RESUMO
O objetivo desse estudo foi analisar a associaçâo entre as características antropométricas, ocupacionais, nivel de atividade física e a ideaçâo suicida em policiais militares de Aracaju e Regiâo Metropolitana, Brasil. Participaram do estudo 254 policiais militares ativos do sexo masculino e feminino, com idade entre 21 e 55 anos. Os dados foram coletados através do Formulários Google, contendo questÐes sobre características sociodemográficas, antropométricas, ocupacionais e comportamentos de risco. Foi realizada estatística descritiva com média, desvio padrâo, frequencia absoluta, relativa e para os casos específicos, análise de regressâo logística binária. Policiais militares com menos tempo de serviço tinham quatro vezes mais chances de apresentar tristeza profunda nos últimos 12 meses (OR = 0,22; 95% IC 0,09-0,51), e policiais mais velhos tres vezes mais chances (OR = 3,12; 95% IC 1,64-7.97). Policiais que trabalhavam em turnos do dia alternados, apresentaram quatro vezes mais chances de ter planejado suicídio nos últimos 12 meses (OR = 4,67; 95% IC 1,08-20,16), e policiais com menos tempo de serviço apresentaram sete vezes mais chances (OR = 0,13; 95% IC 0,26-0,64). É observado que as características laborais estâo associadas a ideaçâo suicida. Também é percebido que a atividade física é um fator de proteçâo contra tristeza profunda.
Palavras-chave: Epidemiologia, Segurança, Comportamento suicida, Saúde Mental, Aptidâo Física, Atividade Física.
ABSTRACT
This study aimed to analyse the association between anthropometric characteristics, occupational status, physical activity level, and suicidal ideation among military police in Aracaju and the Metropolitan Region, Brazil. 254 active male and female military policemen, aged between 21 and 55 years, participated in the study. 254 military police participated in the study. Data were collected through Google Forms, containing questions about sociodemographic, anthropometric, occupational characteristics, and risk behaviours. Military officers with less service were four times more likely to experience profound sadness in the past 12 months (OR = 0.22; 95% CI 0.09-0.51), and older officers three times more likely (OR = 3.12; 95% CI 1.64-7.97). Police officers who worked alternate day shifts were four times more likely to have planned suicide in the past 12 months (OR = 4.67; 95% CI 1.08-20.16), and police officers with less time on duty had seven times more chances (OR = 0.13; 95% CI 0.26-0.64). It is observed that labour characteristics are associated with suicidal ideation. It is also perceived that physical activity is a protective factor against profound sadness.
Keywords: Epidemiology, Safety, Suicide behavior, Mental Health, Physical Fitness, physical activity
INTRODUÇÂO
O Brasil vem passando por grandes mudanças nos últimos 50 anos, mudanças essas de aspecto demográficos, econômicos e sociais, incluindo um rápido processo de urbanizaçao acompanhado pela transferencia dos núcleos demográficos de emprego, passando da zona rural para a urbana (IBGE, 2016). Os avanços tecnológicos que acontecem em diferentes campos tem contribuido gradativamente para a reduçao da exigencia corporal. Com o decréscimo da exigencia física o aumento na demanda psicológica está mais presente no trabalhador, produzindo assim maiores niveis de stress e problemas psicofisiológicos (Tajik et al.2017; Waters et al., 2016).
Também é notável que ocorre uma modernizaçao nos setores como a segurança pública. O policial militar passa uma grande parte do tempo sentado em tarefas administrativas ou em viaturas realizando rondas ostensivas. Fatores como stress, horas extras trabalhadas e periculosidade sao características deste labor, assim como uma dieta pobre em nutrientes, má qualidade do sono e a inatividade física (Kubiak et al., 2017).
A inatividade física é um comportamento de risco que pode levar o indivíduo a desenvolver problemas de saúde como a obesidade, hipertensao e diabetes (World Health Organization [WHO], 2018). Além disso, há evidencias da associaçao entre atividade física com quadros depressivos, consumo de álcool e tabagismo (Gigantesco et al., 2015; Ströhle, 2009). Apesar de já estar bem documento na literatura que, atividade física é uma importante forma de promoçao da saúde, qualidade de vida, bem-estar físico e mental, ainda nao está se a atividade física exerce fator de proteçao mesmo para indivíduos com cargas de trabalhos tao violentas e estressoras quanto a ocupaçao de polícia militar.
Um estudo realizado pelo conselho cidadao de segurança pública e justiça penal, elencou as 50 cidades mais perigosas do mundo, 14 eram do Brasil ("Las 50 Ciudades Más Violentas Del Mundo., 2018). Com o número de 1,343,573 habitantes e de 1,185 homicídios, Natal, a capital do Rio Grande do Norte, foi considerada a cidade mais violenta do Brasil. Já a cidade de Aracaju (Sergipe) foi considerada a 7a cidade mais violenta do Brasil e 25a mais violenta do mundo, com o valor de 949,342 habitantes e 463 homicídios. Necessário ressaltar que das 50 cidades mais violentas do mundo, nove se encontravam na regiao nordeste do brasil.
O aumento na incidencia da criminalidade na cidade de Aracaju em conjunto com as exigencias físicas do trabalho policial, como andar, subir escadas, curvar-se, fazer uso de equipamentos pesados, assim como perseguiçöes de suspeitos e confrontos violentos, repercutem no aumento dos fatores estressores no policial militar, podendo assim influenciar o indivíduo a adotar comportamentos de risco a saúde, como luta corporal, comportamento suicida, o uso do tabaco e consumo de álcool (Anderson et al., 2001). A utilizaçao dessas substancias psicoativas serve para o alívio de tensÐes acumuladas no decorrer dos dias e como consequencia torna mais suscetível a presença de conflitos interpessoais e pessoais (Nascimento et al., 2013; Rezende et al., 2012).
Dentre esses conflitos, o comportamento suicida é um fator de grande preocupaçao global e uma das maiores causas de mortes e lesÐes em todo mundo, cerca de 800.000 pessoas morrem por dia tendo como causa o suicídio. Desde o pensamento, planejamento ou até mesmo tentativa, apresentam cargas significativas e podem ter impactos potencialmente devastadores, nao só sobre vítimas individuais, mas também sobre famílias, colegas de trabalho e estrutura social (WHO, 2018).
A cidade de Aracaju, situada no nordeste brasileiro, é considerada 25a cidade mais violenta do mundo, assim como a maioria das cidades que estao situadas nessa regiao do Brasil ("Las 50 Ciudades Más Violentas Del Mundo., 2018). Nesse sentido, torna-se necessário compreender as cond^Ðes de saúde dos profissionais militares que enfrentam diariamente e, de maneira presencial, a violencia urbana.
Esse mapeamento contribuirá de forma efetiva para a elaboraçao de políticas públicas com o intuito de melhorar a qualidade de vida desses policiais e por consequencia a prestaçao de serviço para a sociedade. Diante disso, o objetivo desse estudo foi analisar a associaçao entre as características antropométricas, ocupacionais, nível de atividade e os comportamentos de risco relacionado a ideaçao suicida em policiais militares de Aracaju e Regiao Metropolitana, Brasil.
MÉTODO
O presente estudo tem caráter descritivo, com delineamento transversal. A populaçao foi composta por policiais militares da cidade de Aracaju e Regiao Metropolitana / SE.
Participantes
A amostra foi calculada com base na populaçao de 2.227 policiais ativos no ano de 2018, a populaçao foi delineada pelo efetivo dos policiais militares em atividade nos batalhÐes e companhias da regiao metropolitana de Aracaju (Aracaju, Nossa Senhora do Socorro, Sao Cristóvao e Barra dos Coqueiros).
O cálculo amostral foi feito através da equaçao de Barbetta, foi levado em consideraçao o erro tolerável máximo de 5% e intervalo de 95% (Barbetta., 2008). Foi identificado 254 (N) policiais. Participaram do estudo policiais militares ativos do sexo masculino e feminino, com idade entre 21 e 55 anos. Foram excluidos da pesquisa em questao, aqueles policiais que optaram nao assinar o termo de consentimento livre e esclarecido (TCLE) ou por afastamento médico ao trabalho. A realizaçao deste estudo foi aprovada pelo Comite de Ética e Pesquisa-CEP: 2.729.750
Instrumentos
Foi utilizada uma planilha para coleta de dados sobre fatores sociodemográficos e ocupacionais. Os fatores sociodemográficos incluíram sexo e idade. Os fatores ocupacionais incluíram tempo de serviço, turno de serviço, carga horária e tipo de serviço, observado no quadro 1.
As medidas de massa e estatura foram obtidas de forma auto referida pelos participantes, no qual os valores informados por eles foram considerados válidos. O índice de massa corporal (IMC) foi calculado através dos valores obtidos de massa e estatura. As classificaçÐes obtidas através do cálculo do IMC, foram caracterizadas em 2 niveis. Entre 18,5 e 24,9 kg/m2 caracterizado como "Eutróficos (<25,0 kg/m2) =0". Valores iguais ou superiores a 25,0 kg/m2 foi caracterizado como "Excesso de peso=1", conforme quadro 1.
A versao curta do Questionário Internacional de Atividade Física (IPAQ) foi utilizada para analisar o nível de atividade física (Matsudo et al., 2001). Caracterizamos a classificaçao do instrumento em dois níveis; a caracterizaçao de "Ativo = 0" foi dada para "muito ativo" e "ativo" e "Baixo nível de atividade física = 1" foi dada para "insuficientemente ativo" e "sedentário", de acordo com quadro 1.
A ideaçao suicida entre os militares foi avaliada com base em algumas perguntas diretas sobre o comportamento suicida (Tristeza profunda; Pensamento suicida; Planejamento; Tentativa). Através das seguintes questÐes: "Nos últimos 12 meses, voce já pensou seriamente em cometer suicidio (se matar)?"; "Nos últimos 12 meses, voce planejou como se suicidar?"; "Nos últimos 12 meses, quantas vezes voce realmente tentou o suicidio?". As questÐes 1 e 2 foram caracterizadas como "Nao = 0" e "Sim = 1"; enquanto a questao 3 foi caracterizada como "Nenhuma= 0" e "Pelo menos uma vez = 1", conforme quadro 1.
Com relaçao ao consumo de bebidas alcoólicas e tabagismo, perguntas sobre o consumo dessas drogas licitas foram realizadas: "Voce consome bebidas alcoólicas?"; "Voce faz uso de cigarro? (tabaco)". As respostas dos avaliados foram caracterizadas em "Nao = 0" e "Sim = 1", de acordo com o quadro 1.
Procedimentos
A primeira etapa do estudo foi a realizaçao de reuniao com o representante da 3a seçao da Polícia Militar. Isto serviu para expor os objetivos e os interesses da pesquisa, bem como esclarecer possíveis dúvidas e questionamentos. Em seguida, e de posse da informaçao do quantitativo de policiais, foi realizado o cálculo estatístico para a amostra, conforme figura 1.
A segunda etapa, consistiu na inserçao de todos os questionários do estudo foram inseridos no Google Formulários e entao os participantes foram orientados a assinar o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Após a assinatura do termo, uma nova etapa no Google Formulários era habilitada, contendo as perguntas dos questionários. Todo esse procedimento ocorreu por meio de um link gerado através da própria plataforma Google e os avaliados respondiam pelos seus respectivos aparelhos eletrônicos.
Análise estatística
Foram utilizadas estatísticas descritivas (média, desvio padrao, mínimo e máximo), frequencia absoluta e frequencia relativa das variáveis supracitadas. Além disso foi conduzida análise bruta da regressao logística para verificar a associaçao entre as características antropométricas, ocupacionais e os comportamentos de risco relacionado a saúde dos policiais militares. Para os casos específicos pós analise bruta, foi conduzido análise de regressao logística binária para estimar a chance de ocorrencia do fenómeno na forma de Odds Ratio (OR). Para todas as análises foi levada em consideraçao o nível de significancia de p<0,05, além do intervalo de confiança de 95%. As análises foram realizadas no programa Statistical Package for the Social Sciences (SPSS®) para Windows, versao 20.0.
RESULTADOS
O presente estudo nao obteve indivíduos excluídos da pesquisa. O público-alvo foi composto por 254 policiais militares sendo 83,5% do sexo masculino do total coletado, 56,3% estava classificado como ativo físicamente, 37,4% dos avaliados realizavam trabalho administrativo e 62,6% serviços operacionais. Sobre o turno de trabalho, 60,6% trabalham em horários alternados. Também foi possível observar entre os policiais militares avaliados, que 72,4% possuíam até 20 anos de serviço na corporaçao. Com uma carga horária semanal podendo variar em menos de 40 horas semanais (57,9%) e mais de 41 horas semanais (42,1%), de acordo com tabela 1.
A média de idade dos policiais militares foi de 36,5 ± 8,06 anos, com massa corporal média de 82,24 ±15,18 kg, estatura média de 1,73 ±6,65 cm, equivalente ao IMC de 27,32 ±3,68 kg/m2, conforme tabela 2.
Em relaçao aos comportamentos de risco, 3.9% faziam uso do tabaco. Em contrapartida 57,1% relatou fazer consumo de bebidas alcoólicas. No que diz respeito a tristeza profunda 29,9% dos policiais militares relataram a presença desse sentimento, 13,8% dos avaliados relataram ter possuído pensamento suicida, 9,1% deles chegaram a planejar o ato, 2% dos avaliados afirmaram ter tentado cometer suicídio, conforme tabela 3.
Após analise bruta, as variáveis que mostraram significancia na análise de associaçao anterior, foram inseridas no modelo de regressao logística binária, conforme mostrado na Tabela 4. A partir da razao inversa da Odds Ratio, observamos que policiais militares com menos tempo de serviço tinham quatro vezes mais chances de apresentar tristeza profunda (OR = 0,22; 95% IC 0,09-0,51), no entanto policiais mais velhos apresentaram tres vezes mais chance de possuir tristeza profunda no últimos 12 meses (OR = 3,12; 95% IC 1,64-7,97). Ainda sobre este sentimento, foi observado que policiais com baixos níveis de atividade física tem mais chance de apresentar a tristeza profunda (OR = 1,85; 95% IC 1,03-3,33). Com relaçao ao planejamento do suicídio, policiais que trabalhavam em turnos do dia alternados (diurno/noturno), apresentaram quatro vezes mais chances de ter planejado suicidio nos últimos 12 meses (OR = 4,67; 95% IC 1,08-20,16). Além disso, a partir da razao inversa da Odds ratio, foi observado que individuos com menos tempo de serviço possuem sete vezes mais chance de ter planejado cometer suicidio nos últimos 12 meses (OR = 0,13; 95% IC 0,26-0,64).
DISCUSSAO
O principal achado deste estudo foi que, os policiais militares das cidades investigadas apresentam uma maior prevalencia de individuos do sexo masculino, maior prevalencia para trabalhos operacionais (rondas ostensivas) e em turnos alternados. Além disso, a maioria dos individuos tinham até 20 anos de tempo de serviço na corporaçao e 27,32kg/m2 (sobrepeso) na média do IMC. Em relaçao a ideaçao suicida, 29,9% relatou tristeza profunda, 13,8% relatou ter pensado em cometer suicidio, 9,1% planejado o ato e 2,0% tentaram.
O presente estudo apontou um elevado percentual do sexo masculino (83,5%) na funçao laborativa, conforme os estudos realizados a presença do sexo masculino é predominante, tendo relaçao com o número de vagas concedidas sempre em maior número para este sexo (Blasco Espinosa et al., 2002; Nascimento et al., 2013; Santana et al., 2012). Especula-se que a divisao por igual do efetivo entre serviço administrativo e operacional se dá pela importancia também dos trabalhos administrativos, desmistificando o pensamento que o policial militar deve tao somente realizar trabalhos de segurança ostensiva.
Em outro estudo, foi observado que entre os possíveis turnos de trabalho (diurno, vespertino e noturno), o mais comum é o diurno, o que diverge dos nossos resultados (Blasco Espinosa et al., 2002). Além disso, foi observado que trabalhar em turnos alternados apresenta um fator de risco para o planejamento do suicídio. Especula-se que essa resposta pode sofrer influencias das variaçöes do período noturno, e a falta de constancia no ciclo vigília-repouso, que por sua vez pode afetar outras variáveis da saúde mental como estresse, ansiedade e qualidade do sono. Levando o individuo ao pensamento de lesÐes auto infligidas.
Em relaçao a variável IMC, os avaliados da presente amostra obtiveram um valor de 27,32 Kg/m2, correspondendo a classificaçao de sobrepeso (WHO, 2018). Presume-se que a falta de hábitos saudáveis e pouca prática de atividades físicas possuem influencia sobre o aumento desse índice na populaçao geral. Um estudo realizado na Finlandia apontou maiores valores na composiçao corporal e na circunferencia da cintura de policiais no final de 15 anos de serviço laboral, com uma taxa de individuos acima do peso (IMC > 27 Kg/m2) sendo superior quando se comparado ao inicio do estudo realizado (29% e 51% respectivamente) (Sörensen et al., 2000).
Um valor aproximado também foi encontrado em outro estudo, no qual os pesquisadores envolvidos realizaram um estudo longitudinal na cidade de Charlotte, Estados Unidos e identificou que 12 anos de atividade policial contribuíram para o aumento da composiçao corporal em policiais militares (Boyce et al., 2008). Imaginase que essas mudanças ao longo do tempo se devem ao consumo inadequado de alimentos, por muitas vezes o policial em sua longa jornada de trabalho tem apenas acesso a redes de fastfood durante o serviço, a falta de consciencia de uma vida saudável com a prática de exercícios físicos também parece estar presente, contribuindo assim para esses valores crescentes.
Em relaçao ao etilismo, a prevalencia do consumo de bebidas alcoólicas nos PMs investigados foi menor (57,1%) quando comparado com os dados de uma pesquisa realizada com policiais militares da cidade do Rio de Janeiro, foi verificado que 75,8% dos avaliados faziam uso de bebidas alcoólicas (Souza et al., 2013).
Estima-se que o uso prejudicial do álcool entre a populaçao entrevistada em nosso estudo se dá devido a fatores estressantes gerados pela atividade policial que envolvem sobrecarga de trabalho, pressao psicológica ou desvalorizaçao devido a hierarquia, que podem causar ansiedade e desconforto pelo local de trabalho, tornando a bebida uma alternativa para fuga de responsabilidades, angústias e frustrates por exemplo, além da procura de momentos de lazer e relaxamento.
Os resultados apontam também que indivíduos ativos apresentam menos chance de possuir a tristeza profunda, ao que parece os benefícios de ser fisicamente ativo também sao presentes para atividades de alto estresse ocupacional assim como na atividade policial. A atividade física regular pode auxiliar a reduzir esses sentimentos de tristeza por várias razÐes. Durante a atividade física, ocorre um aumento da temperatura cerebral, com consequente liberaçao de hormônios, como endorfinas e oxitocinas, o que leva a uma melhora do estado de humor, que por sua vez pode reduzir as respostas da tristeza profunda. Outros possíveis mecanismos para essa atenuaçao de sentimentos triste com a prática de atividade física podem ser a melhora da funçao mitocondrial nos neurônios e a açao de neurotransmissores, como dopamina, serotonina e norepinefrina (Guyton, 2006).
Através de um questionário enviado por email a todos os Policiais Militares do Brasil, filiados a Rede Nacional de Ensino a Distancia (EAD/SENASP-MJ), foi identificado que 79% dos militares nao pensaram e nao tentaram suicídio, 18% pensaram, mas nao tentaram e 3,6% tentaram cometer o suicídio. Estes dois valores foram semelhantes aos que foram apresentados neste trabalho, (13,8%) e (2%) respectivamente. Assim, ao que parece este público está susceptível ao suicídio, sendo que a faixa etária dos 30 aos 39 anos é ainda mais propensa (Miranda & Guimaraes, 2016).
Nosso estudo observou que policiais com idade igual ou maior que 37 anos apresentaram um fator de risco para tristeza profunda. Esta resposta é esperada porque os policiais com mais idade podem ter experimentado mais eventos estressores ao longo da vida. É de comum conhecimento que o trabalho policial inclui momentos de grande estresse e até terror. Deste modo a polícia lida com alteraçöes emocionais após se deparar com incidentes violentos ou traumáticos, o que pode influenciar na incidencia de tristeza profunda. Deste modo, os achados anteriores merecem destaque, pois é comum que policiais militares em atividade cometam suicidio por problemas de saúde mental.
Entre todas as ocupaçöes existentes os policiais militares fazem parte do grupo que mais possui relaçao com o suicidio, pelo fato da polícia militar ser uma instituiçao que possui inúmeros fatores estressores de risco quando comparado com outras organizaçöes de segurança pública e sao poucas as açöes institucionais destinadas a reduçao do alto estresse a que essa categoria está submetida (Miranda & Guimaraes, 2016). As cobranças constantes e a multiplicidade de funçöes sao os principais estressores de qualquer atividade ocupacional, porém para os policiais militares além destes fatores o trabalho ostensivo, as incursÐes policiais e os atendimentos aos chamados estao no topo da lista, principalmente para os que trabalham nas ruas. Simultáneo a isso, existe a cobrança da populaçao que espera desta categoria o cumprimento de seu dever em prol da sociedade como a realizaçao de prisÐes, apreensao de drogas e de produtos roubados.
No entanto, observou-se que tempos de serviço mais longos tem fator de proteçao contra a tristeza profunda e o planejamento de suicidio; especula-se que essa resposta se deva ao fato da experiencia profissional permitir ao policial militar lidar com mais eficiencia com as situaçÐes que ocorrem durante o serviço. Os policiais sao expostos a diversas situapÐes traumáticas e tristes, como episódios de violencia, cenários de acidentes, ameaças a vida e morte. Um estudo de Lee et al. (2016), observou que a autoresiliencia é um fator de proteçao que pode ajudar os agentes de organizaçÐes de segurança pública a minimizar os riscos de trauma e tristeza devido a experiencias negativas no trabalho.
Ao que parece, os comportamentos de risco presente nos policiais militares avaliados, podem sofrer influencias de alguns fatores relacionados ao trabalho. Como limitaçao ao estudo, apesar de nao ser possível inferir na presente pesquisa se o tabagismo ou consumo de bebidas alcoólicas, iniciou antes ou após o ingresso na corporaçao, pois este hábito pode ser apenas uma dependencia preexistente, nao tendo relaçao direta com a prática laboral. É possível estimar, com base na literatura prévia, que a variaçao dos turnos de trabalho, e as demandas psicofisiológicas presentes na característica laboral do público policial em questao, podem favorecer a busca por substáncias psicoativas como manobra para diminuir as tensÐes acumuladas. Quando essas tensÐes chegam a um nível nao mais atenuados pelas substáncias psicoativas, o surgimento de comportamentos que contribuem para lesÐes nao intencionais e violencia passam a surgir e de maneira crónica se agravam chegando a um nível máximo que seria a tentativa do suicídio.
CONCLUSSÄO
Conclui-se que as características laborais dos policiais militar de Aracaju e Regiao Metropolitana estao associadas com a ideaçao suicida nessa populaçao. É possível verificar associaçao entre a idade do policial, o nivel de atividade física e a tristeza profunda. Assim como, entre o tempo de serviço, tristeza profunda e planejamento do suicidio. Também foi observado associaçao entre o Regime de trabalho (turnos) e o planejamento do suicidio. A contribuiçao deste estudo está em fornecer subsidios para criaçao de politicas públicas ou processos institucionais a fim de minimizar as situaçÐes de risco a esse tipo de agente da segurança pública.
Agradecimentos:
Agradecemos a Polícia Militar do Estado de Sergipe pela disposiçâo em autorizar o estudo.
Conflito de Interesses:
Nada a declarar.
Financiamento:
Nada a declarar
* Autor correspondente: Núcleo de Pesquisa em Aptidâo Física, Saúde e Desempenho de Sergipe, Departamento de Educaçâo Física, Universidade Federal de Sergipe, Campus Universitário - Bairro Jardim Rosa Elze. CEP: 49100-000. Sâo Cristovâo/SE, Brasil. E-mail: [email protected]
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© 2020. This work is published under https://creativecommons.org/licenses/by-nc/4.0/ (the “License”). Notwithstanding the ProQuest Terms and Conditions, you may use this content in accordance with the terms of the License.
Abstract
O objetivo desse estudo foi analisar a associaçâo entre as características antropométricas, ocupacionais, nivel de atividade física e a ideaçâo suicida em policiais militares de Aracaju e Regiâo Metropolitana, Brasil. Participaram do estudo 254 policiais militares ativos do sexo masculino e feminino, com idade entre 21 e 55 anos. Os dados foram coletados através do Formulários Google, contendo questÐes sobre características sociodemográficas, antropométricas, ocupacionais e comportamentos de risco. Foi realizada estatística descritiva com média, desvio padrâo, frequencia absoluta, relativa e para os casos específicos, análise de regressâo logística binária. Policiais militares com menos tempo de serviço tinham quatro vezes mais chances de apresentar tristeza profunda nos últimos 12 meses (OR = 0,22; 95% IC 0,09-0,51), e policiais mais velhos tres vezes mais chances (OR = 3,12; 95% IC 1,64-7.97). Policiais que trabalhavam em turnos do dia alternados, apresentaram quatro vezes mais chances de ter planejado suicídio nos últimos 12 meses (OR = 4,67; 95% IC 1,08-20,16), e policiais com menos tempo de serviço apresentaram sete vezes mais chances (OR = 0,13; 95% IC 0,26-0,64). É observado que as características laborais estâo associadas a ideaçâo suicida. Também é percebido que a atividade física é um fator de proteçâo contra tristeza profunda.