* RESUMO: 0 objetivo principal deste trabalho é discutir a possibilidade de investigaçâo da realidade neurofisiológica da sintaxe das línguas naturais. Para que tal estudo seja possível, lingüistas e neurocientistas teriam que achar urna base epistemológica comum. Entretanto, a visäo prevalente em neurociência, que assume aprendizado associativo por conelagäo, näo se combina bem com a visäo internalista da sintaxe, tomada por lingüistas gerativos. Em virtude disso, este trabalho discute as bases epistemológicas das teorias lingüísticas mais aceitas atualmente, servindo de guia para neurocientistas que queiram investigar o processamento da linguagem pelo cérebro. Por outro lado, o artigo discute pesquisas desenvolvidas pela neurociência da linguagem para que os lingüistas possam avaliar os problemas que surgem na intersecgäo das duas áreas. Conclui-se que qualquer pesquisador deve ter um entendimiento claro dessas questóes epistemológicas antes de montar qualquer experimento sobre a linguagem; e que qualquer conclusáo acerca da realidade neural da sintaxe é, no presente, difícil de ser mantida.
* PALAVRAS-CHAVE: Lingüística. Cogniçâo. Neurociência. Sintaxe.
Preámbulo: objetivos
Este trabalho tem dois objetivos principáis. Por um lado, o artigo discute as bases epistemológicas das teorias mais representativas da lingüística atual, servindo assim como um guia para pesquisadores de outras áreas interessados em responder como a lingua é processada pelo cérebro; como é adquirida por falantes; em que medida o ambiente extemo determina a competencia final de um talante adulto; e outras questóes. Por outro lado, discute alguns trabalhos recentes da neurociência da linguagem, servindo assim como um guia para lingüistas interessados em investigar a realidade neurofisiológica da sintaxe. Dessa maneira, este estudo espera contribuir para urna possível colaboraçâo entre lingüistas e neurocientistas na elaboraçâo de experimentos.
A seçâo 2 introduz os fatos mentais como objeto de estudo científico e a relaçâo entre as diversas ciencias que se ocupam desses fatos. Introduz também a tensäo entre a perspectiva nativista e a perspectiva empiricista, que incide sobre os estudos da cogniçâo humana e que será um tema recórreme neste trabalho. A seçâo 3 procura descrever o "fenómeno lingüístico", a dificuldade de sua delimitaçâo e a tensäo entre urna perspectiva internalista e urna extemalista quanto ao objeto de estudo da lingüística, outro tema recórreme neste trabalho. A seçâo 4 retoma o problema da delimitaçâo do objeto de estudo da lingüística e discute sua formulaçâo em Saussure e Chomsky, com o intuito de discutir as bases epistemológicas das teorias atuais que se embasam no trabalho desses grandes pesquisadores. A seçâo 5 discute alguns trabalhos desenvolvidos pela neurociência da linguagem e a sua interpretaçâo quanto ás tensöes nativismo vs. empiricismo e intemalismo vs. extemalismo. A seçâo 6 traz à tona urna teoria lingüística que parece se adequar melhor à visäo prevalente na neurocióncia, a lingüística cognitiva, e discute alguns problemas dessa teoria. Finalmente, a seçâo 7 concluí o trabalho.
Introduçâo: o estudo da mente
O estudo da linguagem humana está intrínsecamente ligado ao estudo da mente e ao estudo da cogniçâo, que é parte do primeiro, apesar disso näo parecer obvio a todo lingüista. A principio, a mente é estudada pela psicología, mas a antropología, quando estuda as sociedades, os ritos e os costumes, também estuda fatos essencialmente mentais. Lévi-Strauss (1949), por exemplo, entende a cultura de um grupo como um sistema compartilhado e estruturado por principios, o que se assemelha bastante com a visäo de sistema lingüístico proposta por Saussure (1971) em seu Curso de lingüística geral, como se verá adiante. De fato, as relaçôes entre as teorias de Lévi-Strauss e as de Saussure e a lingüística estruturalista säo bem conhecidas. As mesmas tensöes estäo presentes no trabalho de ambos: tanto a lingua como a cultura podem ser tomadas como objetos internos ou extemos aos individuos. Se tomada numa perspectiva internalista, a existéncia de principios universais que organizam as sociedades e as línguas levanta a questäo sobre a existéncia de principios gérais que organizam a mente humana. A psicología provavelmente diría que há realmente principios universais que organizam o pensamento e as emoçôes humanas (ambos fatos mentais). Os principios que organizam o pensamento, entretanto, foram mais estudados até hoje pela filosofía (pela lógica e pela filosofía da mente). O fato de que a lingüística teria muito a contribuir na revelaçâo desses principios que norteiam o pensamento e a cogniçâo humana leva Chomsky (2000a) e outros (CHOMSKY, 2011; CHOMSKY; BERWICK, no prelo), por exemplo, a encararem as línguas como objetos de estudo da psicología e, em última análise, da biología.
O estudo da cogniçâo é urna parte crucial do estudo da mente, que nâo é um objeto estático e se transforma de acordo com a experiencia. Novamente, a psicologia abraça esses objetos de estudo. Numa perspectiva metateórica, a psicologia deveria também explicar o estado inicial da mente.1 No contexto deste trabalho, a questâo mais crucial é se o ser humano nasce urna tabula rasa ou já vem equipado por instintos e predisposiçôes. Se a segunda possibilidade for verdadeira, o que parece consensual, há de se descrever como essas predisposiçôes interagem corn a experiencia para produzir um produto final (a mente de um individuo adulto). Seria interessante saber, principalmente, em que medida interagem. Quanto do conhecimento de Pedro advém dessas predisposiçôes inatas e quanto da interaçâo com o mundo exterior, na aprendizagem. O exemplo da aprendizagem tem de ser tomado aqui de urna maneira ampia: desde que nascemos, aprendemos urna lingua, matemática, costumes, crenças, e inúmeras outras coisas. Quanto a crenças, pode-se objetar que nâo as aprendemos, nós as herdamos ou as absorvemos (ou as criamos novas). Para a linguagem, podese objetar o mesmo: a lingua é de alguma forma absorvida (dada pelo ambiente social) e nâo aprendida. Isso toma ainda mais importante que, para cada urn desses "aprendizados", explique-se como acontecem: quanto do aprendizado se deve a recursos genéticamente fornecidos a nós e quanto se deve a fatores externos.
O fato de a lingua ser absorvida (ou adquirida, como se diz comumente em lingüística) ou "depositada no cérebro" do individuo, como disse Saussure, toma a possibilidade de urna predisposiçâo interna ainda mais plausível. Mesmo o aprendizado de matemática, que poderia parecer a priori um produto exclusivo da experiencia do individuo, pode ser considerado como envolvendo facilidades naturais do ser humano. Chomsky (em PIATTELLI-PALMARINI, 1980, p.321) considera "[...] a habilidade humana de lidar com propriedades profundas do sistema numérico." e supôe que essa faculdade seja "genéticamente determinada para os humanos." Na verdade, autores como Chomsky e Fodor (1975), entre outros, tomam como fato autoevidente que nâo se pode aprender nada, a menos que alguns "preconceitos" inatos estejam disponíveis. Hilary Putnam (apud PIATTELLI-PALMARINI, 1980, p.301) concorda que "[...] é verdade que nós nâo podemos aprender como aprender a menos que nós tenhamos alguma predisposiçâo para aprender: nós precisamos ter alguma predisposiçâo para aprender que nâo seja ela mesma aprendida, ou teríamos um regresso infinito."
Entre Putnam e Chomsky, o debate gira em tomo de explicar o conhecimento atingido por um individuo normal munido apenas de "inteligencia", ou munido de vários mecanismos especializados. Putnam argumenta contra esses mecanismos especializados e assume um mínimo de naturismo (que parece inescapável, como discutido acima): "So far I have assumed that there is such a thing as general intelligence; that is, that whatever else our innate cognitive repertoire may include, it must include multipurpose learning strategies, heuristics, and so forth " (PUTMAN, 2011, p.403). A visâo oposta é advogada pelo neurocientista cognitivista C. R. Gallistel, mencionado por Chomsky (2002, p.84-85) nesta passagem:
[Gallistel holds] the substantive theory that in all animals, learning is based on specialized mechanisms, "instincts to learn "in speciñc ways; what Tinbergen called "innate dispositions to learn." These "learning mechanisms" can be regarded as "organs within the brain [that] are neural circuits whose structure enables them to perform one particular kind of computation, " as they do more or less reflexively apart from "extremely hostile environments." Human language acquisition is instinctive in this sense, based on a specialized "language organ."[...] "To imagine that there exists a general purpose learning mechanism in addition to all these problem-speciñc learning mechanisms [...] is like trying to imagine the structure of a general purpose organ, the organ that takes care of problems not taken care of by adaptively specialized organs like the liver, the kidney, the heart and the lungs, " or a "general purpose sensory organ, which solves the problem of sensing" for the cases not handled by the eye, the ear, and other specialized sensory organs. Nothing like that is known in biology.
Se, por um lado, a lingüística relaciona-se ao estudo da mente, com todas as suas subdivisöes; a mente e, por conseguíate, a linguagem, também teriam de ser explicadas numa dimensáo fisiológica e biológica. Nesse sentido, queremos saber: como a lingua (e outros fatos mentais) se instancia no cérebro por meio da transmissäo de pulsos elétricos entre células nervosas; como e por que a evoluçâo da nossa espécie culminou apresentando os fatos desta maneira e näo daquela. Sobre a primeira questäo, Chomsky (2002) é pouco otimista e sua posiçâo contrasta com duas visöes muito difundidas em neurociência. A posiçâo chomskyana, que é de alguma forma ratificada por este trabalho, é a de que o nosso "[...] entendimiento atual é bem insuficiente para deitar as bases de uma unificaçâo entre as ciencias do cérebro e as facilidades mentais mais elevadas, a linguagem sendo urna délas."2 (CHOMSKY, 2002, p.61, traduçâo nossa). As posiçôes contrastantes em neuro ciencias säo: o modelo computacional da mente (BLOCK, 1990; JOHNSON-LAIRD, 1988) e as correntes que tomam a linguagem como um objeto extra-humano (presentes, segundo Chomsky, näo só na neurociência, como também na filosofía da mente e na etologia) (DEACON, 1998). Chomsky salienta que a ideia (atribuida ao neurocientista Vemon Mountcastle) de que "[...] as coisas mentais e, de fato, as mentes, säo propriedades emergentes dos cérebros."3 (CHOMSKY, 2002, p.55, traduçâo nossa), mais do que apresentar uma soluçâo para o problema, simplesmente reitera o que já era sabido pelos filósofos do sáculo XVIII, para quem as propriedades "chamadas mentais" säo "[...] o resultado de uma estrutura orgánica" do cérebro e "do sistema nervoso humano" em geral (CHOMSKY, 2002, p.70, traduçâo nossa).
Sobre a segunda questäo, há uma vasta literatura sobre a genese da linguagem incluindo algumas visóes explícitas de Chomsky (HAUSER; CHOMSKY; FITCH, 2002), o quai tem uma visâo saltacional, em que, apôs modificaçôes auxiliares (e independentes da linguagem) terem acontecido na linhagem humana, a linguagem (em verdade, a sintaxe) surge de uma modificaçâo genética pequeña, mas com grandes consequências. Derek Bickerton (1990,1995) descreve um possível cenário em que, numa primeira etapa, o léxico humano é criado e aumentado impulsionado pelo uso de uma protolíngua pelos homens primitivos, e esse léxico fornece um campo fértil para o nascimento, num segundo momento, da sintaxe (que resulta ñas línguas modernas).
Além de lidar com esses fatos essencialmente lingüísticos, a teoria da mente ainda tem que lidar com outros dois objetos que näo se ligam täo diretamente à linguagem. Um é conhecido como o "difícil problema da consciéncia" (CHURCHLAND, 1984; SHEAR, 1997; CHALMERS, 1995; DENNETT, 1991,2003); o outro constituí a atençâo. Uma das metáforas mais sedutoras e produtivas em neurociência é tomar o cérebro como um computador, que executa subrotinas "aprendidas" através da experiencia (talvez por meio de mecanismos inatos especializados). Para alguns pesquisadores, näo seria exagero comparar a lingua com urna dessas sub-rotinas executadas pelo cérebro. O que parece difícil de explicar é o fato de esse computador ser consciente de si mesmo. Um computador, quando executa sub-rotinas, näo tem consciéncia de estar fazendo isso, nem pode refletir sobre aquilo que executa. Apesar de toda reflexäo envolver linguagem, a consciéncia de estar agora sentado näo é propriamente lingüística, até o momento em que eu pensó (desloco minha atençâo) sobre estar sentado. Consciéncia e atençâo parecem ser as faculdades mais elevadas, acima até mesmo da linguagem. Säo elas que me permitem pensar sobre a palestra que estou indo dar, enquanto consciente de estar dirigindo meu carro, da distáncia dos outros canos do meu, do semáforo que está verde, e de uma série de outros fatos; assim como também o que me permite abandonar esses pensamentos quando uma bola atravessa o caminho em frente ao cano. De repente, o ato de dirigir, que cozinhava numa consciéncia em segundo plano (sem atençâo), pula para uma consciéncia plena (corn atençâo), que me permite frear rápidamente na expectativa de que alguma criança esteja correndo atrás da bola (BICKERTON, 1995; JACKENDOFF, 2002). Obviamente, näo temos a menor ideia de como esses fenómenos acontecem na dimensäo neurológica, apesar de vivenciarmos esses fatos na esfera mental cotidianamente. Derek Bickerton (1995) defende que é a linguagem que possibilita aos humanos usufruir desse tipo de consciencia reflexiva que falta as máquinas e aos animais. As seçôes que se seguem buscam, portanto, localizar a lingüística (e seu objeto de estudo) em meio a todos esses fatos mentais.
A discussâo que se segue jamais poderia fazer jus, ou sequer mencionar, todos os aspectos e questóes relacionadas a todos esses assuntos. Iremos discutir mais propriamente o equilibrio entre pressupostos nativistas e empiricistas em très grandes conentes lingüísticas: urna que parte de Saussure e é conhecida como estruturalismo; urna que parte de Chomsky e é conhecida como gerativismo; e outra que parte de gerativistas dissidentes (George Lakoff e Charles Fillmore, entre outros) e é conhecida como cognitivismo. O estruturalismo toma a lingua e os discursos produzidos com ela como objetos externos aos individuos e, portanto, näo tomam partido sobre o quanto é inato e o quanto é adquirido (a questäo näo é pertinente e nem mesmo surge nos trabalhos dessa linha teórica). 0 gerativismo, grosso modo, parte do pressuposto de que há um componente inato especializado que auxilia na aquisiçâo de urna ou mais línguas. O cognitivismo, por sua vez, toma como inato apenas estratégias gérais de aprendizagem e computaçâo cujo propósito é múltiplo, ou seja, näo especializadas para a linguagem. Deve ser ressaltado que essa teoria propóe que esses principios gérais de computaçâo podem ser verificados por fatos lingüísticos, mas atestam sobre o funcionamiento do pensamento. A hipótese näo é trivial, como será discutido adiante.
A seçâo seguinte discute o estruturalismo descendente de Saussure e os fatos da linguagem. Notamos, novamente, que, enquanto discutimos Saussure, queremos discutir as bases epistemológicas tomadas pelas teorias que se fundam na ideia de lingua como sistema, fato social, e näo propriamente o trabalho daquele autor em particular. A semántica estrutural e a semiótica greimasiana, que decone daquela, por exemplo, é urna teoria da significaçâo que deixou de lado a relaçâo entre a linguagem e o pensamento em virtude de tomar a lingua como produto histórico-social. A discussâo que segue mostra que essa tomada de posiçâo näo pode ser atribuida a Saussure e que a relaçâo citada näo está (ou näo deveria estar em principio) fora do alcance do estruturalismo.
O fenómeno lingüístico
Saussure se referia ao fenómeno lingüístico como o "conjunto heteróclito dos fatos da linguagem". A importância (e a extensäo) desse fenómeno fica destacada quando se utiliza um exercício de imaginaçâo muito usado por Chomsky (CHOMSKY, 2000a, 2000b; HAUSER; CHOMSKY; FITCH, 2002; PIATTELLIPALMARINI, 1980; entre outros):
If a Martian graced our planet, it would be struck by one remarkable similarity among Earth's living creatures and a key difference. Concerning similarity, it would note that all living things are designed on the basis of highly conserved developmental systems that read an (almost) universal language encoded in DNA base pairs. [...] If our Martian naturalist were meticulous, it might note that the faculty mediating human communication appears remarkably different horn that of other living creatures. (HAUSER; CHOMSKY; FITCH, 2002, p.1569).
Um cientista marciano meticuloso poderia concluir que, diferentemente de outros animais, que podem comunicar diversas coisas de fato, o ser humano possui a capacidade de transmitir seus pensamentos a outros individuos da espécie. Nenhum outro animal do planeta sequer se aproxima de tal façanha: ser capaz de traduzir seu pensamento em urna linguagem que possa ser transmitida por ondas sonoras (ou por gestos). Os animais näo possuem linguagem (no sentido usado aqui), exatamente porque ela näo é um sistema de comunicaçâo (que os animais possuem, dos mais variados tipos), mas um sistema de expressäo do pensamento. Linguagem e pensamento estäo intimamente ligados. Apesar de nos parecer correto dizer que um animal relativamente complexo (meu cäo, por exemplo) pensa, mesmo que de urna forma rudimentär, há urna diferença qualitativa entre o pensamento dos humanos e o dos outros animais (o que Bickerton (1995) chama de consciencia 1 e consciencia 2).
A capacidade, por exemplo, de considerar, discutir e informar outros individuos sobre eventos que acontecem em espaços ou pontos no tempo remotos é urna capacidade únicamente humana. O único sistema de comunicaçâo do reino animal que parece ter algo remotamente similar a essa propriedade de deslocamento (no espaço, embora näo no tempo) é a dança usada pelas abelhas para indicar às outras abelhas da colmeia a localizaçâo, o tipo e a quantidade de alimentos. É importante notar que näo há deslocamento temporal (urna abelha nunca dança sobre a comida de ontem) e que a amplitude de representaçâo do mundo é restrita (a dança de urna abelha é sempre sobre comida, sua localizaçâo, tipo e quantidade), enquanto a linguagem é irrestrita em ambos os sentidos. O termo linguagem, portanto, destina-se exclusivamente aos sistemas de representaçâo humanos. Num sentido ampio, o termo abarca sistemas de comunicaçâo: a música, o código morse, etc.); num sentido mais estrito, a linguagem (o mais apropriado seria dizer a faculdade da linguagem) abarca os sistemas lingüísticos (verbais ou de sinais), que säo sistemas de representaçâo do pensamento, como discutido.
Quando Saussure se refere ao "conjunto heteróclito dos fatos da linguagem", o que ele tem em mente é exatamente o processo pelo quai o pensamento de um individuo A é transmitido a um individuo B por meio de ondas sonoras.4 Esse processo envolve, necessariamente, uma espécie de traduçâo do pensamento em estmturas lingüísticas; a traduçâo dessas estmturas em comandos motores (que movimentam os músculos); a recepçâo do som pelo outro individuo e uma traduçâo reversa para chegar finalmente ao significado daquele som produzido por A. Para estudar esse fenómeno notável, feriamos de apelar a um grupo (relativamente grande) de cientistas marcianos: psicólogos, neurocientistas, biólogos, lingüistas, antropólogos. Entretanto, Saussure parece incluir no conjunto de fatos da linguagem ainda mais elementos. Quando se indaga sobre uma ciencia geral dos sistemas de signos, a semiología, Saussure incluí também como objeto de interesse científico os ritos e os costumes sociais.
Saussure escolhe estudar uma parte desse fenómeno complexo de traduçâo do pensamento: a lingua (o código social de signos que possibilita todo o processo), em virtude de ser um objeto de estudo homogéneo e estável. Entretanto, näo se deve concluir que o pai da lingüística desprezava os outros componentes do fenómeno lingüístico. Isso se verá corn mais detalhes na seçâo seguinte.
A fábula do marciano coloca o problema numa perspectiva didática. O marciano pode recortar teóricamente o sistema lingüístico e os textos produzidos por esses animais, os humanos, e estudar esses objetos separadamente; mas o marciano poderia também se perguntar sobre como o ser humano pensa e como esse pensar se relaciona com o comportamiento (o agir) e com a própria linguagem. O marciano notaría que a propriedade principal desses "textos" (que podem consistir de apenas uma frase ou expressâo) é conter um significado. O estudo da significaçâo, portanto, está na base de qualquer estudo sobre a linguagem, a mente ou o pensamento, e lingüistas e filósofos já escreveram muito sobre isso. O estudo da significaçâo abre as portas para outras questóes fundamentáis: como o ser humano constrói um sistema de crenças sobre o mundo exterior e o mundo interior? Como o sistema lingüístico influí, modifica, constrói esse sistema de crenças, ou, dito de outro modo, o sistema lingüístico influencia de alguma forma na visäo de mundo do individuo? Até hoje, a lingüística apenas arranhou a superficie dessas questóes.
Uma tese promissora nesse contexto manteria que, se o homem produz significaçâo a partir da realidade exterior, estudando a realidade exterior e como ela é interpretada pelo homem, estaríamos também estudando um processo mental de construçâo da realidade (uma realidade significante). A base dessa tese é o fato de que a realidade existe para o ser humano na medida em que ele pode reconstituí-la por meio dos sentidos e interpretar um significado nesse percepto construido. A estruturaçâo da realidade para o homem é essencialmente lingüística. O homem olha para o mundo e vé mesas, cachimbos e árvores, quando na verdade o que existem säo objetos que emanam luz, que tém uma certa proporçâo e um certo formato. Num sentido, näo existem cachimbos (nem árvores) no mundo real. O que existem säo objetos construidos pelo homem, que säo interpretados como cachimbos e objetos naturais dos mais variados e que säo agrupados pelo homem em classes como árvore, arbusto, etc. Alguém que nunca viu um cachimbo e näo tem na sua lingua urna palavra para cachimbo veria apenas um objeto, e poderia atribuir a esse objeto usos inusitados (como bâter na cabeça das pessoas ou levar comida à boca). 0 mundo exterior é o mesmo, mas as interpretaçôes sobre esse mundo variam de individuo para individuo e isso se deve em grande parte à lingua. Esse é um caráter cultural da lingua.
A lingüística, tradicionalmente, estuda o sistema que estrutura a significaçâo produzida pelo homem, deixando a interpretaçâo do mundo real para outras áreas. Entretanto, a construçâo do mundo mental (que inclui urna representaçâo do mundo externo) é essencialmente lingüística: a partir de um certo cenário (e motivado por urna comunidade humana) Pedro constrói o significado de cachimbo. Cachimbo passa entäo a fazer parte da realidade de Pedro. Nesse sentido, os objetos säo o resultado das instanciaçôes5 feitas pelos humanos dos conceitos e, de certa forma, representam os conceitos. Do mesmo modo que um som, que compöe um enunciado, é, de certa maneira, urna representaçâo, ou urna instância de urna unidade abstrata que é o fonema, os objetos instanciam e representam os conceitos. O som pode variar bastante (incluindo, às vezes, sons completamente diferentes que representam a mesma unidade fonológica), mas a interpretaçâo continua constante. O mesmo se dá com árvores e cachimbos, ou seja, forma, cor e uso dos objetos podem variar bastante, mas o significado continua constante.
O que se pode concluir por hora é que o objeto de estudo saussureano é um recorte teórico que possibilita o estudo de um processo täo extenso que pode ser estudado ao mesmo tempo pela psicología, fisiologia, antropología, biologia, sociologia, etc., como se verá corn mais detalhe na seçâo a seguir. O delineamento de um objeto de estudo, entretanto, näo deve impedir ou sombrear o delineamento de outra parte desse grande processo da linguagem. Ou seja, as teorias que tomam o objeto de estudo saussureano e discutem, principalmente, a significaçâo näo deveriam ser tomadas como irrelevantes corn relaçâo ao estudo da mente. Assim, se a significaçâo é bem definida em alguma teoria lingüística numa perspectiva externalista, isso deve ser usado para que se explique como a significaçâo acontece numa perspectiva internalista, que ainda parece muito pouco definida. Retomamos essas questóes na seçâo seguinte.
O objeto da lingüística: de Saussure a Chomsky
Em um episodio de um señado cómico daTV británica, um chef de cozinha está servindo bifes aos comensais, enquanto sua ajudante serve o acompanhamento. Num certo momento, a ajudante (marcada abaixo como G, de garata) pergunta ao chef (marcado C) o que a palavra steak significa. O diálogo está transcrito abaixo e esse trecho do programa pode ser visto no site YouTube:
G: Chef, what does steak mean ?
C: Pardon?
G: What does steak mean ?
C: (showing a piece of meat) This is steak.
G: Yes, but what does it actually mean, the word?
C: Well, it's a kind of meat, isn't it?
G: Not always.
C: Hum?
G: Well, you've gotñsh steaks, haven't you?
C: Okay, good point.
G: Salmon steaks.
C:As I say...
G: Wooden stakes.
C: Completely different type of steak, it's spelled...
G: High stakes.
C: Right, well, that's completely different...
G: Stake through the heart.
C: No, it's still...
G: Stake and Ale pie.
C: Well, okay now we're back to the first one, which is clearly meat.
G: But what does it mean ?
C: (hanging the piece of meat in front of the girl's face and yelling) It means THIS! THIS IS STEAK!
Apesar de a garata confundir duas palavras homófonas (steak e stake), o que em parte produz a graça do sketch, ela está certa em nao se contentar com a explicaçâo dada pelo chef. Obviamente, o significado da palavra steak nao é aquele pedaço de carne em particular que o chef está mostrando. Quando o chef mostra o pedaço de carne para a garota, ele está exemplificando um uso ou urna referencia da palavra steak, mas nao explicando o que a palavra significa. Urn steak é geralmente um pedaço de came cortada perpendicularmente à fibra da came (no caso de came bovina) ou perpendicularmente à espinha (no caso de peixe). Nesse sentido, steak se oporia a fillet (no caso de came de peixe). Entretanto, a carne também pode estar moída, maniendo o formato de um bife (no caso de Salisbury steak e hamburguer steak), ou näo (como no steak tartar). A came também pode estar enrolada e cozida {swiss steak) ou desfiada dentro de urna torta [steak and ale pie), o que mostra que steak näo pode ser simplesmente definido em relaçâo à direçâo do corte da came ou um formato específico. O significado de steak, portanto, parece envolver näo só a direçâo do corte mas também um formato prototípico, entretanto ambos critérios podem estar ausentes. Pode-se dizer que, prototipicamente, steak se refere à came bovina (urna vez que outros usos devem ser marcados explicitamente, como no caso de ñsh steak), tem o formato de um bife, etc. Entretanto, há objetos no mundo que, apesar de näo corresponderem ao steak prototípico, podem ser chamados de steak.6
A posiçâo tomada pelo chef, ou seja, a de tomar a referencia da palavra como seu significado é praticamente a mesma das teorias conhecidas como semánticas formais (MONTAGUE, 1974; HEIM; KRATZER, 1998). Nessas teorias, baseadas principalmente na distinçâo fregueana entre sentido e referencia, o significado de steak equivale ao conjunto de objetos (reais ou imaginários) que podem ser caracterizados como (chamados de) steak. Essas säo, portanto, teorias que tomam o significado numa perspectiva externalista: o significado das unidades lingüísticas é dado pelos objetos (reais ou imaginários) designados pelo termo e, portanto, é externo à linguagem. Dizendo de outro modo, a significaçâo está no mundo ou, pelo menos, na relaçâo entre a linguagem e o mundo. A posiçâo tomada pela garata, por sua vez, é intemalista no sentido que ela procura definir um significado que existe internamente à linguagem, dentro de um sistema lingüístico de significados relacionados. Esse significado intemo à lingua é geralmente chamado de conceito (desde, pelo menos, Saussure (1971)). O conceito de steak, por exemplo, terá de ser maleável o suficiente para abarcar o significado de beefsteak, ñshsteak, steak tartar e steak and ale pie] e, considerado internamente à lingua, será definido por suas relaçôes sintagmáticas e paradigmáticas com outros conceitos.7
Entretanto, se Saussure era um intemalista quando à semántica, era também um externalista corn relaçâo à lingua, o objeto de estudo da lingüística. O valor de um signo (que abarca seu significado) só pode ser dado internamente à lingua pois depende da rede de relaçôes internas ao sistema. Bife e steak, por exemplo, podem ter um significado aproximado, mas tém valores bem diferentes: eu näo posso (em portugués) comer um bife de peixe, nem fazer urna torta de bife. A lingua, por outro lado, é tomada por Saussure como algo externo ao individuo (falante), como pode ser comprovado nesta passagem:
[A Lingua] nao se confunde com a linguagem; é somente urna parte determinada, essencial déla, indubitavelmente. É, ao mesmo tempo, um produto social da faculdade de linguagem e um conjunto de convençôes necessárias, adotadas pelo corpo social para permitir o exercício dessa faculdade nos individuos. [...] é a parte social da linguagem, exterior ao individuo, que, por si só, nao pode nem criála nem modificá-la; ela näo existe senäo em virtude duma espécie de contrato estabelecido entre os membros de urna comunidade. (SAUSSURE, 1971, p.17 e p.22).
É importante que se entenda porque Saussure assim define a lingua e porque toma esse objeto em particular (dentre tantos outros) como o objeto de estudo da lingüística. É sabido, através do seu Curso de lingüística gérai, que Saussure se preocupava corn a relagäo entre linguagem e pensamento. Entretanto, no começo do século XX, era impossível pretender explicar, ou mesmo estudar científicamente todo o conjunto (heteróclito, segundo Saussure) dos fatos da linguagem (que envolve fenómenos inteiramente psíquicos, outros inteiramente fisiológicos, outros físicos, etc.). Dada essa impossibilidade, Saussure (1971, p.21) define um objeto concreto e homogéneo: a lingua, "[...] um tesouro depositado pela prática da fala em todos os individuos pertencentes à mesma comunidade [...]", o código socialmente determinado. Essa tomada de posigäo teórica tem mais a ver com a possibilidade do estudo científico do que corn a crença de que os sistemas lingüísticos tem urna existencia puramente social e näo individual. Em verdade, para Saussure, o sistema lingüístico existia, de alguma forma, no cérebro dos falantes:
Trata-se de [...] um sistema gramatical que existe virtualmente em cada cérebro ou, mais precisamente, nos cérebros dum conjunto de individuos, pois a lingua näo está completa em nenhum, e só na massa ela existe de modo completo. (SAUSSURE, 1971, p.21, grifo nosso).
[...] Os signos lingüísticos, embora sendo essencialmente psíquicos, näo säo abstraçôes; as associates, ratificadas pelo sentimiento coletivo e cujo conjunto constituí a lingua, säo realidades que têm sua sede no cérebro. (SAUSSURE, 1971, p.23, grifo nosso).
Logo antes de dizer que a lingua é a parte social da linguagem, Saussure (1971, p.22) estranhamente afirma que "[...] pode-se localizá-la na porgäo determinada do circuito em que urna imagem auditiva vem associar-se a um conceito." Ora, mas essa porgäo está localizada entre a audigäo e a fonagäo no cérebro/mente dos falantes, segundo a ilustragäo de Saussure na página 20. Fica claro, portanto, que Saussure bem sabia que existe urna realidade psíquica e individual da linguagem, o que ele de fato afirmou explícitamente: "A linguagem tem urna lado individual e um lado social, sendo impossível conceber um sem o outro." (SAUSSURE, 1971, p.16).
O lingüista parece referir-se à parte individual da linguagem de duas maneiras. Urna é a fala, "um ato individual de vontade" (SAUSSURE, 1971, p. 17), que pode ser estudada pela psicología;8 a outra Saussure chama de faculdade da linguagem:
[a lingua é] um produto social da faculdade de linguagem [...] poder-se-ia objetar que o exercício da linguagem repousa numa faculdade que nos é dada pela Natureza, ao passo que a lingua constitui algo adquirido e convencional, que deveria subordinar-se ao instinto natural em vez de adiantar-se a ele. [...] nao é a linguagem que é natural ao homem, mas a faculdade de constituir urna lingua, vale dizer: um sistema de signos distintos correspondentes a ideias distintas. [...] existe urna faculdade mais gérai, a que comanda os signos e que seria a faculdade lingüística por excelência. (SAUSSURE, 1971, p.17-18).
E concluí:
[...] urna faculdade de associaçâo e de coordenaçâo que se manifesta desde que nâo se trate mais de signos isolados; é essa faculdade que desempenha o principal papel na organizaçâo da lingua enquanto sistema. (SAUSSURE, 1971, p.21).
Existe, portanto, para Saussure, urna faculdade "natural" da quai a lingua é o produto. Apesar disso, a metáfora do jogo de xadrez, usada por ele, parece indicar que o lingüista suiço equipararía o conhecimento que um falante tem da sua lingua com o conhecimento que um jogador tem das regras do xadrez. Ambos os sistemas, o lingüístico e o do jogo, seriam aprendidos por meio do contato com outros individuos que soubessem as "regras". Essa interpretaçâo advém, exatamente, da perspectiva extemalista que Saussure tem da lingua.
Tomemos agora Chomsky, que toma a faculdade da linguagem como seu objeto de estudo. Em verdade, a "[...] faculdade de associaçâo e coordenaçâo que se manifesta desde que nâo se trate mais de signos isolados.", mencionada por Saussure (1971, p.21), e que "desempenha um papel principal na organizaçâo da lingua enquanto sistema" parece muitíssimo corn a definiçâo chomskyana de gramática. Apesar de tomarem objetos de estudo completamente diferentes, nâo parece que Chomsky e Saussure diferem muito em suas interpretaçôes dos fatos. Isso parece ter passado despercebido a grande parte dos lingüistas.9
Chomsky toma a faculdade da linguagem coo seu objeto de estudo. Sua teoría é, portanto, internalista: a linguagem existe na mente/cérebro do individuo (ou pelo menos urna parte delà). Chomsky entende essa faculdade como sendo a capacidade de Pedro de gerar um número possivelmente infinito de sentenças gramaticais na sua lingua. Essa capacidade seria inata aos humanos e ausente nos outras animais. Isso explicaría porque o bebé Pedro adquire a lingua de seus pais em apenas quatro anos de vida, mas o gatinho da familia nao, por mais estímulo lingüístico que lhe seja dado. Usando as ideias de Gallistel (comentadas na introduçâo), Chomsky (2002, p.64) define assim a faculdade da linguagem:
This language organ, or "faculty of language" as we may call it, is a common human possession, varying Mttle across the species as far as we know, apart from very serious pathology. [...] the language organ is the faculty of language (FL); the theory of the initial state ofFL, an expression of the genes, is universal grammar (UG); theories of states attained are particular grammars; the states themselves are internal languages, "languages" for short. The initial state is, of course, not manifested at birth, as in the case of other organs, say the visual system.
Na passagem abaixo, Chomsky define as línguas particulares como, essencialmente, a sintaxe (urn procedimiento recursivo), intema ao falante, que "géra urna infinidade de expressöes". É importante ressaltar também que Chomsky advoga por urna semántica internalista (como já havia feito explícitamente em outras ocasiöes):
[...] we can think of a particular language Las a state ofFL. L is a recursive procedure that generates an infinity of expressions. Each expression can be regarded as a collection of information for other systems of the mind-brain. [...iEach expression, then, is an internal object consisting of two collections of information: phonetic and semantic. These collections are called "representations, " phonetic and semantic representations, but there is no isomorphism holding between the representations and aspects of the environment. There is no pairing of internal symbol and thing represented, in any useful sense. (CHOMSKY, 2000a, p.86-87).
Tal vez näo fique claro, nas passagens citadas, que, como a lingua (L) é um estado da faculdade da linguagem (FL), se L é um procedimiento recursivo, FL também deve ser um procedimiento recursivo. De fato, desde Hauser, Chomsky e Fitch (2002), pelo menos, Chomsky explícitamente define a FL stricto sensu como um procedimiento recursivo. Em resumo, Chomsky enxerga a sintaxe como um algoritmo que, dada urna sequéncia qualquer de unidades, produz urna estrutura hierárquica subjacente a essa sequéncia por meio de urna operaçâo recursiva de juntar dois elementos. Por exemplo, para urna sequéncia de très itens lexicais a, b e c, a faculdade da linguagem geraria a estrutura abaixo, sendo que os rótulos dos objetos formados pela junçâo de dois itens (a e ß, na Figura 1) dependeriam da categoria morfológica atribuida a cada item lexical:
Urna possibilidade parece obvia e talvez seja urna hipótese de trabalho frutífera: a faculdade da linguagem à quai Saussure se refere pode ser equacionada à sintaxe (o objeto de estudo chomskyano). Apesar de o humano somente adquirir urna lingua quando em contato com outros humanos linguisticamente dotados, a teoria chomskyana prevé que, mesmo completamente sozinho, esse ser humano aínda teña esse algoritmo sintético, que lhe daña muitas vantagens no que diz respeito ao pensamento, ao planejamento de açôes e á soluçâo de problemas. Isso parece ser urna previsäo acertada, afinal, um homem criado por lobos (sem lingua) provavelmente nâo se tomaria menos humano.
Na perspectiva dessa teoria, entäo, urna lingua nâo seria aprendida, apenas as correspondéncias entre significados e significantes säo aprendidas e, por isso, o conhecimento que um falante tem de sua lingua é distinto de qualquer outro conhecimento (como as regras do xadrez, por exemplo). Existe, portanto, na corrente gerativa, urna separaçâo entre o léxico (que é aprendido) e a sintaxe (que é básicamente inata). Entretanto, a existéncia dessa separaçâo entre léxico e sintaxe nâo é obvia a todos os lingüistas e, muito menos, aos neurocientistas.
Adotando-se a distinçâo entre léxico e sintaxe, ou nâo, nenhuma teoria lingüística consegue, aínda, prover um modelo de como a mente/cérebro instancia o sistema lingüístico individual. As consideraçôes tecidas até aqui indicam que as teorias extemalistas poderiam complementar a visäo chomskyana, se tomadas numa perspectiva intemalista. Os estudos da neurociéncia, discutidos a seguir, parecem confirmar essa hipótese.
Neurociéncia
Os experimentos feitos em neurociéncia que tomam as ideias chomskyanas como bases epistemológicas procuram elucidar como e onde esse procedimento recursivo se processa no cérebro (MORO, 2008; GRODZINSKY, 2006; BEN- SHACHAR; PALTI; GRODZINSKY, 2004; BEN-SHACHAR et al., 2003; MORO et al., 2001; INDEFREY et al., 2001; FRIEDERICI; PFEIFER; HAHNE, 1993; NEVILLE et al., 1991; entre outros). Ben-Shachar, Palti e Grodzinsky (2004), por exemplo, argumentam ter localizado urna área no cérebro que seria responsável pelo que chama de movimento sintético, ou "propriedade de deslocamento", que, segundo Chomsky, é característica das línguas. Apesar do otimismo de seus autores, é difícil acessar o que esses experimentos realmente mostram. Se algum experimento realmente registrasse um rastro de urna operaçâo de ordern alta no cérebro (como fazer urna multiplicaçâo, processar o significado de urna sentença ou planejar urna viagem), seria um avanço fantástico para a ciencia. Estamos um pouco longe de poder fazer isso, como Chomsky (2000a, 2000b, 2002, entre outros) tem apontado insistentemente. O problema se deve, em grande parte, à diferente granularidade dos elementos conceituais usados pela lingüística e pela neurociéncia, o que leva a urna incomensurabilidade ontológica (POEPPEL; EMBICK, 2005; EMBICK; POEPPEL, 2003).
Se o pesquisador toma outras bases epistemológicas que näo aquelas da sintaxe gerativa, difícilmente procuraria encontrar a sintaxe "acontecendo" no cérebro. Para esses pesquisadores, talvez a maioria, o cérebro funciona por meio de correlaçôes: "[...] padröes de atividade que coocorrem frequentemente [e] podem ser guardados de modo a reforçar os elos sinópticos entre os neurónios participantes." (PULVERMÜLLER, 2002, p.21-22, traduçâo nossa). Nesse sentido, o cheiro do café fica associado ao líquido e à situaçâo de tomar café, urna vez que a atividade cerebral ligada ao cheiro coocorre frequentemente com atividades ligadas ao líquido e às situaçôes. Essas correlaçôes fleam, para usar um termo da lingüística cognitiva, entrinche iradas no cérebro.
Segundo Pulvermüller (2002, p.62, traduçâo nossa), "[...] é amplamente reconhecido que o córtex motor é organizado somatotopicamente, isto é, músculos adjacentes estäo representados em áreas cerebrais vizinhas do córtex motor."10 Do mesmo modo, existe urna divisäo cortical entre modalidades (visual, olfativa, etc.) e, por isso, pode-se falar em córtex visual, motor, etc. As áreas do cérebro säo interconectadas para permitir "um mapeamento complexo de padröes de informaçâo entre as modalidades". Em resumo, podemos entender que "o córtex tem a funçâo de juntar essas informaçôes multimodais" (PULVERMÜLLER, 2002, p.22, traduçâo nossa) num todo coeso (o percepto aludido por Jackendoff (2002)). Aprendizagem por correlaçâo também implica que "redes neurais distribuidas säo formadas entre várias áreas corticais". Aínda nas palavras de Pulvermüller (2002, p.22):
Development of these networks, called functional webs, would be driven by sensorimotor or sensory-sensory coactivation, and would be determined by the available cortical projections indirectly connecting the coactivated neurons in primary areas to each other. [...] The cortex, a neuroanatomically defined associative memory obeying the correlation learning principle, allows for the formation of distributed functional webs. During language acquisition, the neurobiological principles governing the cortex interact to yield the neuron machinery underlying language.
Exemplificando, se o estímulo experimental for urn garfo, espera-se que a parte do cortex motor, relacionada à boca, e o córtex ligado ao paladar tenham mais atividade do que o cortex visual, por exemplo (mesmo quando o estímulo apresentado é visual) (KIEFER; SPITZER, 2001; PULVERMÜLLER, 2001). O que é significativo para os lingüistas é que, quando o estímulo é lingüístico (quando o paciente ouve ou lê a palavra "garfo"), as mesmas regiöes cerebrais sao estimuladas. Parece haver muito pouca distinçâo cerebral entre ver um garfo, pensar num garfo, 1er ou ouvir a palavra garfo. A distinçâo talvez seja apenas de grau, como demonstra De Araujo et al. (2012). Isso parece sugerir que há urna realidade neural para aquilo que Saussure chamava de "conceito". Obviamente, o conceito inclui (ou está indissociavelmente ligado a) urna imagem acústica. Ao vermos um garfo, a imagem acústica desse conceito sofre urn priming, assim como outros conceitos que se relacionam paradigmáticamente com o primeiro. Segundo Pulvermüller (2002, p.24):
The cat concept would be realized as a large set of neurons distributed over a small set of cortical areas. All of these areas would serve as binding sites. A functional web will be assumed to be a set of neurons
(i) That are strongly connected to each other
(ii) That are distributed over a speciñc set of cortical areas
(iii) That work together as a functional unit
(iv) Whose major parts are functionally dependent on each other so that each of them is necessary for the optimal functioning of the web.
Estudos em neurociência tern confirmado que unidades lingüísticas ativam as áreas neurais correspondentes ao seu significado. Assim, verbos do tipo "andar" evocam correntes mais fortes em áreas dorsais, vizinhas das áreas corticais correspondentes ás pemas, enquanto verbos do tipo "falar" evocam correntes mais fortes em áreas inferiores, próximas ás áreas que representam a face e os articuladores (lábios, lingua) (HAUK; PULVERMÜLLER, 2004; PULVERMÜLLER; HUMMEL; HÄRLE, 2001; PULVERMÜLLER; HÄRLE; HUMMEL, 2000).
De acordo com Pulvermüller (2002, p.62), esses resultados "[...] däo suporte à tese de que a informaçâo sobre a forma da palavra e as partes do corpo usadas para executar as açôes relacionadas àquela palavra estâo entrelaçadas na mesma rede cortical relacionada à palavra e säo ativadas quase simultáneamente."11 0 autor entáo conclui que "[...] o uso de urna palavra no contexto de objetos e açôes leva a urna associaçâo entre os neurônios na área cortical responsável pela linguagem e outras neurônios em áreas que processam informaçâo sobre o referente das palavras.", assim o fato de haver "[...] conexöes fortes dentro da rede pode explicar a impressäo de que a imagem é automáticamente trazida pela forma da palavra apresentada sozinha e que, vice-versa, a imagem quase que automáticamente chama o nome para a memoria ativa." (PULVERMÜLLER, 2002, p.56, traduçâo nossa). O autor entáo chama essa "[...] coleçâo de neurônios ligando informaçâo fonológica e informaçâo sobre as açôes e as percepçôes a que urna palavra se refere" de redes lexicais (no original, word webs) (PULVERMÜLLER, 2002, p.56, traduçâo nossa). A modalidade da sensaçâo ou da açâo por meio da quai urna palavra é conhecida também é aparentemente relevante. Assim, palavras como "tubaräo" e "baleia" evocam associaçôes no cortex visual mais fortemente do que palavras como "gato", que säo mais distribuidas, por razôes obvias (FUSTER, 1999; PULVERMÜLLER; LUTZENBERGER; PREISSL, 1999).
Já foi proposto, também, que o significado de urna palavra pode ser definido pelo conjunto de palavras que coocorrem frequentemente com aquela palavra (LANDAUER; DUMAIS, 1997), o que é muito próximo do entendimento saussureano dos conceitos lexicais. Além disso, a produçâo e compreensäo de substantivos e de verbos, assim como de nomes de animais e ferramentas, foram afetados diferentemente por doenças do cérebro (BAK et al., 2001; CAPPA et al., 1998; WARRINGTON; MCCARTHY, 1983; WARRINGTON; SHALLICE, 1984). Ativaçâo cortical diferenciada para conceitos relacionados a açôes ou objetos é confirmada, em parte, por estudos que usam técnicas de imagem como PET e fMRI (NOPPENEY; PRICE, 2002; MOORE; PRICE, 1999; MUMMERY et al., 1998; GRABOWSKI; DAMASIO; DAMASIO, 1998; DAMASIO et al., 1996; WARBUNTON et al., 1996). Entretanto, näo há consenso (DEVLIN et al., 2002). Em alguns estudos, näo houve diferença na resposta cerebral entre verbos de açâo e substantivos que evocam associaçôes fortes a açôes (PULVERMÜLLER; MOHR; SCHLEICHERT, 1999), o que leva a crer que a categoria gramatical da palavra importa menos do que seu significado (no léxico cerebral). Quanto à distinçâo entre itens lexicais funcionáis (preposiçôes, flexöes verbais, etc.) e itens lexicais corn conteúdo concreto, parece haver evidencias, por meio de estudos de imagens neurofisiológicas, de que o processamento cortical dessas duas classes é diferente (BROWN; HAGOORT; TER KEURS, 1999; NOBRE; MCCARTHY, 1994; PULVERMÜLLER et al., 1996; SHTYROV; PULVERMÜLLER, 2002).
Considerando que a visäo de que o cérebro constitui essas redes lexicais por correlaçôes associativas parece bem estabelecida, percebemos a dificuldade de construir urna base teórica que permita a busca empírica sobre a realidade neural da sintaxe entendida como urna faculdade natural do ser humano. Por um lado, felizmente, o sistema de signos saussureano, a parte "social" da linguagem, parece estar bem representado no cérebro. A faculdade da linguagem, o procedimento recursivo aludido por Chomsky, por outro lado, parece bem mais arredio aos olhos humanos. Para que, a partir do que se sabe sobre como o léxico é instanciado no cérebro, seja possível urna averiguaçâo científica da sintaxe, será necessário que um entendimiento teórico acerca das perspectivas internalistas e externalistas évolua no sentido de possibilitar experimentos que localizem, comprovem ou falsifiquen! a existencia de urna sintaxe operada pelos neurônios. Se a sintaxe pode ser aprendida por correlaçâo, entáo é necessário que se faça um esboço de como isso pode acontecer. Apesar de a teoria gerativa nao se combinar muito bem com aprendizagem por correlaçâo, existe urna outra teoria lingüística, nomeada na introduçâo, que assume exatamente que a sintaxe (no sentido de ser um procedimento recursivo mental especializado para a linguagem) nao existe e que talvez se possa adquirir a sintaxe da mesma maneira, grosso modo, que se adquire o léxico. Essa teoria será tratada a seguir.
Antes de passar a esse assunto, entretanto, é importante notar que os trabalhos comentados acima se restringen! ao estudo da organizaçâo mental de itens lexicais (o que equivale ao sistema de signos saussureanos) e áqueles que tentam estabelecer correlatos neuronais da sintaxe (comentados brevemente no inicio desta seçâo). Em nenhum momento nos referimos a operaçôes mentais mais complexas como inferencias, estabelecimento de implicaturas e cálculos mentais que poderiam ser reconhecidos como pensamento. Isso se deve ao fato de esses assuntos estarem, atualmente, muito além do que a neurociência pode estudar. Salvo engano nosso, esses temas só têm sido desenvolvidos pela filosofía da mente e envolvem questóes muito complexas (FODOR, 2000), que fogem ao escopo deste trabalho. Tudo o que se pode concluir da discussäo aqui apresentada, portanto, é parcial, no sentido de que nosso conhecimento atual sobre a mente é sobremanera parcial.
Lingüística cognitiva
A chamada lingüística cognitiva (LC) foi criada, entre outros, por Mark Johnson, George Lakoff e Charles Fillmore, os dois últimos gerativistas dissidentes. Apesar da dissidência ter se dado nos anos 60, a LC começa a ser reconhecida como área de pesquisa a partir do fim da década de 80 do século passado. Mais do que urna teoria concisa, a LC é um aglomerado de teorias que compartilham principios e pressupostos comuns. A LC nega a separaçâo chomskyana entre um léxico (aprendido) e urna sintaxe (inata) bem divididos e aposta num continuo de construçôes. Apesar da definiçâo de construçâo variar de autor para autor, construçôes prototípicas seriam aquelas já descritas pela gramática tradicional (construçôes passivas, bitransitivas, existenciais, etc.).
Como, nessa teoria, as construçôes säo aprendidas por meio da experiencia, esquemas sintéticos muito comuns (como, por exemplo, [NP V NP] em portugués ou inglés, que é instanciado por sentenças como "gatos tomam leite") também säo considerados construçôes. Assim como os itens lexicais, as construçôes säo dotadas de um significado (mesmo que esquemático). Essas construçôes seriam guardadas em urna rede mental de relaçôes baseadas em prototipicidade e derivaçôes metafóricas, ás vezes chamada de constructicon (como em lexicon), um repositorio de construçôes que variam de itens lexicais a esquemas sintéticos (dependendo da teoria escolhida).
Para exemplificar, muito superficialmente, o tipo de raciocinio usado na LC, tomemos duas construçôes do inglés: a construçâo de movimento causado (la) e a construçâo resultativa (Ib).
(1) a. George pushed Mary off the sofa.
b. George hammered the metal fíat.
A primeira construçâo, a de movimento causado, tern urn significado esquemático que envolve um ator agente (George), urn tema (Mary) e um objetivo, ou goal, [off the sofa) e a ideia de movimento, que é dada pela própria construçâo. A construçâo resultativa pode ser vista como urna derivaçâo metafórica da construçâo de movimento causado se tomarmos a metáfora "STATES are LOCATIONS" como um dos principios que norteia a cogniçâo humana do mundo. De fato, nos referimos a estados como se fossem lugares: entrar em depressäo, cair num sono profundo, estar em paz, sair da pasmaceira. Se o estado de lisura [fíatness) é interpretado metafóricamente como um objetivo do movimento causado por um agente, a construçâo resultativa realmente näo difere da primeira. Isso fica especialmente claro em usos do tipo "George drank himself into oblivion ", em que o agente George causa o movimento de urn tema [himself) para dentro de urn espaço metafórico [oblivion).
Nessa teoria, como o aprendizado se dá exclusivamente por meio da experiência, construçôes muito usadas ficam mais entrincheiradas (do inglés entrenched) no cérebro, assim como outras sequéncias (motoras, por exemplo: levar o garfo do prato à boca). Nesse sentido, urna construçâo transitiva declarativa em portugués está mais entrincheirada do que urna construçâo olivada (do tipo "Foi a Maria que fez isso"). Nessa teoria, portanto, a frequéncia de uso de urna construçâo influenciarla no seu processamento neural. É importante observar, entretanto, que, assumindo a existéncia de um procedimiento recursivo inato, como fazem os gerativistas, a frequência de urna construgäo näo deveria influir em seu processamento. Qualquer experimento sobre a realidade neural da sintaxe, portanto, tem que partir de urna posigäo teórica sobre esse tipo de questäo.
Para os lingüistas cognitivos, näo é claro se existe um objeto teórico que possa ser classificado como sintaxe. As restrigöes de ordern das palavras poderiam ser explicadas simplesmente como produto de urna série de comportamentos ensaiados (e entrincheirados). Mesmo que se possa falar em algo parecido com sintaxe, nessa teoria, ela está fora, extema ao falante. Entretanto, a LC näo é externalista quando à semántica. Na verdade, a teoria se propóe a explicar o conhecimento humano, e a cognigäo, numa perspectiva inteiramente internalista.
Apesar do sucesso irrefutável da LC para explicar certos fenómenos lingüísticos, essa teoria mantém elementos de urna perspectiva comportamentalista, defendida por filósofos como Quine, para quem, durante a aquisigäo da lingua, "[...] dependemos estritamente da observagäo de comportamientos observáveis." (QUINE, 1990, p.37). Chomsky (2000a) se contrapóe a esse tipo de argumento, como tem feito históricamente (ver, por exemplo, a crítica contundente de Chomsky (1967) ao livro Verbal Behavior, de B. F. Skinner). De fato, o que se sabe sobre a aquisigäo da linguagem por criangas normáis vai de encontró a essa visäo em que os dados observáveis determinarían! a linguagem infantil. De maneira geral, as criangas produzem formas lexicais e constmgóes sintéticas ausentes da linguagem adulta. Os exemplos mais comuns säo as generalizagóes morfológicas e os chamados rootinñnitives. No primeiro caso, documentado em várias línguas, criangas produzem formas finitas de verbos que näo existem na lingua dos pais (como "fazi", em vez de "fiz", e "sabo", em vez de "sei", em portugués; e "goed", em vez de "went", em inglés). No segundo, criangas produzem oragöes sem qualquer marcagäo morfológica de tempo e concordáncia, como no exemplo abaixo, do holandés (apud BLOM, 2008, p.18) e do francés (PIERCE, 1992, p.8), respectivamente:
(2) a. Jij de walvismaken.
Voce a baleia fazer.
b. Pas rouler en vélo.
Näo rolar em bicicleta.
Dados como esses indicam que as criangas näo usam urna estratégia do tipo monkey-see-monkey-do; ao invés, as criangas generalizam regras e passam por fases em que sua competencia difere daquela do adulto.12
Mesmo näo aceitando esses argumentos e maniendo uma aprendizagem da sintaxe por correlaçâo, um pesquisador precisada supor (para depois confirmar) uma maneira de instanciar as construçôes no cérebro. Ou seja, como afirma Pulvermüller (2002), precisa haver um desenvolvimiento teórico para que se chegue a respostas que säo, em última análise, empíricas. Para ilustrar o problema, tomemos a sentença citada anteriormente "gatos tomam leite". Um individuo que ouve (ou lê) essa sentença teria as redes lexicais correspondentes a "gato", "tomar" e "leite" ativadas no seu cérebro, urna após a outra. De que maneira a ocorrência sequencial dessas redes lexicais instancia ou produz, na mente desse sujeito, a construçâo [NP V NP]? Pulvermüller (2002) aposta em redes neurais detectoras de sequências, que seriam ativadas à medida que cada item lexical é ativado e possibilitariam a identificaçâo de construçôes por meio de reverberaçâo da atividade neural dessas redes. Apesar dessa descriçâo esquemática, pode-se concluir que hà ainda um longo caminho a ser percorrido para que essas questôes possam ser respondidas.
Conclusöes
Chomsky (1980) discute a questâo de como a presença de uma representaçâo invisível poderia ser testada por um experimento eletrofisiológico durante o processamento de uma sentença envolvendo um certo tipo de operaçâo sintética (movimento-QU, por exemplo). Sua proposta mantém que, se um certo padráo de atividade elétrica está claramente correlacionado com uma certa estrutura (movimento-QU), entäo, se esse mesmo padráo ocorre durante o processamento de um outro tipo de sentença (construçôes-tough, por exemplo), isso seria evidencia de que essas últimas construçôes envolveriam uma operaçâo sintética do mesmo tipo usado nas primeiras, comprovando assim uma representaçâo que foi postulada por consideraçôes teóricas (isto é, a presença de um operador-QU na derivaçâo de uma construçâo-tough). Entretanto, provar que uma certa operaçâo sintética está realmente relacionada a um "certo padráo de atividade elétrica" tem se provado mais difícil do que Chomsky supunha. Em virtude do fato de que itens lexicais parecem ativar redes neurais espalhadas por várias áreas cerebrais, identificar um certo padráo ou uma área cerebral específica que se correlacione com uma certa operaçâo sintética é bem mais difícil do que se supunha na década de 80. Apesar de alguns estudos proclamarem ter encontrado evidencias de tal correlaçâo, as conclusöes parecem provir de uma tomada de posiçâo teórica que näo é única, nem pode, atualmente, ser comprovada e, portanto, constituem mais uma interpretaçâo dos fatos do que uma conclusäo imparcial e objetiva.
Apesar de a busca de comprovaçâo empírica depender de urna tomada de posiçâo teórica prévia, seria salutar se os pesquisadores mantivessem em mente que o júri ainda está indeciso quanto ás questöes mais cruciais sobre a linguagem: a realidade interna ou externa da sintaxe; a contribuiçâo do ambiente externo na definiçâo das estruturas lingüísticas, a tensáo entre predisposiçôes inatas e aprendizagem, entre outros. O trabalho conjunto de lingüistas e neurocientistas é crucial para que estratégias de pesquisas sobre essas questöes sejam achadas.
Agradecimentos
Este trabalho é parte do projeto da Universidade de Sao Paulo "Matemática, Computaçâo, Linguagem e o Cérebro" (MaCLinC) e só foi possível em virtude das discussöes com os pesquisadores Antonio Galves, Andró Frazáo Helene, Sidarta Ribeiro, Cláudia Vargas e Nivaldo Vasconcelos, a quem agradeço.
MODESTO, M. Internalism and externalism in linguistics and the neuroscience of language. Alfa, Säo Paulo, v.58,n.l, p.137-164,2014.
* ABSTRACT: The main objective of this study is to discuss the possibility of investigating the neurophysiology of the natural languages syntax. In order to develop this kind of analysis, linguists and neuroscientists would have to find a common epistemological basis. However, nowadays, the prevalent view in neuroscience, which assumes associative learning by correlation, does not mesh well with the internalist view of syntax assumed by generative linguists. For that reason, this research discusses the epistemological bases of the most accepted linguistic theories, that perform as a guide for neuroscientists wanting to investigate language processing by the brain. On the other hand, this article also discusses experiments within the neuroscience of language in order to evaluate the kind of problems concerning the intersection of these two areas. The main conclusion is that any researcher who is willing to mvestigate such problems must have a clear understanding of those epistemological questions before setting up any kind of experiment; and that any conclusion with respect to the neural reality of syntax is, at the present, unwarranted.
* KEYWORDS: Linguistics. Cognition. Neuroscience. Syntax.
1 Freud (1996) tenta explicar o estado inicial da mente, fazendo urna analogía com o conhecimento instintivo dos animais. Ele diz que, na nossa mente, há um fator instintivo, que seria o núcleo do inconsciente, um tipo primitivo de atividade mental, que seria encoberto e destorcido pela razáo humana, quando essa faculdade é adquirida pelo homem.
2 No original: ../ current understanding falls well short of laying the basis for the unification of the sciences of the brain and higher mental faculties, language among them."
2 No original: "Things mental, indeed minds, aie emergente properties of brains."
4 Como deixa claro o diagrama no terceiro capítulo do Curso de lingüística gérai (SAUSSURE, 1971, p. 19).
5 Apesar do uso do verbo instanciar näo estar completamente estabelecido em portugués, näo me ocone outra maneira de diferenciar "instanciaçâo" (o ato de instanciar, de criar urna instância de um objeto) de "instância" (o produto final produzido pela instanciaçâo).
6 Sobre a teoría dos protótipos em ciência cognitiva, confira os trabalhos de Eleanor Rosch e colaboradores.
7 Confira o conceito de valor em Saussure (1971). Näo é claro que a noçâo de conceito possa ser entendida exatamente como a intensäo de um conjunto extensional. Parece haver bem mais em jogo aqui.
8 "Há o ponto de vista do psicólogo, o quai estuda o mecanismo do signo no individuo; é o método mais fácil, mas nâo ultrapassa a execuçâo individual, nâo atinge o signo, que é social por natureza." (SAUSSURE, 1971, p.25).
9 Tâlvez as diferenças entre Saussure e Chomsky sejam mais importantes que suas semelhanças. Apesar disso, nossa intençâo em discutir esses conceitos fundamentáis é mostrar que mesmo as teorias extemalistas de significaçâo podem fomecer modelos explicativos de como o significado é produzido mentalmente (e que essa já era urna preocupaçâo de Saussure).
10 Confira Penfleld e Roberts (1959) e Penfleld e Rassmussen (1950).
11 Ver também Pulvermüller (2001).
12 A lingüística cognitiva tena, aínda, de dar conta do que é comumente chamado de "argumento da pobreza do estímulo" (BERWICK et al., 2011; PIATTELLI-PALMARINI, 1980; CHOMSKY, 1957) e da génesis de línguas crioulas (BICKERTON, 1981, 1990). Em ambos os casos, parece haver fortes indicios de uma determinaçâo biológica da linguagem, apesar de outras interpretaçôes serem possíveis (PULLUM; SHOLZ, 2002).
REFERENCIAS
BAK, T. H. et al. Selective impairment of verb processing associated with pathological changes in Brodmann areas 44 and 45 in the motor neuron disease-dementia-aphasia syndrome. Brain, Oxford, n.124, p.103-120,2001.
BEN-SHACHAR, M. et al. The neural reality of syntactic transformations: evidence from functional magnetic resonance imaging. Psychological Science, Thousand Oaks, n.14, p.433-440, 2003.
BEN-SHACHAR, M.; PARTI, D.; GRODZINSKY, Y. Neural correlates of syntactic movement: converging evidence from two fMRI experiments. Neuiolmage, Orlando, n.21, p.1320-1336, 2004.
BERWICK, R. C. et al. Poverty of stimulus revisited. Cognitive Science, Norwood, n.35, p.1207-1242, 2011.
BICKERTON, D. Language and human behavior. Seattle: University of Washington Press, 1995.
_____. Language and species. Chicago: University of Chicago Press, 1990.
_____. Roots of language. Ann Harbor: Karoma, 1981.
BLOCK, N. The computer model of the mind. In: OSHERSON, D. N; SMITH, E. E. (Org.). An invitation to Cognitive Science. Cambridge: MIT Press, 1990. v.3. p.247-289.
BLOM, E. The acguisition of ûnitesness. Berlim: Mouton de Gruyter, 2008.
BROWN, C. M.; HAGOORT, R; TER KEURS, M. Electrophysiological signatures of visual lexical processing: openand closed-class words. Journal of Cognitive Neuroscience, Cambridge, n.ll, p.261-281,1999.
CAPPA, S. F. et al. Object and action naming in Alzheimer's disease and frontotemporal dementia. Neurology, Minneapolis, n.50, p.351-355,1998.
CHALMERS, D. Facing up to the problem of consciousness. Journal of Consciousness Studies, Devon, n.2, p.200-219,1995.
CHOMSKY, N. Language and other cognitive systems: what is special about language? Language Learning and Development, Philadelphia, n.7, p.263-278, 2011.
_____. On nature and language. Cambridge: Cambridge University Press, 2002.
_____. New horizons in the study of language and mind. Cambridge: Cambridge University Press, 2000a.
_____. Linguistics and brain science. In: MARANTZ, A. et al. (Org.). Image, language and brain. Cambridge: MIT Press, 2000b. p.13-28.
_____. Rules and representations. New York: Columbia University Press, 1980.
_____. A review of B. F. Skinner's verbal behavior. In: LEON, A. et al. (Org.). Readings in the Psychology of Language. New Jersey: Prentice-Hall, 1967. p.142-143.
_____. Syntactic structures. The Hague: Mouton, 1957.
CHOMSKY, N.; BERWICK, R. The Biolinguistic program: the current state of its evolution and development. In: Di SCIULLO, A. M. ; AGÜERO, C. (Org.). Biolinguistic investigations. Cambridge: MIT Press. No prelo.
CHURCHLAND, P. M. Matterand consciousness. Cambridge: MIT Press, 1984.
DAMASIO, H. et al. A neural basis for lexical retrieval. Nature, London, n.380, p.499-505,1996.
DE ARAUJO, D. B. et al. Seeing with the eyes shut: neural basis of enhanced imagery following ayahuasca ingestion. Human Brain Mapping, Hoboken, v.33, n.ll, p.2550-2560, nov. 2012.
DEACON, T. The symbolic species: the co-evolution of language and the brain. New York: Norton, 1998.
DENNETT, D. Explaining the "Magic" of consciousness. Journal of Cultural and Evolutionary Psychology, Budapest, n.l, p.7-19,2003.
_____. Consciousness explained. Boston: Little, Brown, 1991.
DEVLIN, J. T. et al. Is there an anatomical basis for category-specificity? Semantic memory studies in PET and fMRI. Neuropsychologia, Oxford, n.40, p.54-75,2002.
EMBICK, D.; POEPPEL, D. Mapping syntax using imaging: prospects and problems for the study of neurolinguistic computation. In: BROWN, K. (Org.). Encyclopedia of Language and Linguistics. Oxford: Elsevier, 2003. p.484-486.
FODOR, J. The mind doesn't work that way. Cambridge, Mass.: MIT Press, 2000.
_____. The language of thought. New York: Crowell, 1975.
FREUD, S. Uma neurose infantil e outros trabalhos (1917-1918). Rio de Janeiro: Imago, 1996. (Coleçâo Standard Brasileña, 17).
FRIEDERICI, A. D.; PFEIFER, E.; HAHNE, A. Event-related brain potentials during natural speech processing: effects of semantic, morphological and syntactic violations. Cognitive Brain Research, Amsterdam, n.l, p.183-192,1993.
FUSTER, J. M. Hebb's other postulate at work on words. Behavioral and Brain Sciences, Cambridge, n.22, p.288-289,1999.
GRABOWSKI, T. J.; DAMASIO, H.; DAMASIO, A. R. Premotor and prefrontal correlates of category-related lexical retrieval. Neuroimage, Orlando, n.7, p.232-243,1998.
GRODZINSKY, Y. The language faculty, broca's region, and the mirror system. Cortez, Varese, n.42, p.464-468, 2006.
H AUK, 0.; PULVERMÜLLER, E Neurophysiological distinction of action words in the frontal lobe: an ERP study using minimum cunent estimates. Human Brain Mapping, Hoboken, v.21, p.191-201,2004.
HAUSER, M. D.; CHOMSKY, N; FITCH, W. T. The faculty of language: what is it, who has it, and how did it evolve? Science, Washington, n.298, p.1569-1579,2002.
HEIM, L; KRATZER, A. Semantics in generative grammar. Oxford: Blackwell Publishers, 1998.
INDEFREY, P. et al. Syntactic processing in left prefrontal cortex is independent of lexical meaning. Neuroimage, Orlando, n.14, p.546-555, 2001.
JACKENDOFF, R. Foundations of language, brain, meaning, grammar, evolution. New York: Oxford University Press, 2002.
JOHNSON-LAIRD, P. N. The computer and the mind: an introduction to cognitive science. Cambridge: Harvard University Press, 1988.
KIEFER, M.; SPITZER, M. The limits of a distributed account of conceptual knowledge. Trends in Cognitive Sciences, Oxford, n.5, p.469-471,2001.
LANDAUER,T. K.; DUMAIS, S.T. A solution to Plato's problem: the Latent Semantic Analysis theory of acquisition, induction, and representation of knowledge. Psychological Review, Washington, n.104, p.211-240,1997.
LÉVI-STRAUSS, C. Structures élémentaires de la parenté. Paris: Presses Universitaires de France, 1949.
MONTAGUE, R. Formal Philosophy, selected papers of Richard Montague. Organizado por e com introduçâo de Richmond H. Thomason. London: Yale University Press, 1974.
MOORE, C. J.; PRICE, C. J. A functional neuroimaging study of the variables that generate category-specific object processing differences. Brain, Oxford, n.122, p.943-962,1999.
MORO, A. The boundaries of babel, the brain and the enigma of impossible languages. Cambridge: MIT Press, 2008.
MORO, A. et al. Syntax and the brain: disentangling grammar by selective anomalies. Neuroimage, Orlando, n.13, p.110-118,2001.
MUMMERY, C. J. et al. Functional neuroanatomy of the semantic system: divisible by what? Journal of Cognitive Neuroscience, Cambridge, n.10, p.766-777,1998.
NEVILLE, H. et al. Syntactically based sentence processing classes: evidence from event-related brain potentials. Journal of Cognitive Neuroscience, Cambridge, n.3, p.151-165,1991.
NOBRE, A. C.; MCCARTHY, G. Language-related EPRs: scalp distributions and modulation by word type and semantic priming. Journal of Cognitive Neuroscience, Cambridge, n.6, p.233-255,1994.
NOPPENEY, U.; PRICE, C. J. Retrieval of visual, auditory, and abstract semantics. Neuroimage, Orlando, n.15, p.917-926,2002.
PENFIELD, W.; RASSMUSSEN.T. The cerebral cortex of man. New York: Macmillan, 1950.
PENFIELD, W.; ROBERTS, L. Speech and brain mechanisms. Princeton: Princeton University Press, 1959.
PIATTELLI-PALMARINI, M. (Org.). Language and Learning: the debate between Jean Piaget and Noam Chomsky. Cambridge: Harvard University Press, 1980.
PIERCE, A. Language Acquisition and Syntactic Theory: a comparative analysis of French and English child grammars. Dordrecht: Kluwer Academic Publishers, 1992.
POEPPEL, D.; EMBICK, D. Defining the relation between linguistics and neuroscience. In: CUTLER, A. (Org.). Twenty-ñrst century psycholinguistics-. four cornerstones. New Jersey: Lawrence Erlbaum Associates Publishers, 2005. p.103-118.
PULLUM, Y. K.; SCHOLZ, B. C. Empirical assessment of stimulus poverty arguments. The Linguistic Review, Dordrecht, n.19, p.9-50,2002.
PULVERMÜLLER, F. The neuroscience of language. Cambridge: Cambridge University Press, 2002.
_____. Brain reflections of words and their meaning. Trends in Cognitive Sciences, Oxford, n.5, p.517-524, 2001.
PULVERMÜLLER, F; HÄRLE, M.; HUMMEL, F. Neurophysiological distinction of verb categories. Neuroreport, Oxford, n.ll, p.2789-2793,2000.
PULVERMÜLLER, F; HUMMEL, F; HÄRLE, M. Walking or talking?: behavioral and neurophysiological correlates of action verb processing. Brain and Language, San Diego, n.78, p.143-168, 2001.
PULVERMÜLLER, F; LUTZENBERGER, W.; PREISSL, H. Nouns and verbs in the intact brain: evidence from event-related potentials and high-frequency cortical responses. Cerebral Cortex, Cary, n.9, p.498-508,1999.
PULVERMÜLLER, F; MOHR, B.; SCHLEICHERT, H. Semantic or léxico-syntactic factors: what determines word-class specific activity in the human brain? Neuroscience Letters, Limerick, n.275, p.81-84,1999.
PULVERMÜLLER, F. et al. Brain rhythms of language: nouns versus verbs. European Journal of Neuroscience, Oxford, n.8, p.937-941,1996.
PUTNAM, H. What is innate and why: comments on the debate. Disponfvel em: <http://www.federaljack.com/ebooks/Consciousness%20Books%20Collection/ Putnam%20-%20What%20Is%20Innate%20and%20Why%20Comments%20on%20 the % 20Debate.pdf >. Acesso em: 11 mar. 2011.
DUINE, W. Pursuit of truth. Cambridge: Harvard University Press, 1990.
SAUSSURE, F. Curso de lingüística gérai. Traduçâo de Antonio Chelini et al. Sao Paulo: Cultrix, 1971.
SHEAR, J. (Org.). Explaining consciousness: the 'hard problem'. Cambridge: MIT Press, 1997.
SHTYROV, Y.; PULVERMÜLLER, F. Memory traces for inflectional affixes as shown by the mismatch negativity. European Journal of Neuroscience, Oxford, n.15, p.1085-1091, 2002.
WARBURTON, E. et al. Noun and verb retrieval by normal subjects: studies with PET. Brain, Oxford, n.119, p.159-179,1996.
WARRINGTON, E. K.; MCCARTHY, R. A. Category specific access dysphasia. Brain, Oxford, n.106, p.859-878,1983.
WARRINGTON, E. K.; SHALLICE, T. Category specific semantic impairments. Brain, Oxford, n.107, p.829-854,1984.
Recebido em agosto de 2012.
Apro vado em fevereiro de 2013.
Marcello MODESTO*
* USP - Universidade de Sao Paulo. Faculdade de Filosofía, Letras e Ciéncias Humanas. Sao Paulo - SP - Brasil. 05508-900 - [email protected]
You have requested "on-the-fly" machine translation of selected content from our databases. This functionality is provided solely for your convenience and is in no way intended to replace human translation. Show full disclaimer
Neither ProQuest nor its licensors make any representations or warranties with respect to the translations. The translations are automatically generated "AS IS" and "AS AVAILABLE" and are not retained in our systems. PROQUEST AND ITS LICENSORS SPECIFICALLY DISCLAIM ANY AND ALL EXPRESS OR IMPLIED WARRANTIES, INCLUDING WITHOUT LIMITATION, ANY WARRANTIES FOR AVAILABILITY, ACCURACY, TIMELINESS, COMPLETENESS, NON-INFRINGMENT, MERCHANTABILITY OR FITNESS FOR A PARTICULAR PURPOSE. Your use of the translations is subject to all use restrictions contained in your Electronic Products License Agreement and by using the translation functionality you agree to forgo any and all claims against ProQuest or its licensors for your use of the translation functionality and any output derived there from. Hide full disclaimer
Copyright Universidade Estadual Paulista - UNESP, Departamento de Estudos Linguísticos e Literários, Campus de Sáo José do Rio Preto 2014
Abstract
The main objective of this study is to discuss the possibility of investigating the neurophysiology of the natural languages syntax. In order to develop this kind of analysis, linguists and neuroscientists would have to find a common epistemological basis. However, nowadays, the prevalent view in neuroscience, which assumes associative learning by correlation, does not mesh well with the internalist view of syntax assumed by generative linguists. For that reason, this research discusses the epistemological bases of the most accepted linguistic theories, that perform as a guide for neuroscientists wanting to investigate language processing by the brain. On the other hand, this article also discusses experiments within the neuroscience of language in order to evaluate the kind of problems concerning the intersection of these two areas. The main conclusion is that any researcher who is willing to mvestigate such problems must have a clear understanding of those epistemological questions before setting up any kind of experiment; and that any conclusion with respect to the neural reality of syntax is, at the present, unwarranted.
You have requested "on-the-fly" machine translation of selected content from our databases. This functionality is provided solely for your convenience and is in no way intended to replace human translation. Show full disclaimer
Neither ProQuest nor its licensors make any representations or warranties with respect to the translations. The translations are automatically generated "AS IS" and "AS AVAILABLE" and are not retained in our systems. PROQUEST AND ITS LICENSORS SPECIFICALLY DISCLAIM ANY AND ALL EXPRESS OR IMPLIED WARRANTIES, INCLUDING WITHOUT LIMITATION, ANY WARRANTIES FOR AVAILABILITY, ACCURACY, TIMELINESS, COMPLETENESS, NON-INFRINGMENT, MERCHANTABILITY OR FITNESS FOR A PARTICULAR PURPOSE. Your use of the translations is subject to all use restrictions contained in your Electronic Products License Agreement and by using the translation functionality you agree to forgo any and all claims against ProQuest or its licensors for your use of the translation functionality and any output derived there from. Hide full disclaimer