Submetido 23/11/2020 - Aceito 13/10/2021
ABSTRACT
The objective of this work is to present the results of an investigation that deals with a critique in terms of decolonial theory to the issue of universal human rights and Western democracy in the protection of Brazilian indigenous peoples during the initial period of the Covid19 pandemic in Brazil. To this end, a wide bibliographic review on the subjects of human rights, democracy, coloniality of being and coloniality of gender was utilized, as well as a qualitative analysis of data collected through indigenous rights organizations and newspapers specialized on the subject. The results point to a deficiency in universal human rights and Western democracy in being effective regarding ethnic minorities present in an extensively heterogeneous state like Brazil. Finally, this research sought to point out the importance of peripheral studies aimed at understanding the peripheral reality in detriment of the Center/West reality, since it provides evidence of the difficulty of fitting the reality of the global South into bureaucratic legislation apparatus designed for populations from the North.
KEYWORDS: Western Human Rights. Indigenous Genocide. Western Democracy. Non-Universalization of Human Rights. Indigenous peoples and Covid-19.
RESUMO
O objetivo deste trabalho é apresentar os resultados de uma investigação que trata de uma crítica nos termos da teoria decolonial à problemática dos direitos humanos universais e da democracia ocidental na proteção dos povos indígenas brasileiros durante o período inicial da pandemia de Covid-19 no Brasil. Para tanto, utilizou-se de uma ampla revisão bibliográfica a respeito dos temas direitos humanos, democracia, colonialidade do ser e colonialidade de gênero, bem como uma análise qualitativa de dados coletados por meio de organismos de defesa dos povos indígenas e jornais especializados no assunto. Os resultados apontam para uma debilidade nos direitos humanos universais e na democracia ocidental em serem efetivos no que tange a minorias étnicas presentes em um Estado amplamente heterogêneo como o Brasil. Por fim, esta pesquisa buscou apontar a importância dos estudos periféricos voltados para o entendimento da realidade periférica em detrimento da realidade do centro/ocidente, uma vez que fornece evidências da dificuldade de encaixe da realidade do Sul global em aparatos burocráticos de legislação pensados para populações do Norte.
Palavras chave: Direitos Humanos Ocidentais. Genocídio Indígena. Democracia Ocidental. Não Universalização dos Direitos Humanos. Indígenas e Covid-19.
1 INTRODUÇÃO
No dia 13 de março de 2020, a Organização Mundial da Saúde (OMS), frente à disseminação do Corona Virus Desease - 19 (Covid-19), decretou situação de pandemia. O novo vírus dividiu opiniões, governos, polarizou populações e trouxe muitas especulações sobre sua origem, sua gravidade e sobre a importância do isolamento social para conter a disseminação da doença.
Diante do novo vírus desconhecido e da situação emergencial, fronteiras foram fechadas, economias retraídas, direitos foram delegados e, em muitas nações, direitos colocados em xeque. Na China, país de origem da doença, o vírus infectou, por enquanto, 85.384 pessoas, matando 4.634. A Itália, segundo país a ser o epicentro da infecção e disseminação da Covid-19, registrou 311.354 casos, tendo 35.851 mil óbitos (CovidVisualizer, 2020)1.
Os Estados Unidos, cujo Chefe de Estado negligenciou a validade e a gravidade da doença, tornaram-se o terceiro epicentro da pandemia, com 7.363.152 infectados e 209.865 mortos. E, na direção das indiligências dos Estados Unidos e da Itália, o Brasil, cujo presidente por diversas vezes chamou o vírus de gripezinha, disputa com os Estados Unidos o lugar de núcleo da doença, possuindo um total de 4.748.327 casos, registrando um total de 142.161 mortos (CovidVisualizer, 2020)2.
Face ao desgoverno proporcionado pelo presidente do Brasil, os casos no país continuam a aumentar sem que haja uma política efetiva de proteção à população e, principalmente, às minorias étnicas presentes no território nacional. A demora na tomada de decisão, bem como o descompasso de decisões entre União, estados e municípios, contribuíram para que o vírus se propagasse e se disseminasse entre as regiões mais remotas do Brasil, atingindo diversas aldeias indígenas e comunidades ribeirinhas.
Mais uma vez, a negligência, o descaso e o preconceito do Governo Federal com relação às minorias colocam em perigo a segurança da população indígena brasileira e apontam para uma realidade muito debatida, atualmente, nas Ciências Sociais: a "universalização" da democracia e direitos humanos. Enquanto a população urbana utiliza de um precário sistema de saúde para se tratar das possíveis consequências da Covid-19, as aldeias indígenas são esquecidas pelas políticas governamentais e, muitas vezes, nem mencionadas no que se refere aos cuidados básicos, direitos e proteção.
Assim, diante da falta de expectativa em relação às ações do Governo Federal e trabalhando com a ideia da democracia liberal poliárquica e os direitos humanos como mitos ocidentais propagados por países colonizadores brancos, este artigo tem como objetivo criticar a democracia liberal poliárquica e os direitos humanos no que se refere à sua aplicação para as minorias étnicas indígenas brasileiras. Para tanto, será utilizado como base o modelo de democracia de Robert A. Dahl, um dos autores mais utilizados das Ciências Sociais no que se refere aos estudos de democracia e um dos maiores expoentes na matéria, buscando explanar seus ideais de democracia voltados, principalmente, para o modelo de igualdade intrínseca e o modelo de cidadania inclusiva.
Nesta seara, apresentar-se-á o ideal de direitos humanos e justiça internacional da Organização das Nações Unidas (ONU) (1948) através da Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH) e do Tribunal Penal Internacional (1998), a partir do Estatuto de Roma, como sendo um dos postulados de defesa do processo de especificação dos sujeitos de direito, focando, posteriormente, no estudo de caso da Covid-19 nas aldeias indígenas brasileiras, bem como o descaso do Estado democrático de direito brasileiro face à crise sanitária que assolou o mundo e, atualmente, está invadindo as aldeias indígenas nacionais.
Tais conceitos, democracia e direitos humanos, serão debatidos em conjunto, uma vez que se parte do pressuposto de que onde a democracia é implementada nascem os direitos humanos, pois esta seria a um solo fértil para a propagação de tais direitos. Será, finalmente, apresentada uma crítica partindo dos pressupostos decoloniais à democracia e aos direitos humanos, tendo como base os estudos latino-americanos e sua importância para a desconstrução de um ideal de direitos que não abrangem a heterogeneidade da população brasileira. Dessa forma, buscar-se-á responder à pergunta: a democracia brasileira é democrática e os direitos humanos no Brasil são para todos os humanos?
2 O IDEAL DE DEMOCRACIA PARA DAHL E OS DIREITOS HUMANOS UNIVERSAIS
Como grande expoente da teoria democrática, Robert A. Dahl defende a concepção da democracia como algo contínuo, histórico e, de alguma maneira, nas palavras do próprio autor, "quase interminável" (Dahl, 2001, p. 19). Esse processo de construção contínua perdura até hoje nos direitos incorporados e nas obrigações estatais a serem cumpridas em prol de seus cidadãos. Sem uma definição que seja única e completa, a democracia pode ser entendida hoje como um misto de vários direitos e deveres entre cidadãos e Estado, em geral, fixados em formas de leis, tratados, convenções, direitos humanos, eleições, entre outros.
O papel do cumprimento da democracia ainda tem como seu principal expoente o Estado. Este é o garantidor e o guardião dos direitos democráticos, através de seus inúmeros aparatos estatais, e, principalmente, a Constituição. Assim, para entender o que é a democracia para Dahl, importa compreender que o autor concebe o Estado como uma forma específica de associação. Logo, ele convida a entender que o Estado se distingue de outro tipo de associação, na medida em que é um garantidor da sujeição às regras das quais possui jurisdição através de seus recursos legítimos de coerção. Dessa forma, é possível perceber que, sob a égide da jurisdição estatal, vivem toda a população membra de determinado Estado (Dahl, 2001).
A essa população, cabe cumprir todos os seus deveres e fazer cumprir, através de seus representantes legislativos, todos os seus direitos, não importando sua raça, etnia, orientação sexual ou credo. Nesse sentido, o Estado deve ser entendido, assim como Dahl (1989) sugere, como o núcleo fundamental das ideias democráticas, concedendo aos seus cidadãos direitos fundamentais que, ao menos na teoria, Estados não democráticos são incapazes de conceder. Isso, segundo o autor, torna a democracia algo que vai além de um processo de governar, colocando-a em um patamar de sistema garantidor de direitos.
Importa destacar, nessa ordem, que em um processo de governo identificado como democrático, os direitos deveriam estar, pelo menos em tese, distribuídos de maneira igualitária entre todos seus cidadãos. Contudo, Dahl (2001) reconhece que a igualdade nem sempre se constitui como algo incontestável para todos. Desse modo, enfatiza a necessidade de essa igualdade, chamada "intrínseca", ou seja, o tratamento de maneira igualitária a todas as pessoas, ser um dos princípios adotados pela democracia. Admitida a premissa, compreende-se, então, que a igualdade deve estar presente na relação entre Estado e todos os seus cidadãos, independente de raça, religião, etnia, orientação sexual, entre outros.
Reconhecendo, assim, que a igualdade não é percebida e praticada como algo incontestável, Dahl (2001) propõe a inclusão como sendo uma das normas da democracia. O principal objetivo dessa norma é trabalhar para conter a hipótese de que as vozes próximas aos governantes adquiram mais direitos e possíveis regalias do que as vozes que não possuem representação. Nesse sentido, aproximar todas as classes para que todos tenham a possibilidade de representação tornaria a democracia mais inclusiva. Ato contínuo, dar-se-ia espaço para a cidadania inclusiva, a fim de que os direitos que estão a serviço da população não sejam negados a nenhum residente permanente do país.
Ademais, Dahl (2001) refere dez consequências desejáveis que a democracia traz: (1) Evita tiranias; (2) Direitos Essenciais; (3) Liberdade geral; (4) Autodeterminação; (5) Autonomia moral; (6) Desenvolvimento Humano; (7) Proteção dos direitos pessoais essenciais; (8) Igualdade Política; (9) A busca pela paz; (10) A prosperidade. Entre as consequências esperadas, consequências trazidas pela democracia, ressalta-se, aqui, a 1, 2 e 8 como forma de constituir um argumento sólido a respeito do problema de partida.
Evitar a tirania, para Dahl (2001), tornou-se uma das questões mais importantes para política. Portanto, a democracia seria uma forma eficaz de conter novos governos semelhantes ao de Hitler na Alemanha e Stálin da União Soviética. Ainda, a democracia seria a melhor forma de garantir a seus cidadãos os direitos essenciais. Assim, o autor faz crer que, para além de uma forma de governar, a democracia, através de suas instituições políticas democráticas, consiste em um conjunto exclusivo de direitos. Além disso, ele justifica que, em sistemas de governo nãodemocráticos, uma ampla gama de direitos políticos não seria possível. Ainda direcionando o debate para os direitos essenciais garantidos pela democracia, pode-se considerar, também, que esses direitos vinculam de maneira forte a democracia e os direitos humanos. Por fim, Dahl (2001) afirma que somente a democracia pode garantir a igualdade política entre seus cidadãos, tornando-os iguais sob qualquer aspecto diante das instituições políticas.
A partir da percepção de Dahl (2001) sobre Estados democráticos e direitos humanos, podese considerar os direitos humanos universais como sendo o filho mais novo da democracia, uma vez que o autor expõe, claramente, que a democracia como sistema político é o garantidor de direitos que constitui um terreno fértil para o surgimento dos direitos humanos. Logo, direitos humanos sem democracia seria algo impossível. Para pensar os direitos humanos em sua forma contemporânea, importa compreender como a prática atual dos direitos humanos surgiu e se difundiu no que hoje é chamado de internacionalização dos direitos humanos.
Para tanto, no sentido historiográfico, a concepção da expressão adquire forma a partir da Declaração Universal dos Direitos Humanos e é reafirmada segundo a Declaração dos Direitos Humanos de Viena de 1993. Piovesan (2013) observa que esse entendimento moderno dos direitos humanos se caracteriza pela sua internacionalização, um fato recente na história do mundo, que surge a partir do pós II Guerra. Consoante Piovesan (2013), esse deslocamento foi uma resposta imprescindível aos crimes cometidos pelo nazismo e, como consequência, tornando os direitos humanos um paradigma e referencial ético que possui o poder de orientar a nova ordem internacional que surgia em um contexto pós-guerra (Piovesan, 2013). O autor declara que o desenvolvimento dos direitos humanos do pós-guerra é marcado pela "emergência do Direito Internacional dos Direitos Humanos de um lado e, de outro, a emergência da nova feição do Direito Constitucional Ocidental, aberto a princípios e a valores com ênfase no valor da dignidade humana" (Piovesan, 2013, p. 43).
Dessa maneira, os direitos humanos começam a ser elaborados no âmbito internacional a partir de um sistema normativo, dando a entender que uma espécie de constitucionalismo global estivesse sendo criado a partir das Declarações, Convenções e Tratados Internacionais. Esse novo constitucionalismo global estava direcionado a proteger os direitos fundamentais, limitando o poder estatal, uma vez que se criava um aparelho internacional de proteção aos direitos dos cidadãos (Piovesan, 2013). O aparato internacional citado anteriormente estava coligado e respaldado pelos direitos fundamentais da democracia liberal e tinha o intuito de proteger cidadãos dos excessos não apenas do Estado, mas de possíveis líderes autoritários. Para tanto, a DUDH, adotada e proclamada pela Resolução n. 217 A (III) da Assembleia Geral das Nações Unidas, em 10 de dezembro de 1948, é o primeiro documento internacional garantidor dos direitos humanos. Esse documento tem como objetivo reconhecer que cidadãos não podem ser tratados de maneira desigual e indigna, além de expressar, claramente, que seus direitos são inalienáveis.
Como consequência dessa nova articulação internacional, consoante Piovesan (2013), o direito Constitucional Ocidental deu início à elaboração de seus textos, pautados nos princípios e valores dos Direitos Humanos Internacionais - sobretudo no que se refere aos valores de dignidade humana. A Constituição Brasileira de 1988, nesse sentido, não foi diferente. Conhecida pelos juristas como Constituição Cidadã, ela acolhe os princípios internacionais de direitos humanos e os princípios de um Estado Democrático de Direito.
Para Piovesan (2012), no que tange aos tratados internacionais, estes devem ser entendidos como acordos internacionais, acordos tais que após assinados e ratificados se tornam juridicamente obrigatórios e vinculantes - pacta sund servanda (Piovesan, 2012). Ou seja, a nação que decidir fazer parte do tratado precisa observá-lo e seguir suas regras de modo que suas leis estejam sempre apoiadas nas instruções do determinado tratado, tornando-o, assim, a primeira fonte de observação no que se refere ao plano internacional, sendo então obrigatórios (Piovesan, 2012).
Diante das necessidades e especificidades da população mundial, surgiu a emergência da especificação dos sujeitos de direito. Assim, os tratados internacionais passaram a especificar os sujeitos no sentido de torná-los não apenas iguais, mas equânimes. Portanto, tornou-se essencial a criação de novos tratados e convenções internacionais que possibilitassem a proteção dos direitos de minorias que, mesmo diante dos tratados anteriormente citados, não estavam sendo protegidos.
Seguindo a lógica de proteção do sujeito de direito especificado, o Estatuto de Roma, do Tribunal Penal Internacional (1998), reconhece as especificidades de cada cultura e a herança ancestral que elas carregam, bem como a fragilidade que as permeiam. Como consequência, no intuito de proteger a vulnerabilidade dessas culturas, o Estatuto de Roma busca definir, precisamente, cada crime praticado contra humanidade, definindo o genocídio como,
Artigo 60
Para os efeitos do presente Estatuto, entende-se por "genocídio", qualquer um dos atos que a seguir se enumeram, praticado com intenção de destruir, no todo ou em parte, um grupo nacional, étnico, racial ou religioso, enquanto tal:
a) Homicídios de membros do grupo;
b) Ofensas graves à integridade física ou mental de membros do grupo;
c) Sujeição intencional do grupo a condições de vida com vista a provocar a sua destruição física, total ou parcial;
d) Imposição de medidas destinadas a impedir nascimentos no seio do grupo;
e) Transferência, à força, de crianças do grupo para outro grupo. (Tribunal Penal Internacional, 1998).
Vale lembrar que o Brasil é signatário desse estatuto, promulgando-o no dia 1 de setembro de 2002 e recepcionando-o como complemento dos direitos e garantias já expressos na Constituição Federal. Assim, segundo Piovesan (2012), ao recepcionar os tratados internacionais, a Carta Magna passa a atribuir aos direitos internacionais uma essência exclusiva e dessemelhante tal qual as normas constitucionais. Como consequência, são direitos constitucionalmente consagrados os tratados de direitos humanos dos quais o Brasil for signatário (Piovesan, 2012).
Desse modo, democracia e direitos humanos coexistem e se complementam na Carta Magna do Estado brasileiro, permitindo que os direitos humanos sejam colocados em pauta e em prática no Brasil a partir da Constituição de 1988. A democracia, como consequência, compõe uma forma de validação dos direitos humanos e da justiça internacional no âmbito nacional.
Logo, a relação entre povos indígenas brasileiros, Constituição Federal 1988 e direitos humanos é uma relação pautada pela especificação dos sujeitos de direitos, pelo reconhecimento da cultura, da tradição e das necessidades diferenciadas desse povo no quesito lei, saúde e proteção. Entretanto, a prática desses direitos, muitas vezes, mostra-se defasada e distante da pauta de interesse dos governantes e isso pode ser demonstrado na luta dos indígenas pela segurança sanitária no período de pandemia de Covid-19, colocando em xeque as principais pautas direcionais da democracia e dos direitos humanos defendida pela Carta Magna brasileira.
3 O DESCASO DO ESTADO BRASILEIRO EM RELAÇÃO AO COVID-19 NAS ALDEIAS INDÍGENAS NO PAÍS
Desde o primeiro caso de Covid-19 declarado no Brasil, um dos medos das lideranças indígenas no país era a chegada do novo vírus às aldeias e, consequentemente, a devastação que isso poderia causar. Muitos foram os esforços das próprias aldeias indígenas em tentar conter a chegada da doença. Contudo, as falhas nas notificações governamentais, o descaso do governo, tanto com a população não-indígena, quanto com a população indígena, e a falta de políticas públicas vêm levando o caos para as aldeias e abalando os pilares da democracia, dos direitos humanos e do respeito aos tratados internacionais que foram incorporados às leis brasileiras desde a redemocratização.
Ainda em março, cinco dias após a OMS declarar pandemia do novo coronavírus, o Ministério Público Federal (MPF) encaminhou ofícios a diversos órgãos do Poder Executivo, requerendo informações a respeito da situação dos povos indígenas e quilombolas com relação às diretrizes que estavam sendo organizadas para prevenir o alastramento da Covid-19 entre essas comunidades. Contudo, em reunião com os povos Tenharim e Diahui, ficou claro que nenhum esclarecimento a respeito de medidas de prevenção contra a doença estava sendo repassado por intermédio desses órgãos (Conselho Indigenista Missionário [CIMI], 2020a).
No dia 17 de março de 2020, a Fundação Nacional do Índio (Funai), por meio da Portaria N 419/PRES, trouxe, em seu art. 4 . parágrafo único, a possibilidade de contato com comunidades indígenas isoladas, especificamente no caso de a ação estar relacionada à sobrevivência do grupo, requerendo apenas autorização da Coordenação Regional, através de ato justificado. Em nota, o Conselho Indigenista Missionário (CIMI) repudiou a ação, afirmando que a missão institucional da Funai está ancorada nos princípios de proteção e promoção dos direitos dos povos indígenas do Brasil. Já sob o governo atual, o órgão estaria se deslocando de sua missão original, caminhando na contramão de seu papel enquanto organismo protetor dos direitos dos povos indígenas do Brasil. Assim, a Funai estaria criando uma facilitação na entrada dos territórios indígenas (CIMI, 2020b).
Além da situação crítica da pandemia e das decisões controversas da Funai em relação aos povos indígenas, lideranças indígenas do Vale do Javari, no Estado do Amazonas, precisaram recorrer à Polícia Federal, à Funai e ao MPF para que impedissem um missionário evangélico norteamericano de adentrar em territórios de indígenas isolados. Temendo a proliferação do novo vírus, as lideranças denunciaram que o missionário não respeita os protocolos de ação contra o Covid- 19 em terras indígenas e estaria cooptando integrantes dessas comunidades para conseguir ter acesso aos territórios mais longínquos (CIMI, 2020c).
O arcebispo de Rondônia e presidente do CIMI, em entrevista à rádio do Conselho Nacional de Bispos do Brasil (CNBB), também denunciou o descaso e a indiferença do governo brasileiro com relação às comunidades indígenas. Ele afirmou que o governo se utiliza da pandemia para retirar assistências às comunidades, além de tomar medidas sem grandes impactos para conter a Covid-19 nas aldeias (CIMI, 2020d).
Como reflexo do descaso do Governo Federal em relação aos indígenas na pandemia, houve um aumento das investidas de grileiros, madeireiros e invasores às terras indígenas. No início de abril de 2020, indígenas Karipuna encontraram invasores limpando a floresta em uma área com distância inferior a 10km da Aldeia Panorama, onde os Karipuna vivem e encontram-se em isolamento social devido ao risco de contágio pelo novo vírus. No mesmo período, também ouviram motosserras e maquinário que indicavam o desmate do local, mesmo a terra indígena estando, desde 1998, registrada como Patrimônio da União (CIMI, 2020e). As dificuldades das comunidades indígenas estendem-se, também, às condições alimentares e sanitárias. O Governo Federal não tem contribuído com produtos essenciais nas aldeias indígenas, desde produtos de limpeza como álcool em gel, sabão e máscaras, até produtos de higiene pessoal, como escovas de dentes e absorventes (CIMI, 2020f).
Nesse sentido, observa-se que a democracia exige uma compreensão sobre ética, uma vez que esta rege as ações de todos os sujeitos que participam do Estado:
Si somos y vivimos desde nuestra conciencia, y ésta es un museo de palabras, una selección crítica y creativa de palabras, que orientan y concretan nuestra acción en el mundo, es desde ahí, ámbito espiritual permanentemente amenazado de asedio y conquista por quienes tienen interés permanente en ello, desde donde hemos de llevar a cabo la autoría de nuestro guión. (Herrerías, 2016, p. 49).
Nessa ordem, muitas são as dificuldades das comunidades indígenas para lidar com as questões que pautam suas sobrevivências nesse período de pandemia, uma vez que assuntos relacionados à proteção desses povos são tratados com omissão pelo poder Executivo. A Funai, reconhecida como principal órgão do Poder Executivo de proteção aos povos indígenas, e o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) foram acionados judicialmente por meio de ação civil pública do MPF pela ilegalidade e inconstitucionalidade de uma Instrução Normativa editada pelos órgãos que possibilita a legalização de terras que estão sob posse de grileiros, posseiros e loteadores.
Nesse sentido, a Instrução Normativa (IN) n 9/2020 da Funai vai de encontro à razão de existir dessa fundação, que consiste na proteção dos direitos indígenas, principalmente, frente ao ataque de pecuaristas e agricultores. Ao que se entende, após a leitura da IN referida, é que, a partir de documento emitido pela Funai, o posseiro de terra invadida pode requerer junto ao Incra a legalização da terra, ainda que ela esteja sob o domínio de povos indígenas, no caso de a terra não ter passado por legalização para utilização exclusiva dos povos indígenas (Funai, 2020).
Mesmo no contexto de alta disseminação da Covid-19, o Governo Federal não apresentou medidas direcionadas à saúde dos povos indígenas, atendendo às demandas sanitárias necessárias para o combate à doença. Mesmo com a aceleração do contágio e com o novo vírus já inserido nas comunidades indígenas, a Funai ainda não gastou metade do montante de 640 milhões de reais previstos para o ano de 2020, como pode ser visto no Portal da Transparência (2021). Assim, de acordo com a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) (n.d.), a soma de indígenas já infectados pelo Sars-Cov-2 é superior a 33.935 casos confirmados e 833 óbitos3.
O descaso do Poder Executivo seguiu-se não apenas em relação aos indígenas brasileiros, mas, também, às populações carentes. Entre elas, citam-se as comunidades ribeirinhas, quilombolas, população em situação de rua, população de baixa renda e população abaixo da linha da pobreza. A instituição se negou a atribuir a factual gravidade ao problema, ficando a cargo dos representantes das unidades federativas e dos municípios o controle do problema de saúde pública, bem como o direcionamento de medidas de contenção da crise instaurada pela pandemia. Entre diversas negações, o presidente Jair Messias Bolsonaro chegou a sugerir que todos contrairiam o novo coronavírus um dia, minimizando a doença que já matou centenas de milhares de pessoas em todo o mundo.
No período de pandemia e na luta para se manterem vivos, os indígenas precisaram lutar, ainda, contra a MP 910. Essa urgência, que recai novamente sobre a organização social dos povos originários, evidencia o movimento naturalizado de narrativas que reforçam a descartabilidade dessas comunidades no Brasil. A imobilidade histórica, em alguns governos atenuada por iniciativas isoladas, nunca deixou de promover e reforçar o descaso e a objetificação voltados aos indígenas, o que, de fato, ratifica a permanência do olhar herdado do colonialismo português no país.
Sabe-se que o Brasil enfrentou um grande período de colonialismo e que essa herança ainda se reproduz em várias partes do cotidiano brasileiro, desde o modo de se vestir até na produção de leis e na decisão de quem as cumpre e de quem está liberto delas. Essa visão simplória pode ser observada no cotidiano brasileiro e na divisão de raças presentes na nação: brancos, indígenas e negros. Homens, brancos, heterossexuais, cristãos e possuidores de terras ocupam o cume da sociedade brasileira, ditam as regras, legislam e controlam a economia. Negros são a herança do período da colonização, a força braçal que ocupa o lugar do proletário, quem, geralmente, morre por falta de recursos e por falta de interesse do Estado. E, por fim, indígenas, os ex-donos da terra; a vergonha do passado; a herança da promiscuidade.
Toda essa ideia que transforma negros e indígenas em seres marginalizados na sociedade brasileira são constituídas a partir da percepção ocidental criada desde a colonização, podendo ser chamada de colonialidade. Maldonado-Torres (2007) explica que a colonialidade e colonialismo são termos diferentes, embora parecidos e decorrentes do mesmo sistema colonial. Nesse sentido, colonialismo refere-se a uma relação política e econômica entre colonizado e colonizador. Por sua vez, colonialidade é o "padrão de poder que surgiu a partir do colonialismo moderno" (Maldonado- Torres, 2007, p. 131) e permeia a realidade do colonizado desde então. Nesse sentido, observa-se:
Essa resistência em aceitar o Outro possivelmente está ligada a não aceitação da diferença e diversidade humana, de querer que todos sejam iguais e sigam um padrão aceito pela sociedade ocidental, para que assim sejam acolhidos, fortalecendo dicotomias, ou seja, a partir da negação da subjetividade. (Mendonça & Cardoso, 2018, p. 406).
Assim, pode-se compreender a colonialidade como o resultado da articulação entre trabalho, conhecimento, autoridade e relações intersubjetivas no contexto do capitalismo que rege as relações mundiais e a ideia de raça (Maldonado-Torres, 2007). Compreende-se, dessa maneira, a colonialidade como uma herança do colonialismo e algo que está intrínseco no contexto de países remanescentes do período colonial, mas também dos países que não ditam as regras do capitalismo mundial. Ou seja, a subjetividade de quem detém o capital e de quem é dependente está contaminada pelo que é chamado colonialidade. Como consequência, quem legisla (em geral, o homem branco, heterossexual, cristão, cisgênero e detentor do capital) possui sua percepção voltada às necessidades das características que ele mesmo possui. Isso ocorre pela contaminação da assimilação, fazendo-o crer estar acima da realidade que quem obedece a legislação. Por outro lado, a quem não se enquadra nas características do homem branco, compete o discernimento de obedecer a partir do entendimento de sua inferioridade.
Nesse sentido, nota-se que a colonialidade direciona-se a diversas áreas da vida em sociedade. Ademais, é possível entendê-la, também, desde colonialidade do ser e de diversas outras colonialidades específicas de cada uma das áreas sociais afetadas pelo capitalismo mundial. Desse modo, Maldonado-Torres (2007) afirma que, para que se compreenda o que é a "colonialidade do ser", importa compreender, antes, como foi vivida a experiência do negro e do indígena colonizado frente ao colonialismo mundial, podendo serem entendidos como o princípio de qualquer entendimento a respeito da "colonialidade do ser". Ademais, "a colonialidade do ser se refere a normalização de eventos extraordinários que tomam lugar na guerra" (Maldonado- Torres, 2007, p. 148).
Diante disso, pode-se considerar que, embora de alta gravidade, os eventos ocorridos com os indígenas brasileiros estão normalizados desde o período colonial. Em tal contexto, as monarquias portuguesa e espanhola, ao efetivarem um sistema perverso de dominação territorial, dizimaram milhões de indígenas na América do Sul e incutiram, no pensamento da população que estava se transferindo para colonizar essas terras, a noção de selvageria presente no cotidiano indígena criado pelo imaginário ibérico. Como consequência, ainda no contexto contemporâneo, os indígenas são vistos como não humanos, selvagens, preguiçosos e ladrões de terra pela população branca brasileira - e não apenas por ela. Indígenas fazem parte do Estado como cidadãos, mas, em geral, cidadãos de segunda classe, que não se incluem na ordem funcional do Estado brasileiro, que não gozam dos mesmos direitos dos cidadãos de primeira classe.
Nesse sentido, destaca-se que o Estado, aqui, não é entendido apenas a partir de seu aparato estatal, mas, de maneira primordial, como sendo um conjunto de relações sociais encarregado de estabelecer a ordem em um determinado território, e, por assim dizer, proteger esse território a partir de seu poder coercitivo centralizado, operando seus aparelhos repressores. Contudo, a ordem produzida por esse Estado está distante de ser uma ordem igualitária ou socialmente imparcial. Segundo O'Donnel e Wolfson (1993), tanto frente ao capitalismo, como frente ao socialismo, a ordem estatal favorece e ajuda a reproduzir relações de poder completamente assimétricas.
O'Donnel e Wolfson (1993) criaram um mapa fictício para compreensão dos efeitos da democracia em Estados como Brasil, Peru e Argentina. Nesse mapa, ele pinta de azul regiões estatais que possuem grande presença do estado em seu aspecto funcional, como nas questões de território. Ou seja, estariam presentes nesses territórios burocracias que funcionassem de forma razoável, e que também possuíssem a existência de uma legalidade efetiva. A cor verde seria aplicada em regiões do Estado que possuíssem alto grau de penetração territorial, porém, uma presença muito menor em termos funcionais. Em regiões nas quais predominasse a cor marrom, "significaria uma presença muito baixa, ou nula de ambas as dimensões" (O'Donnel & Wolfson, 1993, p. 170).
O'Donnel e Wolfson (1993) situam o Brasil como pertencente aos grupos de países cuja cor predominante seria o marrom. Isso ocorre, segundo os autores, porque existem, nessas regiões, eleições, governadores, prefeitos, deputados estaduais, deputados federais e senadores. Contudo, esses representantes políticos são caracterizados por serem "máquinas personalistas", ou seja, trabalham em função das regalias que podem receber, tanto no nível estatal local, quanto no nível estatal nacional. Dessa forma, tais governantes e partidos operam com base no clientelismo, personalismo e outros estilos de uma política que não é voltada para o povo (O'Donnel & Wolfson, 1993, p. 170).
Logo, O'Donnel e Wolfson (1993) classificam os interesses dos "legisladores marrons", de acordo com suas palavras, como muito limitados. Isto é, eles têm como objetivo sustentar o sistema de dominação privatizada que os elegeu e mobilizar para esses sistemas e para si mesmos um grande número de patrimônios estatais (O'Donnel & Wolfson, 1993). Pode-se entender, então, que um congresso nacional majoritariamente branco, donos de terra ou representantes de donos de terra têm como objetivo não a representação do povo de um Estado como um todo, mas a defesa dos recursos e empreendimentos de quem o elegeu, ignorando, assim, qualquer necessidade ou carência da população que ele representa.
Os votos dos "legisladores marrons", ainda consoante O'Donnel e Wolfson (1993), possuem atributos conservadores e oportunistas, dependentes de vantagens extraídas do Poder Executivo ou das burocracias estatais. Assim, quando um país possui em seu território grandes zonas marrons, isso significa que sua democracia é pautada por uma condição esquizofrênica que mescla, tanto nas áreas funcionais como territorialmente, peculiaridades constituídas tanto pela democracia, quanto pelo autoritarismo (O'Donnel & Wolfson, 1993). Sabendo que a democracia dessas áreas marrons é pautada pelo autoritarismo, e considerando aqui os direitos humanos como filho mais novo da democracia, pode-se afirmar que esses direitos são, diretamente, influenciados pelos comportamentos dos legisladores marrons. Neste caso, ainda que haja a especificação dos direitos humanos, colocá-los em prática exige que eles estejam introduzidos nos interesses de quem legisla, e que não sejam meros instrumentos de aprovação social em períodos de crise e eleição. Contudo, dado o contexto do legislador que não faz parte da seara social que possui interesse que estes direitos sejam colocados em prática, eles, em geral, tornam-se instrumentos abandonados pelos parlamentares marrons.
Nesse sentido, pensar os direitos humanos universais é pensar, igualmente, na relação entre direitos individuais e direitos coletivos e como eles fazem parte do cotidiano da sociedade brasileira. Conforme Santos e Chauí (2014), a DUDH das Nações Unidas, reconhece apenas os direitos do indivíduo e do Estado. Ademais, a DUDH só reconhece os povos na medida em que esses resultam em Estados, mesmo entendendo que, quando a declaração foi adotada, na data de 1948, diversos povos, nações e comunidades não possuíam um Estado. Além disso, é interessante pensar que a DUDH não oferece proteção aos indivíduos no mundo em que estavam sujeitos à dominação coletiva e à sujeição coletiva. No caso dos povos indígenas, por exemplo, mais de 30 anos se passaram até que fosse reconhecida sua autodeterminação através da Declaração das Nações Unidas Sobre os Direitos dos Povos Indígenas, que foi aprovada na Assembleia Geral das Nações Unidas de 2007 (Santos & Chauí, 2014).
Contudo, antes da Declaração dos Povos Indígenas da ONU, a Organização Internacional do Trabalho (OIT) fez importantes esforços para que, em 1989, fosse aprovada a Convenção 169 que trata sobre os Povos Indígenas e Tribais, a que o Brasil foi um dos primeiros Estados a ratificar. A Convenção 169 é a primeira a dar voz aos direitos coletivos, que existem no sentido de minimizar ou proscrever as injustiças ou inseguranças dos indivíduos discriminados por serem o que são. (Santos & Chauí, 2014).
A Convenção 169 dispõe sobre matérias relacionadas à autodeterminação dos povos indígenas e tribais, sobre saúde, educação, trabalho, seguridade social, entre outros aspectos da vida indígena. No que tange aos aspectos de saúde, o Artigo 25 da Convenção 169 da OIT versa sobre o seguinte:
1. Os governos deverão zelar para que sejam colocados à disposição dos povos interessados serviços de saúde adequados ou proporcionar a esses povos os meios que lhes permitam organizar e prestar tais serviços sob a sua própria responsabilidade e controle, a fim de que possam gozar do nível máximo de saúde física e mental.
2. Os serviços de saúde deverão ser organizados, na medida do possível, em nível comunitário. Esses serviços deverão ser planejados e administrados em cooperação com os povos interessados e levar em conta as suas condições econômicas, geográficas, sociais e culturais, bem como os métodos de prevenção, práticas curativas e medicamentos tradicionais.
3. O sistema de assistência sanitária deverá dar preferência à formação e ao emprego de pessoal sanitário da comunidade local e se centrar no atendimento primário à saúde, mantendo ao mesmo tempo estreitos vínculos com os demais níveis de assistência sanitária.
4. A prestação desses serviços de saúde deverá ser coordenada com as demais medidas econômicas e culturais que sejam adotadas no país. (Organização Internacional do Trabalho [OIT], 1989, parágrafos 1,2,3,4).
Analisando o artigo supracitado, percebe-se a preocupação da Convenção 169 com a saúde indígena e com a manutenção da vida dos indivíduos. Entretanto, o documento esbarra na dificuldade brasileira tensionada entre a razão de Estado e a razão de direitos. Segundo Santos e Chauí (2014), essa tensão gera confrontos entre os direitos humanos e os interesses políticos. Em outras palavras, esse tensionamento refere-se ao reconhecimento ou não das violações massivas de direitos humanos, no caso dos indígenas a negação de uma saúde pública adequada nos termos da Constituição de 1988, do Estado Democrático de Direito e dos Tratados Internacionais que a Carta Magna brasileira acolhe.
Para além dessa tensão, os indígenas brasileiros sofrem com a dificuldade de serem reconhecidos como humanos, uma vez que não possuem as características brancas ocidentais. Assim, Santos e Chauí (2014) explicam que a humanidade possui um ponto de vista ocidental, capitalista e colonialista do que é ser humano. Esse pensamento é acompanhado pelo conceito de sub-humanidade, que pode ser aplicado a todo aquele que é diferente. Assim, tal diferenciação conduz à seguinte situação: nem todo aquele que é humano tem direitos garantidos no ideal ocidental de direitos humanos universais. Como consequência, a carga de colonialidade do "ser presente" no imaginário brasileiro não permite que indígenas, negros, ciganos, ribeirinhos, entre outros, sejam vistos como seres humanos, uma vez que possuem cor, costumes e tradições diferentes do ideal ocidental de raça superior. Nesse sentido, segundo Maldonado-Torres (2007), mortalidade e violação são características que estão escritas nas imagens e nos corpos coloniais. Pode-se compreender, assim, a dificuldade dos indígenas em conseguir que a sociedade se esforce para entender que a mortandade indígena, tanto no caso Covid-19, quanto em todos os outros casos que interferem em suas vidas, não devem ser considerados a partir do olhar da normalidade.
Os direitos humanos eurocêntricos são, segundo Santos e Chauí (2014), fundamentados no princípio da igualdade que faz surgir, assim, a pretensão de universalismo nos direitos humanos. Porém, esse ideal igualitário não pressupõe direitos sócio-econômicos-culturais, mas apenas igualdade jurídico política, ou seja, todos são iguais perante a lei. A noção de dever igualitário sócioeconômico- cultural aparece no debate dos direitos humanos muito mais tarde, tendo seu início quando grupos discriminados passaram a lutar não apenas pela inclusão, mas para que fosse colocado em debate quais critérios levavam a essa discriminação. Assim, a luta dos movimentos transformou-se em luta de reconhecimento e não mais de integração (Santos & Chauí, 2014).
Essa luta vem desde a DUDH e de seu reconhecimento do Estado e do indivíduo, em detrimento do reconhecimento da coletividade, como sugerem Santos e Chauí (2014). Logo, o desinteresse em relação à vida indígena e sua proteção durante a pandemia pode ser considerado um projeto brasileiro que possui sua origem na colonização, caracterizando-se como um genocídio, posto que possui todas as características para tal. Consoante Santos e Chauí (2014), o direito à autodeterminação, acolhido pela Constituição 1988, pode ser empregado apenas de maneira coletiva, atuando de modo que a insegurança e a injustiça que permeiam a realidade opressiva desse coletivo, seja diminuída. Todavia, em se tratando de povos indígenas brasileiros, a autodeterminação tem se constituído como um risco e como uma sinalização para o que o preconceito de governantes e população sejam direcionados a eles.
Consoante Santos (2012), a estrutura do Estado Liberal foi erguida a partir do domínio da elaboração das leis e do direito de aplicá-las dentro de seu território, colocando, assim, o direito em um patamar de direito estatal. Como consequência dessa ação, o direito tornou-se mais um objeto da regulação jurídica, deixando de lado sua premissa inicial de regulador e emancipador social, tornando um conflito a ideia preliminar do direito de emancipação com o que ele se tornaria.
Assim, o intuito de emancipação do direito, podendo pensar tanto em direitos humanos como em direitos que estão sob a égide de um Estado Democrático de Direito, esbarra no que Santos (2012, p. 134) chama de "globalização hegemônica neoliberal". Ou seja, esses direitos foram inspirados por uma percepção excludente da tradição ocidental que se impõe pelo sistema internacional. Nesse sentido, importa compreender que, a partir de seu âmago conservador, os direitos humanos ocidentais direcionam-se ao funcionamento e desenvolvimento do mercado, baseando, assim, suas necessidades jurídicas e judiciais. Dessa maneira, os povos indígenas estão fora do desenvolvimento do mercado financeiro e excluídos da percepção ocidental.
Em relação aos direitos humanos internacionais, embora o Brasil seja signatário de diversos tratados e convenções, sua aplicabilidade ainda se restringe ao Estado brasileiro e à importância que o Estado dá aos mecanismos internacionais de proteção aos direitos da dignidade humana. No caso dos indígenas brasileiros, existe não apenas uma negligência do Estado, mas também um descaso da sociedade em exigir a proteção destes povos. A sociedade brasileira vem passando por um processo de fragmentação desde o impeachment da presidente democraticamente eleita Dilma Roussef em 2016, que deu espaço para o surgimento de um fascismo social.
Segundo Santos (2012), o fascismo social pode ser entendido como um regime social e civilizacional. Isso quer dizer que, diferente do fascismo conhecido por ter predominado em alguns regimes políticos no século passado, esse novo fascismo caracteriza-se pelo sacrifício da democracia. Como consequência, as exigências do capitalismo tornam a democracia algo medíocre, de forma que esta pareça desnecessária e inconveniente frente aos planos de desenvolvimento encadeados pelo capitalismo liberal. Assim, pode-se entender que o fascismo social que permeia a sociedade brasileira seria um dos agravantes para o abandono dos povos indígenas no período pandêmico. Logo, a diferença existente entre o antigo regime fascista e o atual consiste no fato de que primeiro caracterizava-se por ser um regime político, enquanto o segundo caracteriza-se por ser um regime social e civilizacional.
Consoante Santos (2012), o fascismo social pode ser considerado pluralista no sentido de que sua produção se dá no seio da sociedade ao invés de ser produzida inicialmente pelo Estado. Um dos destaques do novo fascismo configura-se pela coexistência entre sociedade fascista e Estado democrático. Para tanto, Santos (2012) distingue o fascismo social em 4 fases: (1) o apartheid social; (2) o fascismo paraestatal; (3) o fascismo da insegurança; (4) fascismo financeiro.
Indo ao encontro das características apresentadas pelo Estatuto de Roma, as quatro fases do fascismo social são explicadas por Santos (2012) como apartheid social. Este pode ser entendido como o destacamento de isolamento de grupos excluídos através da divisão entre "zonas selvagens" e "zonas civilizadas". No sentido das zonas selvagens, atribuídas no conceito, pode-se entender as aldeias indígenas e seu isolamento dos grandes centros urbanos. Como consequência, Santos (2012) explica que as zonas civilizadas se convertem em regiões neofeudais, que promovem a segregação tanto em relação a regiões mais pobres da zona urbana, quanto em relação a regiões rurais. Esse apartheid social pode ser percebido na sociedade brasileira ante ao preconceito da população urbana com a forma de vida política e comunitária dos indígenas. No que se refere ao entendimento estatal, compreende-se que o Estado trabalha de maneira democrática e protetora nas áreas civilizadas; já nas áreas selvagens, atua como um Estado predador, na visão de Santos (2012), sem nenhum respeito pelo Estado de direito e sem sequer tentar esconder isso.
A segunda classe do fascismo social seria o fascismo paraestatal. Este se destaca pela forma com que o Estado, conduzido por atores sociais poderosos e fascistas, apropria-se de meios Estatais, como a coerção social e a regulação social, para neutralizar ações características do Estado democrático de direito. A terceira classe do fascismo social consiste na insegurança. Esta classe se destaca pela manipulação da insegurança para atingir pessoas e povos sociais vulneráveis, causando precariedades no trabalho, na moradia e na saúde desses grupos vulneráveis (Santos, 2012). Nas comunidades e aldeias indígenas brasileiras, as inseguranças do período pandêmico estão relacionadas não apenas à saúde, mas também à manutenção de suas florestas, suas terras e a integridade de seu povo.
A quarta classe do fascismo social refere-se ao fascismo financeiro, que se define por ser o controlador da economia e dos mercados financeiros, e, de acordo com Santos (2012), é a classe mais feroz do fascismo, uma vez que leva em consideração apenas o interesse dos detentores do capital. Estes, por sua vez, mostram-se interessados apenas em maximizar seus lucros. Nessa ordem, a desvantagem dos indígenas na luta contra o capital reflete, diretamente, nos interesses de quem detém os meios de produção. Assim, o conflito se destaca pela luta com o agronegócio e com o garimpo por terras, água e preservação. Nesse sentido, o abandono dos indígenas durante a pandemia reflete também o interesse desses grupos que produzem capital.
Em sua relação com os direitos humanos internacionais, esse fascismo social se define pelo impedimento e pelo desinteresse do cumprimento de tratados e convenções internacionais, uma vez que a principal característica do fascismo social é justamente a marcada desigualdade nas relações de poder e troca que, por assim dizer, concentram-se em formas de exclusão severas que podem ser consideradas potencialmente irreversíveis (Santos, 2012). Assim, entender a universalidade, a aplicação e a efetividade dos direitos humanos consiste em compreender não apenas seus efeitos enquanto universais, mas o quanto essa universalidade consegue chegar aos grupos mais atingidos pelas banalidades cotidianas, ingerências governamentais e fascismos sociais.
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O Brasil, enquanto Estado liberal, democrático de direito, tem como sua máxima o monopólio da criação e da aplicação do direito, além da recepção da legislação internacional enquanto signatário de tratados e convenções internacionais. Legislações internacionais de direitos humanos, como a DUDH, o Estatuto de Roma e a Convenção 169 da OIT, foram recepcionados pela legislação interna ao serem assinados e, de acordo com a forma de governo instituída pela democracia, são parte da legislação interna e estão estabilizados pelo Estado Democrático de Direito a partir de leis e políticas públicas brasileiras.
Assim, trazer à tona os entendimentos democráticos de Dahl (2001), o Estatuto de Roma e a Convenção 169 da OIT possibilitou situar os direitos dos indígenas brasileiros frente à democracia e aos direitos humanos internacionais, no sentido de compreender de que maneira o Ocidente produziu e produz normas que se encaixam na realidade de países periféricos que possuem uma população amplamente heterogênea. Constitucionalmente, o Estado brasileiro cumpre todas as demandas dispostas não apenas pela teoria democrática de Dahl, mas pelas convenções internacionais de recepção de tratados. Contudo, no sentido material, as dificuldades impostas às aplicações de tais demandas podem ser consideradas reflexos de uma nação marcada pela desigualdade social de sua herança colonial.
Nesse sentido, ao analisar a aplicação dos direitos ditos democráticos e dos direitos humanos no Brasil, verificou-se uma debilidade no que tange a suas aplicações universalistas. Isso se deu a partir da leitura e da narrativa das notícias apresentadas do descaso com a vida indígena no período da pandemia, bem como do entendimento a partir da teoria decolonial do indígena como cidadão de segunda classe e do direito como sendo branco, ocidental, heterossexual, cisgênero e masculinizado. Como consequência, entende-se que a universalização dos direitos compreende apenas a parcela da população brasileira que, pela cor de sua pele, nasce signatária desses direitos.
Santos (1997) afirma que o entendimento que sempre predominou na aplicação dos direitos humanos faz com que seja impossível que esses direitos se tornem uma linguagem habitual da defesa da dignidade humana nas diferentes regiões do globo. Isto se dá devido à simbolização pouco cosmopolita com que esses direitos são trabalhados, uma vez que sua aplicação não se vincula a uma rede de línguas nativas de emancipação - muito pelo contrário, está sempre presente no "mainstream" idiomático do debate mais sofisticado do direito ocidental.
Logo, o que seria um modelo de direitos emancipador e supressor de desigualdades tornouse apenas uma questão particularmente ocidental, pois seus valores se baseiam unicamente nos valores ocidentais e, de acordo com Santos (1997), sua aplicação reflete um globalismo localizado que ignora as diferenças da natureza humana e se sobrepõe como superior. Em outras palavras, os direitos humanos universais difundiram-se a partir dos interesses capitalistas dos Estados capitalistas hegemônicos.
A principal temática em torno do debate é a de que democracia e direitos humanos se tornaram terreno fértil para angariar votos e discutir direitos. Todavia, a aplicabilidade desses direitos ainda está voltada para as zonas azuis referidas por O'Donnel e Wolfson (1993), enquanto as áreas marrons sofrem mais diretamente os efeitos da colonialidade que perduram mesmo após o fim da colonização. A grande característica ocidental dominante, entre muitos exemplos, pode ser identificada na elaboração da Declaração Universal de 1948, que, de acordo com Santos (1997), deu-se sem a maioria dos povos do mundo.
Dessa forma, espera-se, com este trabalho, contribuir para o campo de estudos não ocidentais que utilizam da crítica aos direitos humanos e à democracia ocidental como forma de construir um pensamento periférico voltado para as necessidades e debilidades da periferia do sistema. Além disso, a expectativa é demonstrar a ineficácia desses direitos no que tange à proteção de etnias brasileiras. Como consequência, espera-se ampliar a crítica os estudos a respeito da democracia e dos direitos humanos ocidentais e contribuir para o debate da proteção das minorias.
SOBRE OS AUTORES
D. CONTE
Daniel Conte é Bolsista de Produtividade em Pesquisa do CNPq e Coordenador do Programa de Pós-graduação em Processos e Manifestações Culturais da Universidade Feevale. Doutor em Literatura Brasileira, Portuguesa e Lusoafricana e Mestre em Literatura Comparada pela UFRGS. Professor permanente e pesquisador da Universidade Feevale, atuando no PPG em Processos e Manifestações Culturais e no Mestrado Profissional em Indústria Criativa. E professor Visitante no PPG-Letras da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, na linha de pesquisa Pós-colonialismo e identidades e lidera, juntamente com o Dr. Ricardo Postal, o grupo SUTRA - Subalternidades, Transculturalidade e Perspectivas Decoloniais do CNPq.
ORCID ID: https://orcid.org/0000-0002-4251-3299
E-mail: [email protected]
T. V. PAULA
Doutoranda em Ciência Política pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Mestra e Bacharela em Relações Internacionais pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Pesquisa, prioritariamente, gênero e feminismos com ênfase em movimentos indígenas, direitos humanos, religião e organizações internacionais, trabalhando a questão da mulher indígena e da mulher periférica, a partir das lentes da teoria decolonial, da teoria feminista decolonial e do pós-colonialismo.
ORCID ID: https://orcid.org/0000-0002-9524-4141
E-mail: [email protected]
Editor(a) Responsável: Prof . Francinaide de Lima Silva Nascimento
Pareceristas Ad Hoc: Adriana Aparecida Souza e Lenina Lopes Soares Silva
Recebido: 23 de novembro de 2020
Aceito: 13 de outubro de 2021
Publicado: 13 de julho de 2022
1 Dados contabilizados até o dia 29 de setembro de 2020.
2 Idem.
3 Dados contabilizados até o dia 29 de setembro de 2020.
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COMO CITAR ESTE ARTIGO:
Conte, D., & Paula, T. V. de. (2022). O GENOCÍDIO INDÍGENA NO BRASIL: O COVID-19 e a Herança Colonial. HOLOS, 2, 1-18. Recuperado de https://www2.ifrn.edu.br/ojs/index.php/HOLOS/article/view/11583.
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Abstract
Submetido 23/11/2020 - Aceito 13/10/2021 ABSTRACT The objective of this work is to present the results of an investigation that deals with a critique in terms of decolonial theory to the issue of universal human rights and Western democracy in the protection of Brazilian indigenous peoples during the initial period of the Covid19 pandemic in Brazil. To this end, a wide bibliographic review on the subjects of human rights, democracy, coloniality of being and coloniality of gender was utilized, as well as a qualitative analysis of data collected through indigenous rights organizations and newspapers specialized on the subject. The results point to a deficiency in universal human rights and Western democracy in being effective regarding ethnic minorities present in an extensively heterogeneous state like Brazil. [...]this research sought to point out the importance of peripheral studies aimed at understanding the peripheral reality in detriment of the Center/West reality, since it provides evidence of the difficulty of fitting the reality of the global South into bureaucratic legislation apparatus designed for populations from the North.
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1 Universidade Feevale
2 Universidade Federal do Rio Grande do Sul