teoria psicológica formulada por Jakob Friedrich Fries (1773-1843), de tal maneira que, retirado de seus pressupostos, a teoria de Otto se torna especialmente irreconhecível para mais de um leitor atento à tradiçao filosófica. Para uma discussao das raízes filosóficas da Fenomenologia da Religiao e suas principais críticas científico-religiosas, veja DREHER, 2008, p. 60-67.
5 Paine emite um parecer dramático acerca da Filosofia da Religiao no Brasil, considerando, sobretudo, seus aspectos institucionais, resultado da herança positivista (séculos XIX-XX) e marxista (segunda metade do século XX), a saber: "A Filosofia da Religiao no Brasil encontra-se ainda, de certa forma, numa terra de ninguém, entre departamentos de Teologia, em um movimento de posicionamento positivo ou negativo em relaçao ao novo modelo de Ciéncia da Religiao, de um lado, e departamentos de Filosofia, às vezes temerosos de Teologias disfarçadas, de outro" (PAINE, 2013, p. 110). Porém, vale lembrar iniciativas importantes de estudos na área com o surgimento da Associaçoo Brasileira de Filosofia da Religiao (ABFR) em 2009, e a criaçao de seu recente órgao de publicaçao, a saber, a Revista Brasileira de Filosofia da Religiao.
6 Por exemplo, na antologia de autores clássicos da área, compilada por J. Waardenburg, Schleiermacher nao recebeu uma seçao própria e de destaque (WAARDENBURG, 1999). Já na obra organizada por A. Michaels, Schleiermacher nao só apareceu como um clássico da área, sob a responsabilidade dos comentários de B. Gladigow (GLADIGOW, 1997, p. 17-27), mas é o autor que dá inicio ao compêndio, antes mesmo dos comentários sobre M. Müller.
7 F. Wagner argumenta que Schleiermacher nao fundou propriamente uma escola, mas uma nova época para a história da compreensao da religiao e da Teologia (WAGNER, 1985, p. 923).
8 S. Sorrentino sublinha a mudança de paradigma entre a compreensao tradicional racionalista e supranaturalista e uma nova compreensao da religiao cujo foco é a experiência e o caráter histórico das religioes positivas (SORRENTINO, 2000, p. 17-51). H. Adriaanse também ressalta o fato de que a nova compreensao de religiao inaugurada por Schleiermacher se tornaria paradigma para a Filosofia da Religiao (ADRIAANSE, 2000, p. 100-117).
9 Para nosso comentário, utilizamos doravante o texto correspondente à primeira ediçao de 1799. Ademais, todas as traduçoes das línguas estrangeiras sao de nossa autoria, salvo quando indicaçao explícita do contrário.
10 Para um detalhamento desta interpretaçao das Reden, veja artigo de nossa própria pena (OLIVEIRA, 2011, p. 140-165).
11 F. M. Müller pressupöe o conceito de religiäo de Schleiermacher como relaçao do individuo com o Infinito, que entäo pode assumir vários nomes distintos, mas cuja estrutura fundamental possibilita uma História Comparada da Religiäo (Cf. MOHN, 2011, p. 114; GLADIGOW, 1997, p. 25).
12 Schleiermacher se dedicou propriamente à sistematizaçâo de seu pensamento filosófico e teológico a partir, sobretudo, do momento em que se viu na condiçâo de professor de Filosofia e Teologia na entäo recém-inaugurada Universidade de Berlim, no ano de 1810.
13 G. Scholtz (1984, p. 127-128) ressaltou o fato de que, näo obstante a extensa produçâo bibliográfica sobre a Filosofia da Religiäo de Schleiermacher, näo se leva em conta normalmente sua própria compreensäo sistemática de Filosofia da Religiäo.
14 Por exemplo, H. Kippenberg, que é um dos poucos cientistas da religiao a se dedicar de maneira mais detalhada à influência da Filosofia da Religiao para a Historia da Religiao, porém, para sua interpretaçao de Schleiermacher apoiou-se somente nas Reden (KIPPENBERG, 1997, p. 31-34).
15 Para nosso comentário, utilizamos doravante o texto correspondente da segunda ediçao de 1830/31. A obra é amplamente conhecida apenas como Glaubenslehre (Doutrina da Fé) e veio a lume pela primeira vez em 1821/22, publicada em dois volumes: o primeiro data de 1821, o segundo de 1822. A segunda ediçao foi publicada em 1830/31, igualmente dividida em dois volumes, o primeiro apareceu em 1830, o segundo em 1831.
16 Para uma discussao ampla e detalhada dos principios da Teologia de Schleiermacher e da fundamentaçao da discussao que se segue, veja a tese de nossa autoria, sobretudo o capitulo terceiro (OLIVEIRA, 2015, p. 152-208).
17 Enzyklopädie é como ficou conhecida a seguinte obra: Kurze Darstellung des theologischen Studiums zum Behuf einleitender Vorlesungen - Breve exposiçao do estudo teológico como suporte às preleçoes introdutórias: tratava-se de um manual introdutório à Teologia como ciência universitária, com o objetivo de servir de base para as preleçoes teológicas em geral, publicada duas vezes durante a vida do autor em 1811 e 1830 (SCHLEIERMACHER, 1998, p. 243-446).
18 No prefácio à primeira ediçao desta obra de dezembro de 1810, Schleiermacher refere-se ao escrito como uma Enciclopédia formal - pois apenas apresenta a sistematicidade das ciências teológicas, sem desenvolvê-las materialmente -, destacando o fato de que este escrito continha, em síntese, toda a sua concepçao dos estudos teológicos até essa época (SCHLEIERMACHER, 1998, p. 247); Cf. também a segunda ediçao (SCHLEIERMACHER, 1998, p. 333).
19 Já o título da Glaubenslehre enfatiza que se trata de uma fé exposta à luz dos princípios da igreja evangélica.
20 Por isso, como afirmou com razao H-J. Birkner, a Teologia nao tem seu lugar no sistema de ciências "como uma ciência particular ao lado - ou acima - de outras ciências particulares", mas ela se constrói a partir de "uma síntese funcional de diferentes ramos", cujos objetos se situam, do ponto de vista científico, além da Teologia (BIRKNER, 1974, p. 28).
21 Além da Filosofia da Religiao (Religionsphilosophie), Schleiermacher enumera, por exemplo, os seguintes saberes úteis e necessários à Teologia: os Estudos da Língua (Sprachkunde), da Historiografia (Geschichtskunde), da Psicologia (Seelenlehre), da Ética filosófica (Sittenlehre) e das Disciplinas Técnicas (Kunstlehre) - tais como, por exemplo, a Hermenéutica (SCHLEIERMACHER, 1998, p. 329).
22 Conforme ressalta Hermann Fischer, a Dogmática, junto com sua christliche Sittenlehre (doutrina moral crista), comporia o ramo das investigates teológicas hodiernas de Teologia sistemática (FISCHER, 2001, p. 118).
23 Esta tese foi defendida por H-J. Birkner (1974, p. 33-34), que inclusive considerava igualmente as Reden sob a classificaçao de Teologia filosófica. Tal posiçao foi aprofundada por M. Rössler (1994, p. 150ss) que defendeu, na Glaubenslehre, a existência de um desenvolvimento fragmentado da Teologia filosófica.
24 M. Rössler ressaltou o fato de que o uso da expressao alema Lehnsätze era comum no vocabulário científico da época, provavelmente proveniente do uso de Christian Wolff, que por sua vez traduzia o étimo técnico-filosófico grego lemma, usado por Aristóteles (RÖSSLER, 1994, p. 153).
25 Segundo Schleiermacher, a Filosofia da Religiao é semelhante à Filosofia do Direito, na medida em que a última, a partir do conceito de geral de estado - igualmente oriundo da Ética filosófica -, precisa apresentar em seguida um estudo empírico comparado das diversas formas individuais de organizaçoes civis (SCHLEIERMACHER, 2003, p. 17).
26 Discorrer sobre a teoria do sentimento ultrapassa os limites da presente contribuiçao, para uma exposiçao detalhada, nossa contribuiçao já indicada: AUTOR, 2015, p. 119-151; 182-200.
27 Schleiermacher usa também o termo isla para se referir à religiao de Maomé, mas prefere a expressao maometismo a fim de ressaltar o papel fundamental conferido ao fundador de uma religiao.
28 Ora, conforme este critério, o cristianismo é considerado o grau mais elevado ou a forma piedosa de excelência [Vortrefflichkeit) (SCHLEIERMACHER, 2003, p. 63). Schleiermacher nao deixa claro se esta tese já é decididamente apologética, ou se é também filosoficamente defensável independentemente da convicçao de fé. A julgar pela compreensao recorrente da época, tratar-se-ia de uma tese considerada, em principio, sustentável tanto filosófica quanto dogmaticamente.
29 Como o próprio Schleiermacher afirma numa nota, a linha evolutiva das religiöes nao é estabelecida em virtude do sentimento de medo, nem o termo panteismo é considerado um gênero, mas apena um caso particular de forma que ele nao corresponde imediatamente a uma comunidade piedosa (SCHLEIERMACHER, 2003, p. 71-72).
REFERÊNCIAS
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Davison Schaeffer de Oliveira*
Artigo recebido em 07 de setembro de 2016 e aprovado em 22 de dezembro de 2016.
* Doutor em Ciência da Religiao pela Universidade Federal de Juiz de Fora, área de concentraçao em Filosofia da Religiao. Atualmente realiza pesquisa de pós-doutorado e leciona como professor substituto nesta mesma instituiçao. Pesquisa financiada pelo Programa Nacional de Pós-Doutorado (PNPD/CAPES). País de Origem: Brasil. E-mail: [email protected]
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Copyright Pontificia Universidade Catolica de Minas Gera, Programa de Posgraduacao em Ciencias da Religiao Oct-Dec 2016
Abstract
The question of systematic relationship between Philosophy of Religion and Science of Religion remains controversial, even considering some possible points of convergence. Such controversies explicitly or implicitly lead the selection of considered classical authors in the scientific field of religion. This is the case, for example, of the diffuse reception of Schleiermacher's work (1768-1834), a prominent religious thinker of the 19th century, whose recognition as one of the pioneers in religion science researches is still subject of disagreement among the current experts. Nevertheless, it is difficult to understand the trajectory of religion theories developed in the last two centuries ignoring the paradigm shift that Schleiermacher opened. Firstly, our proposal is to expose concisely his Philosophy of Religion, in order to justify their due importance here claimed an expose their epistemological program provided an original and innovative model for religious studies in his time, whose methodology left indelible marks for philosophical and scientific investigations on religion.
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