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A poesia de António Franco Alexandre envia o leitor para um exercício de leitura armadilhado, porque pautado pela inconstância hermenêutica que dela decorre. O leitor posiciona-se defronte de um texto que a todo o momento o questiona, através de uma operação de constante diferimento face à sua significância.
Numa poesia em que a linguagem compromete tudo aquilo que ela própria nomeia, o leitor partilha com o sujeito da enunciação esta sensação de falência, constatando-se que o “eu” oscila entre a vulnerabilidade que o caracteriza e a árdua tentativa de se fixar. O “eu” sofre de uma inabilidade de se dar ao outro, o que acaba por ter consequências não só na construção da sua personalidade, como também na efetivação de qualquer experiência afetiva, em constante ameaça.
No entanto, a verdadeira carência que se urge suprir está relacionada com o próprio fazer poético, que se sustenta, precisamente, a partir desse mecanismo de rarefação, através do qual se potencia poeticamente. Assim, o “eu” passa de vítima dessa fragilidade ao agente que a promove, acionando diversas metamorfoses em busca da inspiração poética que lhe possa aportar a continuidade do escrito, já que a sua estabilidade só se viabiliza enquanto houver versos por escrever.
O núcleo da obra alexandrina gira, assim, em torno da luta entre presença e ausência, permanência e abandono, fragilidade e força, assentando a sua construção poética num exercício que implica anulação para se tornar potência.