Resumo
A integraçâo da História da Ciencia na abordagem do sistema circulatorio humano em articulaçâo com atividades de reflexäo metacognitiva caracteriza uma intervençâo pedagógica implementada e avaliada com um grupo de 22 alunos, no componente curricular Anatomia Humana de uma Licenciatura em Ciencias Biológicas. A investigaçâo aqui efetuada centra-se na análise do impacto da integraçâo educativa da História da Ciencia na (re)construçâo das concepçöes dos alunos sobre a imagem do cientista. Esta análise processou-se com recurso a utilizaçâo de dois instrumentos de investigaçâo, atividades de aprendizagem e guiäo da entrevista dos grupos focais, sendo que as respostas dos alunos äs questöes contidas nestes instrumentos foram avaliadas através da análise de conteúdo. A comparaçâo entre as concepçöes sustentadas pelos alunos, nos momentos antes de ensino e pós-ensino, em associaçâo com a análise das entrevistas do tipo grupo focal, indicou que a estratégia de intervençâo pedagógica contribuiu globalmente para a (re)construçâo da imagem do cientista.
Palavras-Chave: Abordagem histórica; Sistema circulatório humano; Formaçâo inicial de professores; Ensino de anatomia humana.
Abstract
The integration of the History of Science in the approach of the human circulatory system in articulation with activities of metacognitive reflection characterizes a pedagogical intervention implemented and evaluated with a group of 22 students, in the curricular component Human Anatomy of a Degree in Biological Sciences. The research carried out here focuses on the analysis of the impact from History of Science educational integration on the (re)construction of students' conceptions about scientist' image. This analysis was based on the use of two research tools, learning activities and interview guide of the focus groups, and the students' answers to the questions contained in these instruments were evaluated through content analysis. The comparison between the conceptions supported by the students, in the moments before teaching and post-teaching, in association with the focus group interviews analysis, indicated that the pedagogical intervention strategy contributed globally to the (re)construction of scientist' image.
Keywords: Historical approach; Human circulatory system; Teacher training; Human anatomy teaching.
INTRODUÇÂO
As visöes de ciencia e de cientista perfilhadas pelos cidadâos e as possíveis origens e consequendas dessas representaçöes vem sendo investigadas, em diferentes países, há cerca de meio século. A primeira investigaçâo voltada â descriçâo da imagem dos cientistas sustentada pelos cidadâos foi realizada por Mead e Métraux em 1957, com recurso â análise de uma amostra de alunos estadunidenses do ensino médio (Chambers, 1983; Christidou, 2011). De acordo com os achados de Mead e Métraux (1957), a imagem de cientista adotada por esses alunos é a seguinte:
"O cientista é um homem que usa um jaleco branco e trabalha em um laboratorio. É um homem idoso ou de meia-idade e usa óculos. Ele é pequeño, por vezes pequeño e corpulento, ou alto e magro. Pode ser careca. Pode usar uma barba, pode usar barba por fazer e ser despenteado. [...]. É rodeado por equipamentos: tubos de ensaio, bicos de Bunsen, frascos e garrafas, [...] e máquinas estranhas com mostradores. [...]. Ele passa seus dias fazendo experiencias. Ele despeja produtos químicos de um tubo de ensaio para outro. [...]. Varre os céus através de um telescopio [ou um microscopio!]. Faz experimentos com plantas e animais, cortaos empedaços, injetando soro em animais."(p. 386-387, traduçâo nossa).
Ao analisar o valor simbólico de cada um dos elementos presentes nesse estereotipo, Chambers (1983) fez algumas consideraçöes. Por exemplo, a utilizaçâo de óculos relaciona-se ao cansaço visual em decorrencia da intensa observaçâo; o uso de jaleco vincula-se ao trabalho sujo e, consequentemente, â experimentaçâo e ao conhecimento empírico; a barba por fazer pode representar longas horas de trabalho, portanto, um desvio de um padrâo socialmente estabelecido ou a posse de sabedoria ou conhecimento. A ausencia do perfil feminino, nas representaçöes de cientistas, pode ser considerada outra característica marcante (De Meis et al., 1993; Barca, 2005; Christidou, 2011; Costa & Silva, 2012).
Ainda com relaçâo aos elementos subjacentes a esse estereotipo, De Meis et al. (1993) salientam que a presença de objetos de vidro, como frascos e tubos de ensaio, sugere que os cientistas sâo, em geral, químicos ou bioquímicos. Além disso, considerando-se o estereotipo descrito por Mead e Métraux (1957), pode-se supor que uma visâo de ciencia individualista e elitista encontra-se presente no imaginário dos cidadâos, quando os mesmos caracterizam os cientistas como:
"genios isolados, ignorando-se o papel do trabalho coletivo e cooperativo, dos intercambios entre equipes... Em particular faz-se crer que os resultados obtidos por um só cientista ou equipe podem ser suficientes para verificar, confirmando ou refutando, uma hipótese ou toda uma teoria." (Gil Pérez et al., 2001, p. 133).
Quando os cidadâos consideram a atividade científica como um trabalho reservado a minorías dotadas de um intelecto superior, e representam apenas homens como cientistas, nota-se, também, uma visâo elitista e sexista de ciencia, pois negligencia-se o papel das mulheres no desenvolvimento científico.
Seguindo-se nessa linha - de estabelecimento de pontes entre o estereotipo de cientista e a visâo de ciencia sustentada pelos cidadâos -, considera-se que a predominancia do caráter experimental, em muitas representaçöes da atividade dos cientistas, pode ligar-se ao nâo reconhecimento das elaboraçöes teóricas necessárias â construçâo das hipóteses que irâo orientar todo o processo de construçâo científica. Com base nessas consideraçöes, argumenta-se a favor da presença de outra visâo deformada de ciencia, no imaginário popular, a concepçâo empírico-indutivista ateórica (Kosminsky & Giordan, 2002). Ademais, ao circunscrever o labor dos cientistas â dimensâo experimental, desconsidera-se as ciencias nâo experimentais, aspecto que se prende â valorizaçâo de uma única alternativa para o "fazer científico" - o suposto "método científico" -, composto por um "conjunto de etapas a serem seguidas mecanicamente" (Gil Pérez et al., 2001, p. 130), entre elas, a experimentaçâo.
Essas visöes deformadas sobre os cientistas e o empreendimento científico, incidem sobre vários aspectos da vida em sociedade, inclusive tem um efeito negativo sobre a possibilidade de os jovens optarem por uma carreira de pesquisador (De Meis, et al., 1993; Losh, 2010). Além disso, a percepçâo pública de uma profissâo predominantemente masculina (extremamente competitiva) tem influenciado negativamente a escolha feminina por essa atividade laboral que, em tese, atrapalharia as relaçöes familiares (Losh, 2010; Christidou, 2011).
Pesquisas conduzidas posteriormente ao trabalho de Mead e Métraux (1957) permitem afirmar que essa visâo estereotipada de cientista, compartilhada pelos cidadâos, permaneceu estável ao longo da segunda metade do século XX (McAdam, 1990; Christidou, 2011) e início do século XXI (Christidou, 2011). A literatura aponta que essa imagem de cientista começa a se formar por volta dos oito anos de idade (Chambers, 1983), tornando-se mais clara aos dez anos (De Meis et al., 1993), sendo reforçada nos anos seguintes (Christidou, 2011). Além disso, deve-se destacar que essa visao estereotipada está presente em diversas naçöes, que possuem diferentes culturas (De Meis et al., 1993; Christidou, 2011).
Muitos fatores sao responsáveis por essas visöes estereotipadas de cientista e, consequentemente, deformadas de ciencia, destacando-se a influencia exercida por: (a) diferentes mídias de massa; (b) livros de ficçao voltados âs crianças e adultos; (c) pais e outros adultos; (d) livros didáticos; (e) professores de ciencias.
As mídias de massa contribuem de diferentes formas para a construçao do estereotipo de cientista sustentado pelos cidadaos (Barca, 2005; Gallego-Torres, 2007; Mesquita & Soares, 2008), sendo que os noticiários e os programas de entretenimento, como filmes e telenovelas, exercem papel de destaque nessas construçöes. Os noticiários, por exemplo, sacralizam as opiniöes dos cientistas, fazendo com que as mesmas funcionem como uma espécie de certificado de qualidade do novo saber (Gutiérrez Julián, Gomes Crespo & Martín-Díaz, 2001), reforçando, assim, o estatuto diferenciado da ciencia frente a outras formas de conhecimento. As representaçöes midiáticas também sao referenciais para a percepçao das adolescentes sobre a ciencia e, portanto, imagens majoritariamente masculinas podem gerar um menor interesse das mulheres em galgar uma carreira científica (Reznik et al., 2017).
Entre as mídias de massa, a produçao cinematográfica do século XX teve um grande impacto na construçao de imagens estereotipadas de cientista. Personagens do cinema como os doutores Moreau e Strangelove, dentre outros, contribuíram para o estabelecimento de associaçöes entre os cientistas e o horror, o medo e a invençao de armas de destruiçao em massa, como a bomba atómica. Por outro lado, a figura do cientista atrapalhado, repleto de tiques nervosos e pouco compreendido por seus pares, e alunos, é observada em filmes como Uma mente brilhante1 (Barca, 2005). Essas ilustraçöes contribuíram para a disseminaçao, no imaginário popular, de uma visao individualista e elitista da ciencia, ou seja, essa passou a ser vista como um empreendimento altamente tecnificado, construído por indivíduos isolados do meio social e dotados de um saber especializado, aspectos que garantiriam um suposto poder sobre os demais cidadaos (Gutiérrez Julián, Gomes Crespo & Martín-Díaz, 2001; Germano, 2011). Nas palavras de Germano (2011):
"Aínda hoje quando se fala de Ciencias, a imagem predominante é aquela muito aproximada do mito. Algo muito além do conhecimento do cidadäo comum e que tem grande poder de verdade. Para a maioria das pessoas, o cientista e a Ciencia habitam o mundo das coisas fantásticas e de compreensäo inacessível." (p. 322).
Outra mídia de massa com relevante influencia na construçao do imaginário popular sobre a ciencia e o cientista é a televisao (Kosminsky & Giordan, 2002; Gallego Torres, 2007; Mesquita & Soares, 2008), em decorrencia, principalmente, de sua ampla difusao no mundo ocidental. Considerando-se o público infantojuvenil, o impacto da televisao é ainda maior, pois funciona, para muitas familias, como uma "babá eletrônica", tendo em conta o potencial atrativo, principalmente dos desenhos animados. A imagem dos cientistas representada em alguns desses desenhos remonta a uma caricatura, muitas vezes almejada em funçao do entretenimento, que contribui para a construçao de visöes deformadas de ciencia (Mesquita & Soares, 2008), destacando-se as visöes elitista e individualista, empírico-indutivista e rígida (exata e infalível).
Uma análise das visöes de ciencia ilustradas por cem revistas em quadrinhos (Gallego Torres, 2007) demonstrou resultados similares aos encontrados por Mesquita e Soares (2008), ou seja, a representaçao de imagens, elitista de ciencia, em 91,1% das revistas analisadas, empírico-indutivista, em 64,7% das revistas, e individualistas, em 63,7%. Ainda no campo do texto escrito, McAdam (1990) propós outro elemento que contribui para a visao de ciencia e cientista sustentada pelos cidadaos: a influencia dos livros de ficçao científica. Após a análise de duzentos livros de ficçao científica, direcionados âs crianças e jovens adultos, este investigador concluiu que a imagem dos cientistas, descrita pelas crianças, é similar â encontrada nesse tipo de literatura. Em geral, uma imagem "extravagante" que se aproxima da descrita por Mead e Métraux (1957).
Além do papel exercido pelas mídias de massa e pelos livros de ficçao científica, Losh (2010) sinaliza a influencia dos adultos (pais, outros parentes, vizinhos, profissionais de saúde e pastores), na construçao dos estereotipos de cientistas perfilhados por jovens em formaçao.
Tendo-se em consideraçâo o quadro apresentado, responsabilizar o processo de escolarizaçâo, ou mais específicamente, o ensino de ciencias, pelas visöes de cientista, e de ciencia, sustentadas pelos cidadäos é recair, certamente, em um reducionismo. Apesar disso, nao se pode negligenciar o papel do ensino de ciencias na construçao de tais visöes deformadas (Moreira & Ostermann, 1993; Gil Pérez et al., 2001; Coelho da Silva, 2007).
O ensino de ciencias também reforça a visäo individualista e elitista de ciencia, que imputa a construçao de conhecimentos científicos a genios isolados, inacessíveis, descartando-se, assim, a importancia dos intercambios entre grupos de pesquisadores/cientistas e dos corpos de conhecimentos existentes em período anterior a determinada investigaçâo. No ensino os cientistas säo frequentemente representados/descritos como individuos com capacidades intelectuais acima dos demais, aspecto que promove discriminaçöes de genero, pois, em geral, os cientistas säo retratados como figuras do sexo masculino (Gil Pérez et al., 2001; Coelho da Silva, 2007). Finalmente, o ensino de ciencias transmite uma visäo socialmente neutra da ciencia quando näo concebe a influencia de fatores sociais, políticos, económicos, entre outros, sobre o empreendimento científico. Desta forma, a atividade científica é exposta como um processo alheio â sociedade, "sendo apenas condicionada por fatores de natureza científica ou tecnológica" (Coelho da Silva, 2007, p. 322).
Reconhecendo-se o papel do ensino de ciencias na construçao dessas imagens deformadas do empreendimento científico, deve-se destacar, também, o protagonismo exercido pelos livros didáticos de ciencias na sustentaçao das mesmas (Coelho da Silva, 2007; Vidal & Porto, 2012).
A investigaçâo referente ao conteúdo de História da Ciencia (HC) contido em livros didáticos de Química, conduzida por Vidal e Porto (2012), identificou uma frágil exploraçâo desse conteúdo. Para os investigadores, as ideias presentes nos livros didáticos contribuem para que os alunos construam visöes equivocadas sobre o empreendimento científico, entre elas, a visäo individualista. Coelho da Silva (2007), analisando livros didáticos de Ciencias Naturais e de Biologia e Geologia, constatou a presença de visöes elitistas e descontextualizadas de ciencia, ao identificar que os cientistas foram representados, em geral, como indivíduos do sexo masculino, desconectados dos contextos social e familiar.
As consequencias dessas visöes deformadas de ciencia e cientista, forjadas pelas mídias, livros de fi^äo científica, adultos, ensino de ciencias, entre outros "agentes", comprometem diferentes aspectos da vida em sociedade, como o desenvolvimento científico e económico das naçöes (Germano, 2011), a cidadania responsável (Silva & Leite, 2003; Miller, 2004), a escolha profissional (De Meis et al, 1993; Losh, 2010; Christidou, 2011) e o próprio ensino de ciencias (Kosminsky & Giordan, 2002; Mesquita & Soares, 2008; Costa e Silva, Santana & Arroio, 2012). Segundo Mesquita e Soares (2008), a imagem estereotipada do cientista e da ciencia, propagada pela mídia, pode criar uma barreira capaz de afastar os alunos da disciplina e do professor de ciencias, aspecto que dificultaria as mediaçöes necessárias a construçäo do conhecimento científico.
Considerando-se uma perspectiva mais ampliada do ensino de ciencias, torna-se relevante que o professor intervenha sobre essas visöes deformadas de cientista, e da empreitada científica, no intuito de contribuir para a (re)construçäo das mesmas, tendo em vista o desenvolvimento da criticidade dos educandos diante de questöes que envolvam a ciencia (Costa e Silva, Santana & Arroio, 2012). A problemática exposta torna-se mais delicada na medida em que se reconhece que os professores, e näo apenas os alunos, manifestam essas visöes deformadas em re^äo ao empreendimento científico (Gil Pérez et al., 2001).
Diante do exposto, considera-se que o processo de formaçäo de professores deve contemplar açöes que contribuam para a (re)construçäo das imagens deformadas, de ciencia e cientista, aspecto que dificilmente será alcançado se diversas disciplinas que compöem os currículos dos cursos de Licenciatura näo dirigirem esforços em tal direçäo. Em conformidade com esse último argumento, desenvolveu-se a presente investigaçäo, que vislumbrou a possibilidade do componente curricular Anatomia Humana, de um curso de Licenciatura em Biologia, promover discussöes referentes aos cientistas e ao empreendimento científico e suas múltiplas naturezas. Nesta perspectiva, o objetivo desse estudo foi avaliar o impacto da integ^äo educativa da História da Ciencia na (re)construçäo das concepçöes dos alunos sobre a imagem do cientista. A estrutura seguinte do texto está subdividida em cinco seçöes: (i) História da Ciencia e formaçäo de professores de ciencias (ii) contexto educativo e descr^äo da estratégia de intervençäo pedagógica; (iii) metodologia de investigaçäo; (iv) impacto da intervençäo pedagógica na (re)construçäo das concepçöes dos alunos sobre a imagem do cientista; (v) consideraçöes finais.
HISTÓRIA DA CIENCIA E FORMAÇÂO DE PROFESSORES DE CIENCIAS
O valor atribuido â utilizaçâo da HC, como elemento integrante do ensino de ciencias, pode ser dimensionado por meio da apreciaçâo das reformas/reorganizaçöes curriculares por que passaram diversos países europeus (Duarte, 2004) e os Estados Unidos da América (Matthews, 1994).
Para Gooday et al. (2008, p. 324, traduçâo nossa), "a história da ciencia cultiva formas particularmente importantes de conhecimento e compreensâo sobre a ciencia que nao podem ser obtidas de forma tâo eficaz por quaisquer outros meios". Endossando esse ponto de vista, McComas (2011) destacou que a utilizaçâo da HC auxilia os alunos a compreenderem a relaçâo entre ciencia e sociedade e as conexöes e distinçöes entre ciencia e tecnología, tornando o ensino mais desafiador. Além disso, esse autor considerou que a HC favorece o desenvolvimento do raciocinio e contribui com a formaçâo de professores, auxiliando-os em seus aprendizados sobre a ciencia.
No que tange â inclusâo da HC nos curriculos académicos para a formaçâo docente, Pereira e Amador (2007) afirmam que este processo é necessário, pois possibilitaria aos professores a aquisiçâo de:
"conhecimentos em temas como o reconhecimento e a interpretaçâo de episódios de evoluçâo teórica no decurso da história, tipificando e exemplificando diversas situagóes. Näo esquecendo também a necessidade de contextualizaçâo da informaçâo histórica, chamando a atengäo para os inúmeros aspectos sócioeconómicos, políticos, religiosos, etc. que influenciam a prática científica" (p. 213).
Em sentido complementar, Kokkotas et al. (2008) declararam que a utilizaçâo da HC, no ámbito da formaçâo de professores, pode contribuir para a gradual apropriaçâo dos significados contemporáneos das naturezas do ensino, da aprendizagem e da ciencia. Em especial, os contributos da HC para a (re)construçâo de visöes de professores sobre natureza da ciencia tem sido objeto de substantiva consideraçâo por parte de alguns investigadores (ver Rudge & Howe, 2009; Teixeira, Freire Junior & El-Hani, 2009). Os resultados de uma análise de dissertaçöes e teses brasileiras relacionadas ao ensino de biologia - publicadas entre os anos de 1983 e 2013 -, apontaram que a utilizaçâo da história e filosofia da ciencia (HFC), em propostas de ensino, promoveu uma melhor compreensâo da natureza da ciencia, além de um maior interesse pelo ensino de biologia (Augusto & Basilio, 2018).
Apesar da existencia desse conjunto de argumentos a favor da utilizaçâo da HC no ensino de ciencias e do reconhecimento deste pela comunidade internacional, "há pouca inclusâo da história da ciencia, quer em livros didáticos ou no discurso de sala de aula" (McComas, 2011, p.39, traduçâo nossa), aspecto endossado por vários investigadores (ver Flôr & Cassiani, 2005; Teixeira, Freire Junior & El-Hani, 2009; Zanotello, 2011).
Duarte (2004) afirma que as reformas/reorganizaçöes curriculares nâo tem sentido sem modificaçöes na formaçâo de professores, os quais irâo implementar práticas de ensino de ciencias, associadas a HC. Em seu estudo, a autora apresenta uma série de pesquisas que evidenciaram a lacuna nas formaçöes inicial e continuada de professores portugueses que ensinam ciencias, no que tange â HC. No contexto brasileiro, os autores dos Parámetros Curriculares Nacionais referentes ao ensino fundamental descreveram a importáncia da inserçâo de elementos de HFC no ensino, mas afirmam que tal processo torna-se um desafio para o professor de ciencias, em virtude das limitaçöes de sua formaçâo inicial, desprovida de referencias sobre essas questöes (Flôr & Cassiani, 2005).
"O fato de os cursos de licenciatura em ciencias naturais, na maioria dos casos, näo contemplarem reflexóes de ordem filosófica e epistemológica acerca do empreendimento científico parece ser, um dos mais imponentes obstáculos a utilizaçâo da história da ciencia em sala de aula pelo professor. Desprovido muitas vezes de um conhecimento mais amplo sobre essas discussóes, o professor acaba deixado a merce de suas próprias vivencias e interpretaç0es, que poderäo servir como base para a atuaçâo em sala de aula. " (Flôr & Cassiani, 2005, p. 3).
Tais problemáticas aliam-se, também, aos argumentos propostos por Monk e Osborne (1997) para o fracasso da inclusâo de HFC, no ensino de ciencias. Para esses investigadores há uma excessiva preocupaçâo dos professores com a aprendizagem dos conteúdos científicos e com a consequente administraçâo da sala de aula, para atingir esse fim; elementos que podem estar associados, entre outras questöes, â limitaçöes na formaçâo inicial dos professores.
Assim, como elucidado por Duarte (2004), as dificuldades para a inclusâo da HC no ensino de ciencias só poderao ser superadas mediante uma formaçâo docente direcionada a tal perspectiva. Na mesma direçâo, a revisâo de literatura realizada por Augusto e Basilio (2018), citada anteriormente, evidencia que "um ponto comum â maioria dos trabalhos é a proposiçâo de disciplinas que abordem a História e a Filosofia da Biologia nas Licenciaturas para a melhoria da formaçâo de professores" (p. 82).
As Diretrizes Curriculares Nacionais para os Cursos de Ciencias Biológicas2 apontam que os biólogos, bacharéis ou licenciados, deverâo adquirir em sua formaçâo inicial a seguinte, entre várias competencias: "entender o processo histórico de produçâo do conhecimento das ciencias biológicas referente a conceitos/princípios/teorias" (Brasil, 2001, p. 4).
Segundo Matthews (1994), professores de ciencias comprometidos com a utilizaçâo da HC poderiam contribuir para um ensino de melhor qualidade, dentro de uma perspectiva humanística, critica, desafiadora e coerente com o desenvolvimento da ciencia. No ámbito da formaçâo de professores de química, Fernández, Quintanilla e Blancafort (2010, p. 282, traduçâo nossa) completam tal perspectiva ao fazerem as seguintes consideraçöes:
"é essencial reconhecer o papel do professor como mediador entre a evoluçâo histórica do conhecimento científico e o conhecimento científico escolar, razäo pela qual, se reconhece que o ensino das ciencias e a formaçâo docente tem que considerar uma ressignificaçâo das bases que as sustentam, para assim tratar de formular novas propostas, como a inclusäo da História da Ciencia na formaçâo de professores, que visa permitir uma maior participaçâo do docente de química na construçâo de seu conhecimento profissional e científico. "
Além de todos esses aspectos, considera-se que os professores de ciencias deveriam possuir um conhecimento amplo sobre a disciplina que ministram e a riqueza da HC poderia contribuir com a construçâo desse arcabouço teórico, mesmo que todo esse repertório nâo seja explorado, diretamente, no ambiente da sala de aula (Matthews, 1994). Segundo Zanotello (2011, p. 989):
"näo parece concebível que um bom professor de ciencias näo possua conhecimentos sólidos em relaçâo a sua disciplina no que tange a terminologia por ela utilizada, aos seus objetivos por vezes confutantes e ao seu caráter cultural e histórico. "
Por outro lado, nâo devemos esperar que os futuros professores de ciencias se tornem historiadores, filósofos ou sociólogos da ciencia, portanto, deve-se planejar objetivos modestos ao ensinar conteúdos científicos, com recurso a HC (Matthews, 1998). Nesta direçâo, julga-se pertinente enfatizar a licença que os professores de ciencias devem ter para desvencilharem-se dos detalhes da HC, quando tais minúcias prejudicarem objetivos de aprendizagem mais relevantes (Rudge & Howe, 2009).
CONTEXTO EDUCATIVO E DESCRIÇAO DA ESTRATEGIA DE INTERVENÇAO PEDAGOGICA
A estratégia de intervençâo pedagógica caracteriza-se sumariamente pela implementaçâo de atividades de aprendizagem focalizadas na exploraçâo da HC em articulaçâo com atividades de aprendizagem centradas na reflexâo metacognitiva sobre o processo de aprendizagem. Esta intervençâo foi explorada num cenário educativo de cariz dialógico e cooperativo em que se potencializou o papel das interaçöes alunos-alunos e alunos-professor na (re)construçâo dos saberes, seguindo uma perspectiva de cunho socioconstrutivista (Bächtold, 2013).
A intervençâo pedagógica foi desenvolvida no ámbito do componente curricular Anatomia Humana, que compöe o elenco de componentes curriculares obrigatórios do segundo semestre de um curso de Licenciatura em Ciencias Biológicas. Focalizou-se na temática sistema circulatório humano, tendo em vista que a compreensâo da circulaçâo do sangue é considerada uma revoluçâo científica no ámbito da História da Biologia (Agutter & Wheatley, 2008). Neste sentido, julgou-se relevante que os 22 licenciandos em Biologia, futuros professores, compreendessem esse episódio fundamental da ciencia que ensinarâo. Além disto, o sistema circulatório humano é um conteúdo central no currículo escolar de biologia (Alkhawaldeh, 2007).
O Quadro 1 apresenta a estrutura global da intervençâo pedagógica, evidenciando os tipos de atividades de aprendizagem implementadas - atividades de História da Ciencia (At-HC), atividades de reflexäo e atividade de síntese - e algumas características que Ihes conferem identidade. Neste quadro está indicado os tipos de fontes de informaçâo mobilizadas, sendo esta uma característica que diferencia as atividades de História da Ciencia. Pode-se observar, também, os cientistas cujas as ideias foram abordadas na intervençâo pedagógica. No Quadro 1 ainda estäo referidos os conteúdos científicos trabalhados, o modo de resoluçâo adotado e o número de aulas dedicado a cada uma das atividades de aprendizagem.
As atividades de HC foram mobilizadas com a finalidade de contribuir para que os alunos (re)construíssem conhecimentos científicos, associados â morfofunçâo do sistema circulatório humano, e conhecimentos epistemológicos, relacionados âs dimensöes da natureza da ciencia consideradas (imagem do cientista, contexto da atividade científica, processo de criaçâo científica e evoluçâo do conhecimento científico).
As atividades de reflexäo, de cariz metacognitivo, pretenderam auxiliar os alunos na tomada de consciencia acerca de seus conhecimentos, científicos e epistemológicos, em tres momentos: antes, durante e após o ensino. Com relaçâo ao momento durante o ensino, a título de exemplo, seguem algumas questöes que compuseram as atividades de reflexäo e que tiveram como foco o trabalho sobre a imagem do cientista: (a) explique o modo como este texto contribuiu para a (re)construçâo da imagem acerca de quem sao os cidadáos (cientistas) envolvidos na criaçâo/investigaçâo científica; (b) indique as vantagens para a sua aprendizagem da exploraçao deste tipo de texto, focalizado na vida e obra dos cientistas.
A atividade de síntese teve o propósito de contribuir para a sistematizaçao dos referidos conhecimentos, construidos ao longo da estrategia de intervençao pedagógica.
Efetua-se, agora, uma descriçao mais pormenorizada das atividades de HC, considerando-se, especificamente, os elementos que caracterizam a imagem do cientista veiculada na estrategia de intervençao pedagógica. Destaca-se que a intervençao foi composta por sete atividades de HC (At-HC), numeradas de acordo com a ordem de implementaçao e intituladas da seguinte forma:
1. Interpretaçao de fragmentos da História da Ciencia sobre arterias, veias e produçao de sangue (At-HC1);
2. Interpretaçao de fragmentos da História da Ciencia: coraçao e pequena circulaçao (At-HC2);
3. Interpretaçao de um texto autentico de William Harvey (At-HC3);
4. Reconstruçao de um experimento histórico de William Harvey (At-HC4);
5. Interpretaçao de um artigo científico sobre a vida e obra de Giulio Bizzozero (At-HC5);
6. Interpretaçao de um artigo científico sobre a Derivaçao Blalock-Taussig (At-HC6);
7. Interpretaçao de um texto de divulgaçao científica sobre a biografia de Charles Richard Drew (At-HC7).
A imagem de cientista trabalhada nas atividades de HC foi caracterizada pelos atributos que identificam o cientista como individuo e que o situam num contexto familiar (ver Quadro 2).
Nas atividades de HC foram considerados cientistas de origem diversificada (brancos e negros) e de ambos os sexos (masculino e feminino). O cientista foi retratado, também, como um individuo que possui um contexto familiar, tal como o cidadäo dito comum, que sofre as influencias desse contexto e que vivencia situaçöes de maior ou menor felicidade, próprias do percurso de vida de qualquer pessoa. Pretendeu-se com esta abordagem promover a reconstruçâo de visöes estereotipadas de cientista, como a de um individuo branco, do sexo masculino e desprovido de um meio familiar (Finson, Beaver & Cramond, 1995; Zanon & Machado, 2013). O desequilibrio entre o número de cientistas brancos e negros, de cientistas homens e mulheres prendeu-se a dificuldade de encontrar na literatura contributos de cientistas mulheres e de cientistas negros, no ámbito da temática sistema circulatório humano. Esta dificuldade pode estar relacionada com a limitada participaçâo de negros e mulheres na construçâo de conhecimentos científicos sobre a temática em questäo e na atividade científica das épocas contempladas pelo presente estudo.
O contexto familiar dos cientistas foi evidenciado na: (a) descriçâo das atividades laborais desenvolvidas pelos parentes mais próximos, como, por exemplo, os progenitores (pai e/ou mäe) e/ou os irmäos, como nos casos de Galeno e Giulio Bizzozero; (b) expos^äo da situaçäo económica das familias, como a vivenciada por Charles Drew; (c) referencia ao envolvimento de familiares em atividades políticas, aspecto patente no caso de Giulio Bizzozero. Os excertos das atividades de aprendizagem, aqui grifados, ilustram estes aspectos:
"Galeno (...) nasceu em Pérgamo, que hoje faz parte da Turquía, mas que na época se situava nos limites do Império Romano. O pai [Nico de Pérgamo] foi um arquiteto próspero que se dedicou ao filho dotado, proporcionando-lhe uma educagäo estével (em grego), que incluiu a filosofia e a matemática. Quem sabe o que teria acontecido se o pai näo houvesse perseguido um sonho täo poderoso, ao dizer ao filho que ele tinha de ser médico?" (At-HC1).
"Giulio Bizzozero (1846-1901), filho de Felice Bizzozero, um industrial de pequeno porte, e de Carolina Veratti, nasceu em Varese, näo muito longe de Miläo, em uma família de classe média que estava profundamente envolvida no Risorgimento - atividades sociais e políticas voltadas a libertaçâo da Itália do dominio austríaco. Em 1859, enquanto seu irmäo mais velho Cesare lutava contra a Austria, sua mäe se ofereceu como enfermera no Hospital de Varese, que estava cheio de pacientes feridos da guerra" (At-HC5).
"Nascido no gueto, em Washington D.C., Charles R. Drew[1904-1950] era o mais velho de uma família de cinco filhos. O seu pai era estofador e a sua mäe professora. A precaria situaçâo económica da família pressionou Drew, que tinha, entäo, doze anos, a ajudar os pais vendendo jornais" (At-HC7)
Os episódios/aspectos particulares da vida dos cientistas estâo evidenciados na: (a) descriçâo dos problemas de saúde enfrentados, como na situaçâo vivenciada por Erasístrato; (b) referencia a aspectos religiosos, como no caso de Galeno; (c) alusâo a atividades laborais executadas durante o período infantojuvenil, questâo presente na vida de Vivien Thomas; (d) consideraçâo a atividade esportiva desempenhada por Charles Drew. Os seguintes excertos das atividades de aprendizagem, aqui grifados, ilustram estes pontos:
"De acordo com a tradiçâo biográfica, quando Erasístrato diagnosticou sua própria doença como um cáncer incurável, ele cometeu suicidio em vez de sofrer declínio inexorável" (At-HC1).
"Galeno näo era cristăo, mas acreditava num só deus, e foi muito fácil para os primeiros comentadores cristäos incluí-lo na comunidade crista" (At-HC2).
"No outono de 1929, Thomas, que aspirava uma carreira médica, tinha se inscrito no Tennessee State College, que era entäo limitado a estudantes afro-americanos. No entanto, o dinheiro que tinha guardado, enquanto trabalhava como carpinteiro durante seus anos de colegio, foi perdido quando o banco com o qual operava faliu naquele mesmo ano" (At-HC6).
"Nesse mesmo ano, [Drew] ingressou no Amherst College, onde se destacou notavelmente no futebol americano. Ele se tornou a estrela de sua equipe e lhe entregaram o troféu Howard Hill Mossman, que recompensa os esforços daqueles que obtiveram os melhores resultados no atletismo, de todo o centro" (At-HC7).
O Quadro 3 complementa a imagem de cientista trabalhada na intervençâo pedagógica, com a enumeraçâo de outras atividades realizadas pelos cientistas para além do ámbito da investigaçâo científica.
A intervençao pedagógica veiculou uma imagem da atividade dos cientistas que se caracteriza pela pluralidade de açöes. Mostra uma atividade que nao está restrita â investigaçao científica mas que abarca labores de outra natureza. Sao salientadas as atividades de disseminaçâo do conhecimento e de participaçao social e política. A atividade de disseminaçao do conhecimento tornou-se patente na referencia ao papel de professor assumido pelos cientistas enumerados, sendo salientadas as áreas de Anatomia, Histologia, Patologia e Cirurgia. Neste ámbito, destaca-se a referencia ao papel do cientista italiano Fabricius na inovaçao do ensino da Anatomia, mediante a criaçao de um espaço próprio para a realizaçao de dissecaçöes, aspectos grifados no seguinte excerto da primeira atividade de História da Ciencia (At-HC1):
"Os anatomistas de Pádua influenciaram fortemente a revitalizaçao da anatomia, tomando dos autores clássicos o que tinha sido doutrina e usando suas próprias observaçoes de dissecaçâo para fundar o estudo da anatomia moderna. (...) Em 1594 ele [Fabricius] construiu o primeiro teatro permanente já projetado para dissecgőes anatómicas públicas, revolucionando, assim, o ensino de anatomia."
A disseminaçao científica esteve presente, também, na referencia a publicaçao de livros, de relatórios, de artigos científicos e de artigos na imprensa escrita. A publicaçao dos livros De re anatomia, de Colombo, e Exercitatio Anatomica De Motu Cordis et Sanguinis in Animabulis, de William Harvey foram ressaltadas na segunda e terceira atividades de HC, respectivamente.
A participaçao dos cientistas em intervençöes de caráter social e/ou político foi considerada na abordagem dos cientistas Giulio Bizzozero (séc. XIX) e Charles Drew (séc. XX). Sublinha-se o papel exercido por Giulio Bizzozero na promoçao da saúde pública, por intermédio da publicaçao de artigos na imprensa escrita, da participaçao em comissöes de saúde pública, e da promoçao de uma visao positiva de ciencia, sensibilizando a sociedade para os seus benefícios:
"Através de seus artigos na imprensa popular, ele [Giulio Bizzozero] tornou-se um defensor preeminente de medidas sociais e políticas contra a propagaçao de doenças infecciosas, e um promotor ativo do entendimento público dos beneficios da ciencia. Por sua competencia, ele foi eleito presidente de um número de sociedades médicas e membro de várias comissőes de saúde pública. Em 1890, ele foi nomeado Senador - membro do parlamento italiano." (At-HC5)
A intervençâo pedagógica pretendeu, desta forma, contribuir para a reconstruçâo de imagens que dissociam a investigaçâo científica da disseminaçâo do conhecimento científico construido e que apontam o cientista como um individuo isolado de um contexto familiar e social, desconectado do mundo real e encerrado em um laboratório, em dedicaçâo exclusiva â atividade que lhe permitirá efetuar as descobertas científicas.
METODOLOGIA DE INVESTIGAÇAO
A avaliaçâo do impacto da integraçâo educativa da HC na (re)construçâo das concepçöes dos alunos sobre a imagem do cientista processou-se com recurso a utilizaçâo de dois instrumentos de investigaçâo: (a) atividades de aprendizagem e (b) guiâo da entrevista dos grupos focais.
As atividades de aprendizagem foram constituidas por questöes que serviram a dois propósitos, contribuir com as aprendizagens dos alunos e corporificar um dos instrumentos de investigaçâo da pesquisa, estrategia comumente utilizada em pesquisas na área de ensino de ciencias, em ámbito universitário (ver Oki & Moradillo, 2008; Almeida & Sorpreso, 2010; Zanotello, 2011). As questöes das atividades de aprendizagem, utilizadas com finalidade investigativa, podem ser classificadas em dois tipos, de acordo com a forma (Marconi & Lakatos, 2007): (a) abertas, pois permitiram que os alunos as respondessem de forma livre, utilizando linguagem própria, por meio de produçöes textuais; (b) combinadas, uma vez que conjugaram questöes fechadas do tipo múltipla escolha, com questöes abertas. O processo de elaboraçâo das questöes contidas nas atividades de aprendizagem foi composto pelas seguintes etapas: (1) elaboraçâo da primeira versâo das questöes pelo professor-investigador, que implementou a intervençâo pedagógica; (2) sujeiçâo desta primeira versâo a um especialista da área de ensino de ciencias; (3) revisâo/reelaboraçâo das questöes; (4) sujeiçâo da segunda versâo ao especialista da área de ensino de ciencias e (5) redaçâo final das questöes, de acordo com as consideraçöes/sugestöes finais.
O guiâo da entrevista dos grupos focais, outro instrumento de investigaçâo, foi empregado nas entrevistas do tipo grupo focal. Pode-se definir esse tipo de entrevista como uma técnica de pesquisa utilizada para recolher dados, por intermedio da interaçâo de um grupo em torno de um tópico determinado pelo investigador, coordenador ou moderador do grupo (Morgan, 1996). Segundo Gondim (2002, p. 301): "O foco de análise sâo as opiniöes surgidas a partir do jogo de influencias mútuas que emergem e se desenvolvem no contexto dos grupos humanos". A opçâo por esta técnica de entrevista prendeu-se â intençâo de recolher as opiniöes dos alunos sobre alguns aspectos relacionados â implementaçâo da intervençâo pedagógica focalizada na temática sistema circulatório humano. O processo de elaboraçâo das questöes do guiâo da entrevista dos grupos focais seguiu as mesmas cinco etapas empregadas na formulaçâo das questöes das atividades de aprendizagem.
Quanto â composiçâo, os grupos focais foram constituidos por cinco alunos devido â intençâo de alocar, em todas as entrevistas, membros de cada um dos cinco grupos de trabalho estabelecidos na intervençâo pedagógica. Tal medida pretendeu enriquecer as entrevistas por meio da partilha de experiencias e impressöes provenientes das situaçöes vivenciadas em cada grupo de trabalho. Na totalidade foram conduzidas tres entrevistas do tipo grupo focal, com duraçâo média de 90 minutos. A realizaçâo das tres entrevistas seguiu o principio da saturaçâo dos dados (Morgan, 1997), ou seja, o pesquisador percebeu, durante a realizaçâo da terceira entrevista, que as informaçöes recolhidas começaram a se repetir, sendo desnecessário prosseguir com outras entrevistas. Deve-se mencionar que a flexibilidade desta técnica de entrevista (ver Trad, 2009) possibilitou a inserçâo de outras questöes, além das previstas no guiâo da entrevista dos grupos focais, de acordo com o andamento de cada grupo focal. Outro registro relevante, atrelado â flexibilidade desta técnica de entrevista, refere-se ao direcionamento dado pelos alunos âs respostas das questöes do guiâo da entrevista dos grupos focais. Em outras palavras, algumas perguntas do guiâo suscitaram, em meio â partilha de ideias, a exposiçâo de posicionamentos associados a outros tópicos/questöes da entrevista. Considera-se significativo afirmar que os áudios das entrevistas dos grupos focais foram gravados e transcritos, na integra, pelo próprio professor-investigador.
O Quadro 4 mostra a relaçâo entre esses dois instrumentos de investigaçâo, as questöes que os constituem, e as informaçöes a obter.
As concepçöes dos alunos sobre a imagem do cientista, no momento antes de ensino, foram analisadas - análise de conteúdo, aos moldes de Bardin (2009) - por meio das questöes 4 e 10 da atividade As minhas ideias iniciais sobre morfofungăo do sistema circulatório humano e natureza da ciencia, destacadas no Quadro 4. A questâo quatro, baseada no trabalho de Domingues (2006), solicitou aos alunos que indicassem, entre várias imagens (ver figura 1), aquelas que eles consideravam corresponder á figura de um cientista; em seguida, os alunos deveriam justificar a(s) sua(s) escolha(s). Esta questâo prende-se ao parámetro intitulado caracterizagăo iconográfica dos dentistas, já que por meio da iconografia problematizouse o tema imagem do cientista.
A questâo 10 requisitou a caracterizaçâo/descriçâo do periodo de uma semana da vida de um cientista e associa-se, por outro lado, ao parámetro intitulado caracterizagăo da atividade do cientista. A utilizaçâo dessa questâo objetivou identificar a imagem que os alunos tem da atividade do cientista, isto é, se ela assenta apenas numa única atividade que é a atividade de investigaçâo ou se contempla outras atividades como, por exemplo, a de ensino e se ainda conjuga atividades de caráter social e familiar. A análise de conteúdo das respostas dos alunos a essas questöes fundamentou-se em dois conjuntos de atributos de cientistas, o primeiro geralmente associado a perspectivas de orientaçâo positivista e o segundo geralmente associado a perspectivas de orientaçâo pós-positivista (Coelho da Silva, 2007, p. 82):
* Atributos geralmente associados a uma perspectiva de orientaçao positivista. O cientista é visto como um ser "bizarro", que vive â margem do mundo real, isto é, descontextualizado de um meio familiar, cultural, económico e político. É um individuo intelectualmente superior. É um genio, um sábio. Procura, constantemente, o novo e o insólito em permanentes trabalhos de invençâo. É um obstinado coletor de fatos. É um individuo do sexo masculino, de raça branca e ocidental, geralmente integrado num laboratório.
* Atributos geralmente associados a uma perspectiva de orientaçao pós-positivista. O cientista é visto como um cidadâo comum, emocionalmente integrado no mundo real, influenciado nas suas decisöes científicas por convicçöes e ideologias pessoais. É um individuo tanto do sexo masculino como do sexo feminino e de qualquer raça.
Após a análise de conteúdo, as respostas dos alunos foram integradas a uma das seguintes categorias de análise:
* Imagem acerca dos cientistas usualmente associada a perspectiva de cariz pós-positivista. Esta categoria incluiu as respostas que integraram atributos de cientistas que permitiram associá-las a perspectivas de cariz pós-positivista;
* Imagem acerca dos cientistas usualmente associada a perspectiva de cariz positivista. Esta categoria incluiu as respostas que integraram atributos de cientistas que permitiram associá-las a perspectivas de cariz positivista;
* Ausencia de resposta. Esta categoria incluí as questöes nao respondidas.
Com o objetivo de validaçao dos dados, a seguinte sequencia de quatro passos foi aplicada durante a análise de conteúdo referente a imagem do cientista:
1. Primeira categorizaçao das respostas dos alunos, de acordo com as categorias mencionadas.
2. Segunda categorizaçao das respostas dos alunos, comparaçao com a primeira categorizaçao efetuada e definiçao de uma nova categorizaçao (terceira categorizaçao).
3. Apreciaçao da terceira categorizaçao por um especialista da área de ensino de ciencias e definiçao de uma nova categorizaçao (quarta categorizaçao) das respostas dos alunos, após consenso entre as opiniöes do especialista e do investigador.
4. Sujeiçao desta quarta categorizaçao a um segundo especialista da área de ensino de ciencias e definiçao da quinta, e última, categorizaçao.
As concepçöes dos alunos sobre a imagem do cientista, no momento pós-ensino, foram analisadas por meio das respostas dos alunos a uma questao da atividade de aprendizagem As minhas ideias sobre morfofunçâo do sistema circulatório humano e Natureza da Ciencia, ao final da intervençâo pedagógica (Reflexao), indicada no Quadro 4. Em termos específicos, esta questao reflexiva foi elaborada com a finalidade de avaliar a análise que os alunos fizeram de suas concepçöes sobre a imagem de cientista, no momento antes de ensino, e a capacidade dos mesmos de identificar atributos de suas respostas que deveriam ser alterados para alinhá-las a uma concepçao pós-positivista de ciencia, no momento pós-ensino. A análise das respostas dos alunos a essa questao reflexiva seguiu a sequencia de quatro passos descrita acima e os mesmos conjuntos de atributos utilizados para avaliar as respostas äs questöes da atividade de aprendizagem As minhas ideias iniciais sobre morfofunçâo do sistema circulatório humano e Natureza da Ciencia (Reflexao).
As análises qualitativas referentes as respostas dos alunos as questöes das atividades de aprendizagem foram suplementadas por uma análise do tipo quantitativa, por meio da qual se determinou a frequencia de respostas pertencentes a cada uma das categorias consideradas. Este procedimento quantitativo possibilitou a comparaçao das frequencias de respostas dos alunos incluidas em cada uma das categorias de análise.
O impacto da integraçao educativa da HC na (re)construçao das concepçöes dos alunos sobre a imagem do cientista fundamentou-se na comparaçao entre as concepçöes sustentadas nos momentos antes de ensino e pós-ensino. Essa análise possibilitou a identificaçâo do processo de desenvolvimento das ideias dos alunos, classificado de acordo com as seguintes categorias:
* Progressao. Nesta categoria de análise foram incluidos os alunos que manifestavam, no momento antes de ensino, uma imagem acerca dos cientistas usualmente associada a perspectiva de cariz positivista e que passaram a manifestar, no momento pós-ensino, uma imagem acerca dos cientistas usualmente associada a perspectiva de cariz pós-positivista.
* Mesma posiçâo. Nesta categoria de análise foram incluídos os alunos que manifestaram, no momento pós-ensino, a mesma categoria apresentada no momento antes de ensino.
* Regressäo. Nesta categoria de análise foram incluídos os alunos que manifestavam, no momento pós-ensino, uma imagem acerca dos cientistas usualmente associada a perspectiva de cariz positivista, embora tivessem manifestado, no momento antes de ensino, uma imagem acerca dos cientistas usualmente associada a perspectiva de cariz pós-positivista.
* Processo indefinido. Nesta categoria de análise foram incluídos os alunos que situavam-se, no momento antes de ensino, na categoria ausencia de resposta, e que passaram a manifestar, no momento pós-ensino, imagens acerca dos cientistas usualmente associadas a perspectivas de cariz positivista ou pós-positivista. A ausencia de respostas, em relaçâo ao momento antes de ensino, nao permitiu afirmar que estes alunos passaram por processos de progressäo, regressäo, ou que mantiveram a mesma posiçao.
O desenvolvimento das ideias dos alunos no sentido da progressao foi considerado um indicativo de que a integraçao educativa da HC contribuiu para a (re)construçao das concepçöes dos alunos sobre a imagem do cientista.
Como pode ser observado no Quadro 4, a avaliaçao do impacto da integraçao educativa da HC na (re)construçao das concepçöes dos alunos sobre a imagem do cientista prendeu-se, ainda, â análise de quatro questöes do guiäo da entrevista dos grupos focais. Estas questöes possibilitaram analisar as percepçöes dos alunos sobre o papel da intervençao pedagógica na aprendizagem relacionada â imagem do cientista. O conteúdo das respostas dos alunos foi analisado de forma qualitativa, com o intuito de identificar fragmentos dos discursos dos entrevistados capazes de indicar contributos da intervençao pedagógica para a (re)construçao da imagem do cientista.
IMPACTO DA INTERVENÇAO PEDAGOGICA NA (RE)CONSTRUÇAO DAS CONCEPÇOES DOS ALUNOS SOBRE A IMAGEM DO CIENTISTA
Os dados referentes âs concepçöes dos alunos sobre a imagem do cientista, nos momentos antes de ensino e pós-ensino, foram recolhidos a partir das respostas a questöes destacadas no Quadro 4.
O Quadro 5 mostra as imagens adotadas pelos alunos acerca dos cientistas, nos momentos antes de ensino e pós-ensino, de acordo com o parámetro caracterizagäo iconográfica dos cientistas.
Em caráter ilustrativo, seguem duas respostas associadas a perspectiva de cariz pós-positivista, apresentadas por alunos que assinalaram todas as imagens (ver figura 1) ilustrativas dos cientistas:
"As figuras acima näo trazem informaçoes suficientes para se considerar os personagens cientistas, ou näo, pois näo acredito que um cientista se defina através de características externas, nem de estereótipos e sim de conhecimento. Dessa forma, todos os personagens podem ser cientistas, ou nenhum deles. " (aluno A7)
"Todo e qualquer ser humano possui capacidade de tornar-se um cientista, independentemente da cor, raça ou credo, somo idénticos geneticamente, as capacidades intelectuais podem ser trabalhadas, desde a infancia, desta forma qualquer um possui este caminho a sua disposiçâo, basta querer lutar e encarar os desafios que será preciso superar para chegar neste objetivo. " (aluno A21)
A resposta do aluno A7 explicita que um cientista näo pode ser identificado por meio de características externas - provavelmente ela se refere ao sexo e â cor de pele - e estereótipos, como um indivíduo vestido de jaleco (elemento näo explicitado pelo aluno). Por sua vez, o aluno A21 indica, explícitamente, que todo ser humano pode ser um cientista, aspecto que independe de características externas, como a raça. Em sua resposta, este aluno distancia-se das discriminaçöes de genero e raça que despontam na construçao social referente aos estereótipos de cientistas e â empreitada científica, de acordo com uma série de estudos elencados por Reznik et al. (2017).
Por outro lado, a maioria dos alunos perfilhou imagens usualmente associadas a perspectiva de cariz positivista, quer dizer, indicaram, no momento antes de ensino, imagens de cientista que evidenciam estereotipos, como as manifestadas nas respostas abaixo:
[Marcou apenas a letra B] "Pelo traje que parece ser comum entre cientistas e pesquisadores" (aluno A15).
[Marcou apenas a letra B] "Os cientistas geralmente, ou talvez sempre, estaräo usando roupas próprias para laboratório, jalecos, por exemplo" (aluno A17)
Os alunos A15 e A17 assinalaram apenas a letra B (ver figura 1) da referida questao. Esta letra corresponde a um individuo mais velho, de jaleco, óculos e com um tubo de ensaio nas maos, ou seja, elementos que compöem o clássico estereótipo de um cientista integrado em um laboratório, descrito de forma pormenorizada por Mead e Métraux (1957). Esta imagem do cientista como individuo geralmente integrado em um laboratório associa-se á perspectiva (de cariz positivista) de que o agir do cientista é, eminentemente, experimental, e, portanto, pode-se supor, com base nas consideraçöes de Kosminsky e Giordan (2002), que esses alunos, provavelmente, desconsideram as elaboraçöes teóricas e as ciéncias nao experimentais. A referida imagem também foi identificada no estudo de McDuffie (2001), realizado com professores em formaçao e em exercicio.
Utilizando o instrumento de investigaçao Draw a Scientist Test (Chambers, 1983), ou versöes do mesmo, alguns investigadores como Rosenthal (1993), McDuffie (2001) e Miele (2014) também encontraram um percentual significativo de imagens de cientista que evidenciam visöes estereotipadas, em grupos de alunos universitários.
Retornando ao Quadro 5, pode-se observar que as respostas de cinco alunos também prendem-se a imagens de cientista que evidenciam estereótipo, embora, nestes casos, ao estereótipo de um individuo intelectualmente superior. Abaixo sao apresentados exemplos ilustrativos de respostas dos alunos que se associam a este estereótipo, relacionado a perspectiva de cariz positivista:
[Marcou apenas a letra B] "Analisei pelo óbvio, que as vezes näo é täo claro assim, um senhor de óculos, bem vestido e aparentemente cheio de conhecimentos, fazendo uma comparagäo com as outras figuras, mas cientista é aquele que realmente se entrega ao projeto" (aluno A12).
[Marcou apenas as letras B, D e G] "Sao pessoas que estäo em contato com o conhecimento através de livros, laboratorios, internet, aguçando seus conhecimentos fazendo experimentos" (aluno A17).
Embora o aluno A12 afirme que cientista "é aquele que realmente se entrega ao projeto", no aparente intuito de fornecer uma caracterizaçâo geral para os cientistas, ele também afirma, inicialmente, que o indivíduo representado pela letra B é "aparentemente cheio de conhecimentos". Portanto, esse aluno também considerou que os cientistas sao individuos intelectualmente superiores. A justificativa apresentada pelo aluno A17, por ter marcado as letras B, D e G, possibilitou inferir que o mesmo considerou os cientistas como individuos intelectualmente superiores e geralmente integrados em um laboratorio, fazendo experimentos. As expressöes "contato com o conhecimento" e "aguçando seus conhecimentos", utilizadas pelo aluno A17, em referencia ao trabalho dos cientistas, transmitem uma ideia de que o trabalho científico é reservado a minorías dotadas de inteligencia diferenciada. Nesse sentido, as respostas desses dois alunos prenderam-se, em certa medida, a uma visao elitista de ciencia - construida por genios -, caracterizada por Gil Pérez, et al. (2001) e identificada por McDuffie (2001) em uma investigaçao com professores em formaçao. As características de cientista maluco e com inteligencia acima da média foram os principais atributos relacionados â imagem do cientista, em um recente estudo conduzido por Reznik et al. (2017), com adolescentes do segundo ano do ensino médio.
Diferentes autores destacam o papel da linguagem cinematográfica, dos desenhos animados e da midia na formaçao de estereotipos dos cientistas (McDuffie, 2001; Barca, 2005; Mesquita & Soares, 2008). O aluno A10 torna patente, na justificativa apresentada para a marcaçao das letras B e E, a influencia que sofreu dessas industrias:
"É comum vermos em filmes e até em desenhos a figura do cientista como um senhor de idade, jaleco, com canetas no bolso, cabelo arrepiado e cercado de tubos de ensaio" (aluno A10).
Finalmente, a análise do Quadro 5 revela que a maioria dos alunos sustentou uma imagem usualmente associada a perspectiva de cariz pós-positivista, no momento pós-ensino, ou seja, uma imagem de cientista que nao evidencia estereotipo. O estudo conduzido por Miele (2014), em uma disciplina de métodos de ensino de ciencia para a educaçao fundamental, também evidenciou substantivas modificaçöes nas imagens do cientista representadas pelos alunos participantes da investigaçao. Segundo a autora, a reduçao de imagens estereotipadas dos cientistas ocorreu em funçao de um trabalho focalizado em discussöes sobre os estereotipos de cientistas, identificados em desenhos realizados pelos próprios alunos. Neste trabalho, os alunos tiveram que analisar os seus desenhos, com base em critérios definidos pelo professor, aspecto que permitiu a posterior construçao colaborativa de um gráfico, que representou a imagem de cientista da turma inteira. A análise deste gráfico possibilitou a realizaçao de debates sobre os estereotipos identificados.
No que tange a presente investigaçao, considera-se que o conjunto das atividades de aprendizagem que corporificaram a intervençao pedagogica contribuiram para a desconstruçao da visao estereotipada do cientista e, portanto, de uma imagem usualmente associada a perspectivas de cariz positivista. Destaca-se que nas atividades de aprendizagem de HC foram trabalhados conhecimentos cientificos construidos por individuos de diferentes cores de pele (brancos e negros) e de ambos os sexos (masculino e feminino). Assim como Reznik et al. (2017) julgamos que:
"Uma vez que esses estereótipos estäo fortemente presentes tanto nas representaçoes midiáticas quanto no universo da ficçâo e nos espaços de ensino formais, consideramos importante realizar esforços coletivos para desmistificar a percepçâo de cientistas e torná-la mais realista e humanizada" (p. 849).
Na sequencia, apresenta-se o processo de desenvolvimento das imagens adotadas pelos 22 alunos, acerca dos cientistas, tendo-se em consideraçao o parámetro caracterizaçâo iconográfica dos cientistas. Os dados contidos no Quadro 6 representam o referido processo.
A análise desse quadro revela que a maioria dos alunos passou por um processo de progressăo no que tange ao desenvolvimento de suas imagens acerca do cientista, considerando-se o parámetro caracterizaçâo iconográfica dos cientistas. Este aspecto aponta a presença de reconstrugăo das concepçöes dos alunos sobre a imagem do cientista.
Para ilustrar este processo de progressăo serăo utilizados os casos de dois alunos, compostos pelas respostas dos mesmos as questöes referentes aos momentos antes de ensino e pós-ensino.
- Das figuras que se seguem, indique aquela(s) que considera poder representar um cientista. Justifique. (momento antes de ensino)
- [Marcou apenas a letra B] "Acredito que o cientista seja apenas o B por estar nas mäos com um material utilizado em laboratório, nas outras figuras os objetos utilizados săo comuns, năo me fazendo lembrar de um laboratório." (aluno A1)
- [Marcou as letra B e E] "É comum vermos em filmes e até em desenhos a figura do cientista como um senhor de idade, jaleco, com canetas no bolso, cabelo arrepiado e cercado de tubos de ensaio." (aluno A10)
- Com relaçao äs questöes 4 e 10 da atividade As minhas ideias iniciáis sobre morfofunçâo do sistema circulatorio humano e Natureza da Ciencia, descreva que mudanças ocorreram na forma como inicialmente pensava sobre cada questao. (momento pós-ensino)
- "Eu tinha uma visăo diferente do que é o cientista, acreditava que existia um tipo específico, e que para ser cientista teria que ter alguma característica ligada ao laboratório, hoje já tenho uma visăo diferente, os vejo como pessoas normais, por isso marcaría todas." (aluno A1)
- "Qualquer figura pode representar um cientista, pois nao existe um padräo exato para ser cientista." (aluno A10)
O aluno A1 supera a imagem estereotipada de cientista, de um individuo geralmente integrado em um laboratório, e passa a considerar, no momento pós-ensino, que todas as figuras apontadas na questăo poderiam representar um cientista. Além disso, esse aluno afirmou que os cientistas nao precisam estar ligados a um laboratório, característica que sugere que ele passou a nao reconhecer o laboratório como único espaço do fazer científico. A produçao de conhecimento científico por intermédio de processos mobilizados fora do ambiente laboratorial - aspecto trabalhado na presente intervençao pedagógica -, a exemplo da observaçao do corpo humano aquando do tratamento cirúrgico de gladiadores (Galeno foi médico dos gladiadores), pode ter contribuido para a construçao dessa visao do aluno A1. Portanto, verifica-se que esse aluno progrediu de uma imagem usualmente associada a perspectiva de cariz positivista para uma de cariz pós-positivista de ciencia, em relaçao ao parámetro caracterizaçâo iconográfica do cientista.
O aluno A10 também caracterizou o cientista com uma imagem usualmente associada a perspectiva de cariz positivista, no momento antes de ensino. No momento pós-ensino este aluno indicou que qualquer uma das figuras poderia representar um cientista, portanto, passou a sustentar uma imagem usualmente associada a perspectiva de cariz pós-positivista, quer dizer, a imagem do cientista sem estereótipos. A presença de cientistas negros (Charles Richard Drew e Vivien Thomas) e do sexo feminino (Helen Taussig), na intervençao pedagógica, pode ter colaborado para a mudança de perspectiva desse aluno.
A análise do Quadro 6 revela, ainda, que oito alunos nao progrediram, nem regrediram, em relaçao a imagem do cientista, porque mantiveram a mesma concepçao do momento antes de ensino. Desses, a maioria (seis alunos) já manifestava concepçöes pós-positivistas no momento antes de ensino e, portanto, apenas manteve tal concepçao no momento pós-ensino. Por outro lado, dois alunos indicaram imagens usualmente associadas a perspectiva de cariz positivista, nos momentos antes e pós-ensino, evidenciando que a intervençao pedagógica foi incapaz de modificar as concepçöes desses alunos. Avalia-se que a imagem de cientista geralmente integrado num laboratório, manifestada por esses dois alunos no momento antes de ensino, possuía um alto grau de coerencia para os mesmos e, portanto, foram mantidas no momento pósensino (ver Quadro 6). De acordo com Miras (1998, p. 62):
"o problema que se coloca no caso da aprendizagem escolar näo será tanta a existencia ou näo de conhecimentos previos, mas o estado desses conhecimentos. Diante de um novo conteúdo de aprendizagem, os alunos podem apresentar conhecimento prévios mais ou menos elaborados, mais ou menos coerentes e, sobretudo, mais ou menos pertinentes, mais ou menos adequados ou inadequados em relaçâo a esse conteúdo. "
Para ilustrar esta situaçao, utilizou-se o caso do aluno A18, composto por suas respostas ás questöes referentes aos momentos antes de ensino e pós-ensino.
- Das figuras que se seguem, indique aquela(s) que considera poder representar um cientista. Justifique. (momento antes de ensino)
[Marcou as letras B, D, E e G] "Pessoas que estäo devidamente trajadas, com equipamentos ou livros, evidenciando que estao estudando algo." (aluno 18)
- Com relaçao as questöes 4 e 10 da atividade As minhas ideias iniciáis sobre morfofunçâo do sistema circulatorio humano e Natureza da Ciencia, descreva que mudanças ocorreram na forma como inicialmente pensava sobre cada questao. (momento pós-ensino)
"Um cientista näo precisa estar todo o tempo em um laboratório, e fazer do jaleco seu uniforme, leva uma vida normal, tem problemas, como todas as pessoas." (aluno A18)
No momento antes de ensino, o aluno marcou as letras (ver figura 1) que representam a imagem de um individuo integrado em um laboratório (B e E) e que representam um individuo lendo/estudando (D e G). As letras escolhidas, em conjugaçao com a justificativa manuscrita, sugerem que este aluno caracterizou uma imagem do cientista usualmente associada a perspectivas de cariz positivista, ou seja, a imagem estereotipada de um individuo geralmente integrado em um laboratório e intelectualmente superior. No momento pós-ensino, este aluno manifestou que o cientista "näo precisa estar todo o tempo em um laboratório", pois "leva uma vida normal". O argumento prende-se a uma imagem associada a perspectivas de cariz positivista, ou seja, a imagem de um indivíduo integrado em um laboratório, ainda que nao seja o tempo todo. Portanto, julgou-se que o aluno continuou considerando que o fazer científico restringe-se ao ámbito laboratorial. Certamente, este ponto de vista prende-se a marcante influencia das ciencias naturais na formaçao do imaginário dos estudantes sobre os cientistas, seja por meio dos químicos, e seus tubos de ensaio fumegantes, dos físicos, e suas inovaçöes de grande caráter emocional (como a energia nuclear) ou dos biólogos, com suas pipetas e placas de Petri (Reznik et al., 2017).
Na sequencia, passa-se â análise das imagens perfilhadas pelos alunos acerca dos cientistas, considerando-se os momentos antes de ensino e pós-ensino, de acordo com o parâmetro caracterizagäo da atividade do cientista. O Quadro 7 expöem essas imagens.
A análise do referido quadro mostra que, no momento antes de ensino, um número reduzido de alunos (apenas dois) manifestava imagens dos cientistas usualmente associadas a perspectivas de cariz póspositivista, ou seja, considerava que o cientista vive como um cidadâo comum.
A titulo de exemplo, segue uma das respostas associadas a perspectiva de cariz pós-positivista:
"Uma semana da vida de um cientista deve ser como a vida do gari, do professor, bem como a de um aluno como eu, entretanto, seus momentos de intervalo seräo mais 'aproveitados' focando no seu objetivo, acredito. " (aluno A17)
O aluno A17, ao responder â questäo "Caracterize/Descreva o período de uma semana da vida de um cientista", considerou que o cientista vive como qualquer outro cidadäo. Por outro lado, a maioria dos alunos perfilhou imagens usualmente associadas a perspectivas de cariz positivista, quer dizer, descreveram, no momento antes de ensino, imagens dos cientistas que permitiram considerar que os mesmos vivem â margem do mundo real. Entre essas imagens, figuraram em maior destaque aquelas que indicaram que o cientista vive entre pesquisa e leitura ou na busca constante pelo conhecimento. Abaixo säo apresentados exemplos de respostas dos alunos que representam tais imagens, usualmente associadas a perspectiva de cariz positivista:
"Ao acordar, geralmente pela manhă, executa suas atividades matinais e se dirige ao laboratorio. No seu laboratorio, ou seu local de trabalho, dará inicio as suas atividades de pesquisa ou continuidade ao projeto já em andamento, utilizando-se de ferramentas para a execugäo desse projeto, desde um livro até sua cobaia. Incansável, leva horas a dentro, até que nota que, infelizmente, deve ir para casa repousar e recarregar-se para o dia seguinte." (aluno A5)
"Busca incessante pelo conhecimento." (aluno A9)
Os alunos A5 e A9 indicaram que os cientistas vivem entre pesquisa e leitura e na busca constante pelo conhecimento, respectivamente. Investigaçöes realizadas com alunos do ensino fundamental (Costa e Silva, Santana e Arroio, 2012), médio (Kosminsky & Giordan, 2002) e superior (Zanon & Machado, 2013), também evidenciaram representaçöes dos cientistas similares a essas, em que os mesmos sao considerados individuos desconectados do mundo real, sem qualquer tipo de convivio social. O estudo de Zanon e Machado (2013), por exemplo, com licenciandos de um curso de Química, mostrou que esses alunos consideravam que a rotina diária do cientista é constituida, basicamente, por estudos e pesquisas. Tais representaçöes podem estar associadas, mais uma vez, â influencia da mídia, que retrata os cientistas como "pessoas com inteligencias acima da média, muito dedicadas as suas experiencias e sem vida social ou afetiva" (Mesquita & Soares, 2008, p. 423, grifo nosso).
Retornando ao Quadro 7, pode-se verificar que oito alunos nao responderam a questao referente ao momento antes de ensino. Tais resultados prendem-se, provavelmente, ao fato da questao Caracterize/Descreva o período de uma semana da vida de um cientista ter sido a última da atividade de aprendizagem, e, por esse motivo, alguns alunos ficaram sem tempo para responde-la, em funçao do prazo estabelecido para o término da atividade.
A análise do Quadro 7, quanto ao momento pós-ensino, revela que a maioria dos alunos sustentou uma imagem usualmente associada a perspectiva de cariz pós-positivista, ou seja, estes consideraram que o cientista vive como um cidadao comum. Costa e Silva, Santana e Arroio (2012) realizaram um estudo comparativo entre dois grupos de alunos do ensino fundamental, em que um deles havia realizado discussöes acerca da natureza da ciencia, junto ao professor, ao longo dos dois anos anteriores de escolaridade e o outro grupo nao tinha realizado essas discussöes. No momento antes de ensino, os autores constataram que o grupo que havia realizado discussöes anteriores sobre natureza da ciencia, apresentava imagens dos cientistas com características pós-positivistas, diferente do grupo que nao tinha realizado tais discussöes previamente, evidenciando que intervençöes de ensino, nesse sentido, contribuem para a reconstruçao de concepçöes sobre a imagem do cientista. No que concerne a presente investigaçao, considera-se que a estratégia de intervençao pedagógica contribuiu para a desconstruçao da imagem de que o cientista é um individuo que vive a margem do mundo real, ou seja, uma imagem usualmente associada a perspectiva de cariz positivista. Na intervençao foram inseridos elementos do contexto familiar e episódios/aspectos particulares da vida dos cientistas, com o intuito de humanizar esses individuos e, consequentemente, a atividade científica. Os seguintes trechos, de duas das entrevistas com grupos focais, ilustram as percepçöes dos alunos sobre o papel da estratégia de intervençao pedagógica na aprendizagem relacionada a imagem do cientista:
Trecho da 1a Entrevista Grupo Focal
1. Professor: (...) o emprego da história do sistema circulatório contribuiu na compreensao sobre aspectos da natureza da ciencia? Quais aspectos? Que aspectos?
(...)
2. Aluno A13: (...) desmanchou aquela ideia figurativa do cientista que a gente tinha, aquela visao de cientista, aquele louco, isolado, e fez ver que, que é totalmente diferente...
Trecho da 2a Entrevista Grupo Focal
1. Professor: E sobre o cientista?
2. Aluno A18: Conseguí, também, quebrar isso, porque eu achava que o cientista era quase um Deus. Imaginava que ele nao tinha vida, uma vida normal, no final teve um que praticava esportes, outro tinha dificuldades financeiras, sofreu preconceitos e eu achava que o cientista nao passava por nada disso, nao tinha os problemas que nós temos. Outro a familia interferiu, ele queria uma determinada profissao, a familia terminou fazendo com que ele mudasse, procurasse outra, e eu achava que o cientista nao passava por nenhum desses problemas.
No trecho da 1a entrevista grupo focal, o aluno A13 expôs os contributos da intervençao pedagógica para desfazer o estereótipo do cientista louco, a margem do mundo real. Por outro lado, no trecho da 2a entrevista grupo focal, o aluno A18 mobiliza vários elementos que no seu conjunto contribuiram para a mudança de visao. Em primeiro lugar, esse aluno indicou um cientista - necessariamente, Charles Richard Drew, discutido na atividade de aprendizagem intitulada Interpretaçâo de um texto de divulgaçâo científica sobre a biografia de Charles Richard Drew (At-HC7) - que praticava esportes. Logo em seguida, ele se refere a outro cientista - obrigatoriamente, Vivien Thomas, discutido na atividade de aprendizagem intitulada Interpretaçâo de um artigo científico sobre a Derivaçâo Blalock-Taussig (At-HC7) - que teve problemas financeiros e sofreu com o preconceito racial. Por fim, o aluno A18 conseguiu ilustrar como a estratégia de intervençâo pedagógica contribuiu para a integraçâo dos cientistas no contexto familiar, recorrendo a descriçâo de um episódio particular da vida do médico grego Galeno, questäo trabalhada na atividade de aprendizagem Interpretaçâo de fragmentos da História da Ciencia sobre arterias, veias e produçâo de sangue (At-HC1). Portanto, almejou-se na intervençâo pedagógica, assim como a Revista Ciencia Hoje das Crianças - analisada por Almeida e Lima (2016) -, construir outra forma de olhar para os cientistas, escapando "das figuras "imobilizadas na dureza do mármore" partindo de representaçöes de pessoas com histórias pessoais de frustraçöes e aspiraçöes, curiosas, observadoras, intelectualmente subversivas" (p. 46).
Finalmente, a análise do Quadro 7 também revela que, no momento pós-ensino, um número expressivo de alunos adotava imagens dos cientistas usualmente associadas a perspectivas de cariz positivista, ou seja, imagens que consideram que o cientista é um individuo que vive a margem do mundo real. Esta imagem do cientista desconectado do mundo real, e sem uma vida social (com contexto familiar, episódios particulares, etc.), construida sob preponderante influencia da midia, retira o caráter humano da empreitada científica e compromete a construçâo de visöes mais coerentes sobre o fazer científico.
A seguir, por meio do Quadro 8, expöe-se o processo de desenvolvimento das imagens perfilhadas pelos alunos acerca dos cientistas, considerando-se o parámetro caracterizaçao da atividade do cientista.
A análise do Quadro 8 indica que seis alunos passaram por um processo de progressäo, no que concerne ao desenvolvimento de suas imagens acerca do cientista, considerando-se o parámetro caracterizaçäo da atividade do cientista. Este aspecto aponta a presença de reconstruçäo das concepçöes dos alunos sobre a imagem do cientista. Para ilustrar o referido processo de progressäo, será utilizado o caso do aluno A10.
- Caracterize/Descreva o período de uma semana da vida de um cientista. (momento antes de ensino)
"Trabalha 12 horas por dia, durante cinco dias uteis e descansa aos finais de semana. O seu dia-a-dia é extremamente ocupado e produtivo, com várias horas de estudo e experimento." (aluno A10)
- Com relaçao as questöes 4 e 10 da atividade As minhas ideias iniciáis sobre morfofunçâo do sistema circulatorio humano e Natureza da Ciencia, descreva que mudanças ocorreram na forma como inicialmente pensava sobre cada questäo. (momento pós-ensino)
"Trabalha 8 horas por dia. Possui afazeres domésticos. Possui horário de descanso." (aluno A10)
No momento antes de ensino, o aluno A10 sustenta uma posiçâo que indica que o cientista é um individuo que vive â margem do mundo real, entre pesquisa e leitura. Entretanto, no momento pós-ensino este aluno passa a considerar, em sua resposta, elementos que indicam que o cientista intercala trabalho e descanso, e que possui afazeres domésticos (cozinhar, limpar a casa, lavar a roupa etc., açöes nao discriminadas pelo aluno A10), aspectos que, no seu conjunto, evidenciam que o cientista vive como um cidadâo comum.
O Quadro 8 também mostra que nove alunos mantiveram a mesma posiçâo, pois nao passaram por processos de progressâo ou regressâo, quanto âs imagens de cientista sustentadas, considerando-se o parámetro caracterizagäo da atividade do cientista. Este aspecto aponta para a ausencia de reconstruçâo das concepçöes dos alunos sobre a imagem do cientista. Destaca-se que, entre esses alunos, dois já manifestavam uma imagem usualmente associada a perspectiva de cariz pós-positivistas no momento antes de ensino e, por isso, apenas mantiveram tal imagem no momento pós-ensino. Por outro lado, seis alunos indicaram imagens usualmente associadas a perspectivas de cariz positivista, nos momentos antes e pósensino. Nestes casos, supöem-se que as outras atividades que os cientistas realizam, discutidas na intervençâo pedagógica, como as de caráter social, familiar e de ensino, nâo foram suficientes para que esses alunos modificassem as descriçöes/caracterizaçöes que fizeram do cotidiano dos cientistas. Provavelmente, esses alunos precisariam de um número maior de atividades de reflexâo metacognitiva que possibilitassem um trabalho focalizado no cotidiano dos cientistas. Esses resultados também indicam que "construir outra narrativa sobre o que é ciencia, como é produzida e validada e quem sao os cientistas e como vivem continua sendo uma necessidade pedagógica de formaçâo do público em geral" (Almeida & Lima, 2016, p. 31).
Para ilustrar esta situaçâo, de manutençâo de imagens usualmente associadas a perspectivas de cariz positivista, utilizou-se as respostas apresentadas pelo aluno A4 nos momentos antes de ensino e pósensino.
- Caracterize/Descreva o período de uma semana da vida de um cientista. (momento antes de ensino)
"- Leituras, avaliaçâo de resultados de análise, observaçâo de experimentos, relatórios." (aluno A4)
- Com relaçâo as questőes 4 e 10 da atividade As minhas ideias iniciais sobre morfofunçâo do sistema circulatório humano e Natureza da Ciencia, descreva que mudanças ocorreram na forma como inicialmente pensava sobre cada questäo. (momento pós-ensino)
"Nâo ocorreu." (aluno A4)
A análise da resposta do aluno A4, no momento antes de ensino, permitiu inferir que o mesmo considerou que o cientista é um individuo que vive â margem do mundo real, entre pesquisas e leituras, uma imagem usualmente associada a perspectivas de cariz positivista. No momento pós-ensino, este aluno afirmou que nâo ocorreram mudanças na forma como inicialmente pensava sobre essa questâo. Desta forma, considera-se que o aluno A4 permaneceu sustentando uma imagem usualmente associada a perspectivas de cariz positivista, em relaçâo ao parámetro caracterizagäo/descrigäo do cotidiano dos cientistas.
Finalmente, o Quadro 8 mostra que sete alunos passaram por um processo indefinido, em relaçâo ao desenvolvimento das imagens acerca dos cientistas, tendo-se em conta o parámetro caracterizagäo da atividade do cientista. Esses alunos nâo responderam â questâo referente ao momento antes de ensino - aspecto discutido nas análises referentes ao Quadro 8 - e, portanto, nâo manifestaram nenhuma imagem acerca dos cientistas. No entanto, responderam â questâo referente ao momento pós-ensino expondo imagens dos cientistas usualmente associadas a perspectiva de cariz positivista ou pós-positivista. Como nâo se sabe as respostas desses alunos, em relaçâo ao momento antes de ensino, nâo foi possivel afirmar que os mesmos passaram por processos de progressâo, regressâo, ou que mantiveram a mesma posiçâo. Em caráter ilustrativo, seguem as respostas de quatro alunos; as duas primeiras referem-se â imagens usualmente associadas a perspectiva de cariz positivista, enquanto as duas últimas â imagens usualmente associadas a perspectiva de cariz pós-positivista:
- Com relaçâo as questőes 4 e 10 da atividade As minhas ideias iniciais sobre morfofunçâo do sistema circulatório humano e Natureza da Ciencia, descreva que mudanças ocorreram na forma como inicialmente pensava sobre cada questäo. (momento pós-ensino)
"Nâo respondi essa questâo, mas se tivesse que responde-la, hoje, diria que nao se pode descrever o período de uma semana de um cientista, pois ser cientista nao é seguir um padrao de vida e cada pessoa tem sua individualidade e suas particularidades." (aluno A7)
"O período de uma semana de um cientista é um período cheio de atividades diversas, desde que tenha separado tempo para tal, afinal ele é uma pessoa que tem necessidades comuns, porém com tarefas específicas de sua área." (aluno A8)
"Inicialmente, um cientista deve ter algum tipo de objetivo, planos traçados de como proceder, ao desenvolver um novo método de ensino, o cientista observa, cria teorías, compara o que é observado, altera suas teorias em busca de um denominador comum que dificilmente é encontrado em apenas uma semana, neste período acredito que exista muita observaçao e teorias sendo boladas para ser feito um estudo que visa adaptar o ensino â realidade, sem prejudicar o foco principal que é o bem comum." (aluno A21)
"Nao respondi na 1a atividade, mas hoje acho que o período de vida de uma semana de um cientista é repleto de privaçöes, tanto familiares, como em relaçao ao lazer, a amigos, e muitas vezes há uma rotina de várias horas perdidas, acordado, dedicado ao projeto, podendo-se gerar até problemas de saúde." (aluno A15)
A resposta do aluno A7 prende-se â uma imagem usualmente associada a perspectiva de cariz póspositivista, pois o mesmo considera que os cientistas nao possuem um padrao de vida específico, já que "cada pessoa tem sua individualidade e suas particularidades" (aluno A7). O aluno A8 sustenta o mesmo tipo de imagem em sua resposta, embora o mesmo indique, mais especificamente, que os cientistas tem uma vida similar â de outras pessoas. As respostas desses dois alunos, â questao colocada no momento pós-ensino, permitem considerar que os mesmos sustentaram â perspectiva de que os cientistas vivem como cidadaos comuns.
A explicaçao para o aluno A21 ter recorrido a uma imagem usualmente associada a perspectiva de cariz positivista, ao responder â questao referente ao momento pós-ensino, pode estar relacionada ao fato do mesmo ter compreendido que a questao "10. Caracterize/Descreva o período de uma semana da vida de um cientista" prende-se, apenas, aos aspectos laborais. Portanto, avalia-se que esse aluno negligenciou as relaçöes sociais e familiares que os cientistas estabelecem, elementos que foram discutidos ao longo da intervençao pedagógica. Diferente do aluno A21, o aluno A15 respondeu â questao pós-ensino enfatizando as privaçöes - familiares, de lazer e em relaçao a amigos - por que passam os cientistas, ao dedicaram-se exaustivamente â pesquisa, a ponto de comprometer a saúde. Supöe-se que a ideia de um cientista workaholic já poderia fazer parte dos esquemas de conhecimento3 desse aluno, apesar de nao te-la utilizado no momento antes de ensino - pois nao respondeu a questao, em funçao dos aspectos já mencionados nas análises relacionadas ao Quadro 7 - e, portanto, essa característica foi prontamente utilizada para a descriçao da semana de vida dos cientistas, no momento pós-ensino.
Por fim, as análises efetuadas permitem afirmar que a estratégia de intervençao pedagógica contribuiu para que muitos alunos construíssem imagens do cientista usualmente associadas a perspectivas de cariz pós-positivista. Entretanto, destaca-se que esse processo foi mais acentuado no que se refere ao parámetro caracterizagäo iconográfica do cientista.
CONSIDERAÇOES FINAIS
A principal contribuiçao desse estudo está na idealizaçao, implementaçao e avaliaçao de uma estratégia de intervençao pedagógica focalizada na HC e orientada â (re)construçao de concepçöes de licenciandos em biologia sobre a imagem do cientista. Reitera-se que a imagem do cientista articula-se diretamente com a visao de ciencia que os cidadaos sustentam, e, portanto, (re)construir tal imagem pode favorecer o desenvolvimento de concepçöes menos ingenuas sobre o trabalho científico.
A estratégia de intervençao pedagógica, desenvolvida no seio do componente curricular Anatomia Humana e focalizada na temática sistema circulatório humano, foi composta por tres tipos de atividades de aprendizagem, de História da Ciencia, de reflexao e de síntese. As atividades de HC, cerne da intervençao pedagógica, pretenderam, entre outros aspectos, desconstruir a imagem consolidada socialmente do estereótipo do cientista.
As análises efetuadas no presente estudo evidenciám a manifestaçâo, nos momentos antes de ensino e pós-ensino, de imagens de cientista usualmente associadas â concepçâo positivista de ciencia. Seguem abaixo essas imagens sustentadas pelos alunos:
* indivíduo geralmente integrado num laboratório;
* indivíduo intelectualmente superior;
* indivíduo que procura constantemente o novo;
* indivíduo com aparencia relacionada â área em que pesquisa;
* indivíduo do sexo masculino, de cor de pele branca e ocidental;
* indivíduo que vive â margem do mundo real na busca constante pelo conhecimento; entre pesquisa e leitura; seguindo etapa(s) do "método científico"; aplicando o que aprendeu; dedicando-se e persistindo de forma autónoma.
A comparaçâo entre as concepçöes sustentadas pelos alunos, nos momentos antes de ensino e pósensino, em associaçâo com a análise das entrevistas do tipo grupo focal, indicou que a estrategia de intervençâo pedagógica contribuiu globalmente para a (re)construçâo da imagem do cientista e, portanto, para a progressäo das imagens sustentadas pelos alunos em relaçâo ao cientista. No entanto, o processo de progressäo das imagens sustentadas pelos alunos foi mais acentuado em relaçâo ao parámetro caracterizagäo iconográfica do cientista, quando comparado ao parámetro caracterizaçâo da atividade do cientista. A menor taxa de progressäo em relaçâo a este último parámetro relaciona-se, certamente, aos seguintes aspectos: (a) um grupo de alunos respondeu a questäo "Caracterize/Descreva o período de uma semana da vida de um cientista" focalizando suas respostas em aspectos laborais, apenas, desconsiderando dimensöes sociais e familiares da vida dos cientistas, ou seja, aspectos trabalhados na intervençâo pedagógica; (b) a imagem do cientista como um trabalhador obstinado, incansável, workaholic, é resistente a mudanças.
De modo geral, avalia-se que o conjunto de fatores que corporizou a estrategia de intervençâo pedagógica - o conteúdo histórico do sistema circulatório, as fontes de informaçâo mobilizadas, a natureza dialógica e/ou cooperativa da aprendizagem e as reflexöes sobre o processo de aprendizagem - contribuiu para a aprendizagem relacionada a imagem do cientista. Entretanto, deve-se destacar os contributos das atividades de HC na (re)construçâo da imagem do cientista, pois estas foram pautadas em discussöes referentes a cientistas negros e brancos, mulheres e homens, integrados em contextos familiares. Nestas atividades também foram contemplados episódios e aspectos particulares das vidas dos cientistas, como doenças, forma de morte, atividade esportiva realizada, etc., e trabalhos desenvolvidos por esses indivíduos, para além do ámbito da investigaçâo, como disseminaçâo científica - por meio do ensino, publicaçöes e sessöes de divulgaçâo - e açöes sociais ou políticas, como direçâo de um programa nacional de coleta de sangue destinado âs forças armadas e atuaçâo como senador do parlamento italiano.
Por fim, o impacto positivo da estrategia de intervençâo pedagógica na (re)construçâo das concepçöes dos alunos sobre a imagem do cientista evidencia o potencial da mesma para a promoçâo de uma aprendizagem mais alargada, no ámbito do componente curricular Anatomia Humana, capaz de incidir, também, sobre conteúdos de ordem epistemológica. Portanto, a presente investigaçâo aponta um caminho para a superaçâo de um ensino anatómico comprometido, eminentemente, com a memorizaçâo de estruturas que compöem o corpo humano, e dá seguimento â proposta de romper com a frieza do ensino da Anatomia Humana (Ribeiro, Oliveira & Silva, 2011).
1 filme estadunidense dirigido por Ron Howard, lançado no ano de 2001 e considerado um drama biográfico sobre a vida do matemático John Forbes Nash (1928-2015).
2 Referimos, específicamente, as Diretrizes Curriculares Nacionais para os Cursos de Ciencias Biológicas, porque a intervençâo pedagógica, cerne da presente investigaçâo, foi implementada em um curso de Licenciatura em Biologia.
3 Mauri (1998, p. 96) define esquemas de conhecimento como "representaçao que uma pessoa tem, em determinado momento, sobre uma parcela da realidade".
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Recebido em: 20.10.2017
Aceito em: 30.05.2018
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Abstract
A integraçâo da História da Ciencia na abordagem do sistema circulatorio humano em articulaçâo com atividades de reflexäo metacognitiva caracteriza uma intervençâo pedagógica implementada e avaliada com um grupo de 22 alunos, no componente curricular Anatomia Humana de uma Licenciatura em Ciencias Biológicas. A investigaçâo aqui efetuada centra-se na análise do impacto da integraçâo educativa da História da Ciencia na (re)construçâo das concepçöes dos alunos sobre a imagem do cientista. Esta análise processou-se com recurso a utilizaçâo de dois instrumentos de investigaçâo, atividades de aprendizagem e guiäo da entrevista dos grupos focais, sendo que as respostas dos alunos äs questöes contidas nestes instrumentos foram avaliadas através da análise de conteúdo. A comparaçâo entre as concepçöes sustentadas pelos alunos, nos momentos antes de ensino e pós-ensino, em associaçâo com a análise das entrevistas do tipo grupo focal, indicou que a estratégia de intervençâo pedagógica contribuiu globalmente para a (re)construçâo da imagem do cientista.