TEIXEIRA, Faustino. (Org.). Caminhos da Mística. São Paulo: Paulinas, 2012. 293p.
Na atual sociedade, de intensa valorização dos bens materiais, nota-se crescente interesse pelo conhecimento da experiência mística, quer nos meios acadêmicos ou não. Na busca de compreensão de tal fenômeno, é possível encontrar várias definições do termo e muitas apenas fundamentam a relação da mística à magia e superstições. No livro organizado por Faustino Teixeira, professor do Programa de Pós-Graduação em Ciência da Religião da Universidade Federal de Juiz de Fora (MG), a mística é apresentada no sentido original do termo: o da experiência de união da alma humana com o mistério.
Caminhos da Mística, com esmero, segue a intenção de obras anteriores do mesmo organizador: No limiar do mistério. Mística e religião (2004) e Nas teias da delicadeza: Itinerários místicos (2006). Por seu atributo científico, a publicação responde à continuidade de divulgação das pesquisas apresentadas anualmente no Seminário de Mística em Juiz de Fora - MG, desde 2001. A obra evidencia a produção acadêmica de pesquisadores brasileiros diante da efervescência da temática na atualidade.
Os treze artigos se mostram na riqueza da multiplicidade do olhar científico, pois decorrem da filosofia, teologia, psicologia e literatura. Percebe-se a ênfase da mística ocidental, observada em experiências plurais vivenciadas por homens e mulheres, do judaísmo, do islamismo e, sobretudo, do cristianismo.
O livro situa o tema diacronicamente e atende à clássica visão da história da humanidade: Antiguidade, Idade Média, Moderna e Contemporânea. Tal proposta, mesmo que atendida não rigorosamente, permite a compreensão contextualizada da experiência mística e dos escritos místicos.
Após clara apresentação do organizador, o prefácio do poeta Marco Lucchesi ratifica o relevante papel do Seminário de Mística, onde, segundo ele, o conflito das epistemologias é sinal de beleza, mistério e desafio. O artigo de Luiz Felipe Pondé, "No subsolo", abre os caminhos da mística. Sua reflexão provoca a meditação da condição do ser humano que, necessitado do olhar misericordioso de Deus, faz-se indiferente a Ele, que ainda assim é capaz de seduzi-Lo. Pondé relaciona a própria realidade aos pensamentos do escritor russo Dostoievski, os quais compõem significante e filosófica reflexão.
Com o olhar direcionado à Antiguidade, o fenômeno é apresentado por Marcus Reis Pinheiro na "Mística em Plotino". No artigo é possível perceber a profundidade espiritual do pensamento de Plotino, carregado de imagens poéticas e explicações da união mística.
Na Idade Média, quando a imagem dos pássaros desempenhou importante papel cultural e religioso, o místico sufi, Farid Ad-Din Attar desenvolve, a partir da linguagem dos pássaros, belíssimo itinerário espiritual. É o que mostra o pesquisador Carlos Frederico B. de Souza em "Unio Mystica: o que vem Depois?". A mística de Attar mostra-se em bela alegoria da alma à procura do Deus verdadeiro e traça caminhos de encanto e sabedoria.
Nos caminhos da mística cristã do período medieval, quando surge o movimento beguinal e a repressão da instituição religiosa, as místicas Mechthild von Magdeburg e Marguerite Porete vivenciam a união mística expressa em linguagem amorosa, testemunho de caridade e trabalhos intelectuais. É o que apresentam os artigos "Minne: o âmago visceral de Deus em Mechthild von Magdeburg", da autoria de Maria José C. do Amaral; e "Meguerite Porete, mística e teóloga do século XIII", escrito por Ceci B. Mariani. "O exterior mais interior que o mais íntimo" - artigo de Adriana Andrade de Souza - trata de um dos mais fecundos pensadores da filosofia alemã da Idade Média: Mestre Eckhart. Na leitura de Eckhart, vê-se a reflexão do desprendimento no qual se nega a oposição entre Deus e a criatura, ensinando a união entre contemplação na liberdade do desprendimento e a ação na fecundidade das obras.
Ao observar os caminhos da mística de abertura ao mundo, o livro não traz pesquisas que abordam os clássicos intinerários místicos da época Moderna, referentes ao período de transição que vai do século XV ao XVIII, como Teresa de Jesus, João da Cruz e outros. Mas, de alguma forma, os contextualiza na contemporaneidade quando apresenta seguidores importantes como Simone Weil e Thomas Merton.
No artigo "Simone Weil: uma mística para o século XXI", a pesquisadora Maria Clara L. Bingemer mostra que Simone Weil viveu o perfil da experiência mística externamente à instituição eclesiástica e testemunhou profunda união com o Deus da revelação cristã, em sabedoria e compromisso sociopolítico. Na mesma linha desse artigo, Faustino Teixeira enriquece a reflexão com o artigo "Teilhard de Chardin e a diafania de Deus no universo". O místico cristão jesuíta tinha a visão de Deus ao lado (e não no alto) e convoca à fé transformadora. São estilos de vida indicativos aos homens e mulheres da atualidade que buscam na mística motivação de engajamento.
O pesquisador Alexandre Leone, com o artigo "A mística judaica refletida na obra de Heschel", evidencia a pluralidade da obra e apresenta a profundidade espiritual do caminho místico do rabino Abraham Joshua Heschel, difusor do hassidismo. O místico judeu propõe ao homem moderno caminhos para contemplação da presença de Deus: a oração, estudo meditativo e a ação humanizadora.
Thomas Merton, monge e escritor, é o místico estudado por Sibélius Cefas Pereira e apresentado em "Diante da realidade crua das coisas: Thomas Merton e o 'trabalho de cela". O místico expõe em diários sua experiência de contemplação da vida e do mundo. Em seu trabalho de cela, vive o sentido de solidão, traça intinerário espiritual de abandono em Deus e abertura à realidade da raça humana. A mística do monge está presente em belos poemas e obras literárias. Com atenção ao caráter literário da experiência, Mariana Ianelli compõe a análise de Vittoria Guerrini no artigo com o pseudônimo da mística, Cristina Campo: "A portadora de Cristo nos campos do III Reich".
Os dois últimos artigos do livro tratam questões do tema relacionadas à filosofia e à literatura moderna, o que enriquece e atribui particularidade à publicação. José Carlos Michelazzo, em "Mística, heresia e metafísica", apresenta as relações entre cristianismo e filosofia, e expõe a história filosófica de intolerância à mística. Em "Crítica e mística: poesia moderna e instantaneidade", Eduardo Guerreiro B. Losso traz relevante discussão sobre a literatura de importantes teóricos que atribuem características negativas à mística, sem conhecer estudos e aspectos importantes ligados ao fenômeno.
Caminhos da Mística, com relevância científica, provoca reflexões importantes às Ciencias da Religião e contribui para um exercício de olhar fenomenológico da mística, pois tal experiência mostra-se em diversidade da união com o mistério, na sublimidade e na inteligência. A proposta cronológica da obra permite uma observação para o modo como esta experiência da presença divina foi vivenciada ao longo da história da humanidade e como elementos de cada época, de alguma forma, afetaram tal vivência religiosa.
Os mesmos dados estatísticos (IBGE/2010), que apresentam a mobilidade religiosa dos brasileiros, expõem a significativa inquietação do ser humano e a busca constante do mistério. Em realidades complexas e plurais, a mística desponta com sua beleza e sutileza. Os caminhos da mística têm muito a dizer à atualidade. Vale a pena entregar-se à leitura da obra.
Cidlene Castro de Souza*
Rsenha recebida em 28 de agosto e aprovada em 03 de dezembro de 2012.
* Graduada em Ciências Sociais (Universidade Federal do Pará) e aluna de Pós-Graduação em Ciências da Religião (PUCMinas). País de origem: Brasil. E-mail: [email protected]
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