Resumo
Este artigo tematiza o apóstolo Pedro como personagem no evangelho de Mateus. O objetivo é identificar as nuances e transformações do personagem Pedro no evangelho. Para tanto, tomo como ponto de partida a pertença do evangelho ao gênero literário biografia greco-romana, que apresenta Jesus Cristo como protagonista. Os demais personagens são desenvolvidos em relação com ele. O mesmo se dá com o apóstolo Pedro. O texto se desenvolve a partir da teoria narrativa, de modo particular a caracterização de personagens. Identifico, a partir de Erich Auerbach e Robert Alter, as características de personagens bíblicos, tecendo comparações com teorias do personagem no romance moderno. A análise de textos do evangelho de Mateus que retratam o personagem Pedro leva à conclusão que suas principais características são a complexidade e a inversão. Elas produzem uma visão geral da involução do personagem na narrativa do evangelho de Mateus.
Palavras-chave: Pedro. Evangelho de Mateus. Teoria narrativa. Complexidade. Inversão.
Abstract
This article focuses on the apostle Peter as a character in the Gospel of Matthew. It aims at identifying the nuances and changes of the character Peter in the Gospel. For this purpose, I take as a starting point that the gospel belongs to the literary genre of ancient Greco-Roman Biography, which presents Jesus Christ as the protagonist. The other characters are developed in relationship with him. The same is true with the Apostle Peter. The article unfolds from narrative theory, in particular the categorization of characters. I categorize, based on Erich Auerbach and Robert Alter, the features of biblical characters, developing comparisons with theories of the character in the modern novel. The analysis of the main texts from the Gospel of Matthew that portray the character Peter leads to the conclusion that its main features are complexity and inversion. They produce an overview of the involution of the character in the narrative of the Gospel of Matthew.
Key words: Peter. Gospel of Matthew. Narrative theory. Complexity. Inversion.
Introdução
Uma narrativa apresenta como elementos estruturais: tempo (s), cenário (s), personagens, enredo e um narrador. Podemos afirmar que um item é mais importante do que os outros? Difícil, visto que tal avaliação está condicionada ao tipo de texto que se tem em mãos, ao período em que foi escrito, às ênfases propostas etc. Em certo momento, o narrador será a figura de destaque, em outro, o cenário, talvez o tempo ocupe a centralidade em determinada obra, e, ainda em outra, os personagens configurarão o eixo central.
No contexto da produção narrativa, este artigo tem como objetivo trabalhar apenas um de seus aspectos: o personagem. Antonio Candido afirma sua importância ao dizer que, na relação com o enredo e as ideias presentes na obra, "avulta a personagem, que representa a possibilidade de adesão afetiva e intelectual do leitor, pelos mecanismos de identificações, projeção, transferência etc. A personagem vive as idéias e os torna vivos" (1995, p. 54). Ou seja, o personagem assume destaque ao se constituir em principal veículo de conexão entre obra e leitores.
A escolha do personagem neste texto recai sobre o apóstolo Pedro. Afinal ele, depois de Jesus Cristo, é a figura de maior destaque nos três primeiros evangelhos canônicos. Para além dos aspectos históricos e religiosos de sua pessoa1, surgem dados dos próprios evangelhos que confirmam o papel de proeminência do discípulo de Jesus Cristo. Oscar Cullmann faz uma síntese a esse respeito:
De acordo com os Sinóticos, Pedro assumiu uma posição especial no grupo que seguia Jesus. Com os irmãos de Zebedeu e seu irmão André, ele pertenceu ao círculo dos seguidores mais íntimos de Jesus. Mesmo nesse círculo (Mc 9.2 e paralelos) ele possuía uma posição de destaque, de forma que os Evangelhos Sinóticos sempre o apresentam à frente dos demais (Mc 9.5). Dessa forma, Jesus levou apenas Pedro e os filhos de Zebedeu com Ele para o interior da casa do chefe da sinagoga, Mc 5.37. Pedro é também o personagem líder na história da pesca miraculosa, Lc 5.1ss. Segundo Mt 14.28, é ele que tenta imitar o Senhor caminhando sobre o lago. Ele se distingue pelo excesso de zelo e empenho, embora essas características também o levem à negação. Ele atua como porta-voz dos doze, e é ele que acaba ouvindo as duras palavras: "Arreda, Satanás! Porque não cogitas das cousas de Deus, e sim das dos homens" Mc 8.29-33 e paralelos. [...] Em nome dos discípulos ele faz a casuística pergunta: "Senhor, até quantas vezes meu irmão pecará contra mim, para que eu lhe perdoe? Até sete vezes?" Mt 18.21. Mesmo pessoas de fora, como o coletor de impostos (Mt 17.24), dirigem-se a ele como representante dos seguidores de Jesus. A lista dos discípulos (Mc 3.16; Mt 10.2; Lc 6.14; At 1.13) confirma essa posição. Existem diferenças entre as listas, mas todas colocam o nome de Pedro em primeiro lugar (Mt. protos) e, dessa forma, dão suporte ao papel de proeminência de Pedro nos relatos evangélicos (CULLMANN, 1968, v. 6, p. 101-102, tradução nossa).
Abordar o apóstolo Pedro como personagem não implica a negação de aspectos históricos ligados ao conteúdo dos evangelhos, mas o reconhecimento de que tais textos não são historiográficos em sentido científico moderno. Não há neles intenção de descrever os acontecimentos que envolveram a vida de Jesus Cristo e de seus seguidores de uma forma incontestável e indiscutível. Tal perspectiva era estranha aos homens que escreveram os evangelhos. O objetivo era identificar, na vida de Jesus Cristo e de seus seguidores na Palestina dos anos 30 d.C., elementos que fossem relevantes para os cristãos dos anos 80 e seguintes, período em que os evangelhos foram escritos.
Dessa forma, os evangelhos visavam atender a questões missiológicas, apologéticas e pastorais das comunidades cristãs espalhadas pelo império romano. Nesse contexto, há diferenças entre eles não apenas de datação e de origem geográfica, mas também de conteúdo e de abordagem2.
Reconhecer diferenças e alterações na redação dos evangelhos é importante não apenas do ponto de vista do conteúdo, mas também da forma como o conteúdo é veiculado em cada obra. Afinal, como salienta Terry Eagleton, "parte do que entendemos como obra 'literária' relaciona o que é dito com o como é dito. É o tipo de escrita em que o conteúdo é inseparável da linguagem em que ele é apresentado" (2013, p. 3, grifo do autor).
A teoria que até este momento explica de forma mais plausível a relação entre os evangelhos sinóticos é a Teoria das Duas Fontes, que propõe o evangelho de Marcos como o primeiro a ser escrito. Em seguida, tanto Mateus quanto Lucas o utilizaram como uma de suas fontes. Isso explica haver grandes blocos de textos marcanos em ambos os evangelhos. Mateus e Lucas também apresentam material em comum, não proveniente de Marcos. Provavelmente seus autores tiveram acesso a uma fonte em comum. Como essa fonte somente pode ser reconstruída a partir da comparação dos dois evangelhos, não existindo como texto concreto, ela foi denominada de fonte "Q" (de Quelle, "fonte" em alemão). Daí o título de Teoria das Duas Fontes: Mateus e Lucas possuem Marcos e a fonte Q como suas principais fontes. Ao mesmo tempo, Mateus e Lucas trazem material próprio. A eles convencionou-se intitular fonte M, para Mateus, e fonte L, para Lucas.
A Teoria das Duas Fontes esclarece não apenas a origem dos materiais, mas permite reconhecer alterações nelas. Mateus e Lucas não utilizaram passivamente as fontes. Alteraram tanto textos de Marcos quanto de Q. Tais mudanças se deram em função dos objetivos específicos que motivaram a escrita desses evangelhos. Indicam, igualmente, que houve alto grau de tratamento literário nos textos.
Nesse contexto, a escolha do evangelho de Mateus para analisar a figura de Pedro como personagem justifica-se formalmente em virtude do evangelho possuir duas passagens em que o apóstolo recebe maior destaque em relação aos paralelos: no incidente em que Jesus caminha sobre o mar, apenas em Mateus Pedro pede a Jesus para realizar tal proeza (Mt 14.22-31, Mc 6.45-52, Jo 6.15-21); e na confissão de Pedro sobre o messianismo de Jesus Cristo, somente em Mateus há a afirmação de Jesus de que Pedro é a "pedra sobre a qual ele edificaria sua igreja" (Mt 16.13-20, Mc 8.27-30, Lc 9.18-21).
1 Personagens bíblicos
Como Pedro é caracterizado no evangelho de Mateus? A resposta deve ser inserida em contexto maior que pergunta pela caracterização de personagens bíblicos.
Erich Auerbach, no livro Mimesis, afirma sobre os personagens bíblicos que "o mais importante [...] é a multiplicidade de camadas dentro de cada homem [...]" (1998, p. 10). Quanto ao desenvolvimento, destaca Jacó, inicialmente um ladrão da bênção de seu irmão, tornando-se, posteriormente, o patriarca dos doze filhos que se tornariam as doze tribos de Israel: "Mas, que caminho, que destino se interpõe entre o Jacó que obteve ardilosamente a bênção de primogênito e o ancião cujo filho mais amado foi despedaçado por uma fera3 [...]" (1998, p. 14).
Robert Alter concorda com Auerbach, ressaltando o jogo de relações entre primeiro e segundo plano narrativos: "É bem verdade, conforme assinalam Erich Auerbach e outros, que os acontecimentos delineados de modo rarefeito no primeiro plano da narrativa bíblica supõem, de certa maneira, um vasto segundo plano de densas possibilidades de interpretação" (2007, p. 175). E, para efeito de especificação, distingue esse tipo de narrativa daquela presente no romance moderno:
a narrativa bíblica não contém análises minuciosas de causas ou razões, nem entra em detalhes a respeito de processos psicológicos; somente nos concede indicações mínimas acerca de sentimentos, atitudes e intenções, e oferece-nos pouquíssimas informações sobre o aspecto físico, a gesticulação e os trejeitos, a roupa e os instrumentos usados pelos personagens, o ambiente físico em que eles cumprem seus destinos. Em suma, todos aqueles sinais de uma individualidade matizada a que a tradição literária ocidental nos habituou - sobretudo no romance moderno, mas também nas epopeias e histórias romanescas [romances] da literatura grega - parecem estar ausentes da Bíblia (ALTER, 2007, p. 174).
James Wood também salienta a predileção pelo externo na narrativa bíblica a partir da cena em que o rei Davi comete adultério com Bate-Seba4:
O que importa ao autor da Bíblia não é o estado de espírito de Davi, mas a história inteira, todo o arco de sua vida. [...] Davi não tem mente, tal como entendemos a subjetividade moderna. Não tem passado, por assim dizer, e não tem memória porque o que importa é a memória de Deus, que nunca esquece. [...] Mas, para o escritor da história de Davi, o estado mental é exatamente o que está vedado; a ação é tudo [...] Davi vê e age. No que concerne à narrativa, ele não pensa (WOOD, 2011, p. 129-130).
A narrativa bíblica, ao enfatizar as falas e ações dos personagens, coloca em segundo plano sua interiorização. O romance moderno, por outro lado, inverte a relação, salientando os aspectos internos dos personagens. Para Wood, "desenvolveu-se outro tipo de romance, em que o bem e o mal lutam dentro do mesmo personagem, em que há uma inquietude do eu. O que o romance começava a fazer de modo muito eficaz era explorar a relatividade na caracterização" (2011, p. 135).
Temos, então, duas propostas de apresentação do personagem. A bíblica e a do romance moderno. Uma anulará a outra? Para Robert Scholes e Robert Kellogg tal dilema não é necessário: "É loucura sugerir que uma ordem de caracterização é melhor que outra. Reconhecer a existência de diferenças é o começo da sabedoria" (1977, p. 112).
Lembremos que os personagens bíblicos aqui citados e caracterizados pelos teóricos provêm do Antigo Testamento, o que não se configura em problema, visto que a abordagem teológica e a linguagem com a qual recebem suas configurações são basicamente as mesmas nos dois testamentos. Entretanto, é necessário registrar o lembrete de Scholes e Kellogg: "A interiorização na cristandade, conforme representada pela declaração de Jesus sobre o adultério no coração5, abre um novo caminho à consideração da vida interior" (1977, p. 116). Ou seja, o Novo Testamento, no qual se encontra o personagem Pedro, apresenta uma evolução em relação ao Antigo Testamento quanto à presença de descrições da vida interior de seus personagens, embora em poucas situações.
Como síntese do que foi apresentado até este momento, pensando tanto no Antigo quanto no Novo Testamento, é de fundamental importância a observação: "Convém observar que é possível tratar um personagem em desenvolvimento sem apresentar sua vida interior em grande detalhe" (SCHOLES; KELLOGG, 1977, p. 117).
Diante do que foi dito, a questão principal a ser discutida é: como o personagem Pedro é apresentado no evangelho de Mateus? De forma definitiva, à semelhança dos personagens homéricos6, ou em evolução, como vários personagens do Antigo e do Novo Testamento? Se a resposta à última pergunta for positiva, como se dá tal desenvolvimento?
2 Pedro como personagem no evangelho de Mateus
Os evangelhos canônicos pertencem ao gênero literário biografia greco-romana7, e, por isso, apresentam Jesus Cristo como biografado e figura central. Por conta disso, todos os demais elementos, como cenários, tempos, personagens operam em um nível abaixo, contribuindo para o destaque e performance do protagonista. Podemos dizer, dessa forma, que a narrativa evangélica se desenvolve a partir de um "homem-narrativa", segundo o conceito de Tzvetan Todorov (2003, p. 119-133). Os demais personagens gravitam em torno de Jesus Cristo, sendo que a maioria, para utilizar a nomenclatura clássica, pode ser definida como "personagens planos"8 (FORSTER, 1998, p. 65-74).
Dentro desse quadro, a avaliação dos personagens se dá a partir de sua concordância ou discordância com os princípios e atitudes assumidos por Jesus Cristo. Mesmo Pedro, ainda que seja o personagem que mais se aproxima do protagonista em termos de construção narrativa, está sob o critério da concordância/discordância com Jesus.
As cenas em que aparecem menções a Pedro, Simão e Simão Pedro em Mateus são em número de 159, as quais, em graus variados de importância, estão ligadas ao início do ministério de Jesus, ao seu desenvolvimento e aos momentos finais em Jerusalém quando Jesus é julgado, crucificado e morto. Analisarei os textos mais importantes para a caracterização de Pedro enquanto personagem.
2.1 Mateus 4.18-20
A primeira referência a Pedro no evangelho se dá em Mt 4.18-2010, quando ele recebe o chamado para seguir Jesus:
Caminhando junto ao mar da Galiléia, viu dois irmãos, Simão, chamado Pedro, e André, que lançavam as redes ao mar, porque eram pescadores. E disse-lhes: Vinde após mim, e eu vos farei pescadores de homens. Então, eles deixaram imediatamente as redes e o seguiram.
Diferentemente do que pensa o exegeta Donald Hagner, ao afirmar que "Simão é identificado por Mateus como ton legómenon Petron, 'chamado Pedro' (cf. 10:2), antecipando o fundamental papel que Pedro exercerá no evangelho" (1993, v. 33a, p. 76), é mais adequado pensar que, do ponto de vista narrativo, "Pedro" não constitui o nome, mas um apelido de Simão, que intencionalmente não é explicitado neste momento. Essa forma de nomeação aparece também na lista dos apóstolos em 10.2.11 Qual seu sentido? O termo grego petros significa "pedra", e talvez faça referência à força física de Simão, ou então ao seu estilo rude. O fato é que o apelido, neste momento, não é teologizado. Ele o será apenas em 16.18. Não há nenhum outro dado biográfico presente, apenas o fato de que Simão, apelidado Pedro, irmão de André, pescador, é chamado para ser pescador de homens. É digna de nota a ausência de detalhes sobre tal chamado. Qual a razão?
Estamos no início do ministério de Jesus Cristo, logo após seu batizado (3.13-17) e a tentação pelo diabo (4.1-11), dois eventos de capital importância, que não apenas marcam o início do ministério como o autenticam. O batismo é o momento em que o Espírito Santo desce sobre ele (v. 16) e ouve-se uma voz do céu, provinda de Deus, que afirma ser Jesus seu "Filho amado" (v. 17). Na tentação Jesus confirma a filiação divina, afirmada no batismo, pela obediência. O diabo solicita a ele que "comprove" ser filho de Deus apresentando várias propostas de ação, que são preteridas por colocarem em cheque sua fidelidade ao Pai. Dessa forma, o narrador faz com que Jesus atualize o papel de Israel que sucumbiu às tentações no deserto12. Ele é o filho que, pela obediência, permite que o novo Israel, aqueles que são e serão chamados por ele, possa vencer as tentações do diabo.
Como o novo Israel se constitui? A partir do atendimento à convocação com a qual Jesus dá início a seu ministério: "Arrependei-vos, porque está próximo o reino dos céus" (4.17). O chamado genérico ao "arrependimento" - verbo grego metanoeo, que também significa "mudança de mente" (GINGRICH, DANKER, 1984, p. 134) - é seguido pela convocação e atendimento imediato de Pedro, seu irmão André e os irmãos Tiago e João. Eles deixam de ser pescadores de peixes para tornarem-se pescadores de homens, nas palavras de Jesus. Esta mudança de vida, logo após uma mudança de mente, indica que o seguimento de Jesus está ligado diretamente à aceitação de sua mensagem. Pedro alista-se entre aqueles que atendem ao chamado ao arrependimento, e o demonstra concretamente deixando sua atividade profissional para seguir o mestre.
Por decorrência, o texto que introduz Pedro no evangelho de Mateus descrevendo seu pronto atendimento ao chamado de Jesus e a designação de sua missão o caracteriza em termos ideais. Afinal, o seguimento imediato é uma característica do discípulo de Jesus Cristo: "Segue-me, e deixa os mortos sepultarem seus próprios mortos" (8.22).
A sequência do evangelho, entretanto, centrada nas pregações e ações de Jesus, não apresenta Pedro no papel de "pescador de homens". Essa é uma questão que fica em aberto até 10.1-4, quando o narrador relata o chamado formal dos doze apóstolos feito por Jesus, colocando Pedro em destaque, como o primeiro dentre eles (v. 2 - protos Simon ho legomenos Petros - "primeiro Simão, chamado/apelidado Pedro")13. Em seguida temos o envio dos doze a seus compatriotas judeus com as seguintes orientações: "À medida que seguirdes, pregai que está próximo o reino dos céus. Curai enfermos, ressuscitai mortos, purificai leprosos, expeli demônios; de graça recebestes, de graça dai" (10.7-8). Esta informação é importante, visto que eles proclamam a mesma mensagem que ouviram de Jesus (cf. 4.17-19), e operam curas assim como Jesus as fazia (cf. 4.24; 9.35).
Pedro e os demais apóstolos, portanto, recebem orientações sobre como exercer a função de "pescadores de homens", o que, do ponto de vista da caracterização do apóstolo, reforça sua identidade como discípulo de Jesus. Mas o tratamento de tal missão é descrito de modo ambíguo, uma vez que após uma longa série de orientações (10.5-42) não há registro de que eles, de fato, saíram pregando e curando. Pelo contrário, ao final o narrador volta a atenção para Jesus e sua missão dizendo: "Ora, tendo acabado Jesus de dar estas instruções a seus doze discípulos, partiu dali a ensinar e pregar nas cidades deles" (11.1). A mudança abrupta do foco narrativo dos doze para Jesus, sem esclarecer se, de fato, houve uma missão apostólica, indica que no decorrer do evangelho eles não exercerão plenamente a função de pescadores de homens. Essa estratégia narrativa implica uma fragilização dos elementos idealizadores de Pedro enquanto seguidor de Jesus.
2.2 Mateus 14.22-33
A próxima menção a Pedro se encontra em 14.28-29, na narrativa em que Jesus caminha sobre as águas (14.22-33).
Logo a seguir, compeliu Jesus os discípulos a embarcar e passar adiante dele para o outro lado, enquanto ele despedia as multidões.
E, despedidas as multidões, subiu ao monte, a fim de orar sozinho. Em caindo a tarde, lá estava ele, só.
Entretanto, o barco já estava longe, a muitos estádios da terra, açoitado pelas ondas; porque o vento era contrário.
Na quarta vigília da noite, foi Jesus ter com eles, andando por sobre o mar.
E os discípulos, ao verem-no andando sobre as águas, ficaram aterrados e exclamaram: É um fantasma! E, tomados de medo, gritaram.
Mas Jesus imediatamente lhes disse: Tende bom ânimo! Sou eu. Não temais!
Respondendo-lhe Pedro, disse: Se és tu, Senhor, manda-me ir ter contigo, por sobre as águas.
E ele disse: Vem! E Pedro, descendo do barco, andou por sobre as águas e foi ter com Jesus.
Reparando, porém, na força do vento, teve medo; e, começando a submergir, gritou: Salva-me, Senhor!
E, prontamente, Jesus, estendendo a mão, tomou-o e lhe disse: Homem de pequena fé, por que duvidaste?
Subindo ambos para o barco, cessou o vento.
E os que estavam no barco o adoraram, dizendo: Verdadeiramente és Filho de Deus!
Vendo que o barco dos discípulos era castigado com as ondas e o vento no mar da Galileia, Jesus se dirige a ele caminhando sobre as águas. Os homens ficam aterrorizados, pensando ser um fantasma e, mesmo após ouvirem a voz de Jesus para que não temessem, Pedro pede um sinal de que era mesmo o mestre: sair do barco e caminhar até ele. Autorizado por Jesus, Pedro segue em sua direção. Este fato é importante, uma vez que caracteriza Pedro em sintonia com Jesus, identificando-se com ele. No texto analisado anteriormente, esse aspecto já se manifestou parcialmente, quando Pedro recebeu a missão de pregar como Jesus. Agora ele exercita o atributo sobrenatural de caminhar sobre as águas. Logo a seguir, no entanto, começa a submergir com "medo" da força do vento. Este é o primeiro sentimento de Pedro apresentado aos leitores pelo narrador. Tal sentimento o faz perder a sintonia com Jesus. Mesmo que este o salve do afogamento, a frase "homem de pequena fé, por que duvidaste?" aprofunda teológica e concretamente a distância entre eles. A fé/coragem presentes no caminhar sobre as águas se dissipa com a presença do medo, que, por sua vez, manifesta falta de confiança. A pergunta pela razão da falta de fé e da presença da dúvida fica sem resposta. Pedro silencia.
2.3 Mateus 16.13-23
O texto a seguir, certamente o mais conhecido sobre Pedro nos evangelhos, é o de 16.13-20, seguido por 16.21-23. A resposta de Pedro à pergunta de Jesus: "Mas vós, continuou ele, quem dizeis que eu sou?" (v. 15), de forma categórica é: "Tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo" (v. 16). Resposta que introduz, pela primeira vez no evangelho, um ser humano declarando a messianidade de Jesus14. Ele é o enviado, o Filho de Deus. Em decorrência, Jesus afirma sobre Pedro: "Também eu te digo que tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha igreja, e as portas do inferno não prevalecerão contra ela" (v. 18). Sem entrar na discussão secular entre católicos e protestantes a respeito do sentido da edificação da igreja sobre a pedra/Pedro, deve-se ressaltar que Pedro não é apenas caracterizado como alguém em total identidade com Jesus, mas também como o objeto pelo qual a revelação da identidade de Jesus é manifesta. Este é um ponto alto na caracterização de Pedro.
O diálogo entre Jesus e Simão é que define, teologicamente, o significado do apelido Pedro (= pedra). O primeiro sentido, que poderia ser de força física ou de rudeza, fica em segundo plano e o religioso recebe destaque, tornando-se Simão a pedra sobre a qual a igreja será edificada. Este é o mais alto status gozado por Pedro no evangelho.
No texto seguinte o narrador introduz a explicação de Jesus aos discípulos de que sua missão consistia em caminhar até Jerusalém para lá sofrer, ser morto e ressuscitar (16.21). Pedro, que no relato da caminhada sobre o mar já manifestara seu caráter intempestivo, o faz novamente agora: "E Pedro, chamando-o à parte, começou a reprová-lo, dizendo: Tem compaixão de ti, Senhor; isso de modo algum te acontecerá" (v. 22). Aqui há uma profunda ruptura. Pedro censura Jesus pelas palavras ditas. O discípulo assume o papel de mestre. Jesus reage, sem contemporizar, amplificando a ruptura: "Mas Jesus, voltando-se, disse a Pedro: Arreda, Satanás! Tu és para mim pedra de tropeço, porque não cogitas das coisas de Deus, e sim das dos homens" (v. 23).
Embora a tradução traga a expressão "pedra de tropeço", ela não consta no texto grego. O tradutor procura dar sentido ao termo skandalon, que neste contexto significa "armadilha, tentação ao pecado, incitamento" (GINGRICH; DANKER, 1984, p. 189). Pedro é identificado com Satanás por propor a Jesus a fuga da cruz, e com isso, motivá-lo a abandonar sua missão. Essa ideia é reforçada pela expressão: "Arreda, Satanás". Em grego temos "Ypage opiso mou, Satanã" ("vai para longe de mim, Satanás") que é praticamente a mesma expressão usada em 4.10, na terceira e última tentação de Jesus pelo diabo: "Ypage, Satanã" ("Para longe, Satanás"). Portanto, tanto no plano vocabular quanto no da ação, Pedro é identificado com Satanás e sua tentativa de desviar Jesus da missão que resultará em morte.
Esse momento do evangelho revela grande tensão. Pedro transita, em pouquíssimo tempo, entre ser veículo de uma revelação divina e ser portador de uma proposta satânica. Entre ser a pedra sobre a qual a igreja será edificada e logo depois tornar-se escândalo para Jesus. Pedro se manifesta ambíguo em extremo.
2.4 Mateus 26
O último texto, na realidade uma sequência de textos, encontra-se no capítulo 26. Frente ao aviso de Jesus da proximidade de sua prisão: "Esta noite, todos vós vos escandalizareis comigo; porque está escrito: Ferirei o pastor, e as ovelhas do rebanho ficarão dispersas" (v. 31), Pedro reage de forma indignada: "Ainda que venhas a ser um tropeço para todos, nunca o serás para mim (v. 33). Por trás da aparente fidelidade, nova ruptura. Pedro não apenas discorda da avaliação de Jesus, como sugere que a prisão do mestre poderia ser "tropeço" (skandalos) para os demais, não para ele. Novamente Pedro inverte a situação. Jesus afirmou anteriormente (16.23) que ele, Pedro, havia se constituído em escândalo. Mas, para Pedro, é Jesus que pode se tornar motivo de escândalo para os discípulos!
Jesus não se deixa vencer e responde: "Em verdade te digo que, nesta mesma noite, antes que o galo cante, tu me negarás três vezes" (v. 34); e Pedro, inflexível, retruca: "Ainda que me seja necessário morrer contigo, de nenhum modo te negarei. E todos os discípulos disseram o mesmo" (v. 35). Temos, nesse caso, um aprofundamento da ruptura trasvestida de fidelidade da parte de Pedro, e de desmascaramento por parte de Jesus. Há, aqui, posicionamentos muito claros e distintos, que se fincam no chão da convicção de forma inamovível. A sequência da narrativa indicará quem está correto.
Logo após vemos Jesus dirigindo-se para o Getsêmani na companhia de Pedro e os irmãos Tiago e João (26.36-46). Ele está triste e angustiado com a proximidade da morte (v. 38). Quer a companhia dos três amigos. Após um período de oração, Jesus volta-se para os discípulos e encontra-os dormindo. Pergunta diretamente a Pedro: "Então, nem uma hora pudestes vós vigiar comigo?" (v. 40). Por mais duas vezes eles dormem (v. 43, 45). Pedro, aquele que dissera que se necessário morreria com Jesus (v. 35), não consegue nem ao mesmo ficar acordado em companhia de seu Senhor. Novo distanciamento.
Após Jesus ser preso (26.47ss) e conduzido a julgamento na casa do sumo sacerdote Caifás, em um raro momento em que o narrador retira o foco de Jesus, Pedro torna-se o agente central. Ele circula pelos jardins da casa, certamente para ver como se dará o julgamento. Ali, por três vezes ele é identificado com Jesus: "Também tu estavas com Jesus, o galileu" (v. 69); "Este também estava com Jesus, o nazareno" (v. 71); "Verdadeiramente, és também um deles, porque o teu modo de falar o denuncia" (v. 73). E nega Jesus por três vezes (v. 70, 72, 74).
Deve-se salientar que a identificação de Pedro como discípulo é feita por terceiros e com características superficiais, como o andar com Jesus e o sotaque galileu, igual ao de Jesus. O reconhecimento não se dá pela pregação do reino ou pelas curas que deveria praticar, marcas do verdadeiro discipulado. Assim mesmo, tal identificação é demais para Pedro.
Quando a terceira pessoa o reconhece, o galo canta (v. 74), como Jesus havia antevisto (v. 34). O mestre estava certo. Pedro errado. Tomando consciência do que acontecera, o apóstolo sai do local e chora amargamente (v. 75). A distância geográfica de Pedro em relação a Jesus simboliza o afastamento emocional, religioso e humano entre eles. O comentarista Ulrich Luz interpreta o choro de Pedro como sinal de arrependimento: "Fora, chora amargamente, sinal de profundo arrependimento" (2005, p. 297, tradução nossa). No entanto, vê a necessidade de justificar a interpretação ao dizer que
Ainda que Mateus não volte a mencionar Pedro nominalmente, nem apresente um registro explícito de sua reabilitação, como faz João 21,15-1915, suas leitoras e leitores têm claro que Deus perdoará o abandono de sua fé. Pedro estará novamente no monte da Galileia, sem ser mencionado pelo nome (28,16-20) (2005, p. 297, tradução nossa).
A argumentação é fraca. Mesmo que se possa justificá-la do ponto de vista teológico/histórico, ou seja, da constituição da mensagem do evangelho para seus primeiros leitores, alguns dos quais conheciam e até mesmo conviviam com o apóstolo Pedro, o pregador do evangelho, em se tratando de uma abordagem literária o argumento não se sustenta. A fuga e o choro de Pedro indicam que ele está consciente de ter agido equivocadamente, mas também sua incapacidade de administrar tal situação.
Esta é a última aparição de Pedro no evangelho. E nela temos um apóstolo que nega explicitamente seu mestre. O capítulo 27 apresentará o julgamento de Jesus por Pilatos, sua crucificação e morte. No lugar de Pedro e dos discípulos surgem as mulheres discípulas de Jesus, que desde o início do ministério na Galileia o serviam (27.55). Elas estão junto à cruz (27.55-56) e colocam-se em frente ao túmulo onde o corpo é depositado (v. 61). No capítulo 28 elas vão ao sepulcro (28.1) e ouvem de um anjo a notícia de que Jesus ressuscitou (28.5-6), sendo enviadas pelo ser celeste aos discípulos para avisá-los da boa notícia (v. 7). Jesus ressuscitado, provavelmente como forma de reconhecimento pelo que fizeram, manifesta-se a elas (v. 9-10).
Os discípulos reaparecem apenas nos últimos versículos do evangelho (28.18-20) - Pedro entre eles, mas sem ser nomeado -, quando recebem o comissionamento do Jesus ressurreto para fazerem discípulos de todas as nações.
Conclusão
Pedro, personagem no evangelho de Mateus, está longe de ser considerado um personagem acabado, como o são os homéricos, segundo Erich Auerbach. E diferentemente de boa parte dos personagens clássicos e daqueles dos romances e do Antigo Testamento, Pedro é um personagem complexo, caracterizado a partir de uma construção invertida. Ele aparece no evangelho como discípulo ideal, mas no decorrer da trama vai involuindo, contrariando as expectativas positivas em relação a ele. Tal processo é evidenciado em suas posições dúbias e contraditórias em alguns momentos e, em outros, em posturas de explícita confrontação com Jesus.
Como dito na Introdução, não há um processo de psicologização do personagem. Pelo contrário, ele é apresentado por intermédio de suas palavras e ações. Mas há, conforme identifica Wood em relação ao romance, "a relatividade na caracterização" (2011, p. 135). As dubiedades e os movimentos a favor e contra Jesus dão os contornos da complexidade e da relatividade do personagem Pedro. Quando se espera que ele tenha uma atitude, ele vai em direção contrária. Quando se espera que, ao final, diante do sofrimento de Jesus, ele se identifique com o mestre, surge a negação.
Pedro não evolui. Ele regride. Aos poucos, em meio às crises, se apequena. Ele vai diluindo-se no decorrer da narrativa. À medida que a cruz se aproxima de Jesus, Pedro se afasta dele. Provavelmente uma leitura religiosa não permite constatar esse fato, mas no evangelho de Mateus o personagem Pedro está longe de ser um modelo de cristão. Ele é um personagem complexo que experimenta inversões em sua relação com Jesus Cristo.
Sua última aparição no evangelho é sintomática: ele chora amargamente por negar Jesus. Praticamente não é mais discípulo. Somente não podemos fazer tal afirmação pelo fato de que Pedro, diluído entre os demais apóstolos, recebe do Cristo ressuscitado o comissionamento de pregar o evangelho. E aqui está um aspecto da arte narrativa na composição do evangelho. Não é apenas Pedro que se torna indefinido, sem uma postura clara. O próprio narrador age dessa forma ao interromper a lógica de leitura pela qual Pedro, afastando-se choroso de Jesus, estaria indicando sua negação ao discipulado. Isso não acontece porque o narrador apresenta a comissão aos doze para que façam discípulos, inclusive Pedro, no final do evangelho.
1 A esse respeito, cf. o clássico livro de Oscar Cullmann Peter: Disciple - Apostle - Martyr. Translated by Floyd V. Filson. Philadelphia: Westminster Press, 1953 (original alemão de 1952). E mais recentemente a obra de Joachim Gnilka. Pedro e Roma: a figura de Pedro nos dois primeiros séculos. Tradução de Paulo Ferreira Valério. São Paulo: Paulinas, 2006 (original alemão de 2002).
2 Os quatro evangelhos canônicos, quanto ao conteúdo, são divididos em evangelhos sinóticos - Marcos, Mateus e Lucas - e o evangelho de João. Os três primeiros possuem tanto material em comum quanto diverso, o que permite propor explicações para as semelhanças e diferenças entre eles. Já o evangelho de João apresenta tantas variações em relação aos sinóticos que é necessário estudá-lo à parte.
3 Auerbach faz referência ao estratagema de seus filhos para se desvencilharem de José, o irmão preferido do pai. Para tanto, venderam o rapaz para comerciantes que se dirigiam para o Egito e, em seguida, tomaram uma túnica de José, embeberam-na com sangue de bode e levaram ao pai afirmando que um animal selvagem havia despedaçado o jovem (cf. Gênesis cp. 37). O autor enfatiza o sofrimento de Jacó diante da notícia da morte do filho amado.
4 Livro de 2 Samuel, capítulos 11 e 12.
5 Conforme o texto de Mateus 5.27-28: "Ouvistes o que foi dito: Não adulterarás. Eu, porém, vos digo: qualquer que olhar para uma mulher com intenção impura, no coração, já adulterou com ela" (grifo nosso).
6 Cf. a esse respeito a comparação feita por Erich Auerbach entre os personagens bíblicos e os homéricos no cp. 1 do livro Mimesis: a representação da realidade na literatura ocidental.
7 Cf. a argumentação a esse respeito no capítulo "2. Evangelho de Mateus e gênero literário", do livro que escrevi juntamente com Júlio Paulo T. Zabatiero. Bíblia, literatura e linguagem. São Paulo: Paulus, 2011, p. 41-73.
8 Personagens planos são aqueles secundários em uma narrativa, com poucas características, sem desenvolvimento psicológico, despidos de complexidades, e que geralmente exercem a função de contracenar com os personagens principais, esses nomeados por Forster como "redondos".
9 Mt 4.18; 8.14; 10.2; 14.28-29; 15.15; 16.16-18; 16.22-23; 17.1-4; 17.24-26; 18.21; 19.27; 26.33-35; 26.37-40; 26.58; 26.69-75.
10 A versão bíblica utilizada é a BÍBLIA Sagrada. 2. ed. Revista e atualizada. Tradução de João Ferreira de Almeida, 1993. Quando necessário farei uso do texto original em grego.
11 Embora a versão de Almeida Atualizada utilizada neste trabalho traga "Simão, por sobrenome Pedro", a expressão em grego é a mesma de 4.18: Simona ton legomenon Petron (4.18) / Simon ho legomenos Petros (10.2). Por essa razão, a Bíblia do Peregrino traduz os dois versículos da mesma forma: "Simão, apelidado Pedro" (2002, p. 2324 e 2339).
12 Cf. O livro de Números, capítulos 13 e 14.
13 Apenas o narrador do evangelho de Mateus registra ser Pedro "o primeiro", o que reflete a importância do apóstolo no evangelho.
14 Anteriormente a voz divina já havia feito semelhante anúncio no batismo. Cf. 4.17.
15 Segue o texto do evangelho de João, cap. 21: "Depois de terem comido, perguntou Jesus a Simão Pedro: Simão, filho de João, amas-me mais do que estes outros? Ele respondeu: Sim, Senhor, tu sabes que te amo. Ele lhe disse: Apascenta os meus cordeiros. Tornou a perguntar-lhe pela segunda vez: Simão, filho de João, tu me amas? Ele lhe respondeu: Sim, Senhor, tu sabes que te amo. Disse-lhe Jesus: Pastoreia as minhas ovelhas. Pela terceira vez Jesus lhe perguntou: Simão, filho de João, tu me amas? Pedro entristeceu-se por ele lhe ter dito, pela terceira vez: Tu me amas? E respondeu-lhe: Senhor, tu sabes todas as coisas, tu sabes que eu te amo. Jesus lhe disse: Apascenta as minhas ovelhas. Em verdade, em verdade te digo que, quando eras mais moço, tu te cingias a ti mesmo e andavas por onde querias; quando, porém, fores velho, estenderás as mãos, e outro te cingirá e te levará para onde não queres. Disse isto para significar com que gênero de morte Pedro havia de glorificar a Deus. Depois de assim falar, acrescentou-lhe: Segue-me".
REFERÊNCIAS
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ALTER, Robert. A arte da narrativa bíblica. Tradução de Vera Pereira. São Paulo: Cia. das Letras, 2007.
AUERBACH, Erich. Mimesis: a representação da realidade na literatura ocidental. 4. ed. Tradução de George Bernard Sperber. São Paulo: Perspectiva, 1998.
BÍBLIA do Peregrino. SCHÖKEL, Luís Alonso (Org.). Tradução de Ivo Storniolo e José Bortolini. São Paulo: Paulus, 2002.
BÍBLIA Sagrada. 2. ed. Revista e atualizada. Tradução de João Ferreira de Almeida. Barueri: Sociedade Bíblica do Brasil, 1993.
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CULLMANN, Oscar. Peter: Disciple - Apostle - Martyr. Translated by Floyd V. Filson. Philadelphia: Westminster Press, 1953.
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EAGLETON, Terry. How to read literature. New Haven: Yale University Press, 2013.
FORSTER, Edward M. Aspectos do romance. 2. ed. Tradução de Maria Helena Martins. São Paulo: Editora Globo, 1998.
GINGRICH, F. Wilbur; DANKER, Frederick W. Léxico do Novo Testamento grego/português. Tradução de Júlio P. T. Zabatiero. São Paulo: Vida Nova, 1984.
GNILKA, Joachim. Pedro e Roma: a figura de Pedro nos dois primeiros séculos. Tradução de Paulo Ferreira Valério. São Paulo: Paulinas, 2006.
HAGNER, Donald A. Matthew 1-13. Dallas: Word Books, 1993 (Word Biblical Commentary, v. 33a).
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SCHOLES, Robert; KELLOGG, Robert. A natureza da narrativa. Tradução de Gert Meyer. São Paulo: McGraw-Hill, 1977.
TODOROV, Tzvetan. As estruturas narrativas. 4. ed. Tradução de Leyla Perrone-Moisés. São Paulo: Perspectiva, 2003.
WOOD, James. Como funciona a ficção. Tradução de Denise Bottmann. São Paulo: Cosac Naify, 2011.
ZABATIERO, Júlio Paulo. T.; LEONEL, João. Bíblia, literatura e linguagem. São Paulo: Paulus, 2011.
João Leonel *
Artigo recebido em 04 de novembro de 2013 e aprovado em 25 de fevereiro de 2014.
* Doutor em Teoria e História literária. Professor da Universidade Presbiteriana Mackenzie. País de origem: Brasil. E-mail: [email protected].
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Copyright Pontificia Universidade Catolica de Minas Gera, Programa de Posgraduacao em Ciencias da Religiao Jan-Mar 2014
Abstract
This article focuses on the apostle Peter as a character in the Gospel of Matthew. It aims at identifying the nuances and changes of the character Peter in the Gospel. For this purpose, I take as a starting point that the gospel belongs to the literary genre of ancient Greco-Roman Biography, which presents Jesus Christ as the protagonist. The other characters are developed in relationship with him. The same is true with the Apostle Peter. The article unfolds from narrative theory, in particular the categorization of characters. I categorize, based on Erich Auerbach and Robert Alter, the features of biblical characters, developing comparisons with theories of the character in the modern novel. The analysis of the main texts from the Gospel of Matthew that portray the character Peter leads to the conclusion that its main features are complexity and inversion. They produce an overview of the involution of the character in the narrative of the Gospel of Matthew. [PUBLICATION ABSTRACT]
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