RESUMO
Objetivo: O presente estudo busca compreender como o biopoder se manifesta na organização do Carnaval de Olinda. Para tanto, o Carnaval é estudado como uma complexa organização, compreendendo esse conceito para além das organizações formais, e o poder é estudado sob a perspectiva foucaultiana, que constitui a lente teórica desta investigação, permitindo-nos compreendê-lo até em suas manifestações mais difusas, no nível das micropráticas, articulando as dimensões de segurança e riqueza na organização do festejo.
Originalidade/valor: A noção de biopoder na gestão de grandes eventos mostra-se uma construção teórica relevante, num momento em que os folguedos populares têm sido cada vez mais permeados pelas lógicas empresarial e turística. O uso intensivo do espaço público requer tecnologias que permitem liberdade e entretenimento ao mesmo tempo que propiciam segurança e minimização de riscos ao patrimônio e à população. O Carnaval investigado possui grande visibilidade midiática e turística, porém é pouco contemplado nos estudos organizacionais.
Design/metodologia/abordagem: Foi realizada uma análise de discurso foucaultiana da cobertura jornalística de quatro carnavais que distam dez anos entre si (1986, 1996, 2006, 2016) em dois jornais impressos locais, os únicos em circulação durante todo o período estudado.
Resultados: Os resultados apontam para uma crescente ordem mercantil, em que as demandas turísticas e de entretenimento geram resultados econômicos à prefeitura, ao mesmo tempo que exigem um esforço de normatização, vigilância e prevenção de perdas, resultando numa produção biopolítica.
PALAVRAS-CHAVE
Carnaval de Olinda. Disciplina. Biopolítica. Biopoder. Mercado.
ABSTRACT
Purpose: The present study aims to understand how biopower is manifested in the organization of the Carnival of Olinda. For this, Carnival is studied as a complex organization, comprehending this concept beyond formal organizations, and power is studied under the Foucaultian perspective, which constitutes the theoretical lens of this investigation, allowing us to understand it even in its most diffuse manifestations, at the level of micro-practices, articulating the dimensions of security and wealth in the organization of the festivity.
Originality/value: The notion of biopower in the management of big events shows itself to be a relevant theoretical construction, at a time when popular folksies have been increasingly permeated by business and tourism logics. The intensive use of public space requires technologies that allow freedom and entertainment while providing security and risk minimization to the patrimony and the population. The Carnival investigated has great media and touristic visibility, but it is little contemplated in the organizational studies.
Design/methodology/approach: A Foucauldian Discourse Analysis was carried out on the journalistic coverage of four Carnivals in a 10-year interval (1986, 1996, 2006 and 2016) in two local newspapers, the only ones circulating during throughout the study period.
Findings: The results point to a growing market order, in which tourism and entertainment demands generate economic results for the city, while at the same time demanding a standardization, vigilance and loss prevention, resulting in a biopolitical production.
KEYWORDS
Carnival of Olinda. Discipline. Biopolitics. Biopower. Market.
1. INTRODUÇÃO
O Carnaval de Olinda, cidade vizinha a capital de Pernambuco, já ultrapassou a marca de um milhao de foliöes por dia e é considerado um dos traços mais notáveis da cultura olindense (Harchambois & Pontual, 2007). A cidade é considerada Patrimonio Cultural da Humanidade e foi aclamada primeira Capital Brasileira da Cultura (Olinda, 2016). Apesar de o Carnaval ser organizado sob a responsabilidade da Prefeitura Municipal de Olinda (PMO), esta reconhece a participaçao popular como uma de suas diretrizes para a tomada de decisăo acerca do festejo, conforme estabelecem a Lei do Carnaval e o Plano Municipal de Cultura, instrumentos relativamente recentes que regem a organizaçao do festejo.
A história do Carnaval no Brasil guarda uma longa trajetória de cooptaçao do festejo pelas elites dominantes, seja pelo intuito de utilizá-lo como um meio de criaçao e fortalecimento de uma identidade nacional, alinhando o festejo a lógica vigente do governo militar e do sistema capitalista (Vidal & Andrade, 2009), seja pela conversăo do folguedo num modelo empresarial, com a elevaçao da dimensăo económico-mercantil, por vezes em detrimento da simbólico-cultural (Miguez, 2012).
Em Olinda, assim como diversos carnavais do Brasil, o festejo é herdeiro do entrudo - prática que chegou a ser considerada agressiva e danosa a ordem social -, mas do "entrudo civilizado", que correspondía aos jogos de mela-mela (Araújo, 1997). A necessidade de normatizar e disciplinar nao tarda a surgir, mobilizando uma rede de agentes públicos e privados no entorno da organizaçao do festejo, seja para conter a agressividade das torcidas de agremiaçöes rivais, seja para organizar o uso do espaço público e prover o festejo de recursos (Ataíde, 1982). Assim, a PMO torna-se o centro de um processo de profıssionalizaçâo, iniciado na década de 1950 e crescente nas décadas seguintes, resultando numa rede organizacional cada vez mais complexa, em consonancia com a magnitude do festejo: na década de 1960, a criaçao da assessoria de imprensa aproxima-o dos meios de comunicaçao; no fim da década de 1970, um decreto abole as comissöes julgadoras e os palanques; e na década de 1980, outro decreto amplia seu calendário oficial (Ataíde, 1982). Na década de 1990, a parceria entre a PMO e entidades privadas, como os patrocinadores, revela a importante dimensao mercadológica assumida pelo festejo (Harchambois & Pontual, 2007). O processo de, por um lado, prover e, por outro, normatizar e disciplinar torna-se cada vez mais intenso a medida que o festejo tem suas dimensöes ampliadas.
A disciplina e a governabilidade sao, sob a perspectiva dos estudos culturáis e foucaultianos, maneiras de internalizar o controle social, sendo a cultura um importante veículo nesse processo (Yúdice, 2013). No caso do Carnaval, isso se torna evidente a medida que a desaprovaçao de diversas manifestaçöes por elites e autoridades começa a dar espaço a normatizaçao ou mesmo ao incentivo, quando estas passam a reconhecer seu valor na criaçao de uma identidade, bem como do seu potencial de disciplinar o indivíduo.
A prática de governar, que em termos foucaultianos antecede a administraçao dos Estados (Cipagauta, 2006), coloca a problemática da segurança e da populaçao a medida que se insere no contexto desses Estados (Foucault, 2015). Dessa forma, o corpo emerge como uma unidade em que se articulam saberes e poderes que visam maximizar o potencial produtivo e a docilizaçao desses corpos a serviço do Estado, assumindo que é no corpo que saber e poder se articulam (Dreyfus & Rabinow, 2011).
A técnica de governar implica a constituiçao de saberes sobre o correto modo de dispor as coisas de forma que cumpram seus respectivos propósitos - entre essas coisas, coloca-se a problemática da populaçao, como um alvo desses saberes cuja inserçao na economia é indissociável da geraçao de riquezas: uma economia política (Foucault, 2015). Assim, o biopoder, fundamental ao desenvolvimento do capitalismo, permitiu o ajustamento dos fatores económicos e populacionais, assentado em duas dimensöes: a anatomopolítica dos corpos, que atua sobre o corpo-máquina, valendo-se de mecanismos disciplinares para inserir o corpo na máquina produtiva e dele extrair ao máximo seu potencial; e a biopolítica das populaçöes, centrada no corpo-espécie, encarregada de gerir processos biológicos como natalidade, saúde e doença, valendo-se de intervençöes e mecanismos reguladores (Foucault, 2014b).
Como base nessa noçao, questionamos:
* Como o biopoder se manifesta na organizaçao do Carnaval de Olinda?
O presente estudo parte do conceito de biopoder e consequentemente das tecnologías disciplinares e da produçao biopolítica para contemplar as dimensöes de segurança e riqueza do Carnaval de Olinda, compreendido como fenómeno organizacional. Os estudos organizacionais contam com diversas contribuiçöes do pensamento foucaultiano, entre as quais destacamos a compreensao mais ampla de poder, como conduta emocional, familiar, espiritual, indo da vigilancia as micropráticas, inclusive aquelas de natureza discursiva, o que propiciou análises mais sofisticadas ao campo (Dixon, 2007); assim como o entendimento de organizaçao para além das entidades de formais, uma vez que a obra do filósofo aborda como a vida humana organiza e é organizada (Knights, 2004).
Nesse sentido, apresentamos um breve histórico do Carnaval de Olinda, seguido de uma revisao de literatura e da descriçao dos procedimentos metodológicos deste estudo. Fazemos ainda uma descriçao dos achados concomitantemente a discussao destes a luz da teoria. Por fim, indicamos as consideraçöes finais e possíveis desdobramentos.
2.DA FOLIA A PERFORMANCE: O CARNAVAL DE OLINDA
O Carnaval de Olinda é herdeiro do entrudo, assim como diversos carnavais do Brasil. Os jogos de entrudo caracterizavam-se pelo arremesso de substancias diversas (água, farinha, ovos) em transeuntes, numa manifestaçao em espaço público que ignorava distinçöes de classe ou raça (Freyre & Souto Maior, 1974). Seu caráter agressivo nao tardou a ensejar intervençöes do Estado, que desde o século XVII buscou normatizá-lo (Araújo, 1996).
As primeiras expressöes culturais do Carnaval olindense remetem ao surgimento das agremiaçöes locais no inicio do século XX (Harchambois & Pontual, 2007), sendo a Cidade Alta, seu Sitio Histórico, o foco do festejo (Leal, 2008). Apesar da proximidade física com a capital Recife, o Carnaval de Olinda é conhecido por ser um Carnaval "de rua" ou espontaneo, um traço que se atribui a eliminaçao do modelo de passarelas, palanques (vigente na capital) e comissöes julgadoras, no limiar da década de 1970 (Harchambois & Pontual, 2007). A participaçao e o amplo uso do espaço público pelos brincantes, contudo, nao eliminaram a necessidade de normatizar e disciplinar o festejo. Essa necessidade e até mesmo a de prove-lo de recursos e infraestrutura terminaram por mobilizar uma rede de agentes públicos e privados no entorno da sua organizaçao. O intuito de coibir certas condutas se materializava desde os primórdios na figura dos inspetores de polícia, que tanto combatiam a violencia física entre torcedores de agremiaçöes rivais, as chamadas "marchas alusivas" (que provocavam as agremiaçöes rivais) e até mesmo as manifestaçöes satíricas aos representantes do poder (Ataíde, 1982).
Apesar de suas origens no entrudo, uma prática espontanea e desordenada, os carnavais do Brasil de maneira geral passaram por um processo de institucionalizaçao, por objetivos os mais diversos, tais como a criaçao de uma identidade nacional no início do período republicano (Vidal & Andrade, 2009); a necessidade de conter a agressividade das agremiaçöes pedestres que se insurgiam contra o modelo excludente dos carnavais de saldes e ricos carros alegóricos (Araújo, 1997); a importancia de torná-lo uma manifestaçao cultural de utilidade pública estado-novista (Vidal & Andrade, 2009); ou mesmo o interesse em converte-lo num megaevento de caráter empresarial e gerador de resultados económicos (Miguez, 2012). O Carnaval é um exemplo emblemático desse mecanismo de apropriaçao, reinterpretaçao e apresentaçao de práticas populares pelo Estado como manifestaçao genuina da identidade nacional (Ortiz, 1994). Yúdice (2013) atribui esse processo a absorçao do festejo por uma racionalidade económica, inserindo-o no quadro epistemico da sociedade disciplinar de Michel Foucault.
No caso de Olinda, a municipalizaçao do festejo, quando a PMO assume tanto a incumbencia de prover quanto de normatizar o evento, marca a década de 1950 (Ataide, 1982), mas o protagonismo da PMO vai cada vez mais se convertendo num papel de aglutinador de uma rede de agentes públicos e privados que viabilizam o festejo até os dias atuais. Dessa forma, no ano de 2001, foi sancionada pela PMO a Lei n. 5.306, chamada Lei do Carnaval, que dispöe sobre diversos aspectos do festejo, tais como incentivos as agremiaçöes, papel de entidades representativas, relacionamento com patrocinadores, normatizaçao da atividade de ambulantes e bloqueio de transito no perímetro da folia (Olinda, 2001). Além da lei, o Plano Municipal de Cultura também reconhece a participaçao popular como característica do festejo.
O calendário festivo oficial compreende o inicio imediatamente ao término do Dia de Reis, quando o ciclo natalino é oficialmente encerrado (Leal, 2008). No entanto, o periodo de ensaios abertos torna-se cada vez mais precoce, iniciando-se antes mesmo do ciclo natalino. Essa antecipaçao, ao mesmo tempo que dinamiza a economia do Carnaval, enseja um esforço cada vez mais amplo do Poder Público, sobretudo da PMO e da Policia Militar. A magnitude do festejo implica reconhecer, ao mesmo tempo, seu caráter de importante atividade económica do municipio - aquecendo o setor turístico e hoteleiro, bem como a atividade de bordadeiras, costureiras, ambulantes etc. - e seu potencial risco ao património e a ordem social. Harchambois e Pontual (2007) ressaltam as ameaças ao património materializadas no grande fluxo de pessoas, na geraçao de residuos, na poluiçao sonora e no comprometimento do casario em virtude da concentraçao de pessoas e das vibraçöes produzidas. Além disso, o consumo intensificado de bebidas alcoólicas e o grande fluxo de pessoas requerem um esforço coordenado dos mais diversos agentes envolvidos.
Isso posto, discutiremos o papel do Poder Público na dupla incumbencia de prover o festejo de recursos, com vistas a torná-lo sobretudo rentável, e operar mecanismos para a preservaçao do patrimonio. Para isso, utilizaremos o conceito de biopoder, oriundo do pensamento foucaultiano.
3.O BIOPODER, AS DISCIPLINAS E A PRODUÇAO BIOPOLÍTICA
A analítica do poder desenvolvida por Michel Foucault tornou-se um importante eixo de investigaçao nos estudos críticos organizacionais (Souza, Junquilho, Machado, & Bianco, 2006; Motta & Alcadipani, 2004). Sua repercussăo propiciou um deslocamento da compreensao de poder, do interior das organizaçöes para o nivel das micropráticas, além de revelar o panóptico como uma metáfora para a sociedade disciplinar (Burrell, 1988) e, por extensao, do ambiente laboral. Sua analítica de poder, no entanto, possibilita extrapolar a questao do panoptismo, permitindo pensar formas de racionalidade administrativa como relaçöes de saber-poder localizadas em instituiçöes ou discursos específicos (McKinlay & Starken, 1997).
Um importante conceito na sua analítica do poder, e que orienta o presente estudo, é o de biopoder. A discussao dessa noçao no pensamento foucaultiano insere-se na moldura da instauraçao de um novo tipo de governo, notadamente com a emergencia do mercantilismo. Para Foucault (2015), o problema da populaçao coloca-se em torno da relaçao desta com segurança e governo.
Foucault (2015) problematiza a questao do governo investigando historicamente a relaçao entre este, a segurança e a populaçao, bem como sua relaçao com um território (Foucault, 2008). A expansao do capital implicaría uma vigilancia e um controle atentos, bem como dispor as coisas governadas para o atingimento de uma finalidade, ou seja, práticas de governo (Foucault, 2015), que aqui é entendido como prática de conduzir, independentemente de um aparato estatal. A populaçao, por sua vez, nao é uma totalidade de súditos, mas um conjunto de vidas perpassadas por fenómenos naturais, que demandam um conhecimento científico, condiçao sine qua non para que o governo fosse bem-sucedido (Foucault, 2008).
Dessa forma, emerge um tipo de poder cujas tecnologias e cujos mecanismos operam sobre os corpos, o corpo como unidade biológica, visando racionalizar sua utilidade, maximizar sua força útil com o dispendio do mínimo necessário de recursos (Foucault, 2005). Trata-se do biopoder, que ajusta os fenómenos populacionais aos económicos, permitindo, com isso, uma adequaçao dos corpos a máquina produtiva que impulsionou o capitalismo (Foucault, 2014b). Esse poder, que consiste em gerir a vida, assenta-se em dois polos: de um lado, o corpo como máquina produtiva, e, de outro, a populaçao, com os fenómenos que nela incidem e alteram sua confıguraçao (Foucault, 2014b). Como consequencia, essa dimensăo biológica reflete-se nas tecnologías políticas, que, ao problematizarem a vitalidade humana, seus fenómenos naturais, dirigindo-lhes formas de autoridade e intervençöes legítimas, constituem a chamada biopolítica (Rabinow & Rose, 2006).
Foucault sustenta que os polos nos quais as tecnologias biopolíticas se desenvolveram - o corpo como objeto manipulável e a especie humana como categoria científica - existem desde a Antiguidade, mas se unem na modernidade para dar origem a essas tecnologias (Dreyfus & Rabinow, 2011). O desenvolvimento do capitalismo foi um fator determinante, na medida em que as máquinas docilizadas precisariam ser inseridas na produçao (Foucault, 2014b). A primeira fase de acumulaçao capitalista exigiu dos corpos docilidade e maximizaçao de seu potencial produtivo - como recurso produtivo, o Estado nao poderia prescindir deles -, o que teria resultado, inclusive, numa reconfiguraçao na natureza dos crimes (dos crimes de sangue aos de fraude), bem como sofisticaçao dos mecanismos de vigilancia, informaçao e classificaçao. Nasce uma anatomopolítica, que tem na desarticulaçao e rearticulaçao dos corpos um mecanismo de conversao em máquinas dóceis e produtivas, operando com habilidade, velocidade e eficácia (Foucault, 1987).
Essa demanda por maximizaçao do potencial produtivo dos corpos resulta no chamado poder disciplinar (Foucault, 1987). Essa forma de poder dirige-se as subjetividades, de modo que os mecanismos de poder encarnados na disciplina sao internalizados e reproduzidos pelos próprios indivíduos, neutralizando contrapoderes e atenuando o potencial de luta (Ferreira, 2014). As instituiçöes fechadas, por sua vez, tornam-se o modelo dessa sociedade, baseada na classificaçao, vigilancia e manipulaçao dos corpos, analisáveis e esquadrinháveis.
A disciplina tem como modelo por excelencia o panóptico, um projeto arquitetónico cujo princípio é a potencial visibilidade permanente, de modo que a consciencia dessa visibilidade permite tornar o poder constante e automático (Foucault, 1987). É importante ressaltar, no entanto, que o modelo de disciplinamento nao opera uma ruptura em que substitui por completo a soberania, mas um processo gradual, em que a disciplina emerge do intuito de gerir populaçöes (Foucault, 2015). Gerir a vida humana, sob a perspectiva biológica, passa a constituir uma estrategia política (Dreyfus & Rabinow, 2011).
A biopolítica da especie humana, em continuidade a anatomopolítica dos corpos, emerge no decorrer do século XVIII, aproximando questöes populacionais de problemas econômicos e políticos, e constituindo um corpo de saberes que se estendem sobre a populaçao, sendo esta o campo de intervençao do seu poder. Assim, esses mecanismos regulamentadores, embora de natureza distinta, atuam no mesmo nivel dos mecanismos disciplinares, permitindo que se articulem (Foucault, 2014b).
O biopoder reúne corpo e especie em tecnologías de poder vigentes até a atualidade (Dreyfus & Rabinow, 2011). Dessa forma, podemos observar facilmente como a inserçao do corpo e da especie humana em determinadas redes de saberes e poderes delimita cada vez mais o que é da ordem da saúde e da doença, da regulaçao e da transgressăo, tendo como criterio sua docilizaçao, na medida em que neutraliza insurgencias, e sua produtividade, pois insere o corpo numa dinámica produtiva que orienta a vida do individuo.
As técnicas disciplinares propiciaram o crescimento do capitalismo, na medida em que permitiram a inserçao dos corpos na máquina produtiva e, ao mesmo tempo, a racionalizaçao das populaçöes em larga escala (Dreyfus & Rabinow, 2011). O biopoder, embora nao seja disciplinar em sua natureza, encontra na disciplina o suporte para esse impulsionamento do sistema capitalista. Dessa forma, Foucault (2005) defende que a técnica de poder disciplinar e a biopolítica complementam-se: a disciplina atua na vigiláncia, no treinamento (e eventual puniçao), na maximizaçao da capacidade produtiva dos indivíduos, ao passo que a biopolítica age sobre a espécie humana, nos fenómenos que lhes sao particulares, tais como natalidade, saúde e mortalidade, compreendendo uma trama de saberes visando a esse controle.
Tal controle, por sua vez, insere-se na emergencia de uma nova racionalidade política, para a qual o Estado é um fim em si mesmo; dessa forma, a razao de Estado mobilizaria um corpo de saberes administrativos no intuito de compreender tudo o que a ele concerne, buscando identificar, por meio de saberes concretos e mensuráveis, suas forças e fraquezas, visando a sua permanencia (Dreyfus & Rabinow, 2011). Essa razao de Estado apoia-se em dois conjuntos de saberes e tecnologias políticos: por um lado, uma tecnologia diplomático-militar, voltada para "fora", e, por outro, meios para proporcionar o crescimento das forças do Estado em seu interior - este último Foucault (1997) denomina polícia.
A expansao do capitalismo ensejou a emergencia de uma racionalidade de governo, uma ciencia de governo, que se vale da ciencia, do conhecimento e da informaçao para ordenar probabilidades e submeter sujeitos e populaçöes as verdades e tecnologias (Delgado, 2017). A criaçao de sujeitos governáveis requer o alinhamento das práticas de governo as mentalidades subjacentes (Fimyar, 2009). Essa relaçao entre governo e produçao de saberes é a governamentalidade, definida por Foucault (2015) como todo um conjunto de instituiçöes, saberes e práticas que estabelecem uma rede de poder exercida sobre individuos e populaçöes valendo-se de dispositivos de segurança e de uma economia politica.
Foucault (2008) reconhece a liberdade como um requisito para se governar; nessa racionalidade, a regulamentaçao excessiva do modelo de soberanía vem a se desarticular em dois eixos: por um lado, um poder positivo, na medida em que produz - esses mecanismos gerem a populaçao e catalisam as forças do Estado -; por outro, um poder negativo, na medida em que se coloca para conter as insurgencias e desordens, qual seja: a instituiçao policial. O dispositivo da segurança, portanto, assenta-se na liberdade, atuando sobre o meio no qual individuos circulam e exercem essa liberdade: trata-se de um conjunto de tecnologias políticas que emergem do interior da própria realidade dispondo os mais diversos elementos uns em relaçao aos outros, permitindo sua regulaçao sem que tenham sua mobilidade e circulaçao impedidas (Candiotto, 2014).
Entretanto, se é fato que o biopoder repousa na premissa da populaçao como massa, a multidao - um todo multifacetado capaz de agir sob um propósito comum sem anular suas diferenças internas, noçao que se opöe a homogeneidade das massas - é dotada de uma biopotencia, passivel de emanar uma rede de resistencias as formas de opressao oriundas do aparato estatal (Wermouth & Santos, 2018).
4.PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
A trilha metodológica ora apresentada inspira-se na obra foucaultiana, cuja teoria nos propiciou a reflexao dos achados e cuja analítica, sistematizada em sua obra A arqueología do saber (Foucault, 2014a), permitiu-nos analisar o volume de dados coletados, bem como selecionar esse conjunto de dados, tendo em vista que esse método corresponde a uma análise de discurso formulada pelo filósofo (Dreyfus & Rabinow, 2011), aqui denominada análise de discurso foucaultiana (ADF).
A escolha da obra foucaultiana como lente teórica e trilha metodológica deve-se a sua fecundidade na compreensao dos mais diversos fenómenos que impliquem as instancias saber-poder-corpo (Thiry-Cherques, 2010), a exemplo do fenómeno em questăo. Foi a partir da inter-relaçao entre essas instancias que as categorias empíricas emergiram.
No tocante a coleta de dados, este estudo vislumbrou a constituiçao de um arquivo; segundo Foucault (2014a), uma coleçao de dados, um sistema de enunciados e suas respectivas regularidades. Esse arquivo foi composto de materias jornalísticas extraídas dos maiores jornais do Estado de Pernambuco, Diario de Pernambuco e Jornal do Commercio, únicos em funcionamento durante todo o período investigado. A coleta ocorreu no acervo da Biblioteca Pública do Estado de Pernambuco, onde os exemplares foram disponibilizados em formato original (impresso) e digitalizados em PDF para organizaçao e análise. O intervalo coletado compreendeu o Carnaval de 2016 como ponto de partida e o de 1986 como ponto de encerramento de um recuo temporal - este último ano foi escolhido em decorrencia de pesquisa bibliográfica, apontando a década de 1980 como a genese do modelo de festejo praticado até o presente: dessa forma, fixamos um intervalo de uma década entre cada Carnaval estudado no intuito de visualizar de forma panorámica as transformaçöes que ocorreram em quatro décadas. Foram coletadas 86 materias jornalísticas no acervo de 1986, 230 em 1996, 143 em 2006 e 103 em 2016, totalizando 562 documentos, desconsiderando-se cartas do leitor, informes publicitários, anúncios e artigos de opiniăo.
A opçao pelo discurso jornalístico dá-se pela sua presumida polifonia, ainda que subentendidas as respectivas linhas editoriais (para minimizar tais aspectos, buscamos triangular os discursos oriundos de dois periódicos distintos). A opçao pelo discurso midiático dá-se pelo seu reconhecimento como importante poder de documentaçao de uma época; além disso, sua capacidade de "agendamento de mundo", possibilitando uma leitura de relaçöes de saber-poder que perpassam uma época (Tucherman, 2007). Embora a mídia nao fosse propriamente objeto central na sua obra, Foucault (2014b) reconhecia o seu papel na formaçao da opiniao pública, uma espécie de consciencia social.
A análise de discurso operada (ADF) consistiu no estudo dos discursos, os sistemas aos quais estes pertencem e as respectivas condiçöes de constituiçao (Foucault, 2014a). Nessa perspectiva, chamamos discurso toda composiçao de enunciados conforme as mesmas regras de funcionamento, cuja análise requer, para além dessas regras, a investigaçao das práticas nao discursivas (Thiry-Cherques, 2010). Tal análise, portanto, buscou a identificaçao das seguintes categorias analíticas, com base em Foucault (2014a): enunciados: as menores unidades constitutivas do discurso, passíveis de se relacionar com unidades de mesma natureza; funçöes enunciativas: a maneira como as mencionadas unidades enunciam, seu modo de existencia e açâo; regras de formaçâo: condiçöes de constituiçâo das formaçöes discursivas; e formaçöes discursivas: composiçâo de anunciados cujas condiçöes de existencia, modificaçâo, rarefaçâo e desaparecimento coincidem.
A analítica consistiu, portanto, na identifıcaçâo dos enunciados e das funçöes enunciativas em todo o arquivo. Posteriormente, a partir das inter-relaçöes entre enunciados e respectivas funçöes, as regras de formaçâo. Por fim, os elementos constitutivos que convergiram apontaram para as formaçöes discursivas, ponto de chegada da análise. Devido ao caráter parcialmente indutivo do estudo, optamos por apresentar a discussâo teórica concomitantemente aos resultados, possibilitando apontar a relaçâo entre os aspectos empíricos e teóricos que emergiram ao longo das análises, conforme podemos observar na próxima seçâo.
5. APRESENTAÇÂO E DISCUSSÄO DE RESULTADOS
Nesta seçâo, apresentamos os resultados de forma descritiva e analítica. No primeiro momento, descrevemos o processo de inferencia da formaçâo discursiva a partir dos elementos constitutivos, processo ilustrado na Figura 5.1. Em seguida, discutimos os achados a luz do pensamento foucaultiano.
A formaçâo encontrada é composta de tres regras, quatro funçöes e 22 enunciados. Das regras, a que define a competencia do Estado (R3) é a única que se liga a todas as funçöes e todos os enunciados. Contudo, observamos que a funçâo de demonstrar o potencial económico (F04), que na presente formaçâo liga-se exclusivamente a regra R3, revela o quanto a incumbencia do Estado alinha-se as questöes da economia. Os enunciados que se ligam a essa funçâo, por sua vez, ocorrem predominantemente a partir dos anos 1990, o que revela a centralidade que o aspecto económico passa a ter a partir dessa década.
Já a regra que enfoca a manutençâo de ordem (R1) liga-se apenas as funçöes que detectam os riscos que o festejo implica (F03) e a necessidade de melhoria nos serviços de apoio (F02). Os enunciados que constituem esse feixe de relaçöes apresentam incidencia muito mais significativa entre as décadas de 1990 e 2010, quando as ameaças do festejo ao património começam a requerer açöes mais efetivas de prevençâo e correçâo.
Por fim, o exercício de prerrogativa (R2) por parte do Estado dá-se exclusivamente em funçao da constataçao do risco que o Carnaval implica ao patrimonio e a sociedade, e, a exceçao das ameaças ao patrimonio histórico, que já era alvo de preocupaçao desde a década de 1980 (quando já se preocupava com o impacto do número de visitantes no casario), todos os demais enunciados que constituem essa regra ocorrem a partir da década de 1990.
Essa formaçao diz respeito a como o Estado mobiliza tecnologías de poder visando maximizar os ganhos obtidos pela realizaçao do festejo e, ao mesmo tempo, conter as adversidades dele resultantes, seja decorrentes da saturaçao de infraestrutura, seja dos excessos comuns a folia de momo. Observamos a governamentalidade vinculada ao Estado como um aspecto fundamental. Esse governo encarrega-se da relaçao segurança-populaçao, incidindo sobre os corpos na forma de liberdade consentida, que opera tecnologias de poder no intuito de manutençao da ordem.
O Carnaval de rua propicia uma apropriaçao, ainda que transitória, do espaço público pelos foliöes, um espaço gratuito e diverso por defıniçâo (Siqueira & Vasques, 2015). Essa apropriaçao, por sua vez, confronta-se com o caráter de megaevento e meganegócio que tem assumido diversos carnavais do Brasil (Hollanda, 2013). Eventos desse porte requerem uma complexa estrutura organizacional e uma sinergia na articulaçao entre autoridades, visando a minimizaçao de riscos e a promoçao da segurança aos participantes (Santos, Kalid, Avila, Bittencourt, & Bittencourt, 2016). Dessa forma, a promoçao de um evento de grande magnitude e gerador de riquezas e, ao mesmo tempo, a preservaçao do patrimonio, bem como da vida daqueles que participam, constituem uma premissa para a gestao de carnavais dessa natureza.
Gerir os impactos e riscos de um Carnaval de rua ao mesmo tempo que se maximiza seu potencial económico implica a compreensao de que esses foliöes, como populaçao, inserem-se em uma rede de poderes e resistencias.
Em termos foucaultianos, governar implica a incorporaçao do modelo oriundo da economia, com o Estado operando tanto na via positiva, promovendo a educaçao, gestao de bens e circunscriçao do território a um domínio dotado de sua fonte e seus mecanismos de produçao riquezas, quanto na via negativa, no enfrentamento de questöes que se colocam contra essas riquezas, tais como epidemias, mortalidade, desemprego, insegurança (Oliveira, 2014).
Quando se coloca a problemática da gestao populaçao-recursos na formaçao de uma economia política, essa populaçao constitui um conjunto de unidades que obedece a uma dinámica natural da vida, mas é passível de intervençöes articuladas por meios de instrumentos estratégicos (Foucault, 1997). O governo dessa populaçâo consiste em prove-la daquilo que necessita para subsistir e, ao mesmo tempo, desenvolver mecanismos que garantam a manutençâo de ordem. Sob a racionalidade liberal, em que o governo da populaçâo opera sob a premissa da eficiencia (tanto no que diz respeito ao poder exercido quanto ao volume de recursos empregados), a segurança figura como um aspecto central a prosperidade (Fimyar, 2009).
Foucault (2008) afirma que a liberdade é imprescindível para que haja governo, e nâo uma açâo totalizante - uma liberdade estabelecida sob limites necessários a prática governamental. O dispositivo da segurança opera, pois, sobre a liberdade e tendo esta como um requisito para que os mecanismos de regulaçâo atuem (Candiotto, 2014). Essa questâo evidencia-se nos nossos dados, no propósito de manutençâo da ordem durante o ciclo carnavalesco, cujos esforços advindos do Poder Público procuram minimizar o impacto do festejo tanto do ponto de vista social quanto do ambiental, sem que impeça as manifestaçöes carnavalescas de seguirem seu curso, conforme exemplo a seguir:
Desde setembro, a cidade já vive em clima de prévias e já estavam sendo feitas açöes de enfrentamento aos danos ambientais e sociais. [. . .] A Prefeitura de Olinda também está orientando e fiscalizando diariamente os bares, restaurantes e o comércio informal. Estâo sendo observados desde questöes de limpeza e poluiçâo sonora. E para evitar acidentes com garrafas e copos de vidro a prefeitura distribui no acesso as concentraçöes garrafas de plástico. A prática já ocorre nas prévias e vai se estender ao Carnaval, sempre na Praça do Carmo ("Olinda intensifica açöes contra poluiçâo sonora e ambulantes irregulares", 2016).
Atrair um número cada vez maior de visitantes é um propósito da organizaçâo do Carnaval de Olinda, implicando o reconhecimento de que quanto maior a demanda, maior deverá ser o empenho do Estado em promover o bem-estar e evitar os danos tanto a populaçâo quanto a riqueza/ ao patrimonio.
Na citaçâo, observamos que a prefeitura reconhece esse potencial de danos sociais e ambientais, e, consequentemente, envida esforços no sentido de minimizá-los. O trecho evidencia que a poluiçâo sonora, a manipulaçâo inadequada de alimentos e o risco de acidentes e agressöes utilizando garrafas de vidro sâo pontos de atençâo, cuja resoluçâo a prefeitura busca via orientaçâo (treinamento) ou fiscalizaçâo (vigilancia).
Na análise, pudemos observar a incumbencia do Poder Público de organizar o festejo e garantir os serviços essenciais a sua consecuçao (E09), bem como a necessidade de promover a segurança da populaçao usando açöes disciplinares (E11), cujo propósito é aprimorar a prestaçao de serviços para o evento (F08). Por sua vez, a necessidade de açöes disciplinares (E09) parte da premissa de que o Carnaval implica riscos a cidade e as pessoas, reconhecendo a perturbaçao de ordem (E07) como um risco inerente ao festejo (F03). Essa premissa de que cabe ao Estado minimizar os riscos inerentes ao festejo aprimorando a prestaçao de serviços remete a manutençao de ordem (R1).
O corpo social é dotado de uma liberdade consentida, porém regulamentada, imprescindível a essa organizaçao. Enquanto agremiaçöes e foliöes ocupam livremente o espaço público com manifestaçöes carnavalescas, mesmo quatro meses antes do inicio oficial desse ciclo, a PMO mobiliza uma rede de serviços para que haja o mínimo possível de danos ao patrimonio e a populaçao.
Quanto a técnica, essa segurança pode operar via treinamento ou puniçao, no intuito dessa manutençao de ordem. Na gestao das populaçöes, os mecanismos reguladores que outrora repousavam numa polícia super-regulamentar desarticulam-se em dois sentidos: uma via incide nos aspectos que concernem a economia, visando maximizar a produtividade, e a outra via incide na repressao as transgressöes (Foucault, 2008). Trata-se do biopoder, que opera sob a anatomopolítica dos corpos e a biopolítica das populaçöes.
Nos nossos achados, esse aspecto revela-se na preocupaçao do Estado com os prejuízos materiais e sociais que podem advir de condutas transgressoras. Sob a perspectiva da relaçao entre populaçao, riqueza e governo, tais condutas sao propriamente transgressöes na medida em que implicam riscos aos pilares desse governo, quais sejam: a populaçao produtiva e a riqueza preservada e crescente.
Um exemplo de como os festejos carnavalescos operam tecnologías de biopoder diz respeito ao consumo alcoólico que se eleva nesse período, inclusive com a incidencia de embriaguez. Os elevados índices de acidentes automobilísticos com morte ou invalidez decorrentes do consumo de álcool por indivíduos que dirigem automóveis constituem-se num problema de segurança pública que se intensifica durante o período momesco, quando muitos foliöes optam por se dirigir ao perímetro da folia com seus automóveis particulares. Existe um aparato legal que dispöe sobre essa conduta independentemente do período carnavalesco, sob a prerrogativa do Estado de estabelecer níveis considerados seguros, fiscalizar a obediencia a esses níveis e aplicar sançöes caso sejam infringidos.
Quem pretende ir de carro para o Carnaval de Olinda deve pensar duas vezes antes de exagerar na bebida alcoólica. A prefeitura do municipio vai utilizar 1.000 bafômetros na saída da cidade [. . .] numa tentativa de reduzir os acidentes de tránsito relacionados a embriaguez. A ideia, encabeçada pela Secretaria de Saúde de Olinda, é uma das consequendas do 1° Fórum de Mobilizaçao Social para o Consumo Responsável de Bebidas Alcoólicas [. . .]. Por isso, além de punitiva, a açao será principalmente educativa. De acordo com o secretário, quem colaborar com os agentes de tránsito e realizar o teste voluntariamente nao será multado, mesmo que esteja embriagado. "Neste caso, a pessoa poderá entregar a chave do carro a um amigo sóbrio ou deixá-lo aos cuidados da Prefeitura e seguir de taxi." Quem se negar a fazer o teste será retido e encaminhado ao Instituto de Medicina Legal (IML) para passar por um exame clinico. Neste caso, o motorista embriagado será autuado por infraçao gravissima (multa de R$ 957,70), além de ter suspenso o direito de dirigir (DP, jan. 2006, n. 06).
No trecho, podemos observar que a prefeitura se vale de mecanismos de fıscalizaçao e puniçao para reduzir os números significativos de acidentes automobilisticos decorrentes da conduçao de veiculos em estado de embriaguez. Dessa forma, o Poder Público atua em duas estratégias, como enfatiza a matéria: educativa e punitiva. Assim, utiliza-se de sua autoridade para inibir transgressöes que implicam prejuízos graves.
Em nossa análise, evidenciamos a premissa de que o Carnaval é potencialmente nocivo a ordem (E07), na medida em que os excessos etílicos sao comuns e geralmente acarretam prejuízos sociais. Por isso, requer açöes educativas e de segurança para a populaçao (E11), uma vez que a prefeitura opta por promover uma conscientizaçao a respeito disso, ao mesmo tempo que monitora a conduta dos indivíduos (E10), que no exemplo se revela pela utilizaçao de medidores da concentraçao de álcool no sangue (os bafômetros) e, por fim, na insuficiencia dessas açöes, recorre a mecanismos punitivos (E12), que no exemplo podem ser evidenciados na conduçao do suspeito que se recuse a realizar o teste de alcoolemia para exames médicos (em caráter coercitivo) e, em se constatando a infraçao, aplicaçao de multa compatível com sua gravidade. Todas essas questöes consistem em admitir os riscos inerentes ao festejo (F03), apontando para um necessário uso de prerrogativa do Estado (R2) para garantir a segurança da populaçao.
Nesse exemplo, podemos observar como a biopolítica e a disciplina, embora sejam tecnologías políticas que atuam em níveis distintos, comple- mentam-se na segurança da populaçâo. O biopoder, ao articular a anátomo-política do corpo a biopolítica das populaçöes, investiga fenómenos naturais e processos biológicos (Foucault, 2014b). Foucault (2005) menciona um processo de acomodaçao entre mecanismos de poder que sao de natureza distinta: de um lado, mecanismos de poder sobre o corpo individual, via vigilancia e treinamento, a disciplina; de outro, fenómenos populacionais ou biossociológicos que atuam sobre as massas.
No exemplo apresentado, esses conhecimentos biossociológicos articulam-se nas estatísticas e evidencias de efeitos do álcool sobre o organismo, níveis considerados seguros para operar máquinas após ingerir tais substâncias, como o consumo etílico se insere em contextos sociais festivos, a exemplo do Carnaval, etc. Toda essa gama de conhecimentos insere-se numa produçao biopolítica, na medida em que seus efeitos no corpo social sao mensurados e, com base nesses saberes, tecnologías disciplinares sao operadas, bem como o Estado assume a prerrogativa de exercer seu poder de polícia, ou seja, a via repressiva do poder. Esse exercício, por sua vez, ampara-se em tecnologias sob o aparato legal: as açöes educativas sobre os riscos que o álcool representa cumprem a funçao de treinamento dos corpos, enquanto os mecanismos de fıscalizaçâo, como o bafómetro, atestam se houve o cumprimento efetivo da lei, e, em se constatando o contrário, aplicam-se sançöes também previstas no aparato legal.
Conforme já discutimos, o poder disciplinar opera dirigido as subjetividades, pela internalizaçao desse processo de normatizaçao da conduta. Assim, esses mecanismos de fıscalizaçâo, tais como o bafómetro, os fiscais que circulam pelo Sítio Histórico sem identificaçâo clara, as plataformas elevadas de observaçâo instaladas pela Polícia Militar, todas elas apontam para o panoptismo, na medida em que a observaçâo é potencialmente constante. No caso dos bafómetros, a matéria enfatiza que, na insuficiencia de aparelhos, os veículos serao submetidos por amostragem. Isso implica que, ao saberem que podem ser fiscalizados e/ou punidos a qualquer momento, os indivíduos tendem a internalizar a conduta desejada pelo governo.
Contudo, se é verdade que a dupla vigilância-repressâo opera por uma via, o processo de docilizaçâo articula populaçâo e riqueza também por outros caminhos. Na medida em que cultura, turismo e lazer figuram como meios para o desenvolvimento económico das cidades (Richards & Palmer, 2010), a promoçâo de um folguedo popular como evento público nao só gera riquezas, como também proporciona experiencias para a populaçao. Nesse sentido, Richards e Palmer (2010) afirmam que muitas cidades valem-se de ativos culturais para promover a prosperidade e "regenerar o tecido social". Dessa forma, podemos observar como o Carnaval de Olinda é assumido pela gestăo municipal como uma oportunidade de desenvolvimento, sob a responsabilidade do Estado, respaldada num ideal de desempenho do ponto de vista mercadológico. Isso revela uma gestăo municipal preocupada nao apenas em garantir a infraestrutura e os serviços essenciais, mas também dotar o festejo de um diferencial competitivo em relaçao ao Carnaval promovido pelas outras localidades. Podemos observar essa incumbencia assumida pelo Estado no exemplo a seguir:
A seis dias do Carnaval, a cidade de Olinda inicia a contagem regressiva e já demonstra, através de sua arquitetura barroca, a profusăo de cores e magia que torna o lugar um dos polos mais concorridos do mundo nesta época do ano. Até o sábado de Zé Pereira, o municipio recebe os últimos retoques da Prefeitura para oferecer aos visitantes uma infraestrutura que engloba apresentaçöes artísticas, atendimento médico, decoraçao, orientaçao turistica, e até a abertura de uma conta [. . .]. A multidăo esperada do evento, assegura, vai contar com cinco focos de animaçao, quatro postos de atendimento de informaçao turísticas com funcionários bilingues e quatro unidades de pronto-atendimento médico funcionando 24 horas (DP, fev. 1996, n. 18).
O exemplo revela todo um esforço da prefeitura para prover o Carnaval de uma infraestrutura e de serviços de apoio, vislumbrando a conversăo do festejo num espetáculo, que precisa ser o melhor possivel para atrair cada vez mais visitantes: "um dos polos mais concorridos do mundo nesta época do ano". Isso também indica que as atençöes estăo voltadas sobretudo para o turismo, no intuito de que as pessoas advindas de vários lugares "do mundo" sejam acolhidas e disponham da estrutura adequada (E19). Isso também revela que o festejo representa um empreendimento sob a gestăo da prefeitura (E20). Esses aspectos demonstram o potencial económico (F04) que o Carnaval representa para esse governo.
Dessa forma, há um mix de atraçöes (polos de animaçao e decoraçao esmerada) e serviços de apoio (posto de informaçöes bilingue, pronto atendimento) no sentido de servir ao público, com enfase na figura do turista. Por sua vez, essa prestaçao de serviço passa por um reforço de infraestrutura e pela prevençao de danos, o que aponta novamente para a necessidade de açöes educativas e de segurança (E11) para a populaçao e os visitantes, o que cumpre a funçao de aperfeiçoar cada vez mais o setor de serviços (F02) visando a esse propósito e, ao mesmo tempo, admitir os riscos inerentes a esse empreendimento (F03). Por fim, observamos também que a provisăo de serviços essenciais, que requerem reforço durante o evento, é uma incumbencia da PMO (E09), revelando a dimensăo infraestrutural desse processo (F01). Assim, o aperfeiçoamento da produçao do festejo, investindo na melhoria de serviços tanto para proporcionar uma melhor experiencia quanto prevenir adversidades, revela aquilo que compete ao Estado nessa organizaçao (R3).
Conforme já discutimos, a prosperidade de um Estado está intimamente ligada a sua populaçao e a maneira como esta é gerida no sentido de estabelecer com as riquezas uma relaçao adequada. Visando obter essa relaçao adequada, o Estado opera tecnologías de governo que nao se apoiam apenas no aparato da segurança, mas também na promoçao de bem-estar (Fimyar, 2009; Nadesan, 2008). Nesse sentido, podemos dizer que a gestao do folguedo popular se insere nesse propósito de promover o bem-estar social, que, com os mecanismos de segurança, amplia as riquezas e proporciona experiencias aos individuos.
6. CONSIDERAÇOES FINAIS
Embora o Carnaval seja comumente tratado como uma manifestaçao do e para o povo, a penetraçao de instancias formais de autoridade na organizaçao de folguedos populares, que no nosso caso revela-se no protagonismo do Poder Público na organizaçao e nas práticas decisórias, dá-se porque um folguedo dessa natureza e magnitude envolve inúmeras dimensöes da vida pública: uso do espaço público, saúde e segurança públicas, políticas culturais etc. No Carnaval de Olinda, observamos que o papel assumido pela municipalidade, se num primeiro momento vislumbra tao somente permitir que o festejo aconteça e prove-lo de recursos para que o povo festeje em segurança, logo se converte no centro de uma teia dinámica de relaçöes que envolve cidadaos (foliöes ou nao), agremiaçöes, empresas privadas, serviços públicos etc., muitas vezes exercendo a mediaçao de interesses. A gestao do risco e a promoçao da segurança, tanto a populaçao quanto ao patrimonio, colocam-se como um desafio que enseja a articulaçao de mecanismos disciplinares e tecnologias biopoliticas.
Ao promover um evento aberto ao grande público, convidando-o a ocupar espaço público e vivenciar o festejo momesco tanto fruindo as manifestaçöes da cultura popular quanto se permitindo determinadas condutas (consumo elevado de álcool, liberdade sexual, danças e vestimentas), o Poder Público, tendo ao centro a PMO, opera mecanismos disciplinares cuja internalizaçao orienta o foliao sobre o proibido e o permitido, o desejável e o condenável na experiencia da folia. Por sua vez, diversas esferas da gestăo pública articulam-se na prevençao de danos os mais diversos, decorrentes do abuso de álcool, do sexo desprotegido, da violencia, da conduçao indevida de automóveis, do consumo de alimentos malconservados etc.
Para que a populaçao de foliöes seja gerida, há uma rede de saberes sobre a dinámica populacional e os fenómenos que incidem sobre a vida dessa populaçao, permitindo atuar por via preventiva, orientando, usando a imprensa e a propaganda para desencadear comportamentos desejáveis e evitar os indesejáveis, fiscalizando e fornecendo preventivos; ou por via punitiva, quando a prevençao nao permite evitar transgressöes. A vigiláncia, seja pelas plataformas de observaçao, pelo policiamento constante, pela fiscalizaçao de tránsito e de ambulantes, permite aos individuos a internalizaçao dessa conduta. Podemos, pois, dizer que o biopoder é exercido sob a forma da liberdade vigiada, incidindo tanto em nivel individual quanto populacional. Assim como a liberdade é um requisito para o exercicio do governo, ela é também um requisito para que um Carnaval de rua exista, sendo o governo encarregado de gerir probabilidades e obter dos sujeitos a docilidade e a sujeiçao aos mecanismos disciplinares e as tecnologías biopoliticas.
Nesse sentido, os achados apontam para como essas tecnologias estao intimamente ligadas a organizaçao dos festejos públicos, evidenciado tais mecanismos. Se é verdade que houve uma "profissionalizaçao" do Carnaval de Olinda, um aspecto que se colocou ao longo das décadas para a organizaçao desse festejo foi como evitar prejuízos de ordens material, social e ambiental. Esse processo, portanto, passou pelo estudo e desenvolvimento de novas tecnologias para manter as multidöes caracteristicas desse tipo de evento sob controle e pela compreensao de aspectos biossociológicos que incidem nessa multidao (consumo de álcool, práticas sexuais intensificadas na folia, uso de drogas ilicitas, consumo de alimentos sem as necessárias condiçöes de higiene), de modo a promover a segurança dos individuos e do património municipal.
É válido ressaltar, no tocante a essas tecnologias, que o folguedo popular por si só já se insere no propósito de docilizar os corpos para sua inserçao na máquina produtiva, na medida em que a ruptura que se dá no Carnaval mostra-se profundamente atrelada a vida operativa das sociedades, desde os tempos mais remotos. Assim, quando se promove um festejo, que cada vez mais é delineado como um serviço que é ofertado a um público, alinha-se a esse propósito de docilizaçao a vida ordinária que se encerra com o limiar do festejo de momo e é retomada com seu término. No entanto, nao podemos dizer que a vida produtiva e operativa sofre uma completa ruptura com os festejos carnavalescos, já que há toda uma rede de práticas laborais que se intensifica (ou mesmo que é criada) por ocasiao do Carnaval.
A incumbencia do Poder Público em promover essa segurança mostrou-se um aspecto relativamente estável ao longo do período investigado; o que muda, contudo, é a intensidade e a sofisticaçao das tecnologías políticas e os níveis em que essas tecnologias atuam. Outro aspecto que merece destaque é o fato de que a ampliaçao do festejo (seja temporalmente, com as prévias cada vez mais precoces, seja com relaçao ao contingente de público) torna cada vez mais evidentes as ameaças que o festejo encarna a ordem e ao patrimonio público, requerendo esquemas de segurança mais sofisticados e que, muitas vezes, contam com a participaçao de agentes privados.
Os aspectos aqui discutidos evidenciam que o Carnaval de Olinda apresenta uma complexa configuraçao organizacional que vislumbra dar conta da magnitude cada vez maior do festejo e é perpassada por relaçöes de poder as mais diversas, que operam sobre os corpos e emanam de várias instancias, que nao apenas as organizaçöes formais. Nesse sentido, podemos dizer que o Carnaval é atravessado por tecnologias disciplinares e biopolíticas, assim como, ao proporcionar a liberdade, vale-se dela para regular as populaçöes.
O presente estudo teve como limite o intervalo temporal compreendido e como limitaçao o uso de apenas um tipo de documento, o jornal impresso. Essa escolha deu-se em funçao de ser o único acervo regular em todo o período estudado e em funcionamento até o presente, bem como em razao do caráter polifónico do discurso jornalístico, que por princípio deve contemplar uma pluralidade de vozes. Para minimizar tal limitaçao, triangulamos os discursos jornalísticos oriundos de duas fontes e, portanto, linhas editoriais distintas.
Como contribuiçao teórica, além do entendimento do Carnaval como fenómeno organizacional, temos o uso da noçao de biopoder como forma de compreender a relaçao entre governo e populaçao e a gestao de grandes eventos, num momento em que os folguedos populares tem sido cada vez mais permeados pela lógica empresarial e turística.
Para citar este artigo: Franco, S. M., & Leao, A. L. M. S. (2019). Da folia å performance: Biopoder na organizaçao do Carnaval de Olinda. Revista de Administrando Mackenzie, 20(3). doi:10.1590/16786971/eRAMG190127
Submissao: 1 ago., 2018. Aceite: 1 out., 2018.
AGRADECIMENTOS
A Fundaçao de Amparo a Ciencia e Tecnología do Estado de Pernambuco (Facepe).
NOTAS DOS AUTORES
Suelen M. Franco, Programa de Pös-Graduaçâo em Administraçâo, Universidade Federal de Pernambuco (UFPE); Andre L. M. S. Leäo, Centro de Ciencias Sočiais Aplicadas, Universidade Federal de Pernambuco (UFPE).
Suélen M. Franco é agora professora horista do Centro Universitario Mauricio de Nassau (Uninassau); André L. M. S. Leäo é agora professor associado do Centro de Ciencias Sociais Aplicadas da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE).
Correspondencias sobre este artigo devem ser enviadas para André L. M. S. Leäo, Avenida Prof. Moraes Rego, 1235, Cidade Universitaria, Recife, Pernambuco, Brasil, CEP 50670-901.
E-mail: [email protected]
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Abstract
Objetivo: O presente estudo busca compreender como o biopoder se manifesta na organização do Carnaval de Olinda. Para tanto, o Carnaval é estudado como uma complexa organização, compreendendo esse conceito para além das organizações formais, e o poder é estudado sob a perspectiva foucaultiana, que constitui a lente teórica desta investigação, permitindo-nos compreendê-lo até em suas manifestações mais difusas, no nível das micropráticas, articulando as dimensões de segurança e riqueza na organização do festejo. Originalidade/valor: A noção de biopoder na gestão de grandes eventos mostra-se uma construção teórica relevante, num momento em que os folguedos populares têm sido cada vez mais permeados pelas lógicas empresarial e turística. O uso intensivo do espaço público requer tecnologias que permitem liberdade e entretenimento ao mesmo tempo que propiciam segurança e minimização de riscos ao patrimônio e à população. O Carnaval investigado possui grande visibilidade midiática e turística, porém é pouco contemplado nos estudos organizacionais. Design/metodologia/abordagem: Foi realizada uma análise de discurso foucaultiana da cobertura jornalística de quatro carnavais que distam dez anos entre si (1986, 1996, 2006, 2016) em dois jornais impressos locais, os únicos em circulação durante todo o período estudado. Resultados: Os resultados apontam para uma crescente ordem mercantil, em que as demandas turísticas e de entretenimento geram resultados econômicos à prefeitura, ao mesmo tempo que exigem um esforço de normatização, vigilância e prevenção de perdas, resultando numa produção biopolítica.