RESUMO
O estudo objetivou caracterizar as diferenças no processo de trabalho de agentes comunitários de saúde (ACS) em dois municípios sul-mato-grossenses, segundo sua percepção, frente às atividades desenvolvidas no controle da dengue e na saúde da família. Aplicaram-se entrevistas estruturadas a 57 ACS. Constatou-se que os ACS apresentavam características sociodemográficas semelhantes. Os de Rio Verde de Mato Grosso, que executavam apenas ações da saúde da família, não priorizaram o preenchimento da Ficha A. Em São Gabriel do Oeste, os ACS incorporaram as atividades do controle da dengue, extinguindo-se o Agente de Controle de Endemias, enquanto em Rio Verde de Mato Grosso ambos se mantiveram. Na percepção dos ACS de São Gabriel do Oeste, a acumulação dos dois programas não influiu em sua produtividade. A unificação das ações dos dois programas em um mesmo profissional se mostrou viável, sem prejuízos às atividades desenvolvidas.
Descritores: Saúde da Família; Atenção Primária à Saúde; Dengue.
ABSTRACT
The purpose of this study was to identify self-perceived differences in the work processes of community health agents (CHA) in two counties of Mato Grosso do Sul, regarding dengue control and Family Health Strategy (FHS) activities. Structured interviews were applied to 57 CHA. The subjects had similar sociodemographic characteristics. Agents in Rio Verde de Mato Grosso county, who performed only FHS tasks, failed to complete essential data of the Form A. In São Gabriel do Oeste county, CHA currently perform tasks pertaining to dengue fever control, previously conducted by Endemic Disease Control Agents (now abolished), while in Rio Verde de Mato Grosso county, dengue control remained assigned to the latter group. In São Gabriel do Oeste county, CHA did not view the double workload of two programs as affecting their professional productivity. The pooling of tasks from the two programs proved to be feasible, with no detrimental effects on performance.
Key words: Family Health; Primary Health Care; Dengue.
RESUMEN
El objetivo del estudio consistió en caracterizar las diferencias de trabajo de los ACS en los dos municipios de Mato Grosso do Sul, de acuerdo con su percepción, en las actividades desarrolladas de control de dengue y salud de la familia. Entrevistas estructuradas con 57 ACS constataron características sociodemográficas similares. En São Gabriel do Oeste, los agentes comunitarios de salud (ACS) incorporaron las actividades del control del dengue, suprimiendo a los agentes de control de endemias (ACE), mientras que en Rio Verde de Mato Grosso ambos se mantuvieron. Los de Rio Verde de Mato Grosso, que ejecutaban tan sólo acciones de salud de la familia, no priorizaron la Ficha A. En la percepción de los ACS de São Gabriel do Oeste, la acumulación de dos programas no influyó en su productividad. La unificación de acciones de los programas en un mismo profesional se mostró factible, sin problemas para las actividades desarrolladas.
Palabras clave: Salud de la Familia; Atención Primaria de la Salud; Dengue.
INTRODUÇÃO
O Ministério da Saúde, por meio da Política Nacional de Aten- ção Básica, estabeleceu quais as atribuições mínimas específicas de cada profissional inserido nas equipes de Estratégia Saúde da Família (ESF)(1). Como peça central do processo de trabalho des- sas equipes, encontra-se o Agente Comunitário de Saúde (ACS), que tem sob sua responsabilidade atribuições que podem ser classificadas em três grandes grupos: ações de promoção e pre- venção da saúde, ações de mediação entre o serviço de saúde e os usuários e ações de acompanhamento e reabilitação(2).
Além dos ACS, também estão lotados nas Unidades Bási- cas de Saúde os Agentes de Controle de Endemias (ACE), pro- fissionais responsáveis pelas ações de controle da dengue. As ações desse Programa, no entanto, cabem também aos ACS, aos quais compete vistoriar domicílios e áreas peridomiciliá- rias para identificar criadouros de difícil acesso ou outras situ- ações que requeiram a utilização de larvicida, casos em que devem solicitar a presença do ACE de sua área(3).
A integração desses dois profissionais em uma mesma base territorial é considerada fundamental para o êxito no controle das endemias, uma vez que a corresponsabilidade e consequente integração de atividades potencializam o tra- balho preventivo e otimizam ações que, embora distintas, complementam-se(3).
Esse modelo, que envolve o compartilhamento em uma mesma base geográfica por dois agentes, é utilizado em vários municípios brasileiros, como Rio Verde de Mato Grosso-MS, que, em 2002, alcançou cobertura de 100% da ESF. Nesse mesmo ano, o município vizinho, São Gabriel do Oeste-MS, também atingiu 100% de cobertura da ESF e determinou que os ACS passassem a desenvolver tanto as ações prioritárias dessa estratégia quanto as ações de controle e prevenção da dengue, extinguindo dessa forma a figura do Agente de Con- trole de Endemias (ACE).
A partir de então, os ACS de São Gabriel do Oeste passa- ram a incorporar de maneira rotineira em suas microáreas, além das vistorias em imóveis domiciliares, as vistorias em estabelecimentos comerciais, terrenos baldios e pontos estra- tégicos (como cemitérios, borracharias e depósitos de sucata e de materiais de construção). Eles receberam, também, a in- cumbência de destruir criadouros de difícil acesso e utilizar larvicidas químicos e biológicos A aplicação de larvicidas químicos é realizada com equipamentos de aspersão manu- al (bomba intercostal). Devido ao peso desse equipamento, essa atividade foi designada aos agentes do sexo masculino que, quando necessário, eram deslocados de suas microáreas. Outra tarefa incorporada foi o registro dos mapas diários do Sistema de Informação da Febre Amarela e Dengue (SISFAD), o que até então era de responsabilidade exclusiva dos ACE(4).
A existência desses dois municípios sul-mato-grossenses com distintas propostas de atuação no controle da dengue no âmbito da ESF permitiu estabelecer como objetivo deste estudo a análise das diferenças no processo de trabalho do ACS, segundo a sua percepção, frente às atividades de contro- le da dengue e as demais incumbências na Estratégia Saúde da Família.
MÉTODO
Pesquisa realizada com ACS de Rio Verde de Mato Grosso e de São Gabriel do Oeste, municípios de mesmo porte popula- cional, com 19.217 e 21.646 habitantes(5), respectivamente, per- tencentes à mesma região econômica e geográfica e que atingi- ram 100% de cobertura da ESF em suas áreas urbanas em 2002.
A rede de serviços básicos de saúde de Rio Verde de Mato Grosso no momento da pesquisa era constituída por seis Uni- dades Básicas de Saúde da Família (UBSF) na área urbana (congregando 38 ACS) e uma na rural (8 ACS), totalizando 46 ACS. São Gabriel do Oeste contava com sete UBSF na área urbana (44 ACS) e uma na rural (8 ACS), totalizando 52 ACS.
Foram convidados a participar da pesquisa todos os ACS pertencentes às UBSF urbanas, já que nas microáreas rurais não são realizadas atividades de controle de vetores. Foram ex- cluídos os ACS que, apesar de atuarem na área urbana, tinham menos de seis meses de experiência no momento da pesqui- sa, tempo considerado o mínimo necessário para que tivessem pleno conhecimento de sua função. Também foram excluídos os ausentes no momento da coleta de dados e os que se recu- saram a participar. Ao final, o estudo incluiu 30 ACS em São Gabriel do Oeste e 27 em Rio Verde de Mato Grosso.
Os dados foram coletados em novembro de 2009, por meio de entrevistas que seguiram um roteiro constituído de per- guntas fechadas. As entrevistas foram previamente agendadas e realizadas em salas reservadas das UBSF no início de cada expediente, momento em que os ACS reuniam-se para iniciar as atividades. As questões propostas abordaram características socioeconômicas (sexo, escolaridade), tempo de atuação como ACS, capacitações realizadas para o serviço, atividades realiza- das (número e forma de desenvolvimento), acompanhamento de programas prioritários de saúde e de controle de dengue.
Para analisar as repercussões da incorporação das ações de controle da dengue às atividades dos ACS, selecionaram-se, dentre as áreas estratégicas da Atenção Básica(1), os principais programas relacionados à mulher (gestantes), à criança (imu- nização) e à hipertensão e ao diabetes, que constituem os dois principais fatores de risco para doenças cardiovasculares.
Os dados obtidos foram submetidos à análise estatística e as diferenças estatísticas analisadas pelo teste Qui-quadrado (χ2) e, quando necessário, o teste de Fisher, considerando-se estatisticamente significativas aquelas com valor de p menor ou igual a 0,05. Utilizou-se o software Epi-Info, versão 3.4.3.
A pesquisa seguiu os procedimentos formais recomenda- dos pela Resolução 196/96 do CNS, aprovado pelo Comitê de Ética da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, sob o Protocolo de no 1.062/2007, e os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).
RESULTADOS
A Tabela 1 apresenta as características sociodemográficas dos ACS pesquisados. Houve predomínio do sexo feminino em ambos os municípios. Com relação ao tempo de atua- ção como ACS, em Rio Verde de Mato Grosso encontrou-se um maior percentual de agentes com mais de dois anos de atuação (96,3%) e também maior percentual daqueles com grau de escolaridade médio e superior (96,3%) em compara- ção a São Gabriel do Oeste (86,7%).
Comparando-se as capacitações dos ACS nos dois muni- cípios, não houve diferença estatisticamente significativa nas proporções dos que fizeram o Curso Introdutório, embora em São Gabriel do Oeste tal proporção tenha sido menor. Os cursos mais frequentados nesse município foram os de Controle da Dengue (85,7%), de primeira etapa de Técnico ACS (76,2%) e do Programa de Formação de Agentes Locais em Vigilância em Saúde - PROFORMAR (42,9%). Em Rio Verde de Mato Grosso também predominaram essas duas primeiras capacitações, seguidas do Programa do Hipertenso. Entre os dois municípios, observou-se diferença estatisticamente significativa entre as capacitações do Programa do Hipertenso e do PROFORMAR (Tabela 2).
A realização de supervisões em campo aos ACS, os programas priorizados, o planejamento e o número de visitas domiciliárias diárias realizadas foram reunidos na Tabela 3. Houve diferença estatisticamente significativa no número de supervisões de campo, em que São Gabriel do Oeste alcan- çou maior percentual (76,7%), que foram realizadas principalmente pelo supervisor de área (73,9%). Em Rio Verde de Mato Grosso, coube às en- fermeiras a maior parte (66,7%) das supervisões.
Quanto às visitas domiciliárias, em São Gabriel do Oeste, a maioria (83,3%) dos ACS realizou planeja- mentos diários, enquanto em Rio Ver- de de Mato Grosso, as visitas foram planejadas no início da semana ou do mês (44,5%). Não houve diferença es- tatisticamente significativa no número de visitas diárias, embora um maior percentual de ACS em Rio Verde de Mato Grosso tenha priorizado na visita principalmente os programas de dia- betes, mulher/gestante e hipertensão. Em São Gabriel do Oeste, os maiores percentuais de priorização foram para os programas voltados à hipertensão, dengue e diabetes e criança. Houve diferença estatisticamente significativa entre os municípios na priorização do Programa de Controle da Dengue, ao contrário dos programas voltados às diabetes, mulheres/gestantes e hanse- níase (este último nem foi citado pelos ACS de São Gabriel do Oeste).
Na análise das atividades realizadas pelos ACS (Tabela 4), não se constatou diferença estatisticamente significativa na priorização de relatórios. No entanto, a análise por tipo de relatório revelou maior percentual de agentes que priorizava os relatórios dos programas voltados às mulheres/gestantes, hipertensão e diabetes em Rio Verde de Mato Grosso e hipertensão, Ficha de Cadastramento das Famílias (Ficha A) e controle da dengue em São Gabriel do Oeste.
Quanto ao acompanhamento de gestantes, a maioria dos ACS de São Gabriel do Oeste relatou realização adequada de pré-natal, 30% deles solicitava o cartão da gestante durante as visitas e apenas 16,6% verificava o preenchimento da Ficha B - Gestante. Somente os ACS de Rio Verde de Mato Grosso relataram realizar visitas domiciliárias com maior frequência.
Para o acompanhamento do esquema vacinal, 44,4% dos ACS de Rio Verde de Mato Grosso informou que a equipe da unidade comunica- -lhes se uma criança está com o esquema vacinal atrasado e necessita ser visitada. A utilização do cartão- -espelho e de um caderno para anotação dos dados vacinais das crianças foi citada respectivamente por 33,3% e 29,6% dos agentes desse município. Já em São Gabriel do Oeste, o cartão-espelho foi relatado com maior percentual.
Em Rio Verde de Mato Grosso, os agentes que realizavam acompanhamento do tratamento de diabéticos e hipertensos perfizeram maior percentual (59,2%), enquanto em São Gabriel do Oeste, a maioria (83,3%) relatou oferecer orientações sobre medicamentos prescritos, dieta, controle da pressão arterial e da glicemia capilar.
Em relação às atividades do Programa Nacional de Controle da Dengue, os ACS de Rio Verde de Mato Grosso relataram que perguntavam ao morador sobre a presença de possíveis criadouros, sem a necessidade de vistoriar o imóvel, e registravam a visita. Em São Gabriel do Oeste, os ACS disseram que vistoriavam os cômodos da casa, acompanhados pelo morador, verificavam a existência de focos de criadouros de Aedes aegpty e outros mosquitos, realizavam a coleta de larvas para posterior exame laboratorial e comunicavam ao supervisor imediato a presença de focos no domicílio para possíveis intervenções. Consideraram que existia sobrecarga em relação às atividades desenvolvidas, no entanto, mais da metade dos entrevistados afirmou ter incorporado as atividades extras na rotina do trabalho e achava que deveria receber um salário maior (Tabela 5).
DISCUSSÃO
Em ambos os municípios houve predominância de ACS do sexo feminino, situação encontrada em outros municípios brasileiros(6-10). Com relação ao tempo de atuação na função, mais da metade exercia o trabalho há mais de três anos, o que evidencia a baixa rotatividade desses profissionais, um aspec- to positivo, por facilitar a criação de vínculo com as famílias residentes na microárea do agente.
Um dos requisitos para exercer a profissão de ACS é ter concluído o ensino fundamental(11). No entanto, os ACS pes- quisados tinham maior grau de escolaridade (ensino médio ou superior), o que pode estar refletindo a baixa oferta de tra- balho mais especializado e de salários mais altos nesses mu- nicípios. Achados semelhantes foram encontrados em quatro municípios do Noroeste Paulista(7), onde 65,8% dos ACS pos- suía ensino médio completo, 7,9% ensino médio incompleto e 21,1% ensino superior incompleto. Em estudo realizado em Porto Alegre (RS)(8), foi identificada situação oposta, com a maioria dos agentes dispondo apenas de escolaridade funda- mental completa. A boa escolaridade dos ACS pode contribuir para melhor assimilação de novos conhecimentos e facilitar a realização das ações junto às famílias atendidas.
O Ministério da Saúde estabeleceu que todos os profissio- nais que ingressam na ESF frequentem o Curso Introdutório em um prazo máximo de seis meses(1), para permitir o iní- cio de um processo de educação permanente. Os índices de participação dos ACS nesse curso foram satisfatórios em am- bos os municípios pesquisados, embora resultados inversos já tenham sido constatados(7), em que mais da metade dos agentes entrevistados (52,6%) não havia frequentado o Curso Introdutório.
Com relação ao número de capacitações realizadas, os ACS de Rio Verde de Mato Grosso apresentaram percentuais superiores aos de São Gabriel do Oeste, com destaque para o Programa de Controle da Dengue, que, nesse município, é compartilhado com o ACE. Essa capacitação teve como pro- pósito implantar uma nova metodologia de trabalho para os ACS, denominada Zoneamento Compartilhado(12) e atender à Portaria no44/GM, que definiu as atribuições desses agentes na prevenção e no controle da malária e dengue(13). O alto per- centual de menções de realização do curso em Rio Verde do Mato Grosso pode estar relacionado ao fato de que a pesquisa de campo foi realizada logo após o oferecimento do curso.
Embora em São Gabriel do Oeste os ACS executem o Pro- grama de Controle da Dengue, menos da metade estava capa- citada. Esse baixo número pode estar relacionado ao menor tempo de serviço, já que 40% dos ACS atuam há menos de dois anos nesse município.
As capacitações e a educação permanente dos ACS são fundamentais para que atendam às necessidades das famílias, direcionando o olhar e as ações de saúde tanto para as práti- cas curativas como para as preventivas e de promoção(10).
Outra capacitação realizada por mais da metade dos ACS de ambos os municípios foi a primeira etapa do curso Técnico Agente Comunitário de Saúde, requisito básico para a forma- ção profissional. Essa etapa visa desenvolver o perfil esperado desse técnico e seu papel no âmbito da equipe multiprofissio- nal na rede de Atenção Básica do SUS(14).
A presença de enfermeiros nas unidades da ESF permite a realização de supervisões tanto da equipe de enfermagem como dos ACS, atividade essa que lhe é inerente(1) e que foi exercida por mais da metade dos enfermeiros em ambos os municípios pesquisados. Os ACS de São Gabriel do Oeste, que acumulavam os dois programas, receberam maior número de supervisões, não apenas por enfermeiros, mas também por su- pervisores de área, já que compartilhavam das mesmas bases geográficas, o que favoreceu o acompanhamento em campo.
As visitas domiciliárias são uma ferramenta importante para os programas de saúde(15). Em Rio Verde de Mato Gros- so, houve maior priorização dos programas durante as visitas, principalmente aqueles voltados a diabéticos, mulheres/ges- tantes e hipertensos, o que vem atender às áreas estratégicas de atuação da Atenção Básica(1).
Já em São Gabriel do Oeste, onde os ACS estavam encarre- gados do Programa de Controle da Dengue, este foi o segundo mais citado dentre os programas executados nesse município, o que demonstra que já está incorporado à rotina diária desses agentes. Cabe destacar que a dengue é um desafio a ser enfren- tado por todos os ACS vinculados às UBSF e que suas ações de combate devem fazer parte de sua rotina(3). Para maior efetivi- dade, as visitas domiciliárias devem ser planejadas de modo a potencializar a utilização do tempo de trabalho, além de res- peitar a disponibilidade de tempo dos moradores visitados(16).
Os ACS relataram diferentes propostas de planejamento para a realização das visitas. Em São Gabriel do Oeste plane- javam-nas diariamente, o que possivelmente se deve à maior disponibilidade de supervisão; já em Rio Verde de Mato Gros- so, o planejamento era feito no início da semana ou do mês. Pôde-se constatar, no entanto, que, embora os ACS atuem de maneiras distintas, a maioria expressou que planeja as visitas domiciliárias. Segundo o Ministério da Saúde, os ACS devem realizar no mínimo oito visitas diárias, o que pode variar de acordo com as necessidades identificadas(15).
Verificou-se que o acúmulo dos dois programas na percep- ção dos ACS de São Gabriel do Oeste não interferiu na pro- dutividade de suas visitas diárias, que foram feitas em número semelhante a Rio Verde de Mato Grosso, onde os ACS execu- tavam exclusivamente visitas pertinentes à ESF.
Indagou-se também se os ACS priorizavam alguns dos vários relatórios que preenchiam. As respostas foram afirmativas, mas revelaram priorizações diferenciadas. Embora os agentes de Rio Verde de Mato Grosso executassem exclusivamente ações da ESF, a Ficha A não foi citada. Ao contrário, os ACS de São Ga- briel do Oeste, que acumulavam dois programas, citaram a Ficha A com percentuais iguais aos da Ficha de Controle da Dengue, o que demonstra serem ambos importantes para esse grupo. A Ficha de Cadastramento das Famílias - Ficha A é um instrumento essencial, pois possibilita ao ACS conhecer as reais condições de vida das famílias residentes em sua área de atuação(17).
Entre os grupos prioritários analisados, não foram identifi- cadas diferenças no acompanhamento das gestantes, com ex- ceção do número de visitas domiciliárias, que, em Rio Verde de Mato Grosso, foram realizadas com maior frequência.
No acompanhamento dos esquemas vacinais houve maior participação das equipes de Rio Verde de Mato Grosso, pois comunicavam aos ACS o nome das crianças não vacinadas, a fim de que fossem visitadas. Esta participação foi pouco relata- da pelos agentes de São Gabriel do Oeste. Como recurso para o acompanhamento da situação vacinal, a grande maioria dos ACS de São Gabriel do Oeste utilizava o cartão-espelho, bem menos empregado em Rio Verde de Mato Grosso, possivelmen- te pelo fato de que os ACS desse município utilizavam também um caderno para registro de dados das crianças e datas das va- cinas. Apesar do acúmulo dos dois programas em São Gabriel do Oeste, não houve prejuízo, segundo a percepção dos ACS, no acompanhamento dos esquemas vacinais, visto que a maio- ria relatou acompanhá-los por meio do cartão-espelho.
Outra atividade analisada foi o monitoramento dos hiper- tensos e diabéticos cadastrados. As Fichas B - Hipertenso e B - Diabético foram utilizadas por mais da metade dos ACS de Rio Verde de Mato Grosso, ao passo que as orientações referentes aos medicamentos prescritos, à dieta e ao controle da pressão arterial e glicemia capilar, foram mais citadas pelos agentes de São Gabriel do Oeste. As orientações a esses pa- cientes são fundamentais para o controle da doença e foram as priorizadas pelos ACS de São Gabriel do Oeste.
Com relação ao Programa de Controle da Dengue, den- tre as atribuições inerentes aos ACS que foram preconizadas desde 2002, por meio da Portaria no 44, está a vistoria dos cômodos das moradias, que deve ser acompanha pelos mora- dores, para a identificação de criadouros de Aedes aegypti e outros mosquitos(3). Essa atividade foi citada pela quase totali- dade dos ACS de São Gabriel do Oeste, o que mais uma vez demonstra que o controle da dengue já estava incorporado a sua rotina de trabalho, contrariamente ao verificado entre os ACS de Rio Verde de Mato Grosso que, apesar de capacita- dos, não faziam vistorias, concentrando-se principalmente no repasse de informações e orientações.
A sobrecarga de trabalho foi mencionada em maior percen- tual pelos ACS de São Gabriel do Oeste, embora consideras- sem as atividades do Programa de Controle da Dengue como de sua responsabilidade. No entanto, destacaram a questão salarial, pois, por acumularem os dois programas, considera- vam-se merecedores de maiores salários.
A sobrecarga é agravada pela falta de clareza na delimi- tação das atribuições dos ACS(18). Na prática, um leque con- siderável de ações junto às famílias e à comunidade lhes é atribuído, o que inclui a identificação de crianças fora da es- cola, a limpeza de caixas d'água para combate ao mosquito da dengue e o recebimento das mais variadas reclamações.
Em experiência realizada no município de Piraí-RJ, a incor- poração das ações de vigilância da dengue pelos ACS também demonstrou sobrecarga de trabalho, justificada pela quantida- de de protocolos de atendimentos pelos quais são responsá- veis, e da vigilância a diversos agravos a saúde. Além disso, referiram dificuldades operacionais devido à falta de articula- ção com outros ACS, com os ACE ou com as coordenações, de maneira a viabilizar modos de operar mais funcionais e homogêneos entre os profissionais(19).
Outro exemplo dessa incorporação foi desenvolvido em São José do Rio Preto-SP, que a considerou viável, capaz de evitar duplicidade das visitas domiciliárias pelos agentes, maior adesão e facilidade no repasse de orientações sobre prevenção aos moradores pelo ACS. A atuação desse profis- sional trouxe novos elementos à discussão sobre o papel do ACE e de sua relação com a população e o serviço de saúde(13).
CONCLUSÃO
A pesquisa evidenciou que a proposta de incorporação das ações do Programa de Controle da Dengue à Estratégia Saúde da Família, com a presença de apenas um agente de saúde, mostrou-se viável em São Gabriel do Oeste e, segundo a per- cepção dos ACS, não trouxe prejuízos a suas atividades.
Foi possível identificar a necessidade de que os gestores municipais realizem adequações locais, para que não ocor- ra sobrecarga de trabalho para os ACS, como a diminuição de suas microáreas, levando em conta as peculiaridades de seus territórios; e de que atividades de maior complexidade, como o uso de bombas intercostais, sejam realizadas por ou- tros profissionais, a fim de não prejudicar o atendimento da população adscrita. Foi identificada também a necessidade de valorização desse profissional, por meio de remuneração pertinente, já que assumem um maior número de atividades em sua rotina de trabalho.
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Luiza Helena de Oliveira CazolaI, Edson Mamoru TamakiI, Elenir Rose Jardim Cury PontesI
I Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, Núcleo de Saúde Coletiva, Programa de Pós-Graduação em Saúde e
Desenvolvimento na Região Centro-Oeste. Campo Grande-MS, Brasil.
Submissão: 12-12-2012 Aprovação: 27-06-2014
AUTOR CORRESPONDENTE Luiza Helena de Oliveira Cazola E-mail: [email protected]
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Copyright Associação Brasileira de Enfermagem Jul/Aug 2014
Abstract
The purpose of this study was to identify self-perceived differences in the work processes of community health agents (CHA) in two counties of Mato Grosso do Sul, regarding dengue control and Family Health Strategy (FHS) activities. Structured interviews were applied to 57 CHA. The subjects had similar sociodemographic characteristics. Agents in Rio Verde de Mato Grosso county, who performed only FHS tasks, failed to complete essential data of the Form A. In Sao Gabriel do Oeste county, CHA currently perform tasks pertaining to dengue fever control, previously conducted by Endemic Disease Control Agents (now abolished), while in Rio Verde de Mato Grosso county, dengue control remained assigned to the latter group. In Sao Gabriel do Oeste county, CHA did not view the double workload of two programs, as affecting their professional productivity. The pooling of tasks from the two programs proved to be feasible, with no detrimental effects on performance.
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