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O estudo que aqui apresento estende-se pelo espaço de duzentos anos, decorrente nos séculos XVI e XVII, tempo em que chegaram mais portugueses, nomeadamente os jesuítas por motivos religiosos, ao Império do Meio, e se registaram numerosos escritos assinaláveis sobre aquela terra oriental, nos quais, incluíam inúmeras descrições importantes sobre os letrados chineses das dinasti as Ming (1368-1644) e Qing (1644-1912) da China continental.
No que respeita às primeiras imagens dos letrados chineses, abordar-se-ão os primeiros textos portugueses que se referem àclasse letrada, logo a seguir aos primeiros contactos diretos com a China, em 1513, e até 1583. Serão tratados nomeadamente os trabalhos do cativo de Cantão, D. Jerónimo Osório, Fernão Lopes de Castanheda, Galiote Pereira, Frei Gaspar da Cruz, Fernão Mendes Pinto, entre outros. Atestar-se-áo nascimento de uma imagem francamente positiva dos letrados chineses, que leva a que os padres jesuítas modifiquem a sua estratégica de missionação relativamente àChina, com resultados francamente positivos.
Analisam-se a seguir os avanços na missão jesuíta da China, que se desenvolve a partir de 1583, graças a um conhecimento cada vez mais aprofundado da língua e da cultura chinesas. O sucesso de Matteo Ricci e dos seus confrades europeus estáligado precisamente ao relacionamento que estabelecem com os letrados chineses, optando por uma forma de missionação mais elitista. Analisam -se as notícias transmitidas pelos padres jesuítas sobre os letrados chineses, nomeadamente as suas atitudes perante as culturas europeias, àfécristã, aos padres ocidentais, entre outros. Além disso, explorará a imagem dos letrados chineses nas obras dos três missionários jesuítas que deixaram as mais significativas descrições da China: Álvaro Semedo, António de Gouveia e Gabriel de Magalhães. As informações jesuítas serão confrontadas com materiais chinesas, permitindo verificar o respetivo rigor.
O trabalho inclui ainda um capítulo dedicado a Xu Guangqi, o famoso «Doutor Paulo» das fontes jesuítas, um dos primeiros letrados chineses a converter-se ao Cristianismo. O Doutor Paulo foi um dos grandes apoiantes da missão jesuíta, e será tomado como paradigma do «letrado cristão», analisando -se a sua formação, as atividades a que se dedicou e, sobretudo o seu apoio àmissão jesuíta na China.
De qualquer modo, do ponto de vista cultural, os portugueses apresentaram a classe letrada da China Ming e Qing de forma relativamente correta. As suas descrições, embora não completas e com uma tonalidade religiosa, não perderam a essência do carácter dos letrados antigos. Graças aos relatos dos padres missionários, despertou um grande interesse e uma especial atenção entre as classes cultas ocidentais da época, constituindo mesmo um tema privilegiado na literatura europeia dedicada à Ásia, em geral, e à China, em especial. Por outro lado, as considerações dos jesuítas sobre os letrados e as obras confucionistas, contribuíram muito para a divulgação da cultura chinesa, na Europa culta, ampliando grandemente a visão dos europeus sobre a ideologia e a civilização chinesas, além de renovar o saber e a visão tradicionais da Europa, de então, sobre a China.