A Necessidade É a Maior Virtude: O Pensamento Realista nas Relações Internacionais* HASLAM, Jonathan. Säo Paulo: Martins Fontes, 2006, 434 páginas.
Avallar a atualidade do pensamento realista em Relaçoes Internacionais tem sido um exercício intelectual constante. Poucos estudiosos sao indiferentes ao realismo, mesmo aqueles que o negam para valorizar outras correntes ou vetores mais integrados ao campo liberal. Termos como razöes de Estado, balança do poder, interesse nacional e outros sao parte da investigaçao que busca analisar a atualidade ou o relativo desuso do realismo.
Dentro desta perspectiva de estudo é que surge no Brasil livro de grande envergadura teórica para estudar o pensamento realista. Trata-se de A necessidade é a maior virtude: o pensamento realista nas Relaçoes Internacionais, escrito pelo professor da Universidade de Cambridge, Jonathan Haslam. O traballio de Haslam é econòmico na quantidade de capítulos para um livro de 434 páginas. Säo cinco capítulos denominados: 1. Razöes de Estado; 2. O equilibrio do poder; 3. A balança comercial; 4. A geopolítica; e 5. Da realpolitik ao neo-realismo. Todos integrantes do poder político.
Haslam faz um levantamento clàssico e histórico para estudar a origem ou o momento em que o conceito de razöes de Estado ganhou grande impulso, já que poderia haver algo semelhante na Antiguidade greco-romana, nos conflitos entre Atenas e Esparta, como salienta o autor ao estudar a obra de Tucídides ou de Cicero. No entanto, o autor dedica mais tempo para defender a idéia de que as razöes de Estado sao fruto do gènio intelectual e político de Maquiavel em seu O príncipe, que dà o ponto de partida sobre a necessidade da centralizaçao de poder do Estado e seu manuseio sem limites de ordern moral.
Mas Haslam nao faz urna investigaçao dos conceitos que desembocan! no realismo sem levar em consideraçao seus oponentes. Ao contrario disso, o autor dá espaço às correntes dos sáculos XIV, XV e XVI para saber qual era o conteúdo de crítica que autores mais ligados ao desejo de um Imperio Universal tinham em relaçao às razöes de Estado. E por Impèrio Universal o autor entende também seu espirito, de governabilidade mundial; dai os desdobramentos encontrados na Liga das Naçoes ou nas Naçoes Unidas.
Haslam segue o mesmo modelo de análise em todo o livro. O autor também prefere ir aos clássicos e viajar na cronologia até o século XX. Ele faz um estudo em que deixa claro o papel da Grä-Bretanha na defesa da balança do poder na Europa e seu cinismo em trocar o equilibrio europeu pelo imperialismo africano ou asiático. Quer dizer, na Europa eles sao favoráveis ao equilibrio, mas na África e Asia exercitam disputas. Mesmo dentro da política británica o autor le as criticas de políticos que nao desejam a balança de poder por achá-la predisposta ao confuto desnecessário, caso de Gladstone. Contudo, acaba ganhando o partido do conservador Disraeli, que critica a ascensäo da Alemanna de 1 87 1 sem que Londres tornasse urna atitude para, justamente, manter o equilibrio europeu. Dai por diante é so esperar pela escalada do poder alemäo no continente.
As características da balança comercial também chamam a atençao. NeIa há a impressäo de que havia um tour de force no continente europeu entre dois competidores importantes. De um lado, os partidarios da opiniäo de que nao há livre-comércio em essência, mas sim o desejo de poder dos grandes Estados que usam as trocas mercantis para frisar poder. Sob este ponto, encontram-se o ministro de Luís XIV, Colbert, que muito fez pelo mercantilismo, e a influencia que esta corrente teve para seus frutos intelectuais.
De outro lado, havia os seguidores do livre-cambismo, da liberdade de comercio e defensores da idéia de que permitir o laissez-faire seria aprovar o enriquecimento do Estado e o bem-estar da populaçao. Embora pudesse haver quem pensasse desta forma na Europa Continental, o lugar mais prodigioso para divulgar tal pensamento foi a Grä-Bretanha. Terra de Adam Smith e Adam Ferguson, produziu idéias que lideraram mundialmente apregaçao do livre-comércio e a qualidade que a balança comercial pode ter com ele.
No fundo, havia urna questäo näo despercebida por Haslam. Se o comercio é substrato de poder nacional, entäo os Países Baixos o têm em grande número. Isto porque nao há país europeu que nao dependa, de alguma forma, dos mercadores de Amsterdä. E dai vem outra questäo. Por que os demais países europeus näo aproveitaram os beneficios do comercio? Porque tais países estavam afondados em guerras civis ou religiosas; e näo por preconceito ou falta de estima pelo assunto. Claro, havia quem näo gostasse do livre-comércio em virtude de preconceitos religiosos, talvez caso da Espanha ou de Portugal após a guerra contra a primeira. Mas Haslam nao se preocupa muito com a cultura da contra-reforma que havia na Península Ibérica.
Outra questao ligada com o aspecto do poder era saber se a qualidade comercial de um Estado nao seria essencial para urn bom grupo de guerreiros. Maquiavel havia entrado nesse tema. O acumulo de riqueza nao era, para o florentino, razäo primeira para se obter bons guerreiros, mas sim coragem e determinaçao na arte da guerra. Mesmo que pudesse haver quem concordasse com Maquiavel, a tese contraria a ele saiu vitoriosa.
No decorrer do texto, Haslam prefere buscar o que o realismo pede: efetivamente o acumulo de riqueza pelo comercio é condiçao essencial para se construir urna política de poder. O autor chega a frisar que guerras do final do século XVIII e de todo o XIX foram feitas para ampliar o comercio británico e, por seu turno, aumentar seu poder nacional. Cita-se a Guerra dos Sete Anos, na qual Londres ampliou seus dominios na América do Norte, tomando a maioria do Canadá. Essa atitude británica fez com que o intelectual conservador Edmund Burke percebesse que o intento da Coroa era centralizar todas as operaçoes comerciáis com a grande colonia e extrair maior peso do mercado mundial.
Esta é a tónica do livro. Haslam incursiona por temas que nao deixam de ser, necessariamente, pertinentes ao pensamento realista. Assim ele chega à geopolítica ao compreender que espaço é elemento de maximizaçao do poder. O traballio tem um lado pedagógico na medida em que apresenta em linguagem corrente a formaçao e os pontos centrais das idéias versadas. Por isso, o autor de A necessidade é a maior virtude apresenta a gênese do pensamento em geopolitica com Ratzel, Mackinder e outros teóricos da área.
A geopolítica, área de estudo que passou por certa propaganda negativa por causa dos principios de Haushofer na Alemanna nazista, é estudada inclusive pelo interesse que eia despertou em Kissinger, que, de acordo com o autor, nao abriu mäo de seu legado. Certamente isso nao deixa de ser um incentivo ao estudante brasileiro do assunto, já que o desenvolvimento do Brasil contemporáneo nao escapa das explicaçoes geopolíticas.
O livro de Haslam näo quer "reinventar a roda". Sua leitura é largamente amparada nos clássicos da ciencia política e das Relaçoes Internacionais, sendo boa parte deles rarefeita no Brasil. Seria o caso de Pufendorf, de Suarez e ou tros mestres do passado. Este é o mérito do autor, debater classicamente pontos que ainda sao pertinentes na atualidade, mas sem ser hermético para os interessados. Certamente isso é urna qualidade.
* Resenha recebida e aprovada para publicaçfto em novembro de 2007.
José Alexandre Altahyde Hage**
** Doutor em Ciencia Política pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e professor da Faculdade Trevisan, Escola de Negocios. E-mail: [email protected].
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